Nair Lúcia de Britto
Acredito que, assim como os rios Negro e Solimões não se misturam, Política e Religião também não. Os rios não se misturam porque a composição química, a temperatura e a velocidade dos dois rios são diferentes.
O que faz a diferença entre a Política e a Religião é que a primeira cuida das questões materiais da nossa vida terrestre. E a missão da Religião é Espiritual. O cuidado com a nossa alma para merecermos a verdadeira vida, que é a Vida Eterna.
“Sempre que a Religião se juntou a um determinado regime político ou a um reinado, a Igreja se deu mal.”, declarou Dom Aldo Pagotto, ex-bispo da Paraíba. Vale ressaltar que ele não foi um religioso comum, era um sábio! Extremamente inteligente; um estudioso e, por isso mesmo, muito culto. Enfim, era um homem de grandes virtudes.
Na sua humildade dizia não ser um exemplo para ninguém. Mas na verdade era, sim, um belo exemplo tanto dentro da Igreja como da Sociedade.
Dizia ele que, devido a formação que recebeu da família e movido pela própria índole, não se contentava em fixar seu trabalho apenas dentro da Igreja, divulgando os ensinamentos da Evangelho.
Sentia-se também no dever de arregaçar as mangas e trabalhar junto aos demais setores da sociedade, na promoção do Bem comum e recuperação de valores morais esquecidos.
Nesse sentido Dom Aldo expressava sua opinião a respeito de quaisquer assuntos e cobrava dos políticos uma atuação humanitária. Com o cuidado de jamais se envolver em quaisquer partidos ou faltando com a ética quanto as observações colocadas.
Mas era contra à união da Igreja junto Estado. Defendia a posição que o Estado deve ser laico, neutro às questões religiosas, isto é não impor nenhuma religião ao Estado. O Estado porém não poderia ser ateu, negar a existência de Deus (Poder Supremo). Nem ficar alheio às opiniões religiosas.
Vale lembrar que o Laicismo é uma doutrina que prega a inoperância da Religião nos assuntos do Estado. Essa ideia da separação da Igreja e do Estado ganhou força na Revolução Francesa (1789-1799). Devido a confusões sociais causadas pela interferência da Religião na Política.
Durante todo período monárquico (1822-1889) o Brasil foi um Estado Católico, a religião oficial do nosso País, a Célula Máter, a mãe de todas outras religiões. Mas a partir da Constituição de 1891 o Brasil foi definido como um Estado Laico, separado da Igreja.
Tanto no campo religioso como no político Dom Aldo sempre reafirmava: “Somos todos iguais em direitos e deveres.” Sempre na promoção do Bem em todos os setores da Sociedade.
Sua forma de evangelizar era com base no Ecumenismo, isto é, na união de todas as Religiões que têm por base o Evangelho de Jesus. Sem julgar, nem condenar sem conhecimento dos fatos. Nem se colocar como “dono da verdade”. Dispunha-se ao diálogo, à troca de ideias e à reflexão sobre temas polêmicos.
Dom Aldo teve a preocupação de editar uma Cartilha com orientações para o período de eleições, desde que chegou à Arquidiocese da Paraíba, em 2004. Uma nova edição era publicada a cada ano eleitoral.
A edição de 2014 foi diferente das anteriores. Para facilitar a compreensão do maior número de pessoas possível, Dom Aldo escreveu a Cartilha em forma de uma história fictícia. Um diálogo que um menino curioso tem com seus pais, sobre Política.
Creio que a criação da Cartilha de Dom Aldo Pagotto, para contribuir no âmbito da Política, serviu de inspiração para outras criações.
Neste ano de 2020 a Igreja Católica do Paraná criou uma Cartilha para as eleições municipais deste ano; a pedido da presidência da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). Elaborada por peritos em várias áreas do conhecimento, abordando temas relevantes entre eles o problema das “fake news”.
Informações e pedidos podem ser solicitados pelos telefones (41) 3224-7512 ou (41) 99955-9980.
Nota: Segue Cartilha do saudoso Bispo Dom Aldo Bogotto. E o leitor também pode ler no PDF (clique aqui)
CARTILHA ELEIÇÕES 2014 – BISPO DOM ALDO PAGOTTO
O Bispo da Arquidiocese da Paraíba, Dom Aldo Pagotto, costumava alertar a população sobre a importância do voto durante as eleições para uma sociedade justa em que todos pudessem usufruir dos frutos que uma árvore sólida produzisse a serviço da população.
