A IN/EXCLUSÃO ESCOLAR NA REVISTA NOVA ESCOLA: UMA ANÁLISE DAS ESTRATÉGIAS DE GOVERNAMENTO NA FORMAÇÃO DOCENTE
Fernanda Zanette Garbini[1]
Giovana Giacomini Brendler[2]
Juliana Durand de Oliveira Campos[3]
Resumo
O presente artigo tem como objetivo analisar as estratégias de governamento na formação docente a partir da problematização da in/exclusão escolar na Revista Nova escola, periódico educacional de maior circulação no Brasil. A pesquisa analisou dez edições mensais e a edição especial intitulada “Inclusão” do ano 2009, ano seguinte a publicação da Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva Inclusiva. Valendo-se da ferramenta analítica e metodológica da governamentalidade de Michel Foucault, observou-se que há uma recorrência de reportagens que tratam da Inclusão Escolar, governando os sujeitos docentes através da determinação de suas condutas.
Palavras-chave: formação docente, in/exclusão escolar, Revista Nova Escola.
Resumen
Este artículo tiene como objetivo analizar las estrategias de gobierno en la formación del profesorado a partir del cuestionamiento de la in/exclusión de la escuela en la Revista de la Escuela Nueva, la revista del mayor circulación de la educación superior en Brasil. La investigación analizó diez números mensuales y el número especial titulado “Inclusión” de 2009, el año después de la publicación de la Educación Especial Nacional en perspectiva inclusiva. Sobre la base de la herramienta metodológica y analítica de la gubernamentalidad por Michel Foucault, se observó que hay una recurrencia de los informes relativos a la Inclusión Escolar, que regula los profesores de las asignaturas mediante la determinación de su comportamiento.
Cheve palabras: la formación del profesorado, in/exclusión de la escuela, la Revista de La Escuela Nueval.
Traçados iniciais…
Direi, em primeiro lugar, que se trará de um livro conversado e conversante… um livro que está cheio de amigos…atravessado de encontros, de cumplicidades, de piscadas de olhos, de palavras dadas, emprestadas, roubadas, exploradas, ensaiadas e trocas com um grupo de amigos. Trata-se de um livro que às vezes dialoga, às vezes debate, mas sobretudo conversa… daí os amigos…porque se alguém pode discutir, ou dialogar, ou debater, com qualquer um, é claro que não pode conversar com qualquer um…(Larrosa, 2003, p.212).
Iniciamos o presente artigo com as provocações de Larrosa (2003) sobre a “arte da conversa”, conversa esta estabelecida com as obras e, consequentemente com os autores do referencial teórico no qual este ensaio está inscrito: numa vertente pós-estruturalista, trazendo o embasamento de Michel Foucault e seus debatedores, Veiga Neto, Thoma, Lopes, Oliveira, Weschenfelder, etc.
Na condição de pesquisadores da área educacional, seguimos nossa trajetória com as conversas que propõe Jorge Larrosa, problematizando os discursos que circulam na Revista Nova Escola sobre a in/exclusão como estratégia de governamento na formação docente. Ressaltamos que este processo conversante promove desconstruções e mais inquietações sobre esta temática tão emergente nos últimos anos e para tanto, escolhas se fazem necessárias mesmo que com as condições de possibilidade de mudanças, já que estamos enredados nas relações de poder e somos interpelados por tais discursos.
Numa sistematização dos encontros de estudos da Linha de Pesquisa Identidade e Diferença na Educação, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Santa Cruz do Sul tratamos nesta produção de algumas abordagens sobre in/exclusão escolar e formação docente a partir da análise dos discursos que circulam na revista Nova Escola, utilizando como ferramenta analítica da governamentalidade.
Na primeira seção trataremos da in/exclusão escolar como um imperativo do nosso tempo, legitimada por políticas educacionais que reiteram a constituição de uma sociedade inclusiva dentro de uma perspectiva neoliberal.
