Lorena Paoloni*
Falar. Um verbo tão curto e, ao mesmo tempo, tão profundo. Em seus significados mais diversos, o termo encerra em si a capacidade de transmitir às outras pessoas – e aos animais, objetos, lugares, por que não? – palavras, ideias e conceitos que, do contrário, ficariam eternamente presos na sua mente.
Falar. Uma das definições do dicionário Michaelis para esse verbo é “estabelecer comunicação oral com outro(s) falante(s) por meio de um código linguístico, ou língua, próprio de determinada comunidade”. Para falar seria preciso, portanto, compartilhar do mesmo código linguístico. Então, quanto mais desses códigos (ou línguas) uma pessoa souber usar, mais chances terá de poder falar com seus pares em qualquer lugar.
Permitir que uma criança desenvolva essa capacidade de comunicação não apenas em seu idioma nativo, mas também em outros idiomas, é uma forma eficaz de dar a ela ferramentas para se adaptar aos mais diferentes contextos mundo afora. Talvez por isso, ao longo dos últimos anos, as escolas bilíngues se tornaram objetivo de famílias Brasil afora. De acordo com Romaine, o ensino bilíngue está enraizado na afirmação de que o uso de duas línguas, no processo de ensino e aprendizagem, fortalece o conceito delas e constrói um sistema de tradução automática. Ou seja, quanto mais cedo a criança for exposta ao inglês, por exemplo, melhor para que o idioma se torne natural para ela.
A cada vez que uma criança tem acesso ao aprendizado de outras línguas, muitas portas se abrem em seu futuro. É por meio desse aprendizado que ela poderá se conectar a um mundo que está fora de sua comunidade. No Brasil, infelizmente, isso ainda é privilégio. Segundo levantamento feito por Storto em 2015, apenas 5% da população brasileira domina o inglês em algum nível. Dentre esses 5%, 60% estão no nível básico – o inglês de sobrevivência – e apenas 1% fala inglês com alto nível de proficiência.
Palavras, tradução, interpretação. Não é de hoje que o brasileiro precisa aprender idiomas estrangeiros. As muitas línguas e variantes linguísticas que existiam por aqui quando Pedro Álvares Cabral atracou no Nordeste eram tão ricas e cheias de curiosidades quanto o português trazido pelos colonizadores. E, no entanto, restam atualmente poucos desses idiomas ricos que eram amplamente falados pelos povos nativos.
A verdade é que o processo de globalização não começou no século passado. Ele vem se desenrolando ao longo dos milênios, por meio das trocas comerciais e culturais vivenciadas por tantos povos, dos pontos mais distantes da Ásia até os vales e as montanhas da América do Sul. Falar – e falar em línguas diversas – sempre foi uma das formas de integrar povos e compartilhar costumes, manias, modas e tecnologias. Isso aconteceu e acontece também no Brasil. A aquisição de outros códigos de linguagem é uma das premissas da sobrevivência desde que o mundo é mundo.
Se, por um lado, há um válido e importante debate a respeito da legitimidade da adoção de culturas e costumes estrangeiros, por outro, esse é um processo inevitável, repleto de uma tradição que acompanha a humanidade há mais tempo do que conseguimos lembrar.
Ser bilíngue, frequentar escolas bilíngues e conseguir se comunicar em outros idiomas não são, portanto, novidades da vida contemporânea, mas a reprodução sistemática de um padrão de comportamento tão antigo quanto nossos antepassados mais longínquos.
*Lorena Paolini é mestre em Administração e diretora do Colégio Passo Certo, de Cascavel (PR).