Eis os conselhos dados aos eleitores:
“ Observe se você concorda com esses critérios de seleção e acompanhamento dos candidatos? Conheça a trajetória e as propostas do candidato e do partido. Se eleito, cobre resultados!
Veja se o candidato trabalha com políticas estruturais ou se improvisa políticas de compensação. Escolha quem defende a dignidade da Vida e da Família, quem prioriza a área da Saúde, da Educação, do ensino profissionalizante, capacitando jovens para o mercado de trabalho qualificado. Escolha quem promove o bem da coletividade gerando oportunidades de inclusão social, investindo na infraestrutura para o desenvolvimento do Estado e do povo. Escolha quem não faz da política balcão de negócios, deixando-se corromper.
Por que a Igreja trata sobre a política?
A Igreja recebeu de Jesus a missão de Evangelizar, como Jesus ensinou aos seus discípulos, servindo ao povo em nome de Deus nosso Pai (Cf. Mateus. 28,16 ss).
A Igreja reconhece e respeita a autonomia do Estado laico. Não aspira ao poder político, não entra em disputa pelo poder, não “fecha propostas” com políticos, com partidos ou com governos, nos níveis Federal, Estadual e Municipal.
A Igreja não deve se intrometer em política partidária, indicar candidatos, partidos, definir o perfil da administração da coisa pública. Isso é papel de cabos eleitorais.
O que a Igreja faz?
Ela orienta os fiéis a respeito dos princípios éticos e dos valores morais, incentiva-os para que contribuam na organização da ordem social, de modo que sejam bons cristãos e honestos cidadãos, testemunhem os valores do Evangelho de Jesus. Enfim, esforcem-se para torná-los presentes na organização da sociedade. Pelo voto consciente, responsável, democrático, o povo pode decidir o seu presente e o seu futuro.
De que forma a Igreja pode contribuir no ano de Eleições?
Em ano de Eleições a Igreja contribui com a conscientização dos fiéis, orientados a discernir as propostas de políticas públicas apresentadas por candidatos e partidos, conforme as necessidades e os anseios da população.
Através do voto, o cidadão exerce o seu dever, elegendo candidatos honestos e competentes. Dessa forma os fiéis participam da construção da cidade e da cidadania. Que o eleitor escolha candidatos que representem os direitos dos cidadãos. Antes de votar, que forme sua opinião e faça sua opção. Evite oportunistas e interesseiros que compram votos, enganando e corrompendo pessoas não esclarecidas.
Se forem bem orientados pelos valores humanos e cristãos, os cidadãos e cidadãs acompanham e também cobram o encaminhamento dos projetos de políticas públicas prometidos pelos candidatos e pelos partidos durante as campanhas.
Dessa forma, as lideranças participam do planejamento de políticas públicas que defendam os direitos dos cidadãos e promovam o bem comum. Para isso existem muitos canais abertos para a participação das lideranças, representantes das instituições, das associações de bairros, das comissões. Vários encaminhamentos são debatidos nos conselhos de cidadania, nos fóruns de discussão de prioridades, nas audiências públicas, sobretudo no orçamento democrático.
Há várias campanhas e atividades educativas desenvolvidas por órgãos públicos e instituições que contam com a adesão da população. Citemos apenas algumas: paz no trânsito, respeito à sinalização e ao pedestre, lei seca, prevenção de doenças (do câncer de mama e da próstata), Lei Maria da Penha (superando a violência contra a mulher), combate ao abuso e à exploração sexual infanto-juvenil, reciclagem do lixo, promoção da vida saudável, prevenção de acidentes no trabalho, desarmamento, combate às drogas.
Ciente da missão evangelizadora da Igreja, a Arquidiocese da Paraíba propõe-se a colaborar na formação da consciência dos cidadãos sobre a importância do seu voto, devendo ser dado de forma democrática, consciente, livre, responsável.
A ética na política visa à prática da cidadania que se concretiza no amor ao próximo, voltado para a defesa e a promoção do desenvolvimento da coletividade. Em sua missão evangelizadora, a Igreja sugere como prioridade o desenvolvimento humano e social, de forma gradativa e sustentável.
Isso só é possível ser realizado em etapas sucessivas. Nossa sugestão é a busca de investimentos prioritários qualificando as áreas indissociáveis, da Saúde e da Educação. A garantia de inclusão social depende do processo de ensino, de aprendizado e de habilidades à população, especialmente nas classes menos favorecidas.
