Francisco Tarcisio Lisboa
publicado em 21/09/2007 como www.partes.com.br/socioambiental/ocupacao.asp
Resumo: Este artigo traz uma descrição da ocupação amazônica no Brasil e as consequências para os povos indígenas. As dificuldades impostas pelo ambiente e as estratégias políticas foram um grande empecilho para tal fim, deixando a região à margem do cenário nacional por um grande período de tempo. As frentes de ocupação se deram em três períodos distintos e um grande impacto para as populações indígenas ali existentes, mas, é só a partir da década de sessenta do século XX, que ela se tornará efetiva. Para tanto, foi necessário criar políticas públicas como a abertura de estradas, incentivos fiscais e estimular a migração.
Palavras-chave: Amazônia, Povos Indígenas, Políticas Públicas, Colonização.
Abstract: This article brings a description from the amazon occupation in Brazil and the consequences for the indigenous peoples. The difficulties imposed by the environment and the political strategies were a great trammel for such end, letting the region to the margin of the national scenery for a time’s great period. The occupation fronts gave on three distinct periods and a great impact for the indigenous there existing populations, but, is alone from decade on of sixty of century XX, that she will become effective. For so much, it was necessary to create public politicses as the highways opening, fiscal incentives and to stimulate the migration.
Keywords: Amazônia, Indigenous Peoples, Public Politicses, Colonization.
Introdução
Historicamente a Amazônia esteve relegada a uma situação marginal em relação ao país, seja pelas dificuldades impostas pelas dificuldades de comunicação e transporte com as outras regiões do país e as imposições da Coroa Portuguesa, fechando o acesso de embarcações aos seus rios em virtude do controle mercantil e do eminente risco de confronto com os espanhóis durante o período colonial. Mesmo no período imediatamente após a independência, a região amazônica não despertou o interesse das classes dominantes em empreender um projeto de desenvolvimento e a integração com as demais regiões do país, exceto quando da valorização da borracha nos fins do Século XIX e durante a Segunda Guerra Mundial para suprimento dos exércitos aliados – momento em que se foi largamente incentivada a atividade extrativa. Porém, é a colonização agrícola deflagrada pelo governo militar brasileiro, a partir da década de sessenta do século XX, que a ocupação amazônica realmente se consolida.
Todas essas investidas pela região levaram à dizimação de grandes contingentes de populações e culturas indígenas.
O artigo que segue tem o objetivo de fazer um apanhado histórico da ocupação amazônica e o seu impacto sobre os indígenas que residiam e residem nessa imensa região.
A ocupação amazônica
Estudos arqueológicos remontam à ocupação humana da região há pelo menos 11 mil anos (NEVES, 2006, p.22). Segundo os relatos de aventureiros espanhóis e portugueses, era grande o número de sociedades indígenas às margens do Rio Amazonas no início do período colonial. Dois fatores importantes levaram ao extermínio dessas sociedades: primeiro o próprio contato com o europeu, que introduziu um grande número de doenças e contra as quais os indígenas não apresentaram resistências orgânicas; segundo a própria dinâmica da política administrativa e da exploração da natureza pelos europeus (MOREIRA NETO, 1988).
Este último fator engloba uma série de empresas utilizadas pelo europeu, como a escravização dos indígenas para trabalhar a terra ou na mineração, as guerras deflagradas contra os grupos locais para abrir frentes de avanço para o interior da região a distâncias cada vez maiores e a catequização pela igreja, que através de seus ensinamentos levaram a substituição de suas culturas tradicionais pela europeia, ou seja, tinha “o objetivo civilizatório” (RIBEIRO, 1995).
A variação das atividades para ocupação da região amazônica, de acordo com Amaral (2004, p.42), foi assim caracterizada:
[…] primeiramente o que podemos denominar de uma ocupação pontual, na fase do Brasil colônia; em seguida, com início no século passado e primeira metade desse século, temos uma ocupação de caráter linear e beiradeira, norteada pelo extrativismo do látex das seringueiras nativas; e recentemente, após década de sessenta, deu-se uma ocupação interfluvial dando início ao ciclo de colonização agrícola, dos projetos agropecuários, minerais, minério-metalúrgico e de hidroelétricas.
Teixeira e Fonseca (1998, p.32), no livro História Regional: Rondônia, abordam que em relação à ocupação da região amazônica, em especial, o citado Estado:
[…] apesar de várias expedições científicas, predominaram, nos primeiros séculos da conquista, as expedições de reconhecimento e busca de riquezas fabulosas. Entre o paraíso associado ao Eldorado e os conquistadores desejosos de riqueza, juventude e venturas, interpunha-se a grande floresta e o meio hostil com seus rios, cachoeiras, insetos, índios feras e doenças tropicais. A esse conjunto de fatores e a essa nova visão, nem paraíso nem inferno, interpunha-se a necessidade de colonização.
