filosofia Sociologia

LUTA DE CLASSES E REVOLUÇÃO EM MARX E PROUDHON: PRESSUPOSTOS POLÍTICO-IDEOLÓGICOS

LUTA DE CLASSES E REVOLUÇÃO EM MARX E PROUDHON: PRESSUPOSTOS POLÍTICO-IDEOLÓGICOS

Claudinei Frutuoso[*]

Resumo: Este artigo tem por objetivo apresentar os pressupostos político-ideológicos sobre Revolução e luta de classes na produção de Marx e Proudhon. Para tanto, utiliza-se a análise histórico-crítica (SAVIANI, 2003; MACIEL E BRAGA, 2008; Maciel, 2023), metodologicamente fundamentada no materialismo histórico-dialético (MARX, 1996, 2008; NETTO, 2011) para se chegar aos pressupostos apresentados por Marx e Proudhon. Conclui-se que ambos buscam a seu modo a superação da condição da classe operaria pela consciência de classe e luta revolucionária.

Palavras-chave: Revolução. Luta de classes. Marx. Proudhon.

Abstract: This article aims to present the political-ideological assumptions about Revolution and class struggle in the production of Marx and Proudhon. For this, it is used the historical-critical analysis (SAVIANI, 2003; MACIEL E BRAGA, 2008; Maciel, 2023), methodologically based on historical-dialectical materialism (MARX, 1996, 2008; NETTO, 2011) to arrive at the assumptions presented by Marx and Proudhon. It is concluded that both seek in their own way the overcoming of the condition of the working class by class consciousness and revolutionary struggle.

Keywords: Revolution. Class struggle. Marx. Proudhon.

Introdução

Karl Marx em suas primeiras publicações destaca a importância da ação político-ideológica como pressuposto para análise da classe burguesa. Seu ativismo no movimento operário é um legado que está marcado na história. As relações de amizade e as divergências ideológicas também fazem parte do pensamento de Marx, a bela relação de amizade com Engels, assim como as brigas que envolveram Proudhon, o tornam, mais admirável revolucionário. A relação entre Proudhon e Marx se tornou mais próxima com a criação do comitê de correspondência comunista da Liga dos Justos em 1846 (BOTTOMORE, 1988), cujo objetivo era, a expansão do pensamento revolucionário com troca de correspondências, entre revolucionários proletários alemães e franceses.

Cabe destacar que, a seu modo – Proudhon na França e Marx nas várias partes da Europa – contribuíram para plantar sementes do pensamento revolucionário proletário. Em Proudhon algumas obras devem ser destacadas, tais como: O que é a propriedade? (1840);Sistema das contradições econômicas, ou, Filosofia da miséria (1846); as confissões de um revolucionário (1849) e Do princípio federativo (1863).

Marx deixou um legado bem maior em se tratando de revolução. Algumas de suas obras que merecem destaque, são: Miséria da filosofia: resposta à filosofia da miséria, do sr. Proudhon (1847), numa primeira análise a economia burguesa; O manifesto comunista (1848) no qual demonstra a luta de classes como motor da história humana; e depois da Revolução de 1848 publica o livro “As lutas de classes na França de 1848-1850”.

Assim, este trabalho tem por objetivo apresentar os pressupostos político-ideológicos relacionados a Revolução e luta de classes na produção de Marx e Proudhon. O estudo analisa as contradições no pensamento dos dois autores, bem como sua contribuição para a revolução proletária. A revolução em ambos passa pela consciência da classe operária e pela luta desta com sua classe opositora, a burguesia.

Metodologia

A metodologia que orienta este estudo está fundamentada pelo processo de investigação que se segue. Para tanto, utiliza-se a análise histórico-crítica (SAVIANI, 2003; MACIEL E BRAGA, 2008), metodologicamente fundamentada no materialismo histórico-dialético (MARX, 1996, 2008; NETTO, 2011) para apresentar os pressupostos políticos-ideológicos relacionados a Revolução e luta de classes na produção de Marx e Proudhon.

Resultados e Discussões

A revolução social pensada no século XIX teve expoentes como Saint-Simon, Bakunine, Louis Blanqui, entre outros. Porém dois intelectuais se destacam nessa empreitada de construção das bases revolucionárias. O primeiro a ser citado é Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865) filósofo francês, filho de um tanoeiro e uma cozinheira; entrou para o colégio de Besançon aos dezessete anos, porém, teve que deixar o colégio sem concluir seu bacharelato. O segundo, é Karl Marx (1818-1883) descendente de uma antiga família de judeus da Alemanha, seu pai era advogado e procurador em Trier. Marx nasceu numa família liberal, e desde cedo teve o privilégio de em sua casa discutirem-se autores da Revolução francesa como Diderot, Rousseau entre outros.