Nossa crítica aos programas sociais do atual Governo, a exemplo da “bolsa família” (e tantas outras bolsas), orienta-se para o ensino profissionalizante, criando condições das pessoas e famílias caminharem com as próprias pernas, não dependentes de uma esmola, sem contraproposta.
Para inovar na construção das estruturas sociais, voltadas ao bem pessoal, familiar e ao bem de toda a coletividade, é indispensável que o eleitor interesse-se pelo conhecimento das potencialidades produtivas, locais e regionais.
É preciso planejar as prioridades, traçar as metas das ações, organizar as etapas que devem ser percorridas, garantir as verbas para os investimentos, avaliar resultados, corrigir erros, redefinir as metas, fiscalizar e cobrar os resultados.
Não basta depositar um voto na urna, sem que o eleitor esteja por dentro do projeto de Estado e o roteiro das prioridades. Antes, durante a campanha e depois de eleitos.
Desconfie de candidatos que desqualificam os adversários, mas não apresentam propostas nem explicam de onde se tiram verbas para projetos que não têm continuidade. Escolha quem coloca técnicos preparados para administrar a coisa pública. Perceba quem coloca seus protegidos, aparelhando a seu favor os órgãos públicos.
Sugestão aos candidatos antes e depois de eleitos:
Ter conhecimento de causa sobre as condições da gestão pública, de modo tal que os investimentos sejam canalizados prioritariamente no capital humano, técnico e financeiro. Responsabilizar funções técnicas aos técnicos, não a cabo eleitoral, aparelhando a administração com pessoas despreparadas. Cobrar resultados, através de um cronograma de ação, com começo, meio e fim, a curto, a médio e a longo prazos. É preciso acompanhar de perto a gestão, o planejamento de metas e cobrar resultados. Sem cobrança de resultados “tudo fica como antes no quartel de Abrantes”.
Nada muda sem choque de gestão em base técnica e humanitária. Todo político deve prestar contas da sua administração, demonstrar o resultado das atividades empreendidas e realizadas, explicar com transparência a origem e o destino dos recursos financeiros, investidos no patrimônio público.
Note que a exclusão social é consequência do modelo econômico equivocado. Esse modelo penaliza a população produtiva com impostos elevadíssimos. Arrecada trilhões sem retorno para garantir a qualidade de vida da população. O modelo econômico adotado no País não permite que os Estados desenvolvam-se, pois não lhes repassa o Fundo de Participação de forma justa.
Esse modelo não investe em infraestrutura nem na qualificação da Saúde e da Educação. Necessitamos de políticas públicas que tenham solução de continuidade, gerando oportunidades de inclusão social, fortalecendo a estrutura familiar.
O texto da Cartilha é um diálogo entre pais e filho (que falta em muitos lares hoje em dia). Um menino faz perguntas, cujas respostas ajudam a elucidar dúvidas e chamam atenção para quem deve ser dado o seu voto.
Perceba as críticas e os questionamentos. Joãozinho está na fase dos porquês. Ele sempre tem uma pergunta sobre os mais variados assuntos. Por que o céu é azul? Por que o sol nunca se encontra com a lua? Como nascem os bebês?… Maria e José, pais do menino esperto, sempre lhe respondem de maneira objetiva.
A CARTILHA:
A Cartilha (editada em 2014) começa quando, um certo dia, Joãozinho escuta seus pais conversando sobre Eleições. A curiosidade o leva o menino a indagar aos pais:
– O que são Eleições?
– É um momento importante para escolher nossos governantes através do voto – responde a mãe.
– E eu também posso votar?
– Não! – informa o pai sorridente. Só vota quem tem mais de 18 anos de idade. O voto é obrigatório para quem tem mais de 18 anos. Quem já fez 16 também pode votar se quiser. Isso quer dizer que vai demorar para você votar.
– E a gente vota em quem?
– Este ano vamos escolher o presidente da República, o governador do Estado, um senador, deputados federais e estaduais. Daqui a dois anos tem Eleições para prefeito e vereadores – explica o pai.
– E o que faz cada um deles?