Na segunda seção buscamos nas páginas da Revista Nova Escola, questões que se referem à in/exclusão escolar e formação docente, temas que vem inquietando professores que se sentem desabilitados e para tanto desautorizados para o trabalho com esses alunos considerados “diferentes” chegando às escolas regulares, em salas de aula regulares. Trazendo excertos que se reportam ao governamento[4] da formação docente pelos discursos sobre a in/exclusão que circulam no periódico, do ano de 2009, ano que sucedeu o lançamento de Política Nacional de Educação na Perspectiva da Educação Inclusiva da Secretaria da Educação Especial do Ministério da Educação.
Nosso intuito ao lançar piscadas de olhos, frases ao pé do ouvido com os livros, o que segundo Larrosa, nos possibilitam as “conversas” na terceira seção deste artigo sinalizamos as próximas conversas sobre esses temas emergentes: in/exclusão e formação docente, uma vez que é um tema amplo não se esgota numa única conversa.
1 Contextualizando a in/exclusão escolar e a formação de professores
As questões sobre in/exclusão ocupam espaço de destaque na área educacional, com isso, somos chamados a tomar posição neste processo, que vem a se tornar um imperativo comprovado pelos crescentes índices de alunos incluídos. Os números crescentes da educação inclusiva nos últimos anos estão demonstrados nos indicadores do Censo Escolar/INEP. A matrícula de alunos com necessidades educacionais especiais em 1996, era de 201.142 alunos, assando em 2004 para 566.753, representando um crescimento de 181%. A inclusão de alunos em classes comuns do ensino regular, em 1988 era de 13% em 2004 passa a representar 34,4% das matriculas. (Índices da Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação – 2005).
Segundo os dados divulgados pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação (SECADI/MEC) comprovam os avanços obtidos a partir da implantação da política de inclusão escolar, executada conforme os princípios da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU/2006). A SECADI aponta nos últimos oito anos, foi desenvolvido um conjunto de ações que resultou no crescimento do número de matrículas do público alvo da educação especial em classes comuns, que passou de 28%, em 2003, para 69%, em 2010, representando um aumento 929,8%.
A complexidade deste binômio carrega uma série de relações políticas, sociais e econômicas. Trazemos as palavras indissociadas (inclusão e exclusão) justamente para explicitar o período em que esta temática passou a ser alicerçada, dentro da modernidade caracterizada pelos binômios e oposições: dentro/fora, bom/ruim, certo/errado, norma/anormal, etc. Dentro da premissa de reconhecimento e demarcação para o controle dos grupos classificados como anormais o processo de in/exclusão não se restringe apenas às pessoas com necessidades educacionais especiais nos espaços educativos, mas amplia as problematizações para as demais instituições e grupos sociais a que possam causar estranhamento.
Cada vez mais variadas e numerosas grupos que a modernidade vem, incansável e incessantemente, inventando e multiplicando: os sindrômicos, deficientes, monstros e psicopatas (em todas suas variadas tipologias), os surdos, os cegos, os aleijados, os rebeldes, os pouco inteligentes, os estranhos, os GLS, os “outros”, os miseráveis, o refugo, enfim. (Veiga-Neto, 2001, p.105)
No debate sobre a in/exclusão nos estabelecimentos educacionais, observa-se a escola como uma instituição que atente com eficiência à lógica moderna, classificando, esquadrinhando e quantificando. Segundo Portocarrero (2008) a escola da modernidade, considera a noção de espaço transformador, devido a suas divisões internas e a ordem por ele criada, através de seu espaço celular e serial. A organização desta forma de espaço, afirma Foucault, funcionou como condição de possibilidade de controle simultâneo de um grande número de alunos, através da classificação de cada um, individualizando o conjunto heterogêneo destes.
