IDENTIDADES DE PROFESSORAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL DE HUMAITÁ/AM
Naele de Oliveira Braga[*]
Maria Isabel Alonso Alves*
RESUMO – Este artigo é um recorte da pesquisa de iniciação científica – PIBIC/PROPESP/UFAM desenvolvida entre 2022-2023, cujo objetivo foi analisar narrativas de professoras da Educação Infantil acerca das suas identidades docentes, tendo como base, entrevistas narrativas. Os resultados apontaram para a percepção das identidades docentes das professoras da educação infantil mediante os contextos de formação docente e história de vida, tendo em vista a profissão docente como um contínuo processo de ressignificação permeada por aprendizagens e formação.
Palavras-chave: Identidade Docente. Formação Docente. Educação Infantil.
ABSTRACT – This article is an excerpt from the scientific initiation research – PIBIC/PROPESP/UFAM developed between 2022 and 2023, whose objective was to analyze narratives from Early Childhood Education teachers about their teaching identities. This is a qualitative approach based on interview techniques captured from a script of open questions. The analyzes were carried out through thematic axes, organized and systematized based on the data produced in the interviews. The results point to the perception of teaching identities of early childhood education teachers through the contexts of teacher training and life history, considering the teaching profession as a continuous process of resignification permeated by learning and training.
Keywords: Teaching Identity. Teacher Training. Child education.
INTRODUÇÃO
A temática em questão leva à reflexão sobre os conceitos de Educação Infantil, Identidade docente e Formação de Professores. No caso da pesquisa, buscou-se contar com a participação de professoras da Educação Infantil que trabalham na rede pública municipal de Humaitá-AM. Partindo do que defende Silva (2013), o que define uma pessoa são suas identidades, a qual inclui as qualidades, as habilidades, o modo de pensar, de agir e outros fatores característicos de um ser, assim, para discorrer sobre a identidade docente de professoras da Educação Infantil é importante definir “o que é identidade”. Nesta forma de ver, “A identidade é simplesmente aquilo que se é: ‘sou brasileiro’, ‘sou negro’, ‘sou heterossexual’, ‘sou jovem’, ‘sou homem’ dentre outras, como aponta Silva (2013). A identidade assim concebida parece ser uma positividade (‘aquilo que sou’), uma característica independente, um ‘fato’ autônomo e formativo. Nessa perspectiva, a identidade só tem como referência a si própria; ela é autocontida e autossuficiente (SILVA, 2013, p. 74)”.
A identidade profissional diz respeito a uma realidade que se desenvolve, de forma individual ou coletiva ao longo da carreira, sofrendo influências do meio ao qual se encontra inserido, assim como suas experiências adquiridas no decorrer da vida docente, no caso desta pesquisa, as professoras da Educação Infantil. “A identidade docente é uma construção que permeia a vida profissional desde o momento de escolha da profissão, passando pela formação inicial e pelos diferentes espaços institucionais onde se desenvolve a profissão, o que lhe confere uma dimensão no tempo e no espaço” (NÓVOA, 1995, p. 34).
O processo de formação do professor sofre interferências das interações sociais, uma vez que exige que sejam feitas adaptações à sua prática de acordo com a realidade a qual atua. A construção da identidade docente agrega valores de cada indivíduo na maneira que constrói suas histórias, levando em consideração a forma como se situa no mundo enquanto professor e quais seus saberes, angústias e anseios. A compreensão da identidade profissional do professor está diretamente ligada à sua interpretação do meio social, dessa forma, os movimentos ou acontecimentos sociais estão interligados com a realidade escolar e, para promover uma aprendizagem e formação satisfatória do aluno, o professor precisa pautar sua formação de acordo com a sua prática pedagógica.
A docência na Educação Infantil tem sido vista por Lima (2014), como uma atividade profissional complexa, que requer saberes diversificados, o que significa, reconhecer que os saberes que dão sustentação a docência exigem uma formação profissional nas dimensões teóricas e práticas. “A construção da identidade do professor da Educação Infantil diz respeito àquilo que lhe é específico, aos seus saberes e competências, bem como ao espaço que atua, pois é no espaço que os professores adquirem experiência e articula aos seus saberes, permitindo, assim, a sua caracterização como professor da Educação Infantil” (LIMA, 2014, p. 4). As identidades podem, então ser pessoal, social e profissional já que tais perspectivas apontam para o que somos e como somos.