Para Proudhon o caminho foi difícil, pois este começara a trabalhar cedo, seu primeiro trabalho foi como tipógrafo. Passou por inúmeras dificuldades até voltar a academia de Besançon, onde produz sua primeira obra e termina seu bacharelato (GURVITCH, 1980, p. 32), (PROUDHON, 2003). A trajetória de Proudhon é pouco explorada, haja vista, seu pensamento revolucionário diferenciar dos demais filósofos a época. A sua discordância com Marx é retratada em carta enviada em 17 de maio de 1846, na qual questiona os rumos que até ali teriam tomado a Revolução. Em trecho Proudhon manifesta sua aversão a Associação de Marx e diz:

Acojamos, animemos todas las protestas; pronunciémonos contra todas las exclusiones, contra todos los misticismos; no consideremos jamás agotada uma cuestión, y cuando hayamos llegado al último argumento, recomencemos, si es preciso, con la elocuencia y la ironía. Con esa condición, entraré con placer em vuestra asociación; si no, ¡no! (Carta de Proudhon a Marx, 1846).

Aqui a discordância entre Proudhon e Marx é clara. Tanto que a resposta à está negativa, Marx expõe em seu livro “Miséria da Filosofia”, no prólogo inicia com a seguinte frase “[…] o sr. Proudhon tem a infelicidade de ser conhecido na Europa” (MARX, 2009). E continua explicando a dupla faceta proudoniana entre filosofia e economia política abordada em seu livro “Sistemas de contradições ou filosofia da miséria”. A divergência entre ambos neste aspecto está na ideia de revolução, pois enquanto para Marx o fortalecimento do movimento operário é dado pela união (associação mútua), Proudhon (2006, p.49) via a associação como um movimento duvidoso, explicando que “particularmente, a Associação apresentada como instituição universal, princípio, meio e objetivo da Revolução, parece-me esconder uma segunda intenção de exploração e despotismo”. Proudhon em seu texto sobre o princípio da associação vai elencar as razões pelas quais a associação levava ao dogmatismo, e consequentemente, a um modelo de exploração como o da burguesia. Ao apresentar a diferença entre associação e força coletiva, Proudhon (2006, 52-53) explica que:

A força coletiva, eis então mais um princípio que, em sua nudez metafísica, não deixa de ser menos produtor de riqueza. Assim, vamos encontrá-lo aplicado em todos os casos em que o trabalho individual, repetido tantas vezes quanto se queira, permaneceria impotente […] pois a força coletiva, de fato, é um ato impessoal, ao passo que a associação é um engajamento voluntário: entre uma e outra, mesmo que elas se encontrem, não há identidade.

A Associação em Marx ao contrário, expressa a união dos proletários, como proposto no Manifesto de 1848, pois a luta instaurada entre as classes burguesia e proletariado, só pode ser superada pela consciência do trabalhador e a associação dos trabalhadores seria esse espaço. Assim, no conceito de associação, reside a primeira divergência entre Marx e Proudhon.

A segunda divergência entre ambos diz respeito a luta de classes. Numa nota do tradutor Proudhon (2003, p. 150) esclarece essa divergência quanto a luta de classes, quando diz que:

Se a teoria da luta de classes como fator de evolução econômica pode ter alguma valia no regime econômico capitalista ou em regimes à ele aparentados, ela perde totalmente o seu poder explicativo ao considerarmos, o quadro mais geral da história humana, onde a evolução econômica pode obedecer a impulsos bastante distintos; a antropologia econômica, por exemplo, demonstra a profunda inadequação deste esquema para explicar  a economia primitiva: em sociedades onde não existem classes sociais distintas ou rigidamente separadas, não pode existir luta classes. O que dissemos em notas anteriores sobre a economia primitiva e sobre a economia do “despotismo oriental” deve bastar para inquietar o leitor.

Para Proudhon a explicação da luta de classes passava também, pela economia política, por isso ele explica os fenômenos dessa condição pela concorrência. Assim, Proudhon (2003, p. 298) compreende que ao Estado resta regular os interesses privados, pois senão “haverá na concorrência, como na democracia, uma contínua tendência da guerra civil para a oligarquia, da oligarquia para o despotismo e depois, pela dissolução deste último, de retorno à guerra civil, sem fim e sem repouso”. Enquanto Proudhon não apresenta com clareza a definição do conceito luta de classes, por outro lado, Marx & Engels (1998, p.40) iniciam o manifesto afirmando ser a luta de classes um movimento legitimo e histórico, quando diz “A história de todas as sociedades até hoje existentes, é a história das lutas de classes”. No parágrafo seguinte explica os antagonismos de classe e sua guerra na ocupação dos espaços, inclusive na forma como essa ocorre “ora franca, ora disfarçada” pela transformação de uma classe ou pela destruição da classe opositora. Deste modo, a luta de classes está no centro do pensamento de Marx, o que para Proudhon não tem o mesmo valor.

Na Europa do século XIX, inúmeras transformações sociais, políticas e econômicas ocorriam, dado das várias áreas. A industrialização moldou um trabalhador assalariado que dependia do patronato para a subsistência e era cada vez mais explorado pela burguesia. Por outro lado, a economia se expandia e a burguesia se regozijava pelo fato de estar no poder e manter o controle ao menos parcial dos trabalhadores. Mas o século XIX também trouxe à tona todas as problemáticas desse sistema de poder, nesse sentido intelectuais como Proudhon e Marx encontraram a oportunidade ideal para a realização de uma Revolução.

