Adilson Luiz Gonçalves Colunistas

ORA PRO NOBIS

A Justiça parece cada vez mais relativizada e imprevisível no Brasil.

Infelizmente, a percepção é de que o crime compensa e de que as pessoas que prezam pela moral e ética são culpadas até prova em contrário, dependendo da interpretação ou ideário de quem julga.

Os criminosos são “vítimas da sociedade”, protegidos por uma legislação pseudo-humanista, com requintes de hipocrisia, muito bem assessorada.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, por mais bem intencionado que tenha sido sua concepção, em verdade deu “carta branca” para a prática de crimes, dos pequenos aos hediondos, despertando os piores instintos de alguns, e uma oportunidade maquiavélica para marginais adultos.

Parafaseando uma música, hoje “professores” do crime estão tendo aulas com seus “alunos” menores. Os “aviões” alçaram voos mais altos nessa hierarquia.

Recentesdecisões judiciais, sob o pretexto de proteger comunidades de ações policiais, as tornaram refúgio de bandidos e facções de altíssima periculosidade, verdadeiros guetos urbanos.

Outras legislações, também concebidas com base em princípios louváveis, têm tolhido a criação de empregos, tornando o crime uma opção que coopta adolescentes, desesperados e degenerados.

A subversão chegou a tal ponto que será preciso criar novas definições de crime.

Recentemente, um ciclista foi morto para facilitar o roubo de seu celular. Foi um latrocínio, definido como roubo seguido de morte? Não! Foi o inverso!

A vida vale tão pouco para esses criminosos, que potencializa que a sociedade também entenda o mesmo em relação a eles. Aí se insurgem os defensores de “direitos humanos”.

O que é mais radical: pensar em penas perpétuas ou radicais para quem despreza a vida, ou permitir que criminosos de qualquer idade continuem a tirar a vida de pessoas de forma impune e perversa?

Como a legislação e a Justiça brasileira consideram a vida, na prática?

É certo que é impossível ter uma legislação clara e objetiva. Sempre haverá espaço para interpretações e jurisprudências. Além disso, o crime é extremamente criativo e estende suas raízes nefastas por todos os níveis, via cooptação, coação ou corrupção. Para piorar, certas ideologias e vaidades também colaboram com esse processo de degradação social, moral e ética.

A percepção é de que certas decisões são inconsequentes, e seus autores nunca são responsabilizados por seus atos. Essa inconsequência, além do corporativismo, se traduz em instabilidade jurídica. Não à toa, a Justiça brasileira tem sido mal avaliada pela sociedade.

O discurso do respeito aos direitos humanos parece ser seletivo, além de desconsiderar os deveres humanos.

Para alguns, esse cenário é uma oportunidade de negócio, pois obriga a população a contratar serviços de segurança, pela sensação de medo constante.

Residências e condomínios têm se transformado em “bunkers”, enquanto os habitantes honestos e trabalhadores de comunidades se tornaram escudos humanos do crime organizado.

A legislação inibe a posse de armas, mas não consegue conter o armamento dos criminosos, cada vez mais sofisticado e poderoso. Além disso, as ações preventivas e repressoras dos órgãos de segurança são restringidas, virtualmente transferindo o monopólio da violência do Estado para o crime organizado.

Consta que o Código de Hamurabi foi o primeiro código de leis da história, baseado na “Lei de Talião” (“Olho por olho, dente por dente”). Considerando a “fama” que Babilônia tinha na Antiguidade, é compreensível essa radicalidade, que ainda é mantida em algumas culturas.

O crime não pode ser um bom negócio! A defesa de direitos humanos não pode ser seletiva! A justiça não pode ter dois pesos e duas medidas! A população, inclusive as que vivem em comunidades, não pode ser refém do crime organizado, nem acreditar que facções criminosas e milícias substituem o Estado!

O Estado deve estar presente e ser confiável em qualquer lugar, sob pena da consolidação e institucionalização de guetos.

Isso só será possível mediante profunda revisão da legislação processual e penal, ação firme na repressão do crime organizado e da corrupção, e responsabilização de quem toma decisões que colocam a sociedade em risco.

Se as leis são falhas ou permissivas, deveria partir de quem julga sugerir mudanças.

Também é fundamental que o trabalho honesto seja fomentado pela educação e geração de empregos, que só ocorrerá se a economia for incentivada e expandida, o que também exige que outras legislações sejam revisadas.

Ou seja, é preciso que os clamores da sociedade sejam ouvidos pelos Três Poderes, para que a democracia seja mais do que um discurso de palanque, ou falácia panfletária, e para que a litigância predatória e o ativismo judicial, que só aceita as leis com as quais seus adeptos concordam, sejam coibidos. Caso contrário, a única opção continuará a ser apelar para “Ora pro nobis”, na esperança de que a força da fé mande o monstro de volta para a lagoa, ou devolva o mal para a “Caixa de Pandora”.

Parafraseando a música de Milton Nascimento, ficar de costas para esses problemas, com base em proselitismos ideológicos e discursos falaciosos ou utópicos, não vai fazer desse lugar um bom país!

Adilson Luiz Gonçalves é engenheiro e professor universitário.Santos – SP

Adilson Luiz Gonçalves

Escritor, Engenheiro, Pesquisador Universitário e membro da Academia Santista de Letras

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