Para discutir sobre o processo histórico da formação docente no contexto brasileiro, são abordadas as autoras Vicentini e Lugli (2009). A partir deste entendimento, delimita-se o tema central desta pesquisa que é Identidade Docente de Professoras que atuam da Educação Infantil no contexto de Humaitá-AM, que surgiu a partir das indagações: Como as professoras que atuam na educação infantil se identificam como docentes na educação infantil? Que formação estas professoras possuem? Em que momento de suas histórias de vida e de formação se perceberam professoras da educação infantil? Que narrativas estas professoras possuem acerca de suas identidades docentes?
A bibliografia consultada aponta que ser professor e, sobretudo ser professor da educação infantil na contemporaneidade, significa colocar-se na condição de aprendiz, na qual o profissional da educação precisa estar em constante buscar pelo conhecimento. A formação de professores e a identidade docente envolvem reflexão e ação, na qual o desenvolvimento da profissão ele se dá ao longo da história do sujeito professor, no decorrer do exercício de sua profissão, bem como pela continuidade de sua formação profissional.
Um cenário em se que consistem grandes desafios para o contexto do ensino superior, é a formação de profissionais para atuar na Educação Infantil, vista a primeira etapa da educação básica. Porém, o cenário muda após a promulgação das recentes leis, como a Constituição Federal de 1988 e a LDB nº 9.394/96.
Dessa forma os processos de formação inicial e continuada desses profissionais da Educação Infantil, geram debates quanto ao perfil desse educador, visto que longo da história permeou a ideia de que qualquer pessoa poderia atuar na Educação Infantil. Diante dos fatores apresentados, como estudante na área, a atual pesquisa parte de uma inquietação pessoal, em saber como as profissionais atuantes da rede pública municipal de Humaitá, constroem suas identidades na docência da educação infantil.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Apresentamos a percepção das professoras da educação infantil sobre suas das identidades docentes mediante os contextos de formação docente e história de vida, tendo em vista a profissão docente como um contínuo processo de ressignificação das práticas, permeada por aprendizagens e formação individual e coletiva. Souza (2006) destaca que narrativas docentes apresentam trajetórias e experiências do itinerário escolar, sendo marcadas por aspectos históricos que proporcionam reflexões e análises sobre o ato de narrar ou escrever sobre si.
Por questões éticas, as professoras participantes da pesquisa foram mantidas em anonimato. Seguindo a ordem das entrevistas, foram denominas como, Professora Entrevista PE1, Professora Entrevista PE2, Professora Entrevistada PE3, Professora Entrevistada PE4. As entrevistas ocorreram no mês de abril e maio de 2023. Neste contexto apresentamos as professoras entrevistadas no quadro a seguir.
Quadro 2: Perfil das participantes[†]
Professora Entrevistada | Turma que atende | Faixa etária das crianças que atendem | Tempo de Serviço da docente na educação infantil | Formação | Idade |
PE1 | Maternal I (15 alunos) | 3 anos | Pedagoga, mestra em educação, especialista em Psicopedagogia | 35 anos | |
PE2 | Maternal I (15 alunos) | 3 anos | 4 anos na educação infantil. | pedagogia, psicopedagogia clínica e institucional. | 52 anos |
PE3 | Maternal II (14 alunos) | 4 anos | 7 anos | Pedagogia, especialização em metodologia e psicopedagogia. | Não informado. |
PE4 | Maternal I (11 alunos) | 3 anos | 10 anos atuando na educação infantil. | Possui o magistério e formação em Pedagogia | 52 anos |
Fonte: Elaborado pelas autoras
Buscando levantar o perfil docente e a trajetória de formação das professoras entrevistadas, foi pedido para que as professoras falassem um pouco sobre si e sobre os seus processos de formação escolar e acadêmica. Podemos perceber nas narrativas alguns aspectos que constituíram para o processo de construção das identidades das professoras entrevistadas. As suas vivências, suas experiências adquiridas no âmbito de suas famílias, do trabalho, os encontros com professores durante suas formações, mostram que estas estavam em busca de contribuir com uma formação de qualidade, em que pudessem adquirem saberes que contribuiriam de forma significativa para o processo de construção de suas identidades pessoal e profissional e de uma boa prática na Educação Infantil.
