Por Margarete Hülsendeger
Na medida em que as leis da matemática se referem à realidade, elas não são certas, e, na medida em que são certas, elas não se referem à realidade.
Albert Einstein
O fotógrafo estava nervoso. Acostumado a retratar casamentos, batizados e aniversários, nunca tinha sido requisitado para um trabalho como aquele. O ambiente era de seriedade, havia poucos sorrisos e as pessoas falavam como se estivessem participando de alguma cerimônia religiosa. E os assuntos? Ah! Esses eram ainda mais estranhos. Totalmente incompreensíveis.
Quando chegou ao lugar, uma mansão na região de Bruxelas, foi recebido por um mordomo que o conduziu até o local onde a foto devia ser tirada. Era uma sala ampla ocupada por uma grande mesa de madeira sólida, em torno da qual estavam dispostas 24 cadeiras. Sobre ela espalhavam-se papéis e pastas com anotações que mais pareciam garranchos ininteligíveis. Sem dúvida nenhuma, não se tratava de uma reunião festiva.
Após saber o que exatamente desejavam dele pôs-se a trabalhar. Precisava descobrir a melhor posição para dispor a sua máquina a fim de que as 24 pessoas pudessem aparecer juntas no mesmo retrato. Resolveu que o melhor lugar seria de frente para a porta, próximo ao canto esquerdo da grande mesa.
Estava arrumando seu material de trabalho quando eles começaram a entrar. Alguns vinham conversando em voz baixa, como se tudo fosse um segredo a ser preservado. Outros, ao contrário, discutiam acaloradamente tentando convencer a todos do seu ponto de vista. E havia, é claro, aqueles que se limitavam a ouvir, sérios e compenetrados mexiam de vez em quando a cabeça, sinalizando que ainda estavam prestando atenção apesar do seu silêncio.
Era um grupo bem interessante aquele. Haviam lhe dito que ele estaria diante das mentes cientificas mais privilegiadas da Europa, atuais e futuros ganhadores do Prêmio Nobel. No entanto, era difícil de acreditar, pois alguns deles eram jovens que ainda não tinham chegado aos quarenta anos. Mas, o que mais o impressionou foi a presença de uma mulher naquele grupo. “O que ela estaria fazendo ali?”, afinal aquele não parecia ser o local mais apropriado para encontrar uma senhora.
Poucos perceberam a sua presença, mas ele não se incomodou. Logo entendeu que não se tratava de descortesia ou esnobismo, aquelas pessoas estranhas estavam tão concentradas em seus assuntos que simplesmente não o viam. Sem pressa, foram voltando aos seus lugares e assumindo as suas posições. O anfitrião, Monsieur Solvay, percebendo que ele já estava pronto apresou-se em organizar o grupo da melhor maneira possível.
Assim, depois de muitas conversas, a maioria deles se posicionou em pé atrás da mesa, do lado esquerdo. Dos 24, ficaram sentados apenas oito homens e a mulher. Mesmo assim, o fotógrafo foi obrigado a intervir solicitando que eles se aproximassem, permitindo que os mais baixos ficassem na frente. Para seu desgosto, poucos o ouviram e a grande maioria não se moveu.
Precisava que todos olhassem na sua direção a fim de que pudesse capturar as suas expressões. Contudo, seus pedidos não encontravam ressonância entre eles. Nunca havia trabalhado com um grupo tão difícil, nem as crianças lhe exigiam tanto esforço. A mulher, por exemplo, além de não olhar para a máquina, ficou todo o tempo inclinada, com a mão apoiando a cabeça, enquanto atenta ouvia o que lhe era dito por um senhor de cavanhaque que também permaneceu de lado para a foto.
Desanimado voltou-se para o anfitrião pedindo ajuda. No entanto, ele também havia desistido de organizar seus convidados. Com um sacudir de ombros deu sinal para que prosseguisse assim mesmo. Ele ainda fez uma última tentativa ao chamar a atenção de um jovem de cabelos revoltos que segurando um cachimbo, olhava sonhador para o outro lado da mesa onde não havia ninguém.
Cansado, o fotógrafo decidiu que tiraria a foto assim mesmo. Afinal, tinha certeza que aquele retrato iria parar no fundo de alguma gaveta esquecido por todos:
– Senhores e senhora, por favor, olhem para a lente! – pediu o fotógrafo e sem esperar acionou o botão.
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Em 1911, a convite de Ernest Solvay (1838-1922), químico e industrial belga, reuniram-se em Bruxelas os principais nomes da ciência da época. Os debates e exposições dos temas estenderam-se por vários dias e muitos consideraram esse encontro como uma espécie de rito de passagem, pois discutiu-se os problemas e soluções que a Teoria Quântica estava trazendo para a ciência. Participaram desta primeira conferência nomes como o de Marie Curie, Albert Einstein, Jean Perrin, Hendrik Lorentz, Henry Poincaré, Louis De Broglie, Ernest Rutherford, entre outros. A maioria deles já tinha recebido ou iria receber os Prêmios Nobel de Física e Química.
A fotografia que registrou esse encontro histórico é considerada uma das mais famosas da História da Ciência. Infelizmente, o nome do fotógrafo que a tirou caiu no esquecimento.