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Antonio Delfim Netto

Agência FAPESP – Morreu ontem (12/08) Antonio Delfim Netto, aos 96 anos de idade. Economista, formado pela Universidade de São Paulo (USP) em 1951, integrou a terceira turma de alunos da Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas (FCEA), antiga denominação da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA-USP).

Na vida acadêmica, foi professor titular de análise macroeconômica e professor emérito da USP; na carreira política, comandou a economia brasileira por duas vezes como ministro de Estado e se elegeu deputado cinco vezes, inclusive como constituinte por São Paulo, de 1987 a 1988.

“O legado acadêmico e intelectual do professor Delfim continuará a ser lembrado por todos que tiveram o privilégio de conviver com ele, e também por aqueles que poderão acessar as obras do seu acervo construído ao longo de mais de oito décadas disponível na biblioteca da FEA-USP”, afirmou em nota a diretora da FEA, Maria Dolores Montoya Diaz.

Carlos Luque, professor titular da FEA, sublinha o papel de Delfim Netto como professor do Departamento de Economia, no início da década de 1950. “Ele contribuiu de maneira decisiva para que a estrutura do curso de Economia da FEA fosse próxima à das principais universidades do mundo, contribuindo para a formação de novos economistas que, posteriormente, tiveram um papel importante na USP ou em cargos públicos”.

Outra característica de Delfim Netto, ele acrescenta, era sua “capacidade de manter-se atualizado” e sempre opinar sobre os principais assuntos da sociedade, especialmente, econômicos. Suas análises sempre se baseavam nos ensinamentos técnicos dos modelos econômicos, mas nunca esquecia que a Ciência Econômica é uma Ciência Social e, portanto, os modelos poderiam orientar suas análises, mas a realidade de cada momento específico era muito mais importante para orientar suas reflexões.

Destaca, ainda, o papel de Delfim Netto no panorama político e principalmente econômico para nosso país, sublinhando alguns aspectos da sua trajetória, como o período em era Ministro da Fazenda, quando o Brasil apresentou elevadas taxas de crescimento da economia, de 1968 a 1973, no período do “milagre econômico “.

Paixão precoce pela economia

Paulistano, nascido no Cambuci, e aluno do Liceu Siqueira Campos, Delfim Netto começou a trabalhar como contínuo das indústrias Gessy Lever aos 14 anos, após a morte do pai. Prosseguiu seus estudos na Escola Técnica de Comércio e, durante o curso, já escrevia sobre economia para jornais como a Folha da Tarde, do grupo Folha, distribuída entre os anos de 1949 e 1959 e entre 1967 e 1999. Enquanto cursou a USP, trabalhou no Departamento de Estradas de Rodagem (DER), onde redigiu diversos trabalhos na área de economia, como Uma estimativa de custos de operação dos equipamentos rodoviários e Alguns métodos estatísticos para cálculos de depreciação numa economia sujeita à inflação, de acordo com a sua biografia publicada no site do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC-FGV).

Formado, tornou-se assistente de Luís Freitas Bueno, catedrático de econometria e, dois anos depois, em 1953, ministrou um curso de análise matemática para economistas da Bolsa de Mercadorias de São Paulo, antes de ser aprovado no concurso para livre-docente de estatística econômica, de defender a tese O problema do café no Brasil e de ocupar o cargo de catedrático de economia brasileira em 1958. Nesse mesmo ano foi eleito vice-presidente da Ordem dos Economistas de São Paulo e tornou-se membro do conselho editorial da Revista de Ciências Econômicas.

Entre 1958 e 1966, Delfim Netto publicou estudos como: Alguns problemas da agricultura brasileira; Agricultura e desenvolvimento; O trigo no Brasil; Vinte anos de substituição do café brasileiro; O mercado de açúcar no Brasil; entre outros temas relacionados ao planejamento para o desenvolvimento econômico.

Essas obras, e todo o seu acervo particular com mais de 100 mil títulos, foram doados por ele à FEA-USP em 2011, compondo a Biblioteca Delfim Netto. Reinaugurada em 2014, a biblioteca é considerada a mais completa na área de economia e de temas relacionados à área econômica do Brasil. “Delfim Netto era considerado um exímio colecionador. E a coleção permaneceu em crescimento ao longo dos anos devido ao seu interesse pela evolução do conhecimento e também por sua generosidade em manter viva a Biblioteca da FEA-USP”, afirma a nota da FEA-USP.

