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A pedagogia de projetos na Educação Infantil

A PEDAGOGIA DE PROJETOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Fernanda Duarte Araújo Silva*

Fernanda Duarte Araújo Silva. Doutora em Educação pelo Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Professora Adjunta do Curso de Pedagogia na Faculdade de Ciências Integradas do Pontal (FACIP/UFU). Possui experiência na Educação Infantil e Ensino Fundamental como docente e coordenadora pedagógica. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Infâncias (GEPI). Coordenadora do I Curso de Especialização em Educação Infantil da FACIP/UFU.
Doutora em Educação. Professora do Curso de Pedagogia pela Faculdade de Ciências Integradas do Pontal (FACIP) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Especialista em Docência no Ensino Superior (UFU-2004) e graduada em Pedagogia (UFU-2003). Possui experiência na Educação Infantil e Ensino Fundamental como Docente e Coordenadora Pedagógica. Atuou como Professora Assistente da Universidade Federal do Tocantins e atualmente é Professora da Universidade Federal de Uberlândia, Campus do Pontal. fernandaduarte.facip@gmail.com

O presente artigo apresenta algumas reflexões teóricas sobre a Pedagogia de Projetos e suas possibilidades de trabalho na Educação Infantil. Essa metodologia surge com o movimento da Escola Nova em várias cidades da Europa e da América do Norte, estendendo-se para países de outros continentes (BARBOSA, 2013). Entre os principais fundadores desse movimento estão Ovide Decroly, Maria Montessori, John Dewey, Célestin Freinet, entre outros que comumente criticaram o modelo tradicional de ensino e sua organização pedagógica.

Palavras-chave: Pedagogia de Projetos, Educação Infantil, Educação.

 

A partir de estudos realizados sobre a prática pedagógica na Educação Infantil, compreendemos que devemos construir possibilidades metodológicas para que ocorra um trabalho significativo nas instituições escolares que contribuam para o desenvolvimento das crianças.  A pedagogia de projetos foi escolhida pelo fato de ela coadunar com a proposta de instigar a curiosidade infantil. Segundo Katz (1994), podemos conceituar o projeto como:

…uma investigação em profundidade de um assunto sobre o qual valha a pena aprender. A investigação é em geral realizada por um pequeno grupo de crianças de uma sala de aula, às vezes pela turma inteira e, ocasionalmente, por uma criança apenas. A principal característica de um projeto é que ele é um esforço de pesquisa deliberadamente centrado em encontrar respostas para as questões levantadas pelas crianças. (KATZ, 1994, p.1).

A prática com projetos parte dos questionamentos das crianças e gera possibilidades para a construção de um trabalho investigativo. Além disso:

Os projetos abrem espaço nos quais a curiosidade das crianças pode ser comunicada com maior espontaneidade, capacitando-as a experimentar a alegria da aprendizagem independente. Os projetos bem-desenvolvidos levam a criança a usar sua mente e suas emoções, tornando-se aventuras em que tanto alunos como professores embarcam com satisfação. (HELM, 2005, p.23).

Nesses termos, a realização de uma prática pedagógica com projetos já é um tema bastante debatido no meio acadêmico, mas nossa experiência nos espaços escolares, enquanto professora da Educação Infantil e de Estágio Supervisionado no Curso de Pedagogia, mostram que os docentes ainda não conhecem ou não compreendem essa proposta de trabalho. Para Nogueira (2007), os professores que afirmam trabalhar com projetos não possuem conhecimento teórico, o que os conduz a denominar, por exemplo, como “Projeto Animais” qualquer cartaz pendurado na parede com desenho de três patinhos, reduzindo assim essa proposta de trabalho a uma simples elaboração de cartazes.

A pedagogia de projetos surge com o movimento da Escola Nova em várias cidades da Europa e da América do Norte, estendendo-se para países de outros continentes (BARBOSA, 2013). Entre os principais fundadores desse movimento estão Ovide Decroly, Maria Montessori, John Dewey, Célestin Freinet, entre outros que comumente criticaram o modelo tradicional de ensino e sua organização pedagógica. Segundo Barbosa (2013), para os escolanovistas o ensino deveria contemplar “[…] a globalização, o interesse imediato do aluno, a participação dos alunos e da comunidade, uma reorganização da didática e do espaço da sala de aula” (BARBOSA, 2013, p.42). Uma das formas de atingir esses objetivos seria, porquanto, o trabalho com projetos.

Segundo Barbosa (2013) um dos principais estudiosos desse movimento escolanovistas foi Dewey, filósofo americano. Para esse autor:

Como filósofo político, acreditava na importância da comunidade para a vida dos sujeitos e, em seu projeto educacional, visava a que a sala de aula funcionasse como uma “comunidade em miniatura”, ajudando a criança a viver o aqui e o agora que acreditava ser a melhor preparação para a participação social na vida adulta. Para ele, deveria haver uma constante inter-relação entre as atividades escolares e as necessidades e interesses das crianças e das comunidades, isto é, ligar a educação das crianças a uma visão social e política maior. (BARBOSA, 2013, p.43-44).