– Deixa que eu digo – avisa Maria. O presidente da República é o chefe do Poder Executivo do País. Ele nomeia os ministros para ajudá-lo a governar a Nação. É o presidente quem escolhe os planos prioritários para garantir o desenvolvimento econômico e social do País. Ele faz isso prevendo orçamentos e investimentos, criando leis e as enviando para votação no Congresso Nacional. Ele fica no cargo por quatro anos, podendo ser reeleito por mais quatro anos. O governador administra o Estado. Também fica no cargo por quatro anos podendo ser reeleito por mais quatro. Ele nomeia os secretários e outras pessoas para cargos públicos para ajudá-lo na administração do Estado. Apresenta projetos à Assembleia Legislativa para melhorar várias áreas, como Saúde, Educação e Segurança.
– Deve fazer isso de olho no que ganha e no que recebe, prossegue o pai. – É como as despesas daqui de casa. A gente não pode gastar mais do que eu ganho por mês. Se não, de onde tirar a diferença? Se eu ganho cem reais não posso gastar duzentos. Entendeu filho?
– Acho que entendi. Mas aqui em casa quem controla as contas é a mamãe! Então, pai, quem controla o que gastam o presidente e o governador?
– Há tribunais específicos para isso, filho. Tem o Tribunal de Contas da União para o presidente e o Tribunal de Contas do Estado para fiscalizar os gastos do governo local.
– Ah!, assim eles não fazem o que querem?
– Isso mesmo! Trabalham com seriedade, para aproveitar melhor os recursos que surgem dos nossos impostos, por exemplo. Com essa fiscalização, o nosso dinheiro é usado da melhor forma. Evita que ele seja desviado para o bolso de alguém.
– E o que faz um senador?
– Cada Estado é representado por três senadores. Eles ficam no Congresso Nacional, em Brasília, a Capital do País. Eles criam e votam leis sobre todos os direitos dos Estados. Aprovam a escolha de cargos que compõem o Governo da República: magistrados, diplomatas, presidentes das instituições públicas, procuradores gerais da República… Opinam diretamente sobre as propostas do presidente e dos ministros. Julgam e processam os atos do presidente, do seu vice e dos ministros. O senador possui mandato de oito anos. Nesse ano escolhemos um. Daqui a quatro anos vamos escolher mais dois senadores.
– E os deputados federais?
– Os deputados federais representam a população no Congresso Nacional, também em Brasília. O mandato é de quatro anos. Se quiser, pode se candidatar em seguida novamente. São responsáveis por elaborar e votar as leis de interesse de toda a população e por fiscalizar o Governo Federal e as instituições públicas. Apresentam emendas às leis, pedem prestação de contas ao Governo, apresentam proposituras, instalam as Comissões Parlamentares de Inquérito, as CPIs, para esclarecer atos do Governo. –
E os deputados estaduais?
– Eles ficam na Assembleia Legislativa, na Capital do Estado, criando e votando leis que beneficiam a população, que organizam a vida do povo local. Aprovam as políticas públicas e o orçamento apresentado pelo governador. Fiscalizam as iniciativas do Poder Executivo estadual. Criam as CPIs, quando necessárias, para analisar a transparência de questões de interesse público e do bom funcionamento das instituições do Estado. Têm mandato de quatro anos e também podem se reeleger. Compõem o Poder Legislativo, junto com os deputados federais.
– Pai, o que significa Poder Executivo?
– O Poder Executivo é formado por aqueles que colocam “a mão na massa”, no caso o presidente, governador e o prefeito. São eles os responsáveis pelo planejamento de obras e suas execuções, de acordo com as leis e o orçamento público.
– E o que é Poder Legislativo?
– Ele é formado por quem criam as leis. Ou seja, eles legislam.
Depois de receber todas essas explicações, Joãozinho ainda não estava satisfeito. Pelo contrário, ficou ainda mais curioso, tinha ainda mais perguntas:
– Pai, mãe, como é que vocês fazem para escolher o melhor candidato?
– A gente tenta conhecer o que pode da história de cada um deles – responde o pai. – História de vida e de trabalho. Saber, por exemplo, de onde ele vem? Onde já atuou? Que proposta já apresentou e que já realizou em prol das comunidades, da população, especialmente dos mais carentes? O que ainda pretende fazer? Tem competência para assumir um mandato? Ele representa projetos e interesses de quem, do partido político, de algum grupo? Quem são seus padrinhos políticos? Quem o patrocina? Quem disputa reeleição? Quais critérios justificam sua nova candidatura? Ele realizou o que prometeu na campanha anterior? Temos que votar naqueles que comprovadamente respeitam os valores éticos na defesa da vida e da família. Temos que defender os candidatos que promovam a vida saudável para todos os seres humanos, principalmente da gestante, da criança e da pessoa idosa. Temos que votar naqueles candidatos que se comprometem com atividades de promoção humana trabalhando pelo bem comum, que ajudam o desenvolvimento das pessoas precisadas de oportunidades de trabalho, enfim, que se ocupam com o desenvolvimento do povo, com o crescimento da cidade, do Estado e do País. Que saiba trabalhar em equipe, partilhando sua liderança com a coragem de um empreendedor.