Orquestrando o “milagre brasileiro”

Paralelamente às atividades acadêmicas, foi assessor econômico na Associação Comercial de São Paulo e, em 1959, passou a integrar a equipe de planejamento do governo de Carlos Alberto de Carvalho Pinto. Nos anos seguintes, foi diretor de pesquisa da Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da USP, membro do Conselho Universitário dessa instituição, do Serviço Estadual de Mão de Obra da Secretaria do Trabalho do governo de São Paulo e do Conselho Técnico Consultivo da Assembleia Legislativa.

Em 1965, ingressou no Conselho Consultivo de Planejamento (Consplan), órgão de assessoria à política econômica do governo do general Humberto Castelo Branco (1964-1967), conduzida pelos ministros Roberto Campos, do Planejamento, e Otávio Gouveia de Bulhões, da Fazenda, de acordo com o CPDOC-FGV. Por indicação de Roberto Campos, passou a integrar também o Conselho Nacional de Economia.

Em 1966, foi nomeado para um posto executivo na área econômica do governo Laudo Natel, em São Paulo, depois da cassação do governador Ademar de Barros e, por indicação de Roberto Campos, assumiu a Secretaria Estadual da Fazenda.

Em março de 1967 foi nomeado ministro da Fazenda no governo do general Artur da Costa e Silva, com uma política de combate à inflação com a aceleração do crescimento econômico e um Plano Estratégico de Desenvolvimento. Alcançou “os dois principais objetivos definidos para o primeiro ano de sua gestão: a taxa de inflação baixou para 23% em fins de 1967 e o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 4,8%, dando início a um novo ciclo ascendente da economia nacional, que se estenderia até 1974. Em 1968, o crescimento atingiu 9,3%, devido principalmente ao desempenho da indústria, que alcançou a taxa de 15,5%, liderada pelo setor de bens duráveis de consumo”, de acordo com o CPDOC-FGV.

Signatário do Ato Institucional nº 5 (AI-5), em 13 de dezembro de 1968, Delfim Netto manteve seu posto e sua política econômica no governo do general Emílio Garrastazu Médici. A taxa de crescimento do PIB brasileiro se manteve elevada: 9% em 1969, 9,5% em 1970, 11,3% em 1971, 10,4% em 1972 e 11,4% em 1973, período que ficou conhecido como o do “milagre brasileiro”, com benefícios sociais principalmente para as camadas médias ou ricas.

Com a posse do general Ernesto Geisel na Presidência da República em 15 de março de 1974, Mário Henrique Simonsen foi nomeado para o Ministério da Fazenda. Delfim chegou a manifestar interesse em governar São Paulo, mas, como a escolha já tinha recaído sobre Paulo Egídio Martins, aceitou o posto de embaixador do Brasil na França, que ocupou entre 1975 e 1978.

“Delfim Netto continuou prestigiado nos meios governamentais”, afirma o CPDOC-FGV. Com a posse do general João Batista Figueiredo na Presidência da República, em 15 de março de 1979, foi indicado para a pasta da Agricultura. Com a crise do petróleo, o governo optou por medidas contencionistas para o controle da inflação, o que acabou por levar à renúncia de Simonsen e à indicação de Delfim Netto para a pasta do Planejamento em agosto de 1979.

Voltou com força ampliada, conseguindo transferir para o Planejamento atribuições da Fazenda. Apesar de ocupar o cargo de ministro do Planejamento, Delfim Netto atuou efetivamente como um ministro da Fazenda, formulando as principais estratégias econômicas do governo e interferindo praticamente em todos os problemas nacionais. Até a posse de José Sarney, em 1985.

Eleito deputado federal, empossado em 1° de fevereiro de 1987, Delfim Netto alinhou-se na Constituinte ao grupo conservador que, na segunda etapa dos trabalhos, articulou uma maioria parlamentar em torno do bloco suprapartidário autointitulado “Centrão”. Após a promulgação da nova Constituição, em 5 de outubro de 1988, tornou-se membro titular das comissões de Economia, Indústria e Comércio e de Finanças e Tributação. Foi eleito deputado federal para outros quatro mandatos, tendo passado pelo PDS, PPR, PPB e PP, hoje Progressistas. Mais recentemente, pelo PMDB, atual MDB.
 

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