Parte I
Segundo o Oxford Languages, desenvolvimento é definido como: “ação ou efeito de desenvolver(-se); desenvolução; crescimento, progresso, adiantamento”. Já progresso tem a seguinte definição: “ação ou resultado de progredir, movimento para a frente; avanço”. Desenvolvimento e progresso são palavras afins, portanto, e ambas têm suas derivadas.
Desenvolvimentismo é definido como: “valorização do desenvolvimento econômico ou tendência a valorizá-lo; política, atuação caracterizada por essa tendência”; enquanto progressismo tem a seguinte definição: “exaltação do progresso; tendência progressista; corrente de pensamento ou atitude mental dos que aceitam a evolução ou mudanças, esp. em matéria de religião”.
Porém, atualmente qualquer palavra ou expressão passou a ser passível de interpretações e ressignificações segundo a intencionalidade de quem as faz. Os neologismos se inserem nesse contexto: “emprego de palavras novas, derivadas ou formadas de outras já existentes, na mesma língua ou não; atribuição de novos sentidos a palavras já existentes na língua”.
Isso sem falar nas apropriações culturais, entre outras, que são execradas ou bem-vindas, dependendo do ideário e da conveniência de quem as avalia. Não basta seguir, é preciso se adequar aos padrões estabelecidos e provar que os segue, sob constante fiscalização. Mesmo assim, o entendimento ora é absoluto, ora relativo. O que é uma ofensa pode ser considerado normal, dependendo da origem. A moral tende a ser seletiva.
Uma das definições de progressismo remete à religião, o que também se aplica a ideologias em geral, o que justifica muito do que vem ocorrendo no mundo. Muito do que alguns definem como progressismo já ocorreu na Antiguidade, o que poderia ser considerado como retrocesso, mas também como cíclico.
Cada palavra ou expressão pode ser mal interpretada, e não faltam “especialistas” em patrulhar o que os outros dizem, condenando, perdoando ou até concordando, dependendo de quem as profere. Há sempre alguém pronto para atirar a primeira pedra, imediatamente acompanhado pelos que comungam da mesma ideologia ou religião, por espírito de corpo ou meio de vida, quase sempre. Já dizia o poeta: “Ideologia: eu que uma pra viver!”.
No mundo corporativo e institucional também é uma tendência atual transformar em siglas e expressões tudo o que deveria ser racional, de bom senso. Não basta praticar: e obrigatório se adequar aos padrões estabelecidos, quase sempre importados, no âmbito da globalização.
Estruturas são criadas nas organizações para assegurar que eles são cumpridos, e não faltam entidades certificadoras para atestá-lo. Tem sido um crescente mercado de trabalho. Algumas empresas têm seus setores jurídicos e de compliance maiores e seus profissionais melhor remunerados do que os que atuam efetivamente no negócio.
No entanto, para além de modismos, marketing e novos empregos associados, esses padrões e metas são interessantes como alertas diários, conscientizações que devem ser holísticas, o que infelizmente nem sempre ocorre.
Sejam os Objetivos de Desenvolvimento Sustentado – ODS, definidos na Plataforma 2030 da ONU. São 17 e também tenho minhas interpretações sobre alguns deles que, infelizmente, parecem não estar no escopo de alguns setores que se dizem “ativistas” da sociedade.
Seja o ODS 1 – Erradicação da pobreza. Penso que não há como viabilizar esse objetivo sem gerar riqueza, ou seja, é preciso que a economia seja forte para gerar empregos. Pensar que a solução esteja meramente na distribuição de renda mediante assistencialismo não resolve o problema, além de gerar dependência, comodismo ou conformismo ou até exigências. No mais, os recursos financeiros que suportam programas assistenciais vêm da arrecadação de tributos. Quanto mais pessoas dependerem deles, menos recursos estarão disponíveis. E se estiverem, virão em prejuízo de outras áreas, inclusive saúde, educação, segurança e habitação, o que pode agravar ainda mais problemas sociais, tornando-os crônicos. Além disso, é preciso motivar as pessoas a buscarem melhores condições de vida pelo estudo e trabalho, propiciando mobilidade, opções, autodeterminação, sob pena de manter um círculo vicioso de pobreza assistida. A erradicação da pobreza também inclui autoestima e autodeterminação.