E o pai prossegue:
– Tem candidato, filho, que não pensa no bem do povo. Faz muitas promessas, mas só pensa nele mesmo, em seguir carreira e ficar rico com o nosso dinheiro. Para evitar isso, nós, eleitores, devemos ser livres, conscientes e responsáveis na hora do voto. Não se vota por simpatia ou porque achou o candidato bonitinho, por influência de marketing publicitário.
A mãe completa:
– Não podemos levar ao poder quem não é honesto e quem é corrupto.
– Mãe, o que é corrupto? – pergunta, curioso, Joãozinho.
– Corrupto, de maneira geral, é aquele que ganha vantagem em cima de alguém ou de alguma coisa. Político corrupto é aquele que ganha vantagem para criar uma lei, para apresentar uma emenda a uma lei, para executar uma obra.
– E quem sai perdendo é o povo?! – indaga Joãozinho, espantado.
– Sim, com certeza! O corrupto corrompe e cria outros corruptos. A corrupção faz aumentar a miséria material e moral. Reproduz a ignorância, o atraso e a violência.
– Pai, lembra do tio lá do interior que recebeu uma dentadura em troca de voto? Isso é um tipo de corrupção?
– Perfeito, filho! Você está entendendo tudo direitinho. Não é assim que deve agir o eleitor consciente. Ele deve ser honesto consigo mesmo e com os outros. Ele nunca deve trocar ou vender o seu voto por “favores”. Não deve se corromper. Ele não deve pensar apenas no seu bem-estar particular, mas no bem da coletividade, tendo em vista o desenvolvimento da população, principalmente dos mais humildes. Não deve ser oportunista, buscando vantagens pessoais. O que o seu tio fez foi pensar apenas no bem dele, por um momento. E agindo assim ele prejudicou muita gente, porque colocou no poder um político que não está nem aí para o bem do povo. Quem vende ou quem compra voto dá provas de falta de caráter. Seu tio, filho, não tem esclarecimento. É acostumado a receber alguma coisinha em troca de voto. A venda e a compra de voto são pecados contra os Mandamentos da Lei de Deus. O sétimo diz “não furtar” e o décimo “não cobiçar os bens alheios”. E o pai ainda lamenta:
– É, meu filho… Há gente que engana e há gente que gosta de ser enganada… Se há quem corrompe, é porque também há quem se deixa corromper! Tenho que aceitar que quem compra ou vende votos é desonesto, como o meu irmão. Há o mau costume da venda de voto em troca de qualquer coisinha, como o pagamento de uma conta de luz, de água, de uma dentadura, como ele fez, ou de vantagens maiores. Imagine o que essa gente que compra um voto vai fazer com o dinheiro público?
– E agora?, pergunta a mãe. Tem candidato que, quando ganha, administra e se apossa da coisa pública como se fosse particular. Bota gente da sua laia, sem capacitação nenhuma, nos órgãos e cargos de Governo, no lugar de técnicos competentes.
São oportunistas – explica José. – Voto dado a corrupto é voto dado para a morte, porque o dinheiro desviado impede o destino de recursos para a saúde pública, como a construção de hospitais; saneamento básico; para a educação, deixando de lado a construção de escolas e universidades; a moradia; a segurança; para a construção de estradas, e daí por diante. Isso é crime, que tem que ser combatido! E tem mais: quem gasta muito em campanha eleitoral é porque ou já roubou ou vai roubar. Quando eleito toma de volta o que torrou. Voto não tem preço, tem consequências!
– Mas todos são corruptos? – O menino olhou o pai assustado.