Os autores acima citados realçam dois aspectos frequentes no imaginário amazônico: um é o inegável reconhecimento dos rios como facilitadores ao acesso e o outro é a abundância de riquezas em contraste com as dificuldades oferecidas pelo meio. E é com bases nesses aspectos que realmente se inicia a ocupação nos primeiros tempos de colonização.
A inserção da Amazônia no contexto nacional como prioridade de governo só realmente efetivou-se quando se rompeu o isolamento econômico e social através de medidas político-administrativo, e a colonização passa a ser essa ação governamental apresentada pelos militares brasileiros, objetivando a modernização do país. O que na realidade se queria era amenizar a situação de conflito que estava prestes a estourar na Região Centro-Sul do país, fazendo com que a migração das massas camponesas dessa região para a Região Norte cedesse espaço à agricultura mecanizada e empresarial.
Para colocar em prática o programa de colonização da Amazônia, o governo militar brasileiro teve que implementar políticas públicas como a criação da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia – SUDAM, reestruturar o Banco da Amazônia, criar o Instituto de Colonização e Reforma Agrária – INCRA e o Programa de Redistribuição de Terras e Estímulo à Agricultura do Norte – PROTERRA, sendo estes dois últimos de acordo com o Plano de Integração Nacional – PIN. A estratégia utilizada para tanto foi implantar as redes de integração espacial (estradas, comunicações, entre outras), superposição de territórios federais sobre os estaduais e subsídios ao fluxo de capital e indução dos fluxos migratórios (BECKER,1990).
Para melhor compreensão de todos esses acontecimentos é necessário repensar o conceito de fronteira, aplicando-o às condicionais do próprio movimento de colonização.
“Fronteira hoje, portanto, não é sinônimo de terras devolutas, cuja apropriação econômica é franqueada a pioneiros e camponeses. É um espaço também social e político, que pode ser definido como um espaço não plenamente estruturado, potencialmente gerador de realidades novas” (Becker, 1990, p.11).
Por ser também um espaço social e político, conforme acima citado, a colonização atingiu de forma avassaladora as populações indígenas e as populações tradicionais em toda Amazônia através da invasão de seus territórios. Martins (1997, p. 29) afirma que o movimento de expansão territorial “[…] resultou e tem resultado no massacre das populações nativas, sua drástica redução demográfica e até seu desaparecimento”.
Em todas as investidas para ocupação da Amazônia o componente que mais sofreu foram os povos indígenas. Seja pela perda de seus territórios tradicionais, seja pela doença do não-índio (contra as quais não apresentavam resistências), ou mesmo pelos massacres sofridos. Dessa forma, Davis (1978, p.15) defende que:
“[…] as doenças, a morte e o sofrimento humano, que se desencadearam maciçamente sobre os índios brasileiros nos últimos anos, são o resultado direto da política de desenvolvimento econômico dos Governos militares do Brasil”.
Considerações
Diante do que fora discutido, podemos afirmar que a colonização não se preocupou com os povos indígenas e as demais culturas existentes na Amazônia. Esta é a forma de expansão do capital, o grande legado para os tempos modernos ou como alguns podem afirmar, pós-moderno.
Passados trinta anos do início da colonização na Amazônia, ela continua a abrir novas fronteiras, a ameaçar a sobrevivência das diversas espécies vegetal e animal, e quem sabe, a povos isolados desconhecidos. As queimadas embora em menor ritmo que na década de oitenta, continua a destruir o patrimônio ambiental. Aos índios sobraram 20% do território da região e uma pressão muito grande sobre suas terras pela ganância dos madeireiros, garimpeiros e fazendeiros que insistem em invadi-las. Resta também ao Estado brasileiro uma posição mais firme, pois os conflitos continuam.
Referências
AMARAL, Januário. Mata Virgem: Terra Prostituta. São Paulo, Terceira Margem, 2004.
BECKER, Berta K. Amazônia. São Paulo: Ática, 1990, 112p.
DAVIS, Shelton H. Vítimas do milagre: o desenvolvimento e os índios do Brasil. Traduzido por Jorge Alexandre Faure Pontual. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1978.
MARTINS, José de Souza. Fronteira: a degradação do outro nos confins do humano. São Paulo: Hucitec, 1997.
MOREIRA NETO, Carlos de Araújo. Índios da Amazônia, de maioria a minoria (1750-1850). Petrópolis: Vozes, 1988
NEVES, Eduardo Góes. Arqueologia da Amazônia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006. 86p.
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Cia. Das Letras, 1995. 470 p.
TEIXEIRA, Marco Antônio Domingues e FONSECA, Dante Ribeiro da. História Regional: Rondônia. Porto Velho: Rondoniana, 1998. 241 p.
Francisco Tarcisio Lisboa é Mestrando em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente pela Universidade Federal de Rondônia (UNIR)
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