2 A Revista Nova Escola: governando os sujeitos docentes
A Revista Nova Escola tem sido um periódico analisado nos últimos anos pelas pesquisas educacionais, justificado pela ampla utilização deste pelos docentes que exercem suas atividades em escolas da Educação Básica. Compreendida aqui como artefato cultural, que através de seus discursos produzem subjetividades, nos aliamos às proposições de Oliveira (2006) para o registro da revista na perspectiva dos estudos culturais:
Entendo a Revista Nova Escola como um artefato cultural, portanto pedagógico, que engloba a produção e a circulação de saberes, onde os jogos de poder propõem determinados modos de ser professor, graças às operações e estratégias discursivas utilizadas ao longo das páginas, as quais de certo modo estão sujeitas a serem interpretadas como únicas (e verdadeiras) possíveis por parte de grande número de leitores”. (Oliveira, 2006, p. 81)
Ao abrir as páginas da revista para uma breve re-vista, compreende-se como este periódico se constitui como um referencial de fácil acesso, cujo conteúdo toma caráter de verdade sem maiores questionamentos e frequentemente reproduzidos pelos docentes. Costa (2000) aponta que a mídia produz subjetividades e ao produzir os sujeitos a partir dos discursos midiáticos, que no caso aqui são analisados os educacionais, determinam os sujeitos, controlados num exército de governamento. Diante destas relações, trazemos as seguintes considerações de Costa (2000, p. 79):
No caso da Nova Escola, ao destacar e referenciar certos modos de ser das professoras e dos professores, prescreverem formas de trabalho, definir o que é certo e o errado quando se trata da seleção de conteúdos, de condutas de sala de aula ou em relação à profissão ou a sociedade, etc., a revista vai colocando em prática uma cadeia de validação de enunciados que acaba por produzir com regularidade e suposta legitimidade o padrão social de referência.
Ao assumir como objetivo influenciar na educação brasileira visando à formação continuada dos docentes do Ensino Fundamental, os próprios criadores da Revista Nova Escola, Silva e Feitosa (2008), referenciam seu compromisso com as metas educacionais de um determinado período histórico. Há mais de vinte e cinco anos no mercado midiático e sendo distribuídos números crescentes de exemplares para as instituições escolares, alcançando números expressivos de docentes. Observa-se este movimento na própria caracterização da revista pela Fundação que a elabora.[5]
Por meio de suas iniciativas e projetos, muitos deles realizados em parceria com empresas, entidades e governos, a FVC atinge as escolas públicas do país com publicações, sites, eventos e pesquisas, todos realizados com um objetivo comum: promover as melhores práticas para o maior número possível de professores, diretores, coordenadores pedagógicos e demais responsáveis pelo processo educacional para que elas possam ser reaplicadas, e, dessa forma, ajudar as nossas crianças e jovens a aprender cada vez mais.
Com a in/exclusão, assunto emergente da nossa época, a Revista Nova Escola não atua de maneira diferente, pelo fato de trazer em reportagens mensais e edições especiais temas atuais e normalmente, vinculados às políticas educacionais determinadas pelo Ministério da Educação. Este periódico passa a trazer discursos que vislumbram subjetivar os docentes para atender a lógica neoliberal de incluir a todos numa sociedade economicamente efetiva. Desta maneira, elencou-se as edições de 2009 para análise, visto que no ano anterior houve o lançamento através da Secretaria Nacional de Educação Especial do Ministério da Educação: Política Nacional de Educação Especial numa Perspectiva Inclusiva, que veio para oficializar a inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais nas escolas regulares, em salas de aula normais. Desta maneira, todos os professores passam então a atender alunos com estas necessidades e características, alunos estes que anteriormente vinham sendo atendidos somente em classes especiais por professores especializados. Com intuito de buscar as recorrências sobre a temática e o governamento da formação docente, pesquisou-se as edições 219 a 228, na seção “reportagens” do período cujo título é “inclusão” passando a ser uma seção constante assim como as reportagens sobre matemática, geografia, história, etc.
Como podemos perceber, o intuito da revista é atingir um número grande de escolares, promovendo as melhores práticas educativas. Nesta perspectiva, trazemos a governamentalidade das teorizações foucaultianas, que se apresenta na forma de uma dominação consentida, não havendo a necessidade da repressão ou da coerção, já que os investimentos de poder efetuados pelos discursos que circulam na revista e que, neste enfoque refere-se aos da in/exclusão escolar, são aclamados pelos próprios docentes, que buscam no periódico as soluções para os problemas pedagógicos encontrados na escola.
