A EDUCAÇÃO INFANTIL E A CONSTRUÇÃO DE AMBIENTES
Nívia Ferreira da Silva Menezes*
Fernanda Duarte Araújo Silva**
O presente artigo aborda questões referentes à utilização e organização espacial nas instituições de Educação Infantil. Discutimos sobre a importância da desconstrução de paradigmas antagônicos que permeiam o ensino da Educação Infantil na atualidade, propondo assim um projeto que torne realidade à utilização dos “cantinhos pedagógicos”, para que se conceba na organização do espaço a vivência plena da infância.
Palavras – chave: Educação infantil. Organização dos Espaços. Infância.
Sabemos que devemos entender as necessidades das crianças e transformar os espaços da Educação Infantil em locais aconchegantes, interessantes, criativos e ao mesmo tempo pedagógicos que contribuam com práticas educativas de qualidade. Deve ser esse o principal objetivo desse nível de ensino, de modo assim à resignificar o conceito de desenvolvimento integral da criança.
Sampaio (1989) destaca o pensamento de Célestin Freinet (1896-1966), diante das invariantes pedagógicas criadas por ele, atentando para as técnicas educativas e nomeia como a invariante nº 11 aquela que aponta que a observação, a explicação e a demonstração – processos essenciais da escola – não são as únicas vias normais de aquisição de conhecimento, mas a experiência tateante, que é a conduta natural e universal, ou seja, é pela experimentação que a criança se desenvolve de forma significante, pois, é pela prática e exploração que o conhecimento poderá ser construído. Freinet foi precursor de uma pedagogia que trazia a vida para dentro da escola e por meio das experiências vivenciadas transformavam em ações que eram “devolvidas” à sociedade como forma de aproximação entre o estudado e o vivido.
Foi o idealizador de técnicas que direcionasse para uma educação moderna, dentre elas a organização espacial da sala de aula, emergindo então as primeiras concepções dos “cantos pedagógicos”, com a disposição de móveis e instrumentalização para uma formação transformadora (FREINET, 1975).
Assim, nos encontramos diante da sensível percepção de Freinet para as mudanças que deveriam ocorrer no cenário educacional. Os atrativos inexistentes na sala de aula se davam pela precariedade e pela rotina enfadonha regida por uma metodologia obsoleta. Ele acreditava em algo mais que contribuísse para formação dos pequenos, que estivesse no contexto vivenciado dentro das disponibilidades existente, concluindo assim que algo novo deveria ser desenvolvido e consequentemente transformado.
Nesse sentido, transformar o espaço dentro da escola para o despertamento das habilidades de cada criança e por meio de atividades que instiguem o processo criativo, a liberdade de expressão seja, física, emocional, intelectual e psicológica, contribuirá para um espaço realmente pensado para a criança a partir de suas interações com os ambientes descobertos e explorados.
Para tanto, Wolff (2008), destaca que o importante ao organizar espaços é priorizar o que determina os princípios da Educação Infantil, devendo-se respeitar as necessidades e capacidades das crianças E oferecendo sempre o melhor para o seu desenvolvimento.
Para que se torne real as possibilidades para esse imperativo, a escola e o professor devem chegar ao consenso de que o direito de brincar, um espaço estimulante seguro e acolhedor, a saúde e higiene, alimentação adequada, o desenvolvimento cognitivo, proteção e afeto e o estímulo ao desenvolvimento de sua identidade cultural e social, além de estarem integralmente garantidos, serão possibilidades para a formação do ser completo.
Para viabilização do projeto será necessário que os espaços sejam provocadores de diversas formas de expressão: motora, musical, gráfica, artística, linguística, etc., que estimule interação, oportunidade e aprendizado. Devemos enxergar na organização do espaço a vivência plena da infância, e para que se garanta o sucesso da proposta a seguir será necessário: boa vontade, embasamento teórico, clareza das ideias para formação dos sujeitos, criatividade e adesão por parte da gestão, por se tratar de uma instituição cristalizada por uma educação tradicional e acrítica.
Assim, será necessária a conscientização prévia que comprove organização funcional dos espaços e a intencionalidade dos objetivos para tal, laborando como mola propulsora para a quebra de paradigmas antagônicos, de modo a vislumbrar uma educação inovadora e emancipadora. Para tanto, elencaremos a seguir os “cantos pedagógicos” pensados e estruturados mediante as necessidades para a Educação Infantil.
A temática de cada “Cantinho” deverá ser aplicada em algumas salas de aulas, havendo um revezamento e troca de salas conforme a escala prévia definida nas reuniões pedagógicas e no organograma para organização de horários. Todavia, outras temáticas dos “cantinhos” deverão encontrar-se fora da sala de aula, para que haja exploração do espaço externo, o qual foi descrito anteriormente. Assim, com base no pensamento de Wolff (2008) sobre essa temática, a proposta do trabalho em questão se constitui da seguinte forma:
PROJETO: “CANTINHOS PEDAGÓGICOS”.
Objetivo: Transformar o espaço físico existente, em espaço pedagógico pensado exclusivamente para a criança, instigando o processo criativo, a liberdade de expressão seja, física, emocional, intelectual e psicológica por meio da proteção, afeto e o estímulo ao desenvolvimento de sua identidade sócio cultural.
1-Cantinho da leitura
É um espaço importantíssimo na sala de aula. Onde as crianças encontrarão variados materiais de leitura: livros, revistas, gibis, jornais, livros de receitas, atlas, dicionários, etc. As crianças aprendem a manusear o material – escolher, ler e devolver para o mesmo lugar e a ter cuidado/zelo com o material – não amassar, rasgar – ampliando sua autonomia. Poderia utilizar para a decoração tapetes, almofadas, ou poltroninhas feitas de garrafa pet – nas paredes poderia pintar desenhos de livros e crianças para que eles se identificassem. (Não se esquecendo da mediação do professor – que mesmo sendo atividades livres ou dirigidas, direcionar para o diálogo e a intenção para se alcançar os objetivos).
2-Cantinho dos jogos
Podemos disponibilizar jogos que estimulem a criança a solucionar problemas, ajudando na sua coordenação motora e na interação com outras crianças. Utilizá-los para reforçar os conteúdos ministrados, a criatividade, raciocínio, não por obrigação, mas de forma prazerosa. Ajudaria para trabalho em equipe, socialização, ganhar e perder, respeito às regras. Funcionaria como um espaço de recreação – brincar e aprender.
3-Cantinho da música
Esse cantinho seria a remodelação de um espaço já existente (sala de vídeo). Podemos criar um acervo de CDs e DVDs com videoclipes e apresentar as crianças à boa música, desde as músicas clássicas, MPB, cantigas de roda, sempre procurando estimular movimento, audição, ritmo das canções, tempo. Poderia estar aliado às aulas de educação física para trabalhar a coordenação motora, esquema corporal, noções tempo/espaço, lateralidade e muito mais. Nesse caso o professor deverá estar familiarizado com a história da música brasileira, afro, ritmos regionais, de forma a atender a todos os gostos. (Poderia por meio da utilização do cantinho elaborar coreografias, apresentações, show de talentos, dublagens) e tudo o mais que a imaginação permitir.
4-Cantinho para artes
É fundamental! Um dos espaços fora as salas de aula- espaço com área verde, pode ser reservado para as Artes Plásticas: desenho, pintura, modelagem e colagem. Este é um espaço que precisa da organização pela professora (manter os materiais necessários) e das crianças (aprendem a manusear os materiais para suas produções). A limpeza posterior deve ser compartilhada com as crianças.
Para esse cantinho, pode ser pensada a construção de uma cobertura na área verde da escola (debaixo de árvores – gramado). Seria um lugar para deixar livre também a criatividade e exploração da natureza. Nesses encontros poderia ser trabalhada a exposição dos trabalhos – chamar os pais para essa exposição estreitando os laços da relação família-escola. Adotar a prática das aulas passeios dentro da escola Freinet (1975), já que escola é imensa e possui pomar com frutas e hortaliças.
5-Cantinho da dramatização
A “casinha” ou “casa de bonecas”, no qual elas vivem os papéis familiares e constroem relações com os colegas da turma. Para organizar esse espaço você pode dispor de móveis e utensílios em tamanho reduzido, bonecas diversas (de plástico, de tecido) e outros brinquedos. Algumas araras com fantasias, fantoches, um espelho grande, etc., para estímulo à criatividade do faz de conta tão comum nessa faixa etária da educação infantil. Poderia inserir nesse espaço literatura e a contação de histórias – fazer artesanalmente um caixa para fantoches de sombras e uma cabine para contação de histórias – Deixar que as próprias crianças organizem as apresentações (mediados pelo professor) e em outros casos receber um visitante para a contação – poderia ser até mesmo alunos de outras séries. Pode ser o teatro utilizado para fechar uma sequência didática culminando para o entendimento do que foi ensinado, comemoração de alguma data ou apenas criar e fantasiar através da arte de representar.
6-Cantinho das ciências
Pode ser montado com experimentos de acordo com o projeto desenvolvido com as crianças. Livros de assuntos estudados também podem ficar neste canto. Podemos montar aquários e terrários com as crianças. Estudar sobre a natureza –Estações do ano- formação da terra, noções de astronomia e tudo o mais relacionado à vida humana, vegetal, mineral, de forma lúdica e agradável. Aprender a construir o próprio brinquedo com material reciclado.
7-Cantinho da Filosofia
Espaço reservado à condução de perguntas e respostas de forma dirigida, mas ao mesmo tempo informal, em um movimento de vai e vem de aprendizado e experiências, tanto entre os alunos quanto o professor e os alunos. Seria uma forma para que os alunos se expressem, tenham voz, falem de suas dúvidas, curiosidades, como forma expressão por meio da fala e entendimento sobre o outro e o pensamento do outro. Trabalharia os valores, alteridade, ética e outras coisas. Nesse espaço seria utilizada uma zona circunscrita – espaço separado por cadeirinhas ou caixotes, que serviria também para assentar durante a conversação.
8-Cantinho brincar no Parque
Seria o momento de recreação para que as crianças de fato brinquem e sejam crianças – importância do brincar. Gincanas – Trabalhar cores – fazer circuitos – brincadeiras. Seria a forma de utilizar o espaço do parque que citamos acima, pois os objetos já estão lá, o trabalho maior seria a organização pedagógica para o desenvolvimento integral das atividades.
Considerações
Consideramos esse trabalho como forma de possibilitar à criança a construção do conhecimento de forma lúdica, criativa, intencional e direcionada, culminando para uma educação de qualidade, crítica, emancipadora direcionando para um processo de humanização transformadora.
Percebemos a importância da utilização e distribuição dos espaços nas escolas de forma integral, ou seja, de modo que abranja todas as faixas etárias concernentes à Educação Infantil, e assim permitir o desenvolvimento que auxilia na formação, socialização, desenvolvendo habilidades psicomotoras, sociais, afetivas, cognitivas e emocionais.
REFERÊNCIAS
FREINET, Célestin, As Técnicas Freinet da Escola Moderna. Lisboa Editorial Estampa Ltda., 1975.
SAMPAIO, Rosa Maria Whitaker Ferreira. Freinet: Evolução histórica e atualidades. São Paulo: Scipione, 1989.
WOLFF, Celi Terezinha. Organização do trabalho pedagógico na educação infantil. 2ª Ed. Indaial. 2008.
*Nivia Ferreira da Silva Menezes
Graduanda do Curso Pedagogia da Faculdade de Ciências Integral do Pontal da Universidade Federal de Uberlândia (FACIP/UFU). Ituiutaba-MG
**Fernanda Duarte Araújo Silva
Doutora em Educação pelo Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Professora Adjunta do Curso de Pedagogia na Faculdade de Ciências Integradas do Pontal (FACIP/UFU). Possui experiência na Educação Infantil e Ensino Fundamental como docente e coordenadora pedagógica. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Infâncias (GEPI). Coordenadora do I Curso de Especialização em Educação Infantil da FACIP/UFU.