Dewey valorizava o interesse das crianças, diferentemente do que enfatizava o modelo de escola tradicional vigente até então. Para o estudioso, as situações-problemas, as experiências prévias dos alunos, o levantamento de hipóteses na busca de resposta a esses problemas e o trabalho coletivo eram princípios que deveriam ser contemplados na educação. Assim, ele ressalta que um projeto é “[…] a procura da solução de um ato problemático levado à realização completa em um ambiente real tendo um compromisso com a transformação da realidade” (BARBOSA, 2013, p.44).

Nas palavras de Barbosa (2013), ao falarmos de projetos, isso não significa que nossa proposta seja retomá-los, a exemplo do que foi feito pelo movimento da Escola Nova, e sim ressignificá-los a partir de um “[…] contexto sócio histórico, e não apenas o ambiente imediato, o conhecimento das características dos grupos, de alunos envolvidos e a atenção às temáticas contemporâneas e pertinentes à vida das crianças” (BARBOSA, 2013, p.46).

É necessário construir um novo modo de ver e pensar as práticas pedagógicas com as crianças, haja vista que:

Os estudos sobre a infância e a criança observam que esta é um ser humano inteiro. Todos os aspectos da sua vida estão presentes quando ela está na sua sala de aula e, portanto, devem ser leva- dos em conta quando o objetivo é auxiliá-la a compreender o mundo que a circunda. (BARBOSA, 2013, p.48).

A partir dessa visão, a pedagogia de projetos insere-se como uma organização pedagógica em que haja a “[…] compreensão mais geral, global e diversa do mundo e dos conhecimentos sobre o mesmo. A pedagogia de projetos pode ser uma possibilidade interessante para completar essa visão multifacetada” (BARBOSA, 2013, p.48). Nesse contexto, segundo Corsino (2009), na prática com projetos é necessário que os sujeitos se mobilizem e se envolvam “[…] para descobrir  algo novo, procurando respostas a questões ou problemas e necessidades reais” (p.105).

Apesar de sabermos que não existe um modelo único de projetos e um passo a passo, como um receituário para que o trabalho se efetive, optamos por listar alguns momentos básicos dessa proposta, que devem ser avaliados pelo professor a partir dos objetivos propostos. Para Katz (2005, p.29), um desses objetivos a “[…] longo prazo é fortalecer e sustentar as tendências inatas das crianças à curiosidade e ao profundo envolvimento em obter a maior compreensão possível do que vivenciam”. Vale destacar que “[…] os projetos devem sempre garantir uma estrutura com um caráter inovador, além disso, uma mesma turma de alunos pode desenvolver vários projetos ao longo do ano e muitos deles podem ter uma existência concomitante” (BARBOSA, 2013, p.52).

O primeiro momento do projeto consiste em definir com as crianças, por meio de diálogo, qual será o tema do projeto e, a partir dele, quais são as perguntas que orientarão a pesquisa. Nesse caso, o professor considerará os conhecimentos prévios dos alunos, o que possibilita que ele “[…] aprofunde o conhecimento que tem de cada uma das crianças, observando as maneiras como poderá sustentar e fortalecer o progresso delas em todas as áreas de aprendizagem à medida que o projeto se realiza” (KATZ, 2005, p.29). O professor, então, fica responsável por:

…articular esse tema com os objetivos gerais previstos para o ano letivo, realizar uma previsão dos conteúdos que podem vir a ser trabalhados, atualizar-se em relação ao tema, discutir o tema com os outros professores da escola, ampliar os conhecimentos e fazer novas propostas de trabalho para o grupo. (BARBOSA, 2013, p.54).

Assim, as crianças são consideradas protagonistas na escolha do tema, na organização de listas sobre o que sabem do assunto, o que querem saber, o que querem aprender e como se pode fazer para chegar a essas aprendizagens (BARBOSA, 2013).

Depois da escolha do tema, do levantamento de questões e hipóteses, iniciamos o segundo momento do trabalho, no qual as crianças se organizam em pequenos grupos e buscam as respostas para suas dúvidas: “Dependendo da idade das crianças e da natureza do assunto, essa fase implicará que façam uma pesquisa de campo e entrevistem algumas pessoas que possam responder a suas perguntas” (KATZ, 2005, p. 29). Sobre essa pesquisa de campo, Barbosa (2013) afirma que a busca por informações pode ocorrer em diferentes fontes, como: conversas ou entrevistas com informantes, passeios ou visitas, observações, exploração de materiais, experiências concretas e pesquisas bibliográficas.

Nesse movimento de busca, é importante que sejam constantes as oportunidades de trocas, entre as crianças, das informações obtidas por meio das pesquisas, em que elas deverão registrar as ideias e os dados frutos de seus achados. Tais registros podem ser feitos a partir atividades escritas, nas quais os professores solicitam que os alunos coloquem no papel suas percepções sobre as atividades realizadas no projeto. Acerca da necessidade de registros, Barbosa (2013) discorre que:

O registro é um momento também muito importante, pois é necessário escolher o que deve ser registrado, selecionar, reelaborar as partes mais significativas e ajudar a construir um tipo de codificação daquilo que foi pesquisado. Os materiais produzidos nesse momento podem formar a memória pedagógica do trabalho e uma fonte de consultas para as crianças. (BARBOSA, 2013, p.55).