A associação da in/exclusão escolar com a ferramenta analítica da governamentalidade já vem sendo feita por autores como Veiga Neto e Lopes (2008), no sentido de esquadrinhamento de todos aqueles considerados incluídos, ou seja, que não pertenciam a índices, estatísticas. Ao nos apoiarmos nestas proposições, trazemos ainda a questão do governamento da formação dos docentes envolvidos nestes processos inclusivos, descrevendo então, a compreensão desta ferramenta analítica, enquanto uma articulação teórica proposta pelos estudos de Michel Foucault que define esta governamentalidade da seguinte forma:
E com essa palavra quero dizer três coisas: O conjunto construído pelas instituições, procedimentos, análises e reflexões, cálculos e táticas que permitem exercer esta forma bastante específica e complexa de poder, que tem por alvo a população, por forma principal de saber a economia política e por instrumentos técnicos essenciais aos dispositivos de segurança.
A tendência que todo o Ocidente conduziu incessantemente, durante muito tempo, à preeminência deste tipo de poder, que se chama de governo, sobre todos os outros – soberania, disciplina, etc., e levou ao desenvolvimento de uma série de aparelhos específicos de governo e de um conjunto de saberes.
O resultado do processo através do qual o Estado de Justiça da Idade Média, que se tornou nos séculos XV e XVI Estado administrativo, foi pouco a pouco governamentalizado. (Foucault, 2006, P. 291 – 292).
Inscrito este artigo na esteira metodológica e feitas as devidas apresentações do periódico, considerado um artefato cultural a ser analisado, observa-se então os enunciados das reportagens publicadas na Revista Nova Escola no período determinado. Na edição número 221 do ano de 2009, na seção determinada, foi identificada a reportagem cujo título é “Falar com as mãos”, que traz um exemplo de inclusão de alunos surdos nas salas de aula normais em escolas regulares:
A inclusão de crianças com deficiência auditiva sempre foi polemica, mas recentemente ganhou novo rumo em nosso país. De acordo com a política do governo federal, elas não devem mais ficar segregadas em escolas especiais e precisam estudar desde cedo em unidades comuns, com um intérprete que traduza todas as aulas para a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e o contraturno preenchido por atividades específicas para surdos. (R.N.E, 2009, p. 1).
Em Florianópolis, a professora de matemática Silva Maria Soster teve outra reação no inicio do ano passado, quando foi informada pela direção da EM Luiz Cândido da Luz que uma de suas classes da 2ª fase do 2º ciclo (equivalente ao 5º ano, mas já com um docente por disciplina) teria quatro alunos surdos. “Tomei um susto. Nunca tinha passado por isso e pensei: será que posso?”, conta. Para Roseli Baumel, educadora livre-docente especializada em Educação Especial da Universidade de São Paulo (USP), esse tipo de dúvida é natural. “Temos de ser honestos e admitir que não estamos prontos,” orienta a especialista” (R.N.E., 2009, p. 2).
A escola deve se tornar bilíngüe. “““ ““ “Os colegas tem que aprender Libras, afinal, no futuro, eles vão falar com os surdos incluídos na sociedade”, afirma (R.N.E, 2009, p. 2).
Nos excertos acima transcritos pode se verificar que a Revista Nova Escola traz as intenções das políticas educacionais do país, sendo mais uma maneira de legitimá-las e assim assumir um caráter de verdade, muitas vezes inquestionadas, como a Política Nacional de Educação Especial numa Perspectiva Inclusiva. Outra questão que se assinala é a ideia de déficit na formação docente que Hardt (2008) aborda, problematizando no sentido de alcançar os padrões e moldes para o alcance do status de docente ideal.
A in/exclusão, a partir dos enunciados analisados, é dada como um imperativo, devidamente consolidado. Dessa maneira, os docentes são explicitamente estimulados a aprender, no caso da reportagem “Falando com as mãos” a aprender dominar a Língua Brasileira de Sinais, num processo de governamento da formação do docente que passa a atender a racionalidade neoliberal, devendo conhecer todos os alunos, num processo de tolerância e aceitação da diferença, sabendo então, trabalhar com todas as especificidades, inclusive a surdez. Lazzarin e Machado (2010) trazem a expressão “conhecer todos e cada um dos alunos”, relacionando como uma estratégia contemporânea da sociedade de controle, governamentalizada.
