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IDEB: INDICADOR DE QUALIDADE DA EDUCAÇÃO BÁSICA?

IDEB: INDICADOR DE QUALIDADE DA EDUCAÇÃO BÁSICA?

Andreza Texeira de Aquino*

Simône de Oliveira Alencar**

Marlene Schussler D’Aroz***

RESUMO

Este estudo visa refletir sobre o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) como indicador de qualidade educacional, a partir de uma pesquisa bibliográfica interpretativa. Foram identificados artigos na base de dados Scielo, considerando o “IDEB” em títulos, resumos e palavras-chave. Excluíram-se artigos em línguas estrangeiras, resultando em 10 artigos relevantes ao tema e ao objetivo desse estudo. Conclui-se que, embora não abranja todos os aspectos da educação, o IDEB é uma ferramenta fundamental na busca de quantificar a qualidade nas escolas brasileiras.

Palavras-chave: Educação. Avaliação. Qualidade. Quantidade.

ABSTRACT

This study reflects on the Basic Education Development Index (IDEB) as an indicator of educational quality, based on an interpretative bibliographic research. Articles were collected in the Scielo database, considering the “IDEB” in titles, abstracts and keywords. Articles in foreign languages were excluded, resulting in 10 articles relevant to the theme and objective of this study.

Keywords: Education. Evaluation. Quality. Quantity.

INTRODUÇÃO

No Brasil, desde a década de 1990, as políticas educacionais passaram por mudanças significativas, que surgiam com a ideia de promover um Estado mínimo, visando a maximização da eficiência na gestão pública, reveladas em dados amplos acerca das políticas de educação pública implementadas pelas secretarias estudais e pelo Governo Federal. Nesse contexto, as avaliações externas foram introduzidas e ganharam força como ferramentas importantes para medir a qualidade da educação brasileira.

Essas avaliações externas, como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) desde 1990, tornaram-se vitrines da qualidade educacional do país que além de fornecerem dados sobre o desempenho dos estudantes, infelizmente, também servem como base para a criação de rankings que comparam os resultados de diferentes sistemas de ensino, bem como de escolas públicas e privadas.

Este estudo visa refletir sobre o IDEB como indicador de qualidade educacional. Os resultados, têm sido controversos, uma vez que, criam uma competição (rankings) desigual entre as escolas, além de simplificar a avaliação educacional apenas em números, desconsiderando o contexto socioeconômico e cultural das instituições e da comunidade escolar.

METODOLOGIA

Este estudo realizado no Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Humanidades – PPGECH/UFAM, é fruto de uma pesquisa bibliográfica de cunho interpretativo, que segundo Gil (2017), é uma pesquisa organizada com base em materiais publicados. Desse modo, realizou-se um levantamento de artigos científicos publicados na base de dados Scielo Como critérios de inclusão foi considerado o termo: “IDEB”, que apareceu em seus títulos, resumos e palavras-chave. Para os critérios de exclusão selecionou-se artigos escritos em línguas estrangeiras, sem limite temporal, resultando em 10 artigos relevantes ao tema e ao objetivo deste estudo. “A pesquisa bibliográfica não é mera repetição do que já foi dito ou escrito sobre certo assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras” (Lakatos; Marconi, 2003, p. 183).

O método teórico-filosófico-metodológico adotado é Análise de Conteúdo de Bardin (2016), por sua vez, é uma abordagem que busca orientar todo o processo de análise de dados qualitativos, visando identificar o que está sendo dito a respeito do objeto de estudo. Nessa abordagem, a técnica utilizada para realizar a análise dos dados coletados foi a Análise Categorial de Bardin (2016), prática utilizada para a emergência de categorias de análise a partir da materialidade que se propõe a analisar, um processo que se estabelece a partir da análise e exploração do material, identificando os temas mais recorrentes encontrados nos materiais da pesquisa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Partindo da reforma do Estado no Brasil em 1990, que tinha como princípio reorganizar as estruturas da administração pública, visando a qualidade e a produtividade dos serviços prestados, implicou na delineação das políticas educacionais com a proposta de avaliação externa como mecanismo de controle e regulação do Estado.

A partir da reforma supracitada, o debate acerca de qualidade no âmbito do ensino ganhou notoriedade nas pautas governamentais e acadêmicas. No entanto, ao discutir sobre a qualidade no/do ensino, é importante considerar variáveis/fatores que implicam e influenciam este processo, como por exemplo: currículo, formação de professores, infraestrutura escolar e avaliação do desempenho dos alunos e escolas.

Nessa perspectiva, surge o seguinte questionamento que suscitou o interesse pelo presente estudo: O que é qualidade?  Como esta qualidade é medida e verificada no âmbito do IDEB?

