Tempos atrás, quando uma criança começava a gritar, se contrariada, ou se negava a obedecer uma ordem dos pais, tapando os ouvidos e bradando: “Não estou ouvindo nada! Não estou ouvindo nada”, ela era taxada de birrenta, mal-educada, chata ou insuportável por quem assistia esse tipo de manifestação. No entanto, para os pais que toleravam esse tipo de atitude, isso era normal. Alguns, poucos, ao perceberem o escândalo que a falta de modos dos filhos causava em público, pioravam ainda mais a situação, gritando mais alto com a variante de desferir umas palmadas, às vezes desproporcionais. Eram exceções, pois a regra era “educação e civilidade se aprendem em casa”.
Atualmente, essa regra mudou por múltiplos motivos, e a educação de casa vem perdendo espaço para uma espécie de coletivização institucional, onde tudo é permitido, para evitar traumas ou cooptar a juventude com uma falsa liberdade.
Educar à moda antiga passou a ser considerada uma “violência” contra a infância, o que, de certa forma, tirou a responsabilidade de certos pais sobre a criação dos filhos, outorgando-a a terceiros.
O curioso é que uma criança tem o direito a fazer escolhas, mas não pode ser responsabilizado por seus atos até a maioridade. A partir dos 16 anos, um adolescente pode votar, mas não é considerado responsável caso cometa crimes, inclusive gravíssimos. Na maioria dos casos, ele é apenas recolhido a uma instituição, tendo sua identidade preservada, e é liberado ao completar 18 anos.
Lembro de um caso em que um adolescente que matou a ex-namorada poucos dias antes de completar 18 anos…
Essa proteção que, em muitos casos, desprotege crianças e adolescentes, passou a ser muito bem utilizada por criminosos.
Mas também preocupa a forma como algumas pessoas permanecem adolescentes do tipo daqueles que gritam quando são contrariados, ou seguindo modelos de condicionamento baseados em crenças ou ideologias totalitárias, se negando a ouvir qualquer coisa que não esteja de acordo com suas vontades e dogmas.
Daí surgem os homens-bomba, os terroristas e radicais de toda espécie, alguns com PhD.
Alguns chamam isso de imunização cognitiva, outros de doutrinação, intolerância. Enfim, são pessoas que são incapazes de conviver com quem discorda de suas crenças, seus mentores e opções, e querem impô-las como regras absolutas, sem concessões.
Suas reações intolerantes são expressas de múltiplas formas, na maioria das vezes, arrogantes, desdenhosas ou raivosas.
Ao perderem argumentos, apelam para gritos, ofensas preconceituosas, palavras de ordem em coro, gargalhadas e outras ações cenográficas, que consideram liberdade de expressão, sem nunca aceitar a recíproca.
Nada do que fazem é considerado erro ou crime: tudo é parte de um projeto ou ideal. Quem não adere deve ser “cancelado”, expurgado ou eliminado.
Seus mortos sãos mártires colocados no altar da idolatria! Suas vítimas? Mereceram!
Alguns colocam até Deus, com suas múltiplas denominações, para justificarem seus atos de selvageria contra seres humanos!
Ninguém que aja dessa forma jamais poderá se considerar ou ser considerado uma pessoa decente. Nada mais é do que mais um no rebanho de tosquio e corte, na massa de manobra de líderes carismáticos, lunáticos religiosos e oportunistas que querem a Humanidade desunida, em eterno conflito para poderem encontrar seus espaços.
Essas figuras abjetas preferem semear ódio e rancor, cooptar ou constranger crianças e jovens a seguirem suas cartilhas, vivendo e lucrando com as doenças da sociedade, em vez de atuarem pelo congraçamento e pela tolerância.
Eles são a verdadeira doença da Humanidade, escravos da intolerância, disseminadores de ódio. Enfim, a negação da evolução da Civilização, embora digam o contrário!
Adilson Luiz Gonçalves
Escritor, Engenheiro e Pesquisador Universitário
Membro da Academia Santista de Letras