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Posição-Sujeito e Escola: efeito(s) “entre lugares” discursivos

 

Posição-Sujeito e Escola: efeito(s) “entre lugares” discursivos

 

Gabriel dos Santos Kehler*

 

Resumo

Este ensaio de ordem teórica ressalta a emergência de problematizar os entre lugares discursivos, em que se posicionam e são posicionados os sujeitos nas tramas do discurso pedagógico escolar. Os sujeitos são efeitos dos discursos e do poder. A escola, um espaço social de antagonismos, em que crenças e pontos de vistas diversos se negociam e excluem mutuamente. Destarte, saber- poder vem a ser o ponto nodal dessas relações.

Palavras-Chave: Posição-Sujeito. Escola. Efeito(s). Deslocamento(s).

Abstract

This essay highlights the emergence theoretical order to problematize the discourse between places in that position themselves and are positioned subjects in the frame of school pedagogical discourse. The subjects are the effects of discourse and power. The school, a social space of antagonism, in which beliefs and diverse viewpoints are negotiated and mutually exclusive. Thus, know- power becomes the nodal point of these relations.

Keywords: Subject-position. School. Effect (s). Shift (s).

Projeções Introdutórias

Ao iniciar os argumentos que balizam essa reflexão de cunho teórico, proponho a pensar esse exercício, a partir de movimentos constitutivos à prática discursiva, não havendo a pretensão, e tão pouco a possibilidade, de separação entre teoria e prática. Poderia do mesmo modo, denominá-los como práxis, mas pelo desgaste do termo na/da tradição crítica, em que há uma teorização organizativa de orientação à prática, prefere-se a sua fusão produtiva, independente da valoração moral (positiva ou negativa).

As intencionalidades aqui tencionadas, sem haver nada escondido, constituem-se na emergência de problematizar os “entre lugares” discursivos, em que se posicionam e são posicionados os sujeitos em processos educativos nas/das tramas escolares. Destarte, os sujeitos são efeitos dos discursos e do poder. A escola, um espaço social de antagonismos, em que crenças e pontos de vistas diversos se negociam e excluem mutuamente. Nesse limitar tênue entre limitações e possibilidades, é que se pretende discutir os entre lugares que permitem os discursos circularem, sem exclusões e/ou restrições.

Posição-Sujeito em dispersão: rupturas à escola

Pensar os desafios da escola, uma instituição por excelência moderna, em tempos confluidamente liquefeitos como nos sugere Zygmunt Bauman (2001) e com perfis e identidades discentes e docentes, por ora, diferentes de outrora, é um exercício emergente, em termos de ampliações das “lentes sociais”, especialmente ao que se refere a fenômenos educativos. Não é mais salutar, ficarmos presos a leituras limitadas, estruturais e fáceis.  Nesse caso, refere-se especificamente  sobre