Importa destacar que o termo qualidade é um conceito polissêmico e pode modificar de acordo com o tempo e com o contexto. Em termos gerais, qualidade refere-se à medida em que algo atende às expectativas, requisitos ou padrões estabelecidos; envolve a entrega consistente de um produto final de valor aos clientes ou usuários, seja por meio de produtos ou serviços.

No âmbito educacional, qualidade refere-se à capacidade do sistema educacional proporcionar aprendizagens eficazes/significativas/equitativas que promovam o desenvolvimento global dos alunos e os preparem para serem cidadãos responsáveis e críticos na vida pessoal, acadêmica e profissional.

Qualidade é uma palavra polissêmica, plástica, que encerra virtualidades e positividades, expressa convergência de preocupações, permitindo a rápida construção de um consenso por criar a ideia de agregação em torno de compromissos comuns. Estas características ocultam o quanto suas diferentes acepções guardam possibilidades opostas e contraditórias de organização da escola como projeto social (Esteban, 2008, p. 6).

Chirinéa e Brandão (2015) retrata que a busca e a atenção dada por uma qualidade do ensino em nosso país estão relacionadas ao desenvolvimento econômico do país, bem como sua inserção no grupo dos países desenvolvidos. Que pelo contrário, deveria ser uma referência para a consolidação do direito do cidadão em exercer sua participação política e social, ou seja, uma formação humana.

A avaliação educacional vem sendo considerada como uma ferramenta principal de medida da qualidade do ensino, pois através dela, gestores, professores e sistemas educacionais avaliam e mensuram o desempenho dos alunos. Assim, com a tradição de avaliar o ensino pela medição, cria-se as avaliações externas com o objetivo de oferecer um indicativo sobre a possível qualidade de ensino que é oferecido nas escolas.

Nesse viés, as avaliações externas tornam-se imprescindível, com o objetivo de qualificar o ensino ofertado nas escolas e no país, ou seja, verificar e expor o “produto final” dessa qualidade. No entanto, “a qualidade, neste sentido, não é um fator estanque e não pode ser buscada somente com testes que medem o conhecimento cognitivo dos alunos” (Chirinéa; Brandão, 2015, p. 274).

Em 2007, para avaliar o ensino no Brasil, foi criado o IDEB, indicador da qualidade do ensino, elaborado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais “Anísio Teixeira”, que reúnem os dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica e as taxas de aprovação, reprovação e evasão, obtidas por meio do Censo da Educação Básica. O IDEB é um sinalizador de metas a serem alcançadas obrigatoriamente pelas escolas públicas. “Embora seja um indicador de resultado, e não de qualidade, é a partir deste – e da divulgação dos seus resultados – que se mobilizam ações para melhoria da qualidade” (Chirinéa; Brandão, 2015, p. 464).

Corroborando, Brasil (2011), o IDEB é um dos componentes do Sistema de Avaliação da Educação Básica, trata-se de um indicador estatístico, que permite definir metas e acompanhar a qualidade do ensino básico no Brasil, fornecendo informações referentes ao desempenho de cada escola.

A cada dois anos a comunidade escolar acompanha a divulgação desse indicador. Enquanto que os representantes de governos, secretarias, universidades e gestores escolares se dedicam às análises explicativas acerca do “sucesso” ou do “fracasso” das redes de ensino, como se essa “qualidade” pudesse ser medida com a régua da nota. Castro (2009), afirma que é possível, através do IDEB, acompanhar quais Estados e Municípios avançam mais em relação ao seu ponto de partida.

Para Neto (2010), o IDEB é um instrumento confiável que permite uma noção próxima da realidade de uma escola acerca de seu processo de ensino e aprendizagem. Ao servir como parâmetro, acaba sendo um mobilizador de ações para a melhoria do espaço escolar. Nessa perspectiva, Fernandes (2007), confirma que a divulgação dos índices obtidos pelas escolas é um instrumento democratizante, pois fornece parâmetros ao público interno e externo, e pode clarear determinadas percepções sobre o trabalho da escola ou rede de ensino.

Diante do exposto, não se vê preocupações em criar políticas públicas para atingir a meta 7 do Plano Nacional, Municipais e Distrital de Educação que é fomentar a qualidade da educação básica em todas as etapas e modalidades, com melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem de modo a atingir as médias nacionais até 2022. A atenção está voltada em demonstrar resultados.

O resultado quantitativo quando é visualizado como um produto final, lido de forma isolada, acarreta em uma compreensão limitada. É preciso ir além da visualização de números, além de comparações. É importante analisar, questionar, criticar, refletir sobre o que os dados querem dizer, explorá-los qualitativamente.

Nesse sentido, Paz e Raphael (2010), consideram que os alunos e os professores se tornam reféns do IDEB, pois o indicador mede ilusoriamente a qualidade da educação básica. Os números e a quantificação dos índices, de acordo com Duarte (2013), não conseguem dar conta da singularidade dos contextos escolares avaliados, muito menos da subjetividade presente nos alunos que realizam as avaliações externas.

