*Hudson Pinheiro
A redução da perda da biodiversidade e a promoção do uso sustentável de recursos naturais é um compromisso global assumido por 140 nações signatárias da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB). O tratado internacional tem relação com o 14º Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que visa a adoção de medidas para preservar e usar de forma sustentável oceanos, mares e recursos marinhos até 2020. Contudo, diante da atual crise da biodiversidade, os objetivos são ousados.
Um dos temas mais debatidos recentemente está relacionado com a cobertura de unidades de conservação marinha (UCM). Estabelecer esse tipo de área é uma das melhores estratégias para a conservação da biodiversidade e sustentabilidade dos recursos marinhos, pois envolve o manejo a nível de ecossistema. Entretanto, um dos maiores desafios é criar e manejar UCMs em áreas prioritárias para a conservação, pois normalmente estas são áreas de alta diversidade biológica e de alto conflito de usos, onde diversas atividades humanas são praticadas. Ambientes costeiros como mangues, recifes de coral e costões rochosos são os mais vulneráveis.
A melhor estratégia para se remediar a perda da biodiversidade marinha seria focar na proteção do máximo de espécies ameaçadas e ecossistemas por área protegida. A conservação da biodiversidade e sustentabilidade dos recursos depende de unidades de conservação conectadas e que abriguem, de forma homogênea, a diversidade de ecossistemas presentes ao longo da linha costeira.
O manejo pesqueiro e o controle da sobrepesca são vistos como um dos principais objetivos do ODS 14. Uma das estratégias é a valorização da pesca artesanal e o controle de atividades pesqueiras destrutivas, que causam danos aos ecossistemas e que não possuem seletividade nas capturas. Entretanto, muitos países, incluindo o Brasil, caminham em sentido contrário, criando subsídios para pesca industrial e removendo benefícios de pescadores de pequena escala.
Alternativas envolvem o estabelecimento de territórios tradicionais de pesca, onde somente pescadores locais possam pescar, o que tornaria mais fáceis o manejo e o controle do esforço de pesca. O ordenamento e a fiscalização da captura de espécies ameaçadas de extinção e tamanhos mínimos de capturas também são passos importantes para se atingir os objetivos.
A poluição dos mares e o aquecimento global são problemas graves que estão chamando bastante a atenção da sociedade. A ingestão de plásticos tem causado a morte de milhares de animais marinhos anualmente e o aquecimento dos oceanos tem causado o branqueamento e a morte de ecossistemas de coral em todo o mundo. Atividades portuárias desenvolvem dragagens periódicas e despejam toneladas de sedimento sobre os ambientes costeiros, soterrando grandes áreas de habitats naturais.
Em vez de aplicar leis mais restritivas, visando a qualidade de vida humana e saúde ambiental, países em desenvolvimento como o Brasil estão afrouxando as regras para empresas poluidoras. Como consequência, impactos e desastres ambientais são frequentes, o que acelera a perda da biodiversidade e de oportunidades de desenvolvimento sustentável.
Apesar dos desafios, temos esperança. O grande número de nações comprometidas com os objetivos da Convenção sobre Diversidade Biológica é um considerável sinal positivo. Alguns países como Palau e Costa Rica estão dando exemplo de desenvolvimento sustentável e proteção da biodiversidade. Países em desenvolvimento, como Brasil, China e Filipinas, estão comprometidos em financiar iniciativas de proteção e manejo dos ecossistemas costeiros.
A participação de pescadores no manejo e na conservação dos recursos marinhos tem gerado resultados positivos e o Projeto Tamar, no Brasil, é referência mundial nesse tema. Estados como Califórnia e São Paulo têm criado áreas marinhas protegidas ao longo de suas zonas costeiras com o potencial de desenvolvimento sustentável de atividades pesqueiras e turismo. Países e empresas estão investindo na proteção de ambientes costeiros, visando a diminuição de estragos causados por distúrbios ambientais, como tempestades e enchentes. Essas e outras iniciativas inspiradoras foram apresentadas recentemente no artigo “Hope and doubt for the world’s marine ecosystems”, publicado pelo periódico científico Perspectives in Ecology and Conservation.
Uma vez que grande parte da população vive perto da zona costeira, o investimento em educação ambiental é necessário para engajar a sociedade na luta para a manutenção de sua própria qualidade de vida e dos serviços ecossistêmicos providenciados pelos oceanos. Cientistas, cidadãos e tomadores de decisão precisam trabalhar juntos para multiplicar essas iniciativas positivas e reforçar a esperança para a conservação e sustentabilidade da biodiversidade e ecossistemas marinhos no Brasil e no mundo.
* Hudson Pinheiro é mestre em Oceanografia, doutor em Ecologia e Evolução, cientista da Academia de Ciências da Califórnia e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza.