LUDICIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL: CURRÍCULO, INTERAÇÕES E CULTURA EM CONTEXTO
Laura Simone Marim Puerta [*]
Resumo
A relevância da ludicidade, bem como o valor que a brincadeira representa na educação das crianças pequenas é discutida neste estudo. Busca-se analisar o vínculo entre o brincar e a educação infantil, considerando a brincadeira enquanto atividade social infantil e produção sociocultural da sociedade humana; e nessa perspectiva reflete-se a respeito da ludicidade no contexto pedagógico e suas implicações quanto ao currículo.
Palavras-chave: Ludicidade, Currículo, Educação Infantil e Cultura.
Abstract
The relevance of playfulness, and the value that the joke is on education of young children is discussed in this study. Seeks to analyze the link between play and early childhood education, considering the game as children’s social activity and socio-cultural production of human society; and this perspective is reflected about the playfulness in the educational context and its implications for the curriculum.
Keywords: Playfulness, Curriculum, Child and Culture Education.
Introdução
Ao tratarmos a respeito de crianças pequenas, um aspecto muito presente e considerável do universo infantil, é a ludicidade. Esta uma atividade pela qual a criança tem a possibilidade de entrar em contato com o mundo que a cerca, se apropriar dele e ao mesmo tempo lhe dar uma significação conforme sua própria dinâmica; uma vez que é um ser social inserido num contexto sociocultural.
Neste estudo, o termo ludicidade abrange o brincar, fazendo-se referência aos jogos, brinquedos e brincadeiras, bem como a ação lúdica da criança.
Nesse sentido, Wajskop aponta que a brincadeira infantil é “um fato social, espaço privilegiado de interação infantil e de constituição do sujeito-criança como sujeito humano, produto e produtor de história e cultura”. (WAJSKOP, 2001, p.28).
Deste modo, as interações estabelecidas nesse processo que envolve a ludicidade atribuem à brincadeira um valor educativo, em razão de que é uma atividade que conduz à aprendizagem infantil, devido à influência da educação, seja informal ou formal.
Diante a isto, no processo pedagógico a ludicidade exerce um papel educativo a partir dos intercâmbios sociais, que ocorrem nas instituições educacionais. Sendo, conforme Horn “o espaço coletivo da pré-escola como lugar de interações e aprendizagens entre pessoas e os saberes construídos, tendo em vista a matriz sócio-histórica em que se inserem”. (HORN, 2004, p.86).
Pelo exposto, considerando o brincar fundamental na vida das crianças, um elemento cultural que possibilita diversas interações e atividade que permeia o fazer pedagógico da Educação Infantil é que o presente texto objetiva tratar a respeito da relevância da ludicidade para a criança pequena, bem como o vínculo exercido entre o brincar e a Educação Infantil e suas implicações quanto ao currículo.
Ludicidade: relevância e valor educativo
A ludicidade norteia a infância, sendo esta a idade das brincadeiras, nas palavras de Cória-Sabini e Lucena (2004). Em decorrência das vivências realizadas neste período, trazem às crianças significativos benefícios para o seu desenvolvimento e aprendizagem.
De acordo com Brougère “o jogo está associado ao papel social da infância”. (BROUGÈRE, 1998, p.30).
É por isso que por meio da ludicidade a criança, ao representar papéis, tem a possibilidade de expressar sonhos e fantasias e nesse processo possibilita a compreensão do contexto social em que vive.
Neste aspecto, os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil – RCNEI (Brasil, 1998) tratam a brincadeira como linguagem infantil que estabelece vínculo com o simbólico e a realidade da criança.
Isto é, as brincadeiras consistem em atividade relevante da infância, visto que permite que a criança desenvolva capacidades importantes, como por exemplo, a atenção, a imitação, a memória, a imaginação; além de favorecer a socialização, por meio da interação.
Embora as discussões busquem conceituar os jogos e as brincadeiras, estudiosos como Brougère (1998) e Kishimoto (2000) afirmam não ser possível definir tais vocábulos em razão de que são polissêmicos e ambíguos, pelo fato de que tratam-se de manifestações sociais e culturais e por isto adquirem variadas significações.
Com relação ao valor educativo do jogo, Kishimoto declara que
a utilização do jogo potencializa a exploração e a construção do conhecimento, por contar com a motivação interna, típica do lúdico, mas o trabalho pedagógico requer a oferta de estímulos externos e a influência de parceiros bem como a sistematização de conceitos em outras situações que não jogos. Ao utilizar, de modo metafórico, a forma lúdica (objeto suporte de brincadeira) para estimular a construção do conhecimento, o brinquedo educativo conquistou um espaço definitivo na educação infantil. (KISHIMOTO, 1996, p.37-38)
Portanto, a ludicidade é uma ferramenta muito importante para o desenvolvimento infantil, à medida que sua utilização imprime um valor educativo significativo para a criança. Pois, é por meio do brincar que ela tem a possibilidade de conhecer o mundo e estabelecer relações, contribuindo para a sua autonomia, identidade e socialização.
O brincar no currículo da Educação Infantil
A Educação Infantil conquistou notável destaque no cenário educacional, em razão de que passou a ser constituída como um direito da criança de 0 a 6 anos de idade e compreendida como primeira etapa da Educação Básica. Esta definição ocorreu no Brasil, a partir da Constituição de 1988 e com a promulgação, em 1996, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
A partir deste marco, também tem sido crescente a importância conferida ao currículo deste nível de educação. E de acordo com Nono “tão importantes no desenvolvimento das crianças, as brincadeiras devem ter tempo e espaço garantidos nas creches e pré-escolas”. (NONO, 2010, p.1).
Desta maneira, espera-se que o currículo para a Educação Infantil vislumbre a criança como sujeito sócio-histórico, cultural e da natureza, com direitos e especificidades de seu desenvolvimento.
E sabemos que o brincar é a principal atividade do dia a dia da infância e nesse sentido, Marín e Penón contribuem afirmando que essa ação
responde à necessidade de meninos e meninas de olhar, tocar, satisfazer a curiosidade, experimentar, descobrir, expressar, comunicar, sonhar… Brincar é uma necessidade, um impulso primário e gratuito que nos impele desde pequenos a descobrir, conhecer, dominar e amar o mundo e a vida.( MARÍN E PENÓN, 2003, p.30).
Logo, o brincar enquanto eixo importante do trabalho pedagógico e inserido no currículo da Educação Infantil deve ter como princípio central as atividades lúdicas que proporcionam multiplicidade de experiências de aprendizagens que façam sentido para as crianças.
Todavia, envolto a todo esse contexto, é preciso salientar que conforme nos pontua Esteban (2004) o percurso de aprendizagem, bem como as conquistas das crianças não serão os mesmos, assim como não existe um currículo único.
À vista disso, o brincar “desde o início da Educação Infantil é o que garante a cidadania da criança e ações de maior qualidade”, é o que Kishimoto afirma. (KISHIMOTO, 2010, p.1).
Também, a mesma autora tecendo a respeito do currículo acrescenta que “para educar a criança na creche, é necessário integrar não apenas a educação ao cuidado, mas também a educação, o cuidado e a brincadeira. Essa tarefa depende do projeto curricular”. (KISHIMOTO, 2010, p.2).
Por tudo isso, as especificidades próprias da faixa etária infantil devem nortear a seleção e organização intencional das experiências culturais nos currículos da Educação Infantil.
Brincar na Educação Infantil: Interações e Cultura
A contemporaneidade está marcada pela presença de seres plurais inseridos em sociedades multiculturais e deste modo os ambientes educativos, neste caso específico, a Educação Infantil, também deve ser concebida como um espaço plural.
A esse respeito, Cória – Sabini e Lucena acrescentam dizendo que
as brincadeiras infantis tradicionais, ligadas ao folclore, refletem a mentalidade popular e expressam-se sobretudo pela oralidade. Como parte da cultura, essa modalidade de brincadeira perpetua os costumes e valores de um povo em certo período. (CÓRIA – SABINI E LUCENA, 2004, p.43)
Portanto, o brincar enquanto atividade principal do dia a dia da criança e produção sociocultural da sociedade humana se relaciona com a cultura da infância, tendo a brincadeira, conforme Kishimoto (2010) como ferramenta de expressão, aprendizado e desenvolvimento infantil.
Em suma, as interações permeadas pelo brincar na Educação Infantil permitem à criança ressignificar sua cultura, tornando-se sujeitos construtores de uma cultura lúdica própria, de um ambiente em contínua mudança.
Considerações Finais
Por tudo isso, acreditamos que é possível outro mundo, como nos ressalta Santomé (2012); um mundo sob um novo olhar sobre a infância, em decorrência das positivas mudanças sociais.
Este mundo, como visto nos escritos, em que a ludicidade é cada vez mais entendida como atividade que, além de promover o desenvolvimento global das crianças, incentiva as interações. E que o brinquedo como objeto cultural, compreende significados e representações de uma cultura, que inserido no currículo da Educação Infantil, amplia as possibilidades de percepção e participação da criança em sociedade.
Sendo assim, foi possível evidenciar o que as brincadeiras promovem nas crianças e que enquanto atividade presente no currículo infantil oportuniza a construção de um novo mundo, a partir da cultura apresentada, pela própria criança e suas interações estabelecidas com seus pares.
Ou seja, um mundo vasto de inúmeras aprendizagens e experiências enriquecedoras para a criança em questão.
Referências
BRASIL, Constituição da Republica Federativa do Brasil. Brasília, 1988.
_____. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei N.9394, de 20 de dezembro de 1996.
_____. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil: Brasília: MEC/SEF, 1998.
BROUGÈRE, Giles. Jogo e Educação. Porto Alegre: Artmed, 1998.
CÓRIA-SABINI, Maria Aparecida; LUCENA, Regina F. de.Jogos e brincadeiras na Educação Infantil.Campinas,SP:Papirus,2004.
ESTEBAN, Maria Teresa. Diferença e (des) igualdade no cotidiano escolar. In. GARCIA, Regina Leite e outros (Orgs.). Currículo: pensar, sentir e diferir. Rio de Janeiro: Dp&A,2004.
HORN, Maria da Graça Souza. Saberes, cores, sons e aromas: organização dos espaços na Educação Infantil. Porto Alegre:Artmed,2004.
KISHIMOTO, Tizuko Morchida. O Jogo e a Educação Infantil. 1996.
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________________________. Anais do I Seminário Nacional: Currículo em Movimento – Perspectivas Atuais. Brinquedos e Brincadeiras na Educação Infantil. Belo Horizonte, nov.de 2010.
MARÍN, Imma; PENÓN, Silvia. Que brinquedo escolher? Revista Pátio Educação Infantil, ano I, n. 3, dez. 2003.
NONO, Maévi Anabel.O brincar na Educação Infantil.Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”-UNESP,2010.Disponível em http://www.acervodigital.unesp.br/handle/123456789/231.
SANTOMÉ, Jurjo Torres. A socialização infantil por meio do jogo e do brinquedo: discursos explícitos e ocultos sobre o jogo e a brincadeira nas instituições escolares. In. MOREIRA, Antonio Flávio. (Org.). Ênfases e omissões no currículo. Campinas: Papirus,2001.
WAJSKOP, Gisela. Brincar na Pré-Escola. São Paulo: Cortez, 2001.
Como citar este artigo:
Formato ISO
PUERTA, Laura Simone Marim. Ludicidade na Educação Infantil: currículo, interações e cultura em contexto. Junho de 2015.
[*]Pedagoga, Psicopedagoga e Especialista em Coordenação Pedagógica. Atualmente técnica da Coordenadoria de Educação Infantil da Secretaria Municipal de Educação – SEMED/ Campo Grande-MS e Mestranda em Educação pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB). Lauramarim293@hotmail.com