– Não! Claro que não, a mãe enfatiza! Tá certo que o povo anda decepcionado com a Política e com os políticos incompetentes na administração do patrimônio público. Há muitos suspeitos de envolvimento em corrupção, superfaturamento de obras, desvios de recursos e o mau uso de verbas. Daí surge o descrédito e o desinteresse do povo pela Política. Mas há, sim, políticos sérios. Por isso é importante pesquisar e escolher bem em quem votar. A sociedade deve se envolver no combate à corrupção. Nada de silêncio a esse respeito. Essa história de dizer “não adianta fazer nada” só faz aumentar o número de corruptos, que se sentem impunes. Se não há denúncia, eles vão continuar a roubar o nosso dinheiro. É preciso juntar provas, levantar indícios, denunciar fatos concretos ou suspeitos, levando-os ao conhecimento dos responsáveis junto aos órgãos competentes, como o Ministério Público. Quem trabalha com transparência não permite qualquer safadeza com o bem público!
– E como a gente fica conhecendo as propostas dos candidatos? – Através das campanhas eleitorais, por exemplo. As propostas são apresentadas na televisão, no rádio, na distribuição de panfletos, acompanhando os debates… O eleitor deve ficar atento!
– E se a gente não quiser votar em ninguém, pode?
O pai responde:
– Como lhe disse, Joãozinho, o voto é obrigatório. Mas o eleitor pode, se quiser, fazer um voto de protesto, ou seja, votar branco ou nulo. Porém, se agir assim, está enfraquecendo a Democracia. Ele deve é votar certo!
Joãozinho e os pais foram dormir. E, no dia seguinte, o menino acordou com um grande apetite de saber tudo sobre Política.
À mesa, a mãe do garoto conversava com o pai avisando que havia recebido, no dia anterior, um comunicado da direção da escola do filho de que a unidade pública não ia mais funcionar no ano seguinte. Uma preocupação a mais para o casal, que não tinha condições financeiras de manter o filho numa escola particular.
– Mas por que a escola vai fechar? Eu não vou mais estudar com os meus amigos? – preocupa-se Joãozinho.
– Pelo visto não, filho. Vai começar tudo de novo: Procurar uma escola pública para você perto de casa. Se não, vamos ter mais trabalho para lhe levar à escola – preocupa-se Maria. – Em vez de abrir mais escolas, eles fecham as que já têm?! Absurdo!
– E disseram o motivo? – pergunta José.
– Disseram apenas que era um ajuste. – Ajuste! É nessas horas, filho, que a gente tem que cobrar do Governo as ações para melhorar a Educação. Por isso é importante saber das propostas de cada candidato antes de votar nele.
– Assim a gente pode cobrar depois, não é, pai?
– Sim. Um bom político é aquele que valoriza os dois polos do ensino e aprendizado: o professor e o aluno – criança e adolescente. É preciso investir em recursos indispensáveis na capacitação dos professores. Professores mais preparados e melhor remunerados geram alunos mais interessados e com melhor rendimento em sala de aula. Uma boa proposta é que a escola chegue ao tempo integral, manhã e tarde, com espaços de estudo, esporte e lazer. E que nós, pais, possamos estar envolvidos na formação dos filhos. É preciso ainda preparar melhor a infraestrutura dos prédios das escolas e contar com material didático adequado. A merenda escolar devia ser oferecida a partir dos produtos da agricultura familiar das cidades vizinhas. Criança e adolescente fora da rua diminui a disseminação das drogas. Seria bom que nessas escolas de tempo integral os alunos tivessem acesso a várias atividades esportivas e também às matérias de práticas de iniciação a serviços caseiros e profissionalizantes.
– Jovens capacitados têm mais chances de entrar no mercado de trabalho – completa a mãe.
– O que é ensino profissionalizante?
– São aulas que façam você aprender uma profissão, assim como o papai, que é marceneiro.
– Ah, entendi. Mas eu quero ser médico quando crescer. – Por quê? – pergunta Maria, surpresa.
– Lembra do dia quando a senhora ficou doente e o papai ficou aperreado porque não conseguia interná-la? Desde esse dia que eu decidi ser médico para ajudar a tratar das pessoas.
– Para ser médico, filho, é preciso estudar muito. Mas não basta ser médico para melhorar a Saúde. Os políticos precisam pensar melhor nessa área. Muitos recursos destinados à saúde pública nos municípios por esse Brasil a fora são desviados pelos próprios gestores. – E que a Medicina e as leis favoreçam à vida. É preciso garantir assistência à mulher gestante, à criança, evitando a mortalidade infantil, desnutrição, obesidade e favorecendo vacinações, e aos idosos, envolvendo familiares nos cuidados com a saúde e aposentadoria, evitando que sejam explorados e maltratados dentro da própria casa, e ainda oferecer assistência às pessoas com algum tipo de deficiência. E que não faltem profissionais nos Postos de Saúde da Família – brada o pai.
