Adilson Luiz Gonçalves Colunistas

DESENVOLVIMENTO OU SUBDESENVOLVIMENTO SUSTENTADO?

DESENVOLVIMENTO OU SUBDESENVOLVIMENTO SUSTENTADO?

Parte II

Infelizmente, no âmbito dos ODS como de outras áreas, a visão parcial é uma impedância de complexa superação, por conta de interesses ideológicos ou corporativos, vaidades e influências externas, que afetam principalmente os países em desenvolvimento e pobres.

Essa resistência decorre de uma visão bastante particular ou peculiar que alguns têm do significado da expressão “desenvolvimento sustentado”, por vezes se respaldando em discursos messiânicos, verdades absolutas e hipocrisia, esquecendo que o paradigma moderno é holístico. Isso tem exigido significativa resiliência, por parte dos que querem efetivamente promover desenvolvimento sustentado, ou seja, equilibrando aspectos ambientais, sociais e econômicos. Obviamente, isso não inclui radicais que defendem apenas um desses tópicos como sendo mandatório, o que torna qualquer proposta insustentável em médio e longo prazo, por mais apaixonante, altruísta e bem-intencionada que seja.

Voltando à minha análise sobre os ODS:

ODS 5 – Igualdade de gênero. Considerando que até para eliminar preconceitos outros têm sido criados por conta de discursos “progressistas” e oportunismo de ocasião, e que certas culturas ainda mantêm conceitos anacrônicos, dogmáticos, esse tema tende a permanecer em voga.

O ideal seria que ele atingisse um nível de equilíbrio, mas isso tem sido prejudicado por extremismos.

Quando as pessoas passarem a ser consideradas apenas como seres humanos em sua plenitude, com seus méritos, competências e empatia, esse objetivo não terá mais sentido.

A igualdade deve ser de oportunidades, acessíveis independentemente de critérios de inclusão ou exclusão. O mérito e a competência devem estar acima de qualquer outro critério discricionário. No entanto, isso não implica deixar quem quer que seja ao largo.

Sem a intenção de ser piegas, o fato é que ninguém é indispensável, mas cada um é único e tem potenciais que podem e devem ser aprimorados para além de preconceitos.

ODS 6 – Água potável e saneamento. Alguém duvida de que esse objetivo está diretamente ligado ao ODS 3? Mas, como já mencionei, é possível e natural interligar todos os ODS de alguma forma. Não é um desafio, mas uma constatação.

Investimentos são necessários para prover a infraestrutura necessária. Fiscalização também é fundamental, para evitar a contaminação de mananciais por ações antrópicas decorrentes de ocupações habitacionais subnormais, atividades de mineração, uso de defensivos agrícolas e despejo de resíduos industriais. Também é importante lembrar que a solução de problemas habitacionais depende de recursos públicos ou compensações ambientais de empreendimentos, que estão diretamente associados a fatores econômicos.

E por falar em socioeconomia, a educação de qualidade e a geração de empregos também contribui para evitar/solucionar o problema das ocupações irregulares de áreas de mananciais, entre outros espaços de risco.

ODS 7 – Energia limpa e acessível. Esse talvez seja um dos temas mais nevrálgicos, tantas são as suas implicações diretas e indiretas sobre os demais objetivos. O primeiro questionamento se refere à palavra “limpa”.

A rigor, nenhuma energia é limpa, pois todas têm algum impacto ambiental. O mesmo vale para expressões do tipo “não poluente”, pois qualquer ser vivo, apenas por respirar, polui. São palavras e expressões cunhadas para exortar, porém abrem espaço para entendimentos literais ou interpretações, afetando licenciamentos ambientais e permitindo judicializações por questões ideológicas ou outros interesses.

A energia hidráulica é considerada “limpa”, mas os reservatórios tendem a ocupar áreas naturais e/ou urbanas, também alterando características climáticas das regiões. A energia solar fotovoltaica ocupa grandes áreas em terra ou no mar, prejudicando outros usos ou afetando ecossistemas. A energia eólica também tem seus impactos ambientais. Nos EUA, consta que o ruído contínuo prejudicava o sono do rebanho leiteiro, prejudicando a produção de leite. A evolução tecnológica vem reduzindo esse problema.

O Brasil tem avançado substancialmente na geração de energias alternativas, além de ter uma matriz energética significativamente menos ambientalmente impactante do que a de países desenvolvidos.

Esses países têm se arvorado defensores do meio ambiente, mas baseiam suas economias na utilização maciça de carvão, hidrocarbonetos e energia nuclear.

Quanto à acessibilidade, ela pressupõe capacidade de arcar com os custos, subsídios governamentais ou redução do custo de produção e distribuição.

Para ser efetivamente acessível o ideal é conciliar diversificação da matriz energética, ampliar a oferta e reduzir custos de geração e distribuição, racionalizar o consumo e ter uma economia forte, geradora de receitas tributárias e empregos. Caso contrário, será apenas uma expectativa.

ODS 8 – Trabalho decente e crescimento econômico. Esse, a meu ver, é um dos objetivos melhor definidos e menos considerados por certos setores “ativistas”.

Até prova em contrário, todo o trabalho honesto, que beneficia direta ou indiretamente a sociedade, é decente. Por definição, decente é: “que está em conformidade com os padrões morais e éticos da sociedade; digno, correto, decoroso; que está em conformidade com o que se espera da sua apresentação, qualidade, utilidade, etc”. No entanto, salvo engano, a intenção é que a decência considere remuneração que possibilite bem-estar e viabilize projetos de evolução profissional e social. Daí o trabalho decente estar indissoluvelmente vinculado ao crescimento econômico, e não a discursos populistas ou assistencialismos como política de Estado.

