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O levante das prisões e a falência da autoridade

Por José Genoíno

José Genoíno
É Deputado Federal
pelo PT/SP

A rebelião dos detentos nos presídios paulistas impressiona pelos números envolvidos e pela forma como foi feita: foram 29 unidades prisionais amotinadas, 27 mil presos envolvidos e mais de cinco mil reféns.

O motim foi levado a cabo de forma coordenada, ágil e simultânea. A tragédia de 20 mortos só não foi maior porque os presos não se dispuseram a fugir ou a enfrentar a tropa força policial que invadiu os presídios.

Os problemas no sistema prisional não são específicos apenas do Estado de São Paulo, atingem todos os Estados da federação. Eles também não são apenas responsabilidade dos atuais governantes, resultam de uma longa história de falta de investimentos no sistema carcerário e na ausência de políticas de segurança.

No entanto, os atuais governantes têm responsabilidades específicas sobre as condições e os acontecimentos dos últimos tempos nas áreas de segurança e no sistema carcerário. Nos últimos anos, o governo federal cortou mais de 50% das verbas que deveriam ser destinadas para a melhoria e construção de presídios.

O Plano Nacional de Segurança Pública não passa de uma peça de ficção. As verbas federais disponíveis até agora não foram aplicadas nos Estados. O Ministro do Planejamento, Martus Tavares, culpa os governos estaduais, inclusive o de São Paulo, pela não liberação e aplicação dos recursos.

Quanto à rebelião nos cárceres de São Paulo, o próprio governo estadual admite que foi pego de surpresa. Trata-se de uma grave omissão.

As autoridades estaduais ignoraram inúmeros alertas que vinham sendo dados pela imprensa e até pelo sindicato dos carcerários sobre as articulações e movimentações do grupo criminoso Primeiro Comando da Capital (PCC). É inadmissível que o serviço de inteligência das polícias não tenha detectado as articulações do PCC e a preparação da rebelião. Saindo pela tangente, o governo estadual identificou um único culpado: o celular.

Todos sabem que o sistema carcerário está superlotado, é desumano e está dominado pelas práticas de tortura, tráfico e corrupção. Ao invés de reabilitar os presos, a prisões se tornaram escolas do crime e quartéis generais de organizações criminosas. Aparentemente, organizações como o PCC em São Paulo e o Comando Vermelho no Rio de Janeiro se tornaram tão poderosas, que contam com milhares de integrantes e comandam o crime dentro e fora das prisões.

A ousadia cada vez maior do crime organizado está na mesma proporção da desmoralização crescente da autoridade. Os diferentes governos vêm aplicando dois princípios igualmente errados: ou a condescendência ou a violência estatal.

Da mesma forma que o respeito aos direitos humanos não pode ser confundido com a condescendência, a violência não pode ser confundida com a eficácia. É preciso aplicar uma política de segurança que combine três princípios: o restabelecimento da autoridade pública, a eficácia na prevenção e combate ao crime e o respeito aos direitos humanos. Isto se consegue se existirem políticas de segurança estruturadas de forma estratégica, com base em diagnósticos precisos, em planejamento, em reavaliação permanente dos resultados e que sejam políticas ativas e preventivas e não reativas, como ocorre atualmente.

Integrar as polícias civil e militar, capacitá-las, remunerá-las melhor, dotá-las de instrumental tecnológico e de armas eficazes para combater o  crime, lidar com informações e bancos de dados atualizados e envolver as comunidades nas políticas de segurança, são decisões que precisam ser tomadas para reverter esse processo de crescente criminalização, de deterioração geral da autoridade e de instauração crescente de anomia e anarquia social.

Rever o código penal, criando penas alternativas para crimes leves e aumentado as penas para crimes pesados como estupro, homicídio, tráfico  etc., é uma medida que já poderia ter sido adotada há tempo se houvesse vontade política no governo e no Congresso Nacional.

A reorientação da política carcerária é imprescindível: trata-se de desafogar as cadeias,  classificar e separar os presos por categoria criminal, introduzir o trabalho e o ensino em larga escala nos presídios, adotar os meios técnicos  e disciplinares para impedir a formação de organizações criminosas nas cadeias e requalificar o corpo funcional do sistema. Se algo nesse sentido não for feito com urgência e eficácia, a sociedade será cada vez mais submetida ao medo e à insegurança. As fugas, rebeliões e tragédias crescerão de intensidade.

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