– Tá vendo, quando eu for médico vou trabalhar no PSF aqui do bairro.
– Mas cuidar da saúde vai mais além. Os políticos devem investir no sistema público, acabando com as filas intermináveis de gente à espera de atendimentos, consultas, tratamentos. Faltam remédios e acompanhamento médico-hospitalar para a maioria da população empobrecida, seja nos casos simples ou de maior complexidade. Muitos hospitais estão sucateados, sem equipamentos, leitos e sem profissionais suficientes.
-Também é importante cuidar do saneamento básico, tratamento de água e esgoto. Isso evita muitas doenças. Isso é saúde preventiva! – explica a mãe.
O pai de Joãozinho saiu para o trabalho. À noite, chegou em casa assustado. O ônibus que ele havia pego do trabalho para o lar tinha sido assaltado por dois jovens. Não usavam capuzes. Portavam facas. Pareciam menores de idade. Levaram o dinheiro do cobrador. Felizmente ninguém ficou ferido. Uma idosa passou mal e desmaiou. Mas foi socorrida por outros passageiros e logo ficou bem.
Maria providenciou um chá de camomila para acalmar o marido. Joãozinho, vendo a preocupação do pai, tentou puxar conversa, baseada nas perguntas e respostas sobre a Política:
– Pai, tirar os ladrões da rua também é dever dos políticos? – Claro que sim, filho! Hoje, a gente sai de casa e não sabe se volta vivo. Ficar na calçada de casa está tão perigoso que é por isso que nem eu nem sua mãe deixamos você brincar lá fora.
– Eu bem que queria brincar de bola com os meus amiguinhos, agora à noite…
– Enquanto a violência estiver nesta escalada, você fica é dentro de casa – alerta a mãe.
O pai faz um reflexão sobre a questão da violência:
– Assim como na Educação e na Saúde, os Governos também devem investir mais em Segurança. Para isso, eu acho, é preciso capacitar para o trabalho e remunerar melhor os policiais. Deveria haver uma parceria eficaz entre as Polícias Civil, Militar, Rodoviária, Bombeiros e Guarda Civil Municipal, oferecendo melhor infraestrutura para prevenir e enfrentar a criminalidade. Acredito que o combate às drogas seja fundamental para diminuir os assaltos. Muitos jovens, hoje desocupados, fora da escola, sem perspectivas de trabalho, acabam entrando na bandidagem e roubam para manter o vício. Temos que tirar as crianças e os adolescentes das mãos dos bandidos. As drogas estão destruindo as famílias. O narcotráfico precisa ser combatido. E a violência não fica só na cidade grande não, viu? Hoje à tarde eu recebi um telefonema do meu irmão lá do interior .
– Aquele que recebeu a dentadura em troca de voto? – pergunta, rindo, Joãozinho.
– Ele mesmo, filho.
– E o que ele queria? Quase nunca liga.
– Disse que estava preocupado com a violência lá na zona rural. Que muitos agricultores lá da região já foram assaltados, perdendo o pouco que conseguiram construir com tanto esforço na lida no campo. Acredito que a situação esteja difícil mesmo. Se já não bastasse a seca, ainda mais a violência para afastar o homem da zona rural. A transposição das águas do Rio São Francisco bem que vai ajudar no combate à seca. Mas se os gestores dos municípios receptores das águas não planejarem bem a distribuição dessas águas, aí o projeto desanda. Elas devem ser usadas para as potencialidades produtivas das regiões. As obras da transposição ficaram paralisadas por muito tempo e por isso quase tudo se estragou. Tanto dinheiro rebolado no mato! A seca, que dura desde 2012, penaliza os 9 Estados nordestinos. Ainda precisamos aprender a conviver com o semiárido, contando com infraestrutura para projetos produtivos. O Governo Federal arrecada bilhões do contribuinte e empresários, mas a agroindústria não recebe incentivos. Os gastos do Governo com sua máquina administrativa absorvem as verbas que deveriam se repassadas aos Estados federados, com o Fundo de Participação, absolutamente insuficiente para gerar desenvolvimento local e regional.