Na edição nº 223, destaca – se reportagem intitulada “Formas criativas para estimular a mente de alunos com deficiência”, dentro da sessão Inclusão, trazendo um exemplo de sucesso de inclusão dentro de uma escola da rede paulista de ensino, endossado por especialistas da Unesp, como se pode verificar nos excertos selecionados:
Mas por onde começar quando a deficiência é intelectual? Melhor do que se prender a relatórios médicos, os educadores das salas de recurso e das classes regulares precisam atender que tais diagnósticos são uma pista para descobrir o que interessa: quais obstáculos o aluno enfrentará para aprender e eles para ensinar. (p.1)
Outra característica da deficiência intelectual que pode comprometer o aprendizado é a dificuldade de comunicação. A inclusão de músicas, brincadeiras orais, leituras com entonação apropriada, poemas e parlendas, ajuda a desenvolver a oralidade”. Parcerias com fonoaudiólogos devem sempre ser buscadas, mas na sala de aula contribui bastante”, explica Anna, da Unesp.(p.1)
Com os destaques anteriores, assinala-se a linguagem acessível da revista, que explica de forma bastante resumida os diferentes tipos de deficiência se colocando como uma fonte de conhecimento para responder as dúvidas comuns dos docentes, suprindo possíveis lacunas na formação destes sujeitos, que passam a atender a lógica inclusiva sem questioná-la, no sentido de disseminar a ideia da tolerância, ao colocar todos no processo de esquadrinhamento e aproximação da norma considerada ideal, sem que haja a discussão da ideia diferença, ficando atreladas apenas a estas ações normalizadoras propostas pelos modelos propostos pelo periódico que objetivam uma facilitação do processo complexo de inclusão.
Na edição de Agosto, nº 224, apontamos a reportagem “Como atender alunos com altas habilidades”, em mais uma leitura que aborda uma das especificidades que contemplam os processos de in/exclusão. A matéria citada anteriormente traz as maneiras de identificar os alunos com altas habilidades/superdotação, além de descrever as fontes de informações consideradas pelos editores da revista como ideais para o trabalho com alunos que apresentam esta anormalidade.
Trabalhar com alunos com altas habilidades requer antes de tudo, derrubar dois mitos. Primeiro: esses estudantes, também chamados de superdotados, não são gênios com capacidades raras em tudo – só apresentam mais facilidade do que a maioria em determinadas áreas. Segundo: o fato de eles terem raciocínio rápido não diminui o trabalho do professor. Ao contrário, eles precisam de mais estímulos para manter o interesse pela escola e desenvolver seu trabalho se não, podem até evadir. (p.2)
O Ministério da Educação montou um formulário com 24 frases que ajudam a identificar estudantes assim (confira a lista no quadro “como identificar a superdotação”). Se você reconhece um de seus alunos como possível superdotada, procure o Núcleo de Atividades de Altas Habilidades/ Superdotação, na Secretaria de Educação de seu estado. (p.4)
Os destaques para o trabalho com altas habilidades não se difere dos indicativos para o trabalho com surdez e deficiência mental, relacionando as práticas pedagógicas com a possível e necessária participação de especialistas para este auxilio. Outra questão é a sugestão para os docentes seguirem listas de diagnósticos e as condutas dos professores sugeridas nas revistas no enfrentamento destas dificuldades (termo utilizado pela revista). Segundo Garbini, Brendler e Campos (2011), os modelos de formação são constituídos na lógica moderna, havendo uma organização baseada em regras e esquadrinhamentos, de separações e binarismos. No caso específico da reportagem há uma necessidade de identificação do anormal para então propor ações que aproximem os sujeitos da normalidade.
Com uma série de discursos de convencimento que circulam em diferentes âmbitos sociais e políticos, o docente já não pode mais fugir da inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais, constituindo uma ação de incentivo e, principalmente de legitimidade e de tolerância à diversidade.
O ideário sobre a in/exclusão toma proporções maiores, não ficando restrita somente a questão numérica ou de acessibilidade, trazendo um conjunto de subjetividades que circulam nos discursos sobre o tema, constituindo a ideia dos espaços para todos operando na engrenagem neoliberal como forma de vida em sociedade e não só como um sistema econômico (Garbini, Brendler e Campos, 2011).