De modo geral, pode destacar a preocupação em relação ao uso dos resultados do IDEB, os quais tem gerado grandes discussões sobre as reais melhorias nos sistemas de ensino. É notável o incentivo financeiro despendido as escolas com “bons” resultados, o que acaba estimulando uma competição entre as mesmas, onde a preocupação com o ranking cria obstáculos ao processo de ensino. Desse modo, os sistemas de avaliação tornam-se puramente regulatórios e mercadológicos, sem se importar com as diversidades das escolas, suas potencialidades e precariedades (Fillipin et al., 2020, p. 9).

Diante do desafio de mensurar a qualidade da educação, através do IDEB, é importante perguntar: É possível efetivamente quantificar a qualidade do ensino? Somos condicionados a acreditar que sim, pois através de números visualiza-se a qualidade quantificada, e nessa perspectiva, os números por vezes se apresentam como suficientes e assim dar-se por encerrada essa discussão, uma vez que, nos meios de comunicação a “qualidade” da educação já é um “produto final” em números que circulam livremente sem nenhuma preocupação.

Talvez o problema seja sucumbir à sedução dos números e o esforço necessário deva ser o de desconfiar da sensação de objetividade que eles nos dão. Não, as estatísticas não são objetivas. São um recurso útil de objetivação – o que é diferente – e comportam riscos, efeitos colaterais, que não podemos desconhecer nem desconsiderar (Gil, 2021, p. 187).

Nessa direção, “nem tudo o que conta em educação é mensurável ou comparável” (Afonso, 2009, p. 13). Partindo dessas reflexões, as escolas podem e devem promover ações voltadas para a melhoraria da qualidade do ensino, para depois se pensar no índice, haja vista que um é decorrente do outro.

Diante do exposto, inferimos que definir a qualidade educacional a partir dos resultados do IDEB é um risco. Sugere-se que a leitura dos números seja articulada com contextos, realidades e possibilidades de cada comunidade escolar, proporcionando a melhoria da qualidade para além de números e ranqueamento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Procuramos apresentar neste trabalho, uma breve reflexão a respeito do IDEB, enquanto indicador de qualidade, o qual mostrou-se um tema desafiador e controverso no campo educacional, aberto a múltiplos olhares e interpretações. Por tratar-se de dados quantitativos, o tema necessita ser mais investigado e discutido para qualificá-los efetivamente.

A literatura revisada neste estudo divide concepções à cerca das análises sobre os resultados do IDEB. Por um lado, demonstra ser um importante instrumento de avaliação da qualidade do ensino brasileiro, por outro lado, o mesmo possui limitações que podem comprometer sua interpretação e seu significado, por ser apresentado tão somente em números, não é necessariamente um reflexo da qualidade real da educação.

A partir dessas reflexões mais horizontes se abrem para futuros estudos que contemplem as influências e implicações sobre o IDEB e sua relação como verificador da qualidade de educação, para isto, é relevante considerar os contextos específicos de cada comunidade escolar, bem como suas possibilidades, tornando-se um indicador que permita e promova a melhoria contínua da educação no Brasil.

REFERÊNCIAS

AFONSO, Almerindo Janela. Nem tudo o que conta em educação é mensurável ou comparável. Crítica à accountability baseada em testes estandardizados e rankings escolares. Revista Lusófona de Educação, n. 13, p. 13-29, 2009.

BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2016.

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BRASIL. O IDEB e o Censo Escolar da Educação Básica. 2011. Inep. Disponível em http://portal.inep.gov.br/web/educacenso/situacao-do-aluno/o-IDEB-e-o-censo-escolar. Acesso em: 04. mai. 2024.

CASTRO, Maria Helena Guimarães de Castro. A Consolidação da Política de Avaliação da Educação Básica no Brasil. Meta: Avaliação. Rio de Janeiro, v. 1, n. 3, p.271-296. 2009.

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FILLIPIN, Gabriela Granzotto; LOBATO, Beatriz Cardoso; JACOBI, Luciane Flores; ZANINI, Roselaine Ruviaro. Uma visão sobre o IDEB, suas aplicações e resultados. Ciência e Natura. Santa Maria, v. 42, Commemorative Edition: Statistic, e25, 2020.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisas. 6. Ed. – São Paulo, SP: Atlas, 2017.

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* Pedagoga. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Humanidades da Universidade Federal do Amazonas/Instituto de Educação Agricultura e Ambiente. E-mail: andreza_aquino@hotmail.com.br

** Pedagoga. Doutora em Educação da Universidade Federal do Amazonas/Instituto de Educação Agricultura e Ambiente. E-mail: simonealencar@ufam.edu.br

*** Pedagoga. Doutora em Educação da Universidade Federal do Amazonas/Instituto de Educação Agricultura e Ambiente. E-mail: marlenedaroz@ufam.edu.br

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