– E o que os políticos podem fazer para mudar essa situação, pai?
– Podem fazer muito, Joãozinho! Acho que é preciso uma reestruturação geral no campo. Se o homem não consegue ficar na zona rural, ele vem para a cidade e acaba morando em péssimas condições, principalmente nas favelas. Muitos municípios não têm mais infraestrutura para suportar tanta gente. Os planos sobre a reforma agrária e agrícola estão defasados, por isso há tantos conflitos para o uso da terra e da água. Geram invasões ilegais baseadas em ideologias ultrapassadas. As invasões de propriedades produtivas não geraram produtividade porque não houve planejamento, assistência técnica e crédito agrícola. Acredito que os políticos devem defender o desenvolvimento sustentável, planejando a agricultura familiar em regime de cooperativas agrícolas, dando condições para a capacitação, assistência técnica e crédito aos que realmente têm vocação para se fixar na terra e torná-la produtiva. Devem criar mecanismos para a convivência da agricultura familiar com o agronegócio e a preservação ambiental. Sem planejamentos e incentivos, aumenta assustadoramente o êxodo rural. –
– Êxodo rural?
– Êxodo rural, filho, é o nome que se dá à saída do homem do campo para a cidade.
– E tem mais: sem trabalho no campo, como é que a comida vai chegar às nossas mesas? – indaga Maria.
– Sofre o trabalhador no campo. Sofre o trabalhador na cidade. Lá na fábrica a produção está fraca. Já falam até em demissão.
– Ave-Maria, homem! Você pode ir pra rua?
– Nunca se sabe, né? Não dá mais para dormir tranquilo. O problema é que o Governo cobra impostos altíssimos. Por isso, os empresários não conseguem investir na produção. E quando as vendas diminuem,sobra pra gente, empregado, que vai parar na rua. É preciso fazer, como se diz, uma reforma tributária urgente, reduzindo e unindo alguns impostos! Simplificar. Essa é a palavra! – O povo paga impostos “salgados”, pior que não tem acesso a bons serviços públicos de primeira necessidade.
– O Governo também não corta os seus gastos e aí acaba sobrando pouco dinheiro para investir nos setores produtivos, que são essenciais para o crescimento econômico local e regional. Como garantir inclusão social sem investir no comércio, indústria, agricultura familiar, agronegócio, por exemplo? Boa parte do atraso e da exclusão social deve-se à ausência de investimentos prioritários na Educação, Saúde, ocupação profissional qualificada com tecnologia e infraestrutura modernas. São imprescindíveis obras estruturantes. Sem energia, água, estradas, o progresso não chega! São várias as áreas que merecem atenção dos governantes: tem ainda a questão da moradia, com a construção de casas populares para as famílias de baixa renda, evitando invasões e conglomerados caóticos, onde reinam a violência e o tráfico de drogas. Não podemos esquecer de valorizar a Cultura, incentivando e financiando os artistas e os grupos locais. É preciso preservar ainda o patrimônio histórico, as raízes socioculturais, as potencialidades artesanais. – Bom seria se o Governo investisse em microcréditos para pequenas empresas, na cidade e no campo, oferecendo incentivos fiscais, capacitando pessoal para serviços qualificados, formando sistemas de cooperativas. Hoje, concorre no mercado somente quem se qualifica profissionalmente.
– E… Agora a conversa ficou chata! Imposto, reforma tributária… Muita coisa difícil de entender – esbravejou Joãozinho.
– Conversa pra gente grande, filho. Mas que interessa a todos, principalmente a você. Porque é o seu futuro que está em jogo. O nosso voto não tem preço, mas tem consequências! Se a gente erra na escolha, acaba colocando políticos incompetentes no comando das nossas vidas. E aí eles não vão valorizar as famílias, não vão gerar oportunidades de trabalho e ocupação e renda, distribuindo-a de forma justa, e não vão construir obras estruturantes para o desenvolvimento do nosso País e Estado. É preciso criar riquezas e dar oportunidades a quem mais precisa, ou seja, os menos favorecidos – explica José. Tá ficando tarde. É hora de dormir.
– Como dormir direito com tantos problemas? É escola sendo fechada, é falta de médicos, é insegurança geral nas cidades, é falta de incentivo para o homem do campo, é medo de demissão no trabalho!… – diz Maria, preocupada.
– Mas essa história pode mudar. É só vocês, no dia das Eleições, votarem certo! – finaliza Joãozinho.