Esta questão podemos identificar na reportagem “Bullyng contra alunos com deficiência” na edição 228, traz a repulsa a qualquer forma de exclusão, cabendo ao docente direcionar as ações para efetivar o processo inclusivo e a aceitação dos alunos que apresentam diferenças. Como podemos visualizar nas citações:
A exclusão é uma forma de bullyng e deve ser combatida com o trabalho de toda a equipe. De fato um bom trabalho para reverter situações de violência passa pela abordagem clara e direta do que é deficiência. De acordo com a psicóloga Sonia Casarin, diretora do S.O.S. Down – Serviço de Orientação sobre Síndrome de Down, em São Paulo, é normal reagir negativamente diante alunos de uma situação desconhecida. Cabe ao professor estabelecer limites para essas reações e buscar erradicá-las não pela imposição, mas pela conscientização e pelo esclarecimento. (p.1)
O professor deve analisar o meio em que a criança vive refletir se o projeto pedagógico da escola é inclusivo e repensar até seu próprio comportamento para checar se ele não reforça o preconceito e consequentemente o bullyng. Se ele olha a criança pelo viés da incapacidade, como pode querer que os alunos hajam de outra forma?”É tarefa dos educadores oferecer um ambiente propício para que todos, especialmente para os que tem deficiência se desenvolvam, com respeito e harmonia.(p.2)
Nos fragmentos observa-se que a deficiência é marcada, justificando a necessidade de uma intervenção pedagógica diferenciada para um grupo de sujeitos que até pouco tempo eram invisíveis para a sociedade, sendo a escola a instituição ideal para prepará-los à vida em sociedade. Neste sentido, nos aliamos às proposições de Veiga Neto (2003) que pontuam o fortalecimento da instituição escolar como um dos principais órgãos centralizadores de gerenciamento do risco social, prevendo ao mesmo tempo a conduta docente que deve ser tolerante, amável e incentivadora das boas relações, e também dos alunos que necessitam ser trabalhados no sentido da aceitação de qualquer sujeito considerado fora do padrão.
3 Sinalizando as próximas conversas
A partir das análises realizadas e breve descrição da revista Nova Escola reiteramos a idéia da in/exclusão como protagonista das discussões educacionais atuais, exemplo disso, é o número significativo de reportagens publicadas na revista no ano de 2009, sendo uma fonte de informação consultada pelos docentes e muitas vezes tomadas como exemplos de práticas pedagógicas a serem seguidas e universalizadas como verdades inquestionáveis, governando-os.
Sabemos que os discursos que circulam na revista são dotados de relações de poder e interpelam os docentes de forma a conduzir sua conduta em sala de aula e na sua formação docente no sentido de dominá-los de forma sutil e consentida através dos temas abordados pela revista, aclamados pelos próprios professores, como por exemplo: a surdez, o déficit cognitivo, as altas habilidades e o bullyng com os alunos deficientes, afinal, intui-se encontrar nas revistas as respostas para os problemas do cotidiano referido, nesse sentido a revista vale-se de estratégias que facilitam sua aceitação e legitimação enquanto excelente fonte de informação consideradas pelos leitores, e neste caso esperamos que não seja a única.
A necessidade de controle e gerenciamento de riscos dos sujeitos que há poucos anos estavam fora da vitrine educacional, os alunos com necessidades educacionais especiais, proporciona o entendimento por que a escola é uma das instituições modernas mais eficazes de subjetivação de sujeitos para a adequação nesta sociedade neoliberal, por isso o direcionamento dos discursos que circulam na revista para os professores, principalmente do ensino fundamental. A revista Nova Escola, por agir diretamente na escola, funciona como uma grande fábrica de subjetividades para a lógica da in/exclusão, promovendo a efetivação da inclusão e, consequentemente a busca de conhecimentos para realizar a inclusão com o sucesso que a revista divulga. É na escola uma verdade e constante troca de saberes: garante a passagem dos conhecimentos do mestre ao aluno, mas retira do aluno um saber destinado e reservado ao mestre. A escola torna-se local de elaboração da pedagogia. (FOUCAULT, 1997, p.155)
REFERÊNCIAS
GARBINI, Fernanda Zanette; BRENDLER, Giovana Giacomini. e CAMPOS, Juliana Durand de Oliveira. Problematizando a formação docente e a in/exclusão escolar: uma breve análise. In: Anais do IV Congresso Internacional de Educação: educação, docência e humanização. Santa Maria: FAPAS, 2011.