Trabalho decente e crescimento econômico são basilares para prevenir tensões sociais e afastar quem se beneficia delas.

ODS 9 – Indústria, inovação e infraestrutura. Ah, esse objetivo! Considerando o arcabouço legal brasileiro e o que fazem a partir dele, parece que esse objetivo não existe.

Instalar indústrias, fomentar pesquisa e inovação e implantar infraestruturas terrestres e aquaviárias no Brasil são trabalhos hercúleos.

Não à toa, nossa exportação de produtos industrializados é incipiente, assim como nossa produção de patentes.

O “Custo Brasil”, logístico, é decorrente do distanciamento das áreas produtoras dos centros de consumo e portos.

Além dos custos logísticos, a emissão de poluentes também é maior, por conta de longos trajetos. Daí, a criação de plantas industriais próximas a portos é uma solução lógica sob múltiplos aspectos, adotada em todos os países desenvolvidos do mundo.

Isso deveria ser considerado na análise de licenciamentos ambientais e na redução de judicializações, que têm sido responsáveis pelo aumento de custos e atraso na disponibilização de benefícios difusos. Quando quem promove ações deletérias, sendo improcedentes ou simplesmente protelatórias, passarem as ser responsabilizados por seus atos, talvez os processos sejam mais ágeis e objetivos. Obviamente, também é necessário que os projetos sejam bem definidos, inclusive com o apoio de quem licencia e questiona, pois o interesse pelo incremento pelo desenvolvimento sustentado é geral.

Esse objetivo, em conjunto com o ODS 8, tende a afetar positivamente todos os anteriores. Mas sempre haverá quem considere os empreendedores como vilões, por questões que não se sustentam no âmbito holístico.

É preciso coibir abusos, não há dúvida. Esse é o papel do Estado. No entanto, desestimular empreendimentos é comprometer o desenvolvimento efetivamente sustentado do país.

ODS 10 – Redução das desigualdades. Esse objetivo é bastante coerente, na medida em que até quem faz sua defesa baseada em ideologias, não se enquadra na “igualdade” que propõe para os outros, considerando-se “mais igual”, ou definitivamente superior. Talvez uma melhor definição seria “melhoria das condições de vida”, até porque a redução das desigualdades também pode ser para baixo, e não para cima.

As desigualdades sempre existirão por múltiplos motivos, até por opção pessoal. Aliás, o fundamental é que existam opções e condições para que as pessoas façam escolhas e possam desenvolver plenamente seus potenciais.

Uma das opções pode até ser por viver como quer, em comunidades alternativas, recusando-se a pagar impostos, etc. Mas que não seja esperando ou exigindo que suas escolhas sejam sustentadas por outros.

Em outro âmbito, certas atividades não têm demanda de mercado, o que não quer dizer que não tenham valor. Mas é igualmente importante salientar que escolhas têm consequências, por isso precisam ser muito bem pensadas, e não esperar que o mundo se adapte a elas, subsidiando-as.

ODS 11 – Cidades e comunidades sustentáveis. A sustentabilidade pressupõe o equilíbrio entre aspectos ambientais, sociais e econômicos. Historicamente, cidades antes poderosas entraram em decadência quando suas atividades econômicas feneceram. Em vários casos isso ocorreu em função da evolução econômica e tecnológica, condições geográficas, competição de outros centros, conflitos bélicos internos ou externos. Mas também decorreu, em grande parte, por falta de visão estratégica de médio e longo prazo por parte de seus governantes, associada ou não a extremismos que pregavam a expulsão de atividades econômicas e convulsões sociais.

Alguns dos que criticam essas atividades ignoram sua importância para as cidades e população. Às vezes têm razão, mas a abordagem poderia e deveria ser outra. Deveriam cobrar melhorias em aspectos ambientais, de segurança e comprometimento social, em vez de demonizá-las e tentar expulsá-las.

No que se refere a comunidades sustentáveis, entendo que toda a cidade deve ser considerada como uma comunidade, e não fracionada. “Dividir para governar” é uma solução anacrônica, embora ainda muito utilizada em política e religião. Dividir para inviabilizar governos é ainda pior, pois todos são afetados.

Na forma como alguns entendem “comunidade”, há risco de hermeticidade, ou seja, dela isolamento, gerando preconceitos internos e externos, que em nada favorecem à mobilidade física, social e a própria noção de cidadania plena. Se assim for, uma comunidade não contribuirá para a inclusão social, mas para consolidar sua exclusão social. O ideal é que haja integração e interação.

ODS 12 – Consumo e produção responsáveis. Esse objetivo está diretamente relacionado com mudança de hábitos, economia circular, reciclagem, logística reversa e outros procedimentos que permitam a redução da exploração deletéria de recursos naturais.

Isso depende de uma mudança cultural em todos os níveis, mas que pode ter impactos negativos sobre outros objetivos.

Mais uma vez, considerar os ODS seletivamente, segundo crenças ou interesses particulares, pode ter consequências negativas, sobretudo nos objetivos com viés social.

Ainda faltam alguns ODS, que ficam para a última parte.

Adilson Luiz Gonçalves Escritor, Engenheiro, Pesquisador Universitário e membro da Academia Santista de Letras

Deixe um comentário