ODS 2 – Fome zero e agricultura sustentável. É difícil falar nesse objetivo quando o agronegócio é encarado por alguns como um vilão, ao mesmo tempo em que é protagonista no comércio exterior do Brasil.
Seus detratores reclamam da expansão de áreas produtivas, das tecnologias que permitem aumento da produtividade por hectare, do preço da carne e da emissão de metano pelos rebanhos, entre outros. Exigem a ampliação de demarcações de áreas indígenas, áreas de preservação ambiental e afins, mas não dão alternativas de sustentabilidade para os povos que nelas vivem, a não ser subsídios governamentais e compensações de empreendimentos.
As alternativas propostas por alguns radicais, embora pareçam ambientalmente sustentáveis, são elitistas, pois não são acessíveis à população de menor renda.
ODS 3 – Saúde e bem-estar. Gostaria de saber o que certos setores da sociedade entendem como “bem-estar”, principalmente aqueles que propõem políticas para os outros, mas não as seguem.
Padrões mínimos não podem ser definidos como limitações ao desenvolvimento das pessoas, mas pontos de partida. Tampouco opções pessoais e doutrinações ideológicas podem ser impostas a outros seres humanos. Isso também é um tipo de violência.
A distinção entre saúde e bem-estar é coerente, na medida em que ter saúde não implica bem-estar em sentido mais amplo, mas é difícil estar bem quando não se tem saúde.
Saúde está primordialmente associada ao saneamento básico, que é infraestrutura fundamental em centros urbanos, mas também é necessário em áreas habitadas sujeitas a infestações.
O bem-estar é físico e espiritual, o que demanda comodidades que também dependem de infraestruturas, de estabilidade social, trabalho digno e liberdade de escolhas.
ODS 4 – Educação de qualidade. Aí talvez resida um dos principais questionamentos a serem feitos aos que definem políticas públicas.
Os comentaristas esportivos frequentemente usam a palavra “qualidade”, sem complementar se é boa ou ruim. Um “perna-de-pau” é um jogador de péssima qualidade, mas é muito bem visto por quem cuida de lesões e fraturas. Assim, qual é a qualidade que se propõe para a educação? E mesmo que ela seja devidamente qualificada, qual é o padrão adotado?
O importante é que ela qualifique bem quem é formado para atuar de forma positiva e útil à sociedade; que seja um instrumento pensante e atuante para a solução de problemas, e não para viver deles.
De nada adianta assegurar que todos tenham acesso ao ensino universitário, se não houver mercado de trabalho para os egressos, e se a formação pregressa for deficiente.
Às vezes, um curso técnico pode ser muito mais interessante, e nada impede que depois seja uma opção de evolução profissional cursar o Ensino Superior. Seria menos frustrante do que ter um curso superior, mas ser obrigado a atuar em atividades que prescindem dessa formação, ou menos oportunista ou patético viver de criticar o sistema, em busca de compensações por suas próprias escolhas e expectativas.
Falei que ponderaria sobre alguns dos ODS, mas cada um deles se presta a considerações de forma um pouco mais abrangente, para contrabalançar certas visões enviesadas ou seletivas, que esquecem que todos eles são integrados.
Em minha opinião, é possível – e necessário – estabelecer relações de igual importância entre todos, até porque vários se confundem, se agregam ou se complementam. Assim sendo, privilegiar um tornará o objetivo final capenga.
Até os próximos capítulos.

Escritor, Engenheiro, Pesquisador Universitário e membro da Academia Santista de Letras