Algumas coisas me incomodam sobremaneira. Uma delas é a insistência com que filmes e séries atuais inconsequentemente tentam mostrar que algumas coisas são normais.
Considerando como o cinema e a televisão tendem a influenciar pessoas mais susceptíveis, sobretudo jovens, e como isso tende a criar “modas” que podem prejudicar a saúde, sanidade mental e segurança da sociedade, a responsabilidade dos autores, atores e mídias é ainda maior.
Não digo que deva haver censura, mas que ao menos avaliem os riscos das mensagens que passam, das ideologias que pregam e dos vícios que consideram “normais” ou “inofensivos”. No entanto, certos padrões exigidos atualmente, sobre o pretexto de assegurar liberdade de expressão, em verdade são um tipo de censura seletiva.
Conhecendo a idolatria que alguns jovens têm por artistas, sobretudo pelos que morreram jovens por overdose de drogas, suicídio ou outros extremos comportamentais, esses temas deveriam ser tratados com muito cuidado.
No filme “Anjos de cara suja” (EUA, 1938), dois jovens amigos cresceram num bairro violento de Nova Iorque. Mais tarde, um deles se tornou padre, enquanto o outro se transformou num criminoso violento e destemido, ídolo da nova geração do bairro.
Preso e condenado à morte, ele permaneceu arrogante, o que fascinou ainda mais as crianças e adolescentes que o veneravam.
Seu amigo padre, preocupado com isso, implorou que ele tentasse ser um bom exemplo para eles, ainda que na hora da morte, mas ele se mantinha irredutível.
Sua execução seria transmitida pelo rádio, em tempo real, e os meninos acompanhavam atentamente.
No caminho para a sala de execução, ele pensou nas palavras do amigo e, contrariando seus instintos selvagens e arrogantes, numa súbita crise de consciência passou a encenar, intencionalmente, medo, desespero e covardia.
Ao ouvir isso, a decepção das crianças fez com que reavaliassem sua percepção de heroísmo e futuro.
Era o que por muito tempo Hollywood classificou como “fábulas moralizantes”, o que hoje alguns chamariam de pieguice ou fuga da realidade.
Para estes “libertários”, popularizar o consumo de maconha em filmes e séries é normal, mesmo quando a ciência já demonstrou os males que os vícios em tabagismo e drogas causam ao viciado e à sociedade. E o crime, além da má índole, está normalmente associado ao tráfico e ao consumo de entorpecentes. Isso afeta tudo e todos, indiscriminadamente, terrivelmente.
Sei que, mesmo não havendo esse tipo de cena, as crianças e adolescentes não ficarão menos vulneráveis a más influências e modismos importados por oportunistas, que lucram com a desgraça alheia. A pressão para experimentarem cigarro e drogas nas escolas e grupos de afinidade continuará, tendo indivíduos populares como instrumentos de difusão, munidos das frases de sempre: “fumar faz beijar melhor”, “cigarro faz mais mal do que maconha”, ou alegando que o vício é uma forma de libertação, um rito de passagem, ironizando e humilhando quem não aceita.
Esse indivíduos lucram com o vício, viciados ou não. E nunca estarão lá para cuidar do resultado nefasto de suas práticas, a não ser para cobrar dívidas, inclusive com ameaças à vida.
Isso não é nem nunca será normal!
Se estúdios e atores podem fazer algo de útil, que seja combater o mal, e não para justificá-lo, banalizá-lo ou disseminá-lo.
Também gostaria, da parte dos que se arvoram defensores de direitos humanos, que atuem mais em nome da sociedade, e não em prol de quem tenta corrompê-la, corroê-la e destrui-la.
Adilson Luiz Gonçalves
Escritor, Engenheiro, Pesquisador Universitário e membro da Academia Santista de Letras