Há, porém, um fato que deve ser destacado: como realizar uma Revolução e quais os efeitos dessa na futura sociedade que se pretendia construir. A esta questão Marx e Proudhon vão divergir na forma e no modelo de sociedade. Em sua primeira obra intitulada “A propriedade é um roubo” Proudhon (2014, p. 24) promove um ataque aos defensores da propriedade, quando diz:

Sim, todos os homens acreditam e repetem que a igualdade de condições é idêntica à igualdade, de direitos; que propriedade e roubo são termos sinônimos; que toda proeminência social, concedida ou, para melhor dizer, usurpada sob pretexto de superioridade de talento e de serviço, é iniquidade e pilhagem: todos os homens, eu digo, atestam estas verdades em sua alma; trata-se só de fazê-los descobrir.

Já Marx, no livro Miséria da Filosofia, ao abordar a propriedade e a renda, tece uma crítica severa a Proudhon. Para este, o modo como aquele analisa a propriedade é por demais superficial. Assim, Marx (2009, p.143) destaca que “em cada época histórica, a propriedade desenvolveu-se diferentemente numa série de relações sociais totalmente distintas”. O que segundo Marx fez Proudhon, foi atacar a propriedade de forma geral, sem levar em consideração sua origem econômica.

O que se pode ver até aqui, é que as divergências entre ambos são maiores que as convergências. Embora tenham tido uma relação amistosa, trocado correspondências e cogitado uma luta em conjunto em prol da Revolução proletária, as divergências se intensificam quando o tema é luta de classes. Outro ponto de discordância está na visão sobre a “economia política” e, portanto, sobre propriedade e renda. Embora divergentes em muitos pontos, estes dois grandes teóricos contribuíram significativamente para a Revolução proletária do século XIX, cada um a seu modo, Proudhon com maior influência na França e Marx em toda a Europa.

Considerações Finais

Tendo em vista a problemática debatida, o pressuposto político e ideológico do pensamento desses autores quanto aos temas luta de classes e revolução é fundamental para se entender o movimento revolucionário proletário no tempo. Cabe destacar que as divergências entre esses dois líderes do movimento comunista, foi um momento que marcou a 1ª internacional comunista. Ressalta-se que a revolução em ambos passa pela consciência da classe operária e pela luta desta com sua classe opositora, a burguesia, embora houvesse divergências de Proudhon sobre conceitos de associação, luta de classes e propriedade.

Referências

BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento marxista. Zahar, 1988.

GUERIN, Daniel. Proudhon: textos escolhidos. Porto Alegre: L&PM, 1983.

GURVITCH, Georges. Proudhon e Marx I. Tradução de Luz Cary. 1980.

PROUDHON, Pierre-Joseph. Sistema das contradições econômicas, ou, filosofia da miséria. Tomo I. Tradução de J. C. Morel. São Paulo: Ícone, 2003.

PROUDHON, Pierre-Joseph. Do princípio federativo. São Paulo: Nu-Sol/Imaginário, 2001.

PROUDHON, Pierre-Joseph. Sobre o princípio da associação. Verve, 10: 44-74, 2006.

PROUDHON, Pierre-Joseph. A propriedade é um roubo: seleção e notas de Daniel Guérin. tradução de Suely Bastos. Porto Alegre: L&PM, 2014.

MACIEL, Antônio C.; BRAGA, Rute M. Politecnia e emancipação humana: uma metodologia para a formação histórico-crítica na universidade. In: AMARAL, Nair F. G.; BRASILEIRO, Tânia S. A. (org.). Formação docente e estratégias de integração universidade/escola nos cursos de licenciatura. São Carlos: Pedro & João; Porto Velho: EDUFRO, 2008.

MACIEL, A. C. O método histórico-crítico de produção acadêmica: elementos didáticos para o trabalho pedagógico em sala de aula. Teresina: Alumia, 2023.

MARX, Karl. Miséria da filosofia: resposta à filosofia da miséria, do sr. Proudhon. Trad. José Paulo Neto. São Paulo: Expressão Popular, 2009.

MARX, Karl. Contribuição à crítica da economia política. 2. ed. Trad. Florestam Fernandes. São Paulo: Expressão Popular, 2008.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido comunista. Trad. Álvaro Pina. São Paulo: Boitempo Editorial, 1998.

SAVIANI, Dermeval. O choque teórico da politecnia: trabalho, educação e saúde. Revista Trabalho, Educação e Saúde, v. 1, n. 1, p. 131-152, mar./ago., 2003. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1981-77462003000100010. Acesso em: 28 jul. 2019.

FRUTUOSO, C. História, luta de classes e revolução em Marx e Proudhon.


[*] Doutor em Educação. Professor Substituto UNIR-Ariquemes. E-mail: claudinei.frutuoso@unir.br

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