Crônicas nair lucia de britto

Bonde da Saudade

Nair Lúcia de Britto

 

Sempre que vou a Centro da cidade, em Santos, e vejo o bonde turístico que circula pelos arredores, desde a Praça Mauá, não tem como não lembrar desse transporte antigo e tantas recordações que estão relacionadas a ele, na época da minha infância e adolescência.

Eu e minhas colegas de Escola pegávamos o bonde todos os dias. Gostávamos de ir no banco da frente, porque ali era possível um banco ficar de frente para o outro; e assim os lugares eram suficientes para a turma toda ir junta; conversando, fazendo uma bagunça inocente e dando risada.

Na adolescência qualquer coisa era motivo de felicidade e aqueles momentos, em que fazíamos juntas, a breve viagem, com o cobrador pegando o dinheiro da passagem e apitando para o motorneiro dando sinal para ele seguir em frente,  era uma grande felicidade.

Eu acredito que cada pessoa da minha geração que olhe ou viaje no bonde turístico de Santos aconteça o mesmo que acontece comigo: gratas recordações. Cada qual com suas respectivas  histórias e seus personagens inesquecíveis.

No que me diz respeito, a Praça Mauá é o local mais marcante para mim. Se eu tivesse braços infinitamente longos eu abraçaria essa praça com todo o seu encanto, que me faz lembrar.

Como naquela época, são muitas as lojas; mas a que se sobressai mais na minha lembrança são as Lojas Americanas. Era lá que mamãe costumava comprar seus aviamentos de costura: carretéis de linha de todas as cores; fita métrica, tesourinha, dedal, elástico… Enfim tudo que uma boa costureira precisa para atender sua clientela.

Eu gostava da apresentação da loja. Compunha-se de vários balcões nas laterais esquerda e direita. Um balcão específico para cada tipo de mercadoria. No meio, o corredor pelo qual a farta freguesia passava: uns entrando, outros saindo. Meu balcão preferido era o dos doces e chocolates; depois o balcão de brinquedos…

Feitas as compras, nós íamos até a lanchonete que ficava bem no meio da loja. Saboreávamos aquele cachorro-quente, com a salsicha bem assada na chapa, com queijo derretido; dentro do pãozinho macio e quentinho. Acho que nunca mais comi um cachorro-quente que fosse tão bom!

Dia desses eu passei por lá. Parei bem em frente às Lojas Americanas. Permaneci ali por vários minutos, olhando a sua fachada que me pareceu não ter mudado nada; ou talvez mudado muito pouco.

Imersa em recordações, o passado me parecia tão presente que nem parecia passado!

Frente ao ponto inicial do Bonde Turístico, a antiga loja de discos A Musical também foi palco de antigas alegrias. Lembrei-me de uma colega de classe: a Lizette.  Depois da aula, nós íamos até lá só para  ouvir as nossas músicas prediletas, dentro de cabines individuais. Eram discos vinil: uma música no lado A; outra no lado B; em 68 rotações. Minha música predileta era; Woman in Love. Ouvi essa música umas quinhentas vezes, lá na A Musical; porque eu ainda não tinha uma vitrola, em casa.

Suspirei fundo, quando olhei o relógio e vi que era hora de voltar para casa. Peguei o ônibus via Ana Costa;  e a praça Mauá ficou lá pra trás…

Enquanto o ônibus seguia calmamente o seu percurso eu pensava com meus botões:

Que feliz ideia teve quem deu vida nova ao Bonde da cidade de Santos, terra querida!!

Quantas recordações boas esse bonde nos trás!…

Nair Lúcia é poeta, jornalista, escritora e colaboradora da Revista Partes

 

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