O próximo momento da prática pedagógica com projetos concerne ao planejamento e à realização da atividade de culminância, em que a trajetória da investigação e suas descobertas são resumidas e compartilhadas: “Ao longo desse processo, o professor tem muitas oportunidades para observar o progresso de cada criança e para estimular e apoiar a aprendizagem futura com base em tais observações” (KATZ, 2005, p.29).

Para Barbosa (2013), após a organização do material pesquisado, é necessário que as crianças exponham, recontem e narrem o que aprenderam por meio de diferentes linguagens: “A avaliação do trabalho desenvolvido é feita a partir do reencontro com a situação- problema levantada inicialmente e com os comentários feitos sobre o proposto e o realizado” (BARBOSA, 2013, p.56).

Nessa linha de trabalho, o professor rompe com o modelo tradicional, de detentor do saber, e assume a função de criar oportunidades de aprendizagens, pois “[…] em uma aula convencional, o professor sabe até onde seus alunos podem chegar, trabalhando com projetos, esse limite se supera e surpreende” (ANTUNES, 2012, p.83). Sobre a função do professor nos projetos enquanto um pesquisador de sua prática, Corsino (2009) destaca:

O professor torna-se alguém que também está na busca de informações, que estimula a curiosidade e a criatividade do grupo e, sobretudo, que entende que as crianças não são receptores passivos, mas sujeitos, que têm seus interesses, que têm uma história, que participam ativamente do mundo construindo e reconstruindo a cultura na qual estão imersos. (CORSINO, 2009, p.106).

 Vale destacar que encontramos críticas ao trabalho com projetos:

Ao basear-se na pedagogia de projetos sem levar em conta uma agenda social e política mais definida, os professores arriscam-se a torná-la mais uma técnica educacional, e não uma proposta mais global. Ao ignorar o papel das diferenças culturais, dos mitos e ritos, das cosmologias, dos hábitos e modos de pensar e agir dos diferentes grupos humanos, a pedagogia de projetos pode impor um modo de relação com o mundo unilateral, cognitivista, antropocêntrico e dominante. (CORSINO, 2009. p.63).

Em linhas gerais, os benefícios dessa prática pedagógica superam os limites impostos, desde que o professor tenha consciência do seu papel na escola e de seus objetivos mais amplos. Nesse sentido, a escola se torna um “[…] espaço de busca, de reflexão crítica,  que se vale de fontes e áreas de conhecimento diversas para entender um fenômeno natural, cultural ou social” (CORSINO, 2009, p.106), a partir de um trabalho coletivo entre crianças, professores, pais, e comunidade.

Apesar de termos enfatizado nesse momento a pedagogia de projetos enquanto possibilidade de uma abordagem significativa na Educação Infantil, ela pode ocorrer em qualquer nível de ensino, desde que seja pensado e planejado considerando as dúvidas, os anseios e os conhecimentos prévios dos sujeitos envolvidos no processo.

Questões como a aprendizagem significativa, a criança no centro do processo, a relação entre conhecimentos prévios, cotidianos e científicos, a valorização dos saberes das crianças, o respeito à diversidade e a possibilidade de uma prática pedagógica não apenas com Ciências, mas com as diversas áreas do conhecimento, são alguns dos destaques desse trabalho nas instituições escolares. Para que isso se efetive, é necessário que tenhamos docentes com boa formação; nesse sentido, na sequência apresentamos reflexões acerca da formação do professor para atuar na Educação Infantil.

REFERÊNCIAS

ANTUNES, Celso. Inteligências múltiplas e seus jogos: Inteligência ecológica. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.

BARBOSA, Maria Carmen Silveira Barbosa. Trabalhando com projetos pedagógicos. In: RENDIN, Marita Martins (et al.). Planejamento, práticas e projetos pedagógicos. Porto Alegre: Mediação, 2013.p. 39-64.

NUNES, Maria Fernanda Resende; CORSINO, Patrícia. A institucionalização da infância: antigas questões e novos desafios. In: CORSINO, Patrícia. Educação Infantil: cotidiano e políticas. Campinas, SP. Autores Associados, 2009. p.15-32.

HELM, Judy Harris. Os desafios contemporâneos na Educação Infantil. In: HELM, Judy Harris; BENEKE, Sallee (orgs.). O poder dos projetos: novas estratégias para a Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed, 2005.p.13-26.

KATZ, Lilian G. The Project approach. Champaign, Il: ERICA Clearinghouse on Elemtary and Early Childhood Education, 1994.

 

* Fernanda Duarte Araújo Silva

Doutora em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Professora Adjunta do Curso de Pedagogia na Faculdade de Ciências Integradas do Pontal (FACIP/UFU). Possui experiência na Educação Infantil e Ensino Fundamental como docente e coordenadora pedagógica. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Infâncias (GEPI). Coordenadora do I Curso de Especialização em Educação Infantil da FACIP/UFU.

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