COSTA, Maria Vorraber. Mídia, magistério e política cultural. In: Estudos culturais em educação: mídia, arquitetura, brinquedo, biologia, literatura, cinema. COSTA, Marisa Vorraber. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 2000.
FOUCAULT, Michel. Arqueologia do Saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997.
FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso: aula inaugural no Collége de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. 13ª ed. Trad: Laura Fraga de Almeida Sampaio. São Paulo: Edições Loyola, 2006.
HARDT, Lúcia Schneider. Formação de professores: as travessias do cuidado de si. Anped – 2008.
LAROSSA, Jorge. A arte da conversa. In: Pedagogia (improvável) da diferença e se o outro não estivesse ai?São Paulo, DP & A Editora, 2003.
LAZZARIN, Márcia Lise Lunardi; MACHADO, Fernanda de Camargo.Formar, tolerar, incluir: tríade de governamento dos professores de surdos. In: Cadernos de Educação, Pelotas: FAE/PPGE/Ufpel. Maio/agosto, 2010.
LOPES, Maura C. Inclusão escolar, currículo, diferença e identidade. In: LOPES, M. e DAL’LGNA, M. C. (orgs). Inclusão: nas tramas da escola
OLIVEIRA, Claudio José de. Políticas educacionais e os discursos sobre matemática escolar: um estudo a partir da revista Nova Escola. 2006. Tese (Doutorado em Educação) – Unisinos –São Leopoldo – RS.
REVISTA NOVA ESCOLA, São Paulo, nº 219, 2009.
REVISTA NOVA ESCOLA, São Paulo, nº 220, 2009.
REVISTA NOVA ESCOLA, São Paulo, nº 221, 2009.
REVISTA NOVA ESCOLA, São Paulo, nº 222, 2009.
REVISTA NOVA ESCOLA, São Paulo, nº 223, 2009.
REVISTA NOVA ESCOLA, São Paulo, nº 224, 2009.
REVISTA NOVA ESCOLA, São Paulo, nº 225, 2009.
REVISTA NOVA ESCOLA, São Paulo, nº 226, 2009.
REVISTA NOVA ESCOLA, São Paulo, nº 227, 2009.
REVISTA NOVA ESCOLA, São Paulo, nº 228, 2009.
SILVA, M.; FEITOSA, L. dos S. Revista nova escola: legitimação de políticas educacionais e representação docente. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, n.31, p.183-198, Set.2008.
VEIGA-NETO, Alfredo. Educação e governamentalidade neoliberal: novos dispositivos, novas subjetividades. In: PORTO CARRE RO, Vera; CASTELO BRANCO, Guilherme. (org). Retratos de Foucault. Rio de Janeiro: Nau, 2008.
______. Incluir para excluir. In: LARROSA, Jorge; SKLIAR, Carlos. (orgs). Habitantes de babel: políticas e poéticas da diferença. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.
* Gostaríamos que fosse citado:
GARBINI, Fernanda Zanette; BRENDLER, Giovana Giacomini; CAMPOS, Juliana Durand de Oliveira. A in/exclusão escolar na revista nova escola: uma análise das estratégias de governamento na formação docente. Revista P@rtes.
[1]Mestre em Educação pela Universidade de Santa Cruz do Sul – RS. E-mail: fezanette2@hotmail.com
[2] Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Santa Cruz do Sul – RS. E-mail: gika.b@bol.com.br
[3] Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Santa Cruz do Sul – RS. E-mail: julianadoc@hotmail.com
[4] A opção pela palavra governamento advém das leituras de Veiga Neto (2002) que propõe a sua utilização “nos casos em que estiver sendo tratada a questão da ação ou ato de governar”, isso é segundo Foucault (1995) dirigir a conduta dos indivíduos ou dos grupos: governo das crianças, das almas, das comunidades, das famílias e dos doentes.
[5] Disponível em www.f.v.c.org.br – no link “quem somos”. Acesso em Abril de 2011.