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Educação Matemática: a etnomatemática como prática pedagógica no processo de ensino aprendizagem

EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: A ETNOMATEMÁTICA COMO PRÁTICA PEDAGÓGICA NO PROCESSO DE ENSINO APRENDIZAGEM

 

Lucas Noel Almeida Klein*, Sirley Leite Freitas**


RESUMO: A presente pesquisa tem por objetivo apresentar concepções acerca do programa etnomatemática em caráter conceitual, dimensional e vincular propostas pedagógicas a partir do referido programa, bem como demonstrar a etnomatemática como metodologia alternativa para o ensino da matemática. Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática procura estimular a inserção da etnomatemática de modo que ela seja uma alternativa pedagógica e justifica que a mesma possui forte enfoque cognitivo. Sobre o referido tema procura despertar questionamentos, como por exemplo: Como sincronizar as práticas pedagógicas com a etnomatemática? As inovações das tecnologias da informação e comunicação pode ser trabalhada a partir da etnomatemática como práticas pedagógicas? O tema etnomatemática é um vasto campo para pesquisa, assim por meio de pesquisa em livros, artigos, dissertações e teses disponíveis na internet buscou-se ressaltar a importância do uso da etnomatemática no ensino da matemática e apresentar propostas que possam auxiliar os professores em suas aulas. Com o presente estudo foi possível identificar que a etnomatemática aplicada à disciplina de matemática dentro e fora da escola contribui para elevar a capacidade cognitiva dos educandos e tornará o ensino de matemática um ensino transformador.

Palavras–chave: cultura matemática, ensino de matemática, metodologia

MATHEMATICS EDUCATION: THE ETHNOMATHEMATICS HOW TO PRATICAL PEDAGOGICAL IN TEACHING LEARNING

ABSTRACT: This research aims to present conceptions of Ethnomathematics program conceptual dimensional character and link educational proposals from the program, as well as demonstrate the Ethnomathematics as an alternative methodology for teaching mathematics. The National Curriculum Standards of Mathematics aims to stimulate the inclusion of Ethnomathematics so that it is an educational alternative and justify that it has a strong cognitive focus. On that theme seeks to awaken questions such as: How to synchronize the pedagogical practices with Ethnomathematics? The innovations of information and communication technologies can be worked out from the Ethnomathematics as pedagogical practices? The Ethnomathematics theme is a vast field for research, and through research in books, articles, dissertations and theses available online sought to emphasize the importance of using Ethnomathematics in mathematics education and to make proposals that can assist teachers in their classes. With this study we observed that the Ethnomathematics applied mathematics discipline inside and outside the school helps to raise the cognitive ability of students and make math education a transforming education.

KEYWORDS: mathematical culture, mathematics teaching, methodology

 

 

INTRODUÇÃO

A preocupação com o ensino da matemática desperta um olhar crítico para esse componente curricular, tornando-o objeto de estudo para docentes e pesquisadores que anseiam por mudanças. Considerar diversas possibilidades de práticas de ensino é, sem dúvida, colaborar para uma melhor formação de discentes, pois, eles não aprendem de modo homogêneo, sendo assim, quanto mais recursos, metodologias e práticas de ensino forem trabalhadas, a sala de aula se tornará um espaço significativo para o discente, com uma perspectiva transformadora do ensino e da aprendizagem escolar.

Assim, o presente trabalho busca conhecer a etnomatemática em caráter conceitual, dimensional e vincular propostas pedagógicas a partir do referido programa e apresenta-la como metodologia alternativa para o ensino da matemática que pode ser utilizada para elevar a qualidade do ensino. Cabe salientar que este estudo a priori terá como foco o ensino fundamental.

A proposta de vincular a Etnomatemática como prática pedagógica, consiste em fazer com que o método de ensino da matemática seja o mais próximo do contexto sócio histórico e cultural do educando. Desta forma, aproximar os conteúdos programáticos da disciplina com os conceitos matemáticos informais construídos a partir da realidade dos educandos.

 

METODOLOGIA

 

Em termos metodológicos, o presente estudo tem uma abordagem qualitativa em relação ao objeto. O presente trabalho foi produzido a partir de estudos realizados durante o desenvolvimento de um projeto de pesquisa intitulado “Metodologias para o Ensino da Matemática e sua Utilização em uma Escola do Município de Cacoal-Rondônia”, que desenvolvido entre o período de agosto de 2015 a setembro de 2016, por uma professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia-IFRO/Campus Cacoal, coordenadora do projeto, por um grupo de acadêmicos do curso de Licenciatura em Matemática do IFRO/Campus Cacoal e por um professor colaborador do IFRO/Campus Cacoal.

A coleta dos dados aqui apresentados, foram realizadas por meio da leitura prévia de livros, artigos, dissertações e teses disponíveis na internet durante o período dos meses de fevereiro a julho de 2016, tempo esse dedicado às discussões sobre de que maneira vincular a etnomatemática em seus respectivos aspectos nas salas de aula do ensino fundamental.

1 A ETNOMATEMÁTICA O QUE É?

 

A primeira impressão quando ouvimos o termo etnomatemática, é de uma matemática cultural, étnica e pode ser entendida como a “matemática de cada cultura”, de fato quando D´Ambrósio afirma que; Etnomatemática retorque a raízes de uma cultura. Portanto o objetivo da Etnomatemática é constatar e compreender as especificidades culturais de dado povo (D’AMBRÓSIO, 2008). Além de buscar esse resgate cultural das várias matemáticas existentes, não se deve vincular a etnomatemática apenas ao passado, o programa etnomatemática está presente na atualidade. A evolução constante das tecnologias da informação e comunicação as (TIC´S) exige cada vez mais vincular o saber matemático as novas culturas tecnológicas.

É importante entendermos que a Etnomatemática pode colaborar muito para a prática pedagógica dos professores, uma vez que o programa tem sua essência em entender e registrar conhecimentos e fatos das práticas sejam elas do passado ou contemporâneas, visto que como afirma Kinjnik (1993, p.5),

[…] uma abordagem da etnomatemática parte da investigação das concepções, tradições e práticas matemáticas de um grupo social subordinado e o trabalho pedagógico que se desenvolve na perspectiva de que o grupo interprete e codifique seu conhecimento; adquira o conhecimento produzido pela matemática acadêmica, utilizando, quando se defrontar com situações reais, aquele que lhe parecer mais adequado.

D´Ambrósio (2001, p. 110) também define etnomatemática como uma,

Meta-definição etimológica, pois faz elaborações sobre as etnos, os matemas, e as ticas, na tentativa de entender o ciclo do conhecimento, ou seja, a geração, a organização intelectual, a organização social, e a difusão do conhecimento adquirido pelos grupos culturais. Nesta dinâmica cultural, não existe uma História da Matemática como um processo, mas sim como um registro seletivo dos fatos e das práticas que serviram para esta apropriação. Este fato faz brotar a vertente histórica do programa etnomatemática através da releitura da História do Conhecimento.

Vergani define etnomatemática como “O estudo comparativo de técnicas, modos, artes e estilos de explicação, compreensão, aprendizagens, decorrentes da realidade tomada em diferentes meios naturais e culturais” (2007, p. 25).

Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino da matemática também destacam a Etnomatemática, com uma proposta alternativa para a ação pedagógica e que a Etnomatemática busca partir da realidade do educando para se chegar a uma sedimentação do aprendizado de maneira natural, tendo um enfoque cognitivo fortemente fundamentado na cultura do educando (BRASIL, 1997).

Para melhor compreender a etnomatemática e como desenvolve-la se faz necessário observar suas dimensões. A partir das concepções de D´Ambrósio (2015) é possível verifica-las.

A dimensão conceitual: Etnomatemática é um Programa de pesquisa em história e filosofia da matemática, com óbvias implicações pedagógicas. Cada indivíduo percebe uma realidade natural, formada pelas experiências e saberes acumulados por ele e pela sua espécie. O acúmulo de conhecimentos compartilhados pelos indivíduos de um grupo e seus comportamentos compatibilizados constituem a cultura de um grupo. (D´AMBRIOSIO, 2015).

A dimensão histórica: Vivemos no momento de apogeu da ciência moderna, que é um sistema de conhecimento que se originou na bacia do Mediterrâneo a cerca de 3000 anos. A modernidade privilegiou o raciocínio quantitativo, graças a aritmética (tica = arte + aritmos = números) feita com algarismos indo-arábicos e, posteriormente, com as extensões de Senion Stevin (decimais) e de John Neper (logaritmos), culminando com os computadores. Mais recentemente, evidencia-se o raciocínio qualitativo, principalmente através da inteligência artificial, o que ressalta o interesse pelas etnomatemática, já que as mesmas apresentam um caráter predominantemente qualitativo. (D´AMBRIOSIO, 2015).

A dimensão cognitiva: As características principais da espécie humana são dadas pelas ideias de comparar, classificar, quantificar, medir, explicar, generalizar, inferir e, de algum modo, avaliar. Há evidencias de uma espécie de australopiteco, que viveu a cerca de 2,5 milhões de anos e utilizou instrumentos de pedra lascada para descarnar animais. Na hora em que esse australopiteco escolheu e lascou um pedaço de pedra, com o objetivo de descarnar um osso, a sua mente matemática se revelou. Para selecionar a pedra, é necessário avaliar suas dimensões, e, para lasca-la o necessário e o suficiente para cumprir os objetivos a que ela se destina, é preciso avaliar e comparar dimensões. (D’AMBROSIO, 2015).

A dimensão epistemológica: Segundo (D´Ambrósio 2015, p. 18), “não se deve buscar a teoria final uma epistemologia, para o saber/fazer matemático de uma cultura “etnomatemática”, é necessário estar sempre aberto a novos enfoques, a novas metodologias, a novas visões do que é ciências […]”.

A dimensão política: Uma maneira eficiente de manter um indivíduo, tribo, grupo ou cultura inferiorizados, é enfraquecer suas raízes, excluir a história do conquistado. Nas escolas, onde há o encontro da criança, adolescentes e jovens, que tem suas raízes culturais, com a outra cultura, a cultura da escola, que é também a do professor, poderia ter resultados positivos e criativos, mas geralmente o que se nota são resultados negativos e perversos, conforme supracitado no primeiro parágrafo. (D’AMBROSIO, 2015).

A dimensão educacional: A proposta da etnomatemática não significa a rejeição da matemática acadêmica. Não se trata de ignorar nem rejeitar comportamentos modernos. Mas, sim, aprimorá-los, incorporando a eles valores de humanidade, sintetizados numa ética de respeito, solidariedade e cooperação. A proposta da etnomatemática é fazer da matemática algo vivo, lidando com situações reais no tempo e no espaço, questionando o aqui e o agora. Assim, mergulhamos nas raízes culturais e praticamos dinâmica cultural, reconhecendo na educação a importância das várias culturas e tradições na formação de uma nova civilização, transcultural e transdisciplinar. Por tudo isso, a etnomatemática representa um caminho para uma educação renovada, capaz de preparar gerações futuras para construir uma civilização mais feliz. (D’AMBROSIO, 2015).

2 ETNOMATEMÁTICA COMO METODOLOGIA ALTERNATIVA

Ao se fazer uma reflexão sobre como vincular a etnomatemática à sala de aula no contexto atual, pode se por exemplo; estruturar a linguagem presente nos softwares utilizados para o ensino da matemática, pois softwares, jogos e o computador já se faz presente em grande parte das escolas e nas casas de boa parte da população na cultura contemporânea.

O contato com essas tecnologias pode desencadear uma série de ganhos cognitivos, intuitivos e conceituais aos discentes, o professor pode propor aos alunos atividades orientadas com softwares matemáticos, mas que o produto final seja elaborado por todos, após a experiência da construção provocar uma discussão e que dessa seja elaborado um passo-a-passo, um roteiro e esse registro servirá de base para que alunos façam a verificação e tenha a liberdade de modifica-lo conforme a necessidade de cada nova geração, pois a evolução das tecnologias é constante, dessa forma é possível construir conhecimento matemático vinculado a tecnologia da informação e comunicação. Para reforçar esse argumento, D´Ambrósio diz que; “A proposta pedagógica da etnomatemática é fazer da matemática algo vivo, lidando com situações reais no tempo [agora] e no espaço [aqui]” (D´AMBRÓSIO, 2015, p. 46/47).

O calendário pode ser outro exemplo prático para se trabalhar em sala de aula, por meio de entrevistas feitas por alunos, onde os entrevistados pode ser membros da família, pioneiros, agricultores e entidades relacionadas ao manejo do solo da cidade onde reside, com o objetivo de interpretar o ciclo de chuvas local, o período de estiagem, qual o melhor período para se iniciar uma plantação e quais tipos de plantio se desenvolvem melhor na referida localidade. Após a coleta de dados é possível elaborar um calendário especifico da cidade criado a partir das especificidades daquela cultura. Para dar sustentação a referida proposta D´Ambrósio diz que; “A construção de calendários, isto é, a contagem e registro do tempo, é um excelente exemplo de etnomatemática (D´AMBROSIO, 2015, p. 21).

A etnomatemática também pode ser divertida, um objeto que está vinculado a cultura das crianças é a pipa, por que não utiliza-la dentro e fora da escola, os vários tipos e formatos existentes de pipas propiciam ao estudo da geometria com suas diagonais, triângulos, quadrados entre outros mais, ao se construir uma pipa a primeira regra que se observa é que ela deve ser simétrica, a partir desse pequeno relato pode se perceber uma considerável fonte de relações que pode ser utilizada, essa aula pode ser realizada em um parque, estádio ou local aberto onde não tenha trânsito, “conscientização” após a “diversão” transmitir os conceitos observados mostrando aos discentes que, por exemplo; sem a simetria não seria possível a pipa permanecer no ar, e mostrar na prática fazendo uma sem simetria. Novamente ancorado nas concepções de D´Ambrósio (2015, p. 78) para sustentar a ideia de que “[…] a geometria do povo, dos balões e das pipas, é colorida. A geometria teórica, desde sua origem grega, eliminou a cor”.

A várias possibilidades de vincular a etnomatemática à sala de aula, entretanto não se deve aplica-la somente dentro dos muros da escola, e sim fora deles, abrir um novo campo de pesquisa para todos os envolvidos no processo ensino e aprendizagem, caminhar em paralelo, ensino tradicional e ensino cultural de matemática.

Para etnomatemática não existe uma teoria final da matemática, ou seja, pronta e acabada, as várias matemáticas existentes estão em constate transformações exercidas pelo meio a qual é submetida. O programa etnomatemática pode ser percebido como sendo algo muito extenso que envolve a matemática em proporções desproporcionais sob a perspectiva tradicional, sem dúvida esse é o paradigma que precisa ser quebrado, pois como afirma Gelsa “[…] a Etnomatemática tem contribuído exatamente para “desestabilizar”, para nos “pôr a pensar” sobre o que temos feito nas aulas de matemática […]” (KNIJNIK, 2010, p. 12, grifo do autor).

Para D´Ambrósio (2015, p. 81) “A intervenção do educador tem como objetivo maior aprimorar práticas e reflexões, e instrumentos de crítica”. O que pode ser percebido até o momento é que o professor precisa receber capacitação e formação continuada nas áreas do conhecimento nas quais estão incumbidos, para despertar nele a ânsia por melhores práticas e métodos de ensino, visto que a falta dessas ferramentas motivadoras, pode resultar em profissionais sem perspectivas de crescimento e o reflexo dessa desmotivação incidirá diretamente sobre seus alunos.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Mediante a problemática exposta, é possível concluir, com base nos dados colhidos na pesquisa bibliográfica e nas experiências vividas durante o desenvolvimento do projeto de pesquisa qual este artigo é recorte, que a etnomatemática como proposta pedagógica para o ensino da matemática, contribui para uma quebra de paradigma no que tange o ensino da matemática.

A busca por novas práticas e metodologias exige que o educador se retire da inércia e se torne um professor-pesquisador, onde seu campo de estudo, dentre outros pode ser a sala de aula na qual leciona. A sociedade atual em seu tempo e espaço reclama um professor com as qualidades de pesquisador, as tecnologias da informação se encarregam de semear novas informações, estudos, métodos, práticas e pesquisas. Esse fluxo acaba por desencadear uma série de novos saberes, novas práticas e métodos.

Desta forma buscamos ao final deste estudo proporcionar uma reflexão sobre conceito, dimensão e a prática pedagógica a partir da etnomatemática no intuito de desenvolver metodologias alternativas a partir da etnomatemática, estimular professores a usufruir dessa fonte de conhecimento para elevar sua potencialidade e de seus educandos.

Assim, etnomatemática contribui para “atualizar”, aprimorar e incorporar valores de cultura global, resumidos na moral, respeito, solidariedade e cooperação. Tornar a educação matemática em seus múltiplos aspectos, uma educação na qual, todos possam aprender sem receio.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: matemática. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997.

D’AMBRÓSIO, Ubiratan. Educação Matemática. Da Teoria à Prática. 16. ed. Campinas: Papirus, 1996.

______. Etnomatemática. São Paulo. Ática, 2001.

______. Para uma abordagem multicultural: o Programa Etnomatemática. Rev. Lusófona de Educação. n. 11. Lisboa-Portugal, 2008.

______. Etnomatemática: elo entre as tradições e a modernidade. 5.ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015.

KNIJNIK, Gelsa. O saber acadêmico e o saber popular na luta pela terra. Educação Matemática em Revista, Blumenau, n. 1, p. 5-11, 1993.

______. [et al.]. Etnomatemática, currículo e formação de professores. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2010.

______. [et al.]. Etnomatemática em movimento. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012.

VERGANI, Tereza. Educação etnomatemática: o que é? Natal: Flecha do Tempo 2007.

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