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A importância do terceiro setor no combate ao impacto social causado pela COVID-19

*Por Natalie Melaré 

Natalie Melaré é especialista em gerenciamento de organizações sem fins lucrativos e campanhas de terceiro setor, fundadora e presidente do Instituto Devolver. Pós-graduada por U. C. Berkeley, desviou sua trajetória de marketing de moda para se dedicar a causas de impacto social enquanto cursa Non-Profit Management por Harvard, conectando seus contatos empresariais a causas ligadas a crianças e adolescentes.

Comércios e escritórios fechados, escolas e universidades com aulas à distância, ruas e famosas avenidas vazias e parte da população isolada dentro de suas casas. Este cenário era inimaginável seis meses atrás. Se alguém nos dissesse que em 2020 enfrentaríamos uma batalha mundial contra um vírus com certeza duvidaríamos. 

A pandemia da COVID-19 trouxe medo, incerteza, ansiedade e tristeza, mas ao mesmo tempo foi um chamado à retomada do pensamento coletivo e solidário, uma vez que essa doença respiratória tem a capacidade de colapsar o sistema de saúde de uma coletividade, por possuir altos índices de contágio (uma pessoa infectada pode, rapidamente, alastrar para diversas pessoas próximas). 

No caso do Brasil, a chegada da COVID-19 é ainda mais preocupante, levando em conta o cenário social atual em que: 

  • 47,8% das crianças e adolescentes de 0 a 14 anos vivem em condição domiciliar de baixa renda, ou seja, são de famílias pobres ou extremamente pobres, em que 20 milhões desse total pertencem a famílias com renda per capita mensal de até meio salário mínimo e outros 9,5 milhões vivem com renda per capita de até um quarto do salário mínimo, segundo o Relatório Cenário da Infância e Adolescência no Brasil de 2019 e
  • 24.344 pessoas vivem em situação de rua em São Paulo, principal cidade brasileira afetada pelo Coronavírus. Entre 2015 e 2019, a prefeitura da cidade constatou um aumento de 53% de pessoas que vivem nas ruas. 

A campanha #FiqueEmCasa é um pedido à segurança de todos, mas pouco eficiente para as camadas mais baixas da população, que tem pouco ou quase nenhum acesso ao saneamento básico, produtos de limpeza e higiene para combater o vírus, e que serão diretamente afetadas com falta de alimentos diante de um país com a roda da economia praticamente parada. 

Esse chamado ao pensamento solidário não limitou-se apenas ao olhar dentro do próprio círculo social, como aquele vizinho idoso que precisa de apoio na logística das compras , mas também a quem as nossas mãos não alcançam sem o intermédio de uma ONG ou Instituição do Terceiro Setor. 

O chefe do Departamento de Epidemiologia da Universidade de Harvard, Marc Lipsitch, estima que o novo Coronavírus deve infectar, ao longo de 1 ano, cerca de 40% a 70% da população mundial. 

Apesar de afetar a todos sem distinção de classes, as camadas sociais mais baixas estão mais vulneráveis pela falta de estrutura e, neste momento, o terceiro setor torna-se ainda mais essencial na minimização do impacto da desigualdade social por meio de campanhas e ações que visam arrecadar alimentos, produtos de higiene e limpeza e tornar a informação da doença acessível.  

Se as instituições do Terceiro Setor atuarem de forma eficiente, com transparência na comunicação de seus objetivos de campanhas, prestação de contas e detalhamento do caminho que o dinheiro do doador faz dentro da Instituição, ou seja, da arrecadação ao cumprimento do objetivo, será possível mudar a cultura de doação no Brasil, que é resumida em pessoas solidárias, mas que doam apenas em casos específicos, como por exemplo, diante de uma indicação de alguém próximo. 

Para conquistar a credibilidade da população e mudar a cultura de doação no Brasil, as Instituições do terceiro setor precisam de: 

  • Site, redes sociais e canais de comunicação oficiais estruturados para dialogar com a população e possíveis doadores.
  • Clareza nas campanhas com explicação do objetivo, grupo beneficiado, data de entrega e meta de arrecadação. Por exemplo: Estamos arrecadando produtos de higiene pessoal para famílias do interior de São Paulo, que serão entregues no dia 17 de abril de 2020.
  • Transparência com o doador a fim de prestar o detalhamento dos processos após a arrecadação do dinheiro. A comunicação não deve acabar assim que o dinheiro é arrecadado, somente depois que o objetivo da doação é concluído com a entrega aos beneficiários. 
  • Prestação de contas por meio de relatórios detalhados do caminho do dinheiro arrecadado dentro da Instituição, quando entrou, itens que foram comprados com ele e local para onde foram levados estes itens. 

Abraçando um pouco a Síndrome de Poliana, acredito que este cenário triste e incerto que vivemos pode trazer um impacto positivo para o terceiro setor, uma vez que certamente sairemos desta crise do Coronavírus diferente de quando entramos, com muito mais empatia e compaixão pelo próximo, entendendo a necessidade da ajuda humanitária em todas as situações. 

*Natalie Melaré é especialista em gerenciamento de organizações sem fins lucrativos e campanhas de terceiro setor, fundadora e presidente do Instituto Devolver. Pós-graduada por U. C. Berkeley, desviou sua trajetória de marketing de moda para se dedicar a causas de impacto social enquanto cursa Non-Profit Management por Harvard, conectando seus contatos empresariais a causas ligadas a crianças e adolescentes. 

 

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