No relato da PE3, os desafios já se iniciam ao precisar mudar de cidade, deixando o âmbito do seu lar, para exercer à docência em Humaitá/AM, apesar dos percalços de ingressar em uma universidade pública não desistiu de sua escolha, e conseguiu formar-se em pedagogia. Sua narrativa mostra sua identidade docente “sou professora há 10 anos na Educação Infantil”, mostrando estar feliz na sua profissão. A PE1 e PE3 após adquirem os saberes básicos e necessários para o exercício da docência, em suas formações iniciais, optaram por dar continuidade nesse processo, ingressando em outras formações na área da educação e do ensino. Denota-se a busca pelo aperfeiçoamento dos conhecimentos de sua profissão com o objetivo de assegurar um bom ensino e de melhor qualidade aos seus educandos.
Dessa forma, a identidade pessoal e a identidade construída coletivamente são essenciais para definir a identidade profissional docente. E que o processo da construção da identidade docente se dá pela sua própria satisfação do trabalho, é um processo contínuo, subjetivo, suas trajetórias individuais e sociais, possibilitando a construção, desconstrução e a reconstrução, conforme aponta Tardif (2002).
Acerca dos relatos a PE3, que afirma:
Ser professor/a da educação infantil, não é fácil você precisa realmente gostar, pois é cansativo, desgastante, exige muita dedicação. A palavra ‘vou descansar’ para um professor não existe, nos dias de folga ou nos pequenos minutos do dia para o descanso o pensamento não para, é sempre pensando na temática, na metodologia, que música, qual história para ser contada, quais os recursos. É um turbilhão de emoções, de ideias que precisam ser traçadas, para a aula do dia seguinte. Apesar das dificuldades de se trabalhar nas escolas de rede pública, vindo de uma unidade de ensino privado onde se vive uma realidade, e ao chegar na escola pública encontrar outra realidade totalmente diferente, posso dizer que hoje estou feliz no meu trabalho (PE3, MAIO, 2022).
Diante do relato é possível notar que há uma grande preocupação em desenvolver práticas interessantes para trabalhar com seus alunos, mesmo sendo cansativo o exercício da profissão, está sempre em busca de traçar ideias relacionadas aos objetivos da educação, mobilizando os conhecimentos adquiridos durante a sua formação acadêmica. Segundo Souza, (2006 p. 57) “[…] a formação enquanto processo objetiva ampliar as capacidades de automatização, de iniciativa e de criatividade.” Dessa forma a professora demonstra estar em busca dos aperfeiçoamentos de suas práticas, reflete e leva em consideração o progresso de seus alunos, sempre pensando na melhor forma de proporcionar uma aula que se seja atrativa e envolva os seus alunos.
As narrativas mostram que as professoras estão em busca de conhecimentos para desenvolver práticas que contemplem a aprendizagem e desenvolvimento de seus alunos, mostram ter responsabilidade e comprometimento com a sua função. Apesar do cansaço do cotidiano, é possível notar em suas falas certa preocupação em torno de melhorias que ressignifiquem suas práticas, como visto no relato da PE1, “é trabalhoso, sem apoio de sala… necessita se reinventar sempre” (Abril, 2022).
O processo e construção da identidade docente também acontecem por meio da prática reflexiva, em que o docente faz uma reflexão crítica em torno dos pontos positivos e negativos. Nas instituições de Educação Infantil, o professor deve “[…] propiciar e garantir um ambiente rico, prazeroso, saudável e não discriminatório de experiências educativas e sócias variadas” (BRASIL, 1998, p. 30). Dessa forma, os saberes pedagógicos são fundamentais para se trabalhar as técnicas os métodos, as ferramentas para conduzir todo o processo de ensino e aprendizagem. Para Tardif (2011, p. 228), “[…] os professores de profissão possuem saberes específicos que são mobilizados, utilizados e produzidos por eles no âmbito de suas tarefas cotidianas […]”. Com base no apontamento citado analisamos a fala da PE3 à mostra que, apesar das dificuldades de atuar em escola de rede pública, diz estar feliz em seu trabalho.
Os apontamentos de Tardif (2011) mostram que a escolha pela profissão docente implica reconhecer que sua identidade profissional estará em constante processo de construção, além disso, o início da carreira não é fácil, é nessa hora que se confronta todo o aprendizado da faculdade a realidades das escolas. Torna-se professor é exigido do profissional, tomar decisões difíceis, arrisca-se, colocar em jogo todos os seus conhecimentos. Também segundo Libâneo, (2007, p. 227), “a formação pode possibilitar reflexividade e mudança nas práticas docentes […]”. De outro modo Gatti, Barreto e André (2011) ainda apontam que o professor deve estar preparado para as eventuais necessidades e demandas que a educação vem modificando para atender as especificidades de cada instituição; dessa forma os profissionais devem ser comprometidos com as suas ações para promover o processo educativo.
Podemos perceber nas narrativas das professoras alguns aspectos que contribuíram para a construção de suas identidades docentes, as professoras enquanto alunas puderam adquirir experiências e conhecimentos a partir de encontros oportunos com profissionais que contribuíram positivamente para esse processo e enquanto docentes, as relações pessoais e profissionais com o público infantil contribuíram para a construção de suas identidades na educação infantil.
Dessa forma, a identidade dentro de um processo da escolha profissional das docentes entrevistadas, situa-se como um autoconhecimento, tudo aquilo que me constitui como pessoa, o meio de interação social, as oportunidades e frustações são ferramentas essenciais no processo de formação da identidade pessoal e profissional. Um dos aspectos marcantes na identidade das professoras aparece em suas atitudes como educadoras. As professoras mostraram que suas identidades docentes foram construídas a partir de suas experiências formativas e nas relações com a prática.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
O objetivo central da pesquisa foi analisar as narrativas das professoras da Educação Infantil acerca de suas identidades docentes na Educação infantil. Para tanto, buscou-se entender como as professoras entrevistadas vivenciaram ou construíram suas identidades mediante os contextos de formação docente e história de vida, tendo em vista a profissão docente como um contínuo processo de ressignificação permeada por aprendizagens e formação.
Entendemos que o processo de construção de identidade não se limita a partir de um diploma, suas identidades docentes estão sendo formuladas a cada etapa de formação e atuação profissional, além das experiências adquiridas durante o trajeto da profissão docente na educação infantil.
Observou-se a partir de suas narrativas que estas possuem compreensão acerca do processo de suas formações, bem como os aspectos que constituem no processo de construção de suas identidades, tal como, as reflexões acerca dos aspectos do cotidiano escolar. Foi possível identificar também, uma visão romantizada acerca do ser professora da educação infantil, tal como vinculada ao “ter jeito” com crianças, não que essas atribuições sejam descartadas, porém, é preciso ter visão ampliada e crítica acerca da identidade docente e seu papel para a constituição de uma sociedade justa e igualitária. Assim, a pesquisa torna-se apenas um ponto de partida para novos olhares sobre identidades docentes na educação infantil.
REFERÊNCIAS
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Citar:
BRAGA, Naele de Oliveira; ALVES, Maria Isabel Alonso. Identidades de professoras da educação infantil de Humaitá/AM. Revista Virtual P@rtes. xxxxx
[*] Graduanda em Pedagogia, pesquisadora do Programa de Iniciação Científica (PIBIC/PROPESP/UFAM – 2022/2023). E-mail: naeleoliveira29@gamil.com
[*] Doutora em Educação. Professora do Magistério Superior na Universidade Federal do Amazonas (UFAM/IEAA). E-mail: profamariaisabel@ufam.edu.br
3 Os dados foram extraídos das narrativas durante as entrevistas com as docentes.