Há algum tempo, uma amiga, sem explicar o motivo, me perguntou: “Se sua esposa tivesse que optar entre salvar a sua vida ou a de seu filho, qual opção ela escolheria?”.
Minha resposta foi imediata: A de meu filho!
Ela sorriu e explicou que o motivo do “teste” era um conhecido comum. Ele lhe contara que havia feito a mesma pergunta a sua esposa e, ao ouvir que ela não optaria por ele, ficou profundamente perturbado e frustrado, pois esperava uma resposta que considerasse toda uma história de companheirismo, cumplicidade e amor entre os dois.
Confesso que também fiquei surpreso, mas com a atitude e expectativa dele! Primeiro, porque é muito cruel propor esse tipo de questão para uma mãe. Segundo, porque eu nem precisaria perguntar isso para saber a resposta. Terceiro, porque os filhos são trazidos à vida pelos pais. Daí, nada mais justo que os pais sejam responsáveis pela preservação dessas vidas. Quarto, porque ele estava bem acima do peso e seria difícil sustentá-lo por muito tempo.
Os laços de amor entre um homem e uma mulher podem ser extremamente fortes, mas nunca chegarão sequer perto dos que unem mães e filhos, a começar pelo momento mágico da concepção.
Some-se a ele nove meses de coabitação física e espiritual num mesmo espaço corporal, compartilhando o mesmo alimento, relativizando o princípio da Física segundo o qual dois corpos distintos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço e ao mesmo tempo.
Essa ligação tão íntima não se rompe quando o cordão umbilical é seccionado!
Podemos conhecer muito bem a mulher que amamos, mas só um filho pode afirmar que a conhece por dentro!
E isso nada tem a ver com o Complexo de Édipo, pois é algo muito mais próximo do espírito do que da matéria. Afinal, se elas já dão a vida para que eles nasçam e vivam, o que as impedirá de fazê-lo novamente?
Inesperado e frustrante é ver uma mãe mandar um filho à morte ou festejar sua perda, por mais nobre que tenha sido o motivo. Na verdade, diante do inevitável, a mãe morre um pouco com ele.
Enquanto o homem pensa no presente, egoísta, a mulher também o faz, mas sem descuidar do futuro.
O raciocínio é simples e objetivo: pouco ou nada eu terei para acrescentar à vida, por mais que eu me esforce, mas uma criança terá ao menos uma geração pela frente para tentar. Isso é lógica pura, nos dois sentidos!
As mulheres são capazes de amar infinitamente, enquanto nós ainda não aprendemos a lidar direito com isso. Se existe tanto amor disponível por que querer um quinhão maior do que o infinito? Uma gota desse oceano já basta!
Sobre esse conhecido comum, o fato dele ficar frustrado não diminuiu seu amor pela esposa. Quem sabe ao pensar, num primeiro momento, em correr para o colo de sua mãe, ele próprio tenha entendido a tolice de sua pergunta. Hoje, recuperado dessa ilusão de primazia sentimental, seu amor pelos filhos e pela esposa deve ser, seguramente, muito maior. Também deve ter concluído que são amores diferentes, onde não cabem ciúme, cobranças, competições ou testes. Pelo contrário, cada um deve aprender a dar o máximo de si, sem exigir retribuição, pois ela vem naturalmente. Isso se chama família!
No mais, se os procedimentos internacionais de salvamento já sentenciam: “Mulheres e crianças primeiro!”, quem somos nós para contrariá-los?
Além disso, a morte é uma incógnita, embora seja a certeza da existência.
É impossível saber quem estará disponível para nos dar a mão!
Talvez não seja ninguém conhecido. Talvez sejamos somente nós e Deus.
O que vale, portanto, é estarmos de mãos dadas na vida!
Adilson Luiz Gonçalves
Escritor, Engenheiro, Pesquisador Universitário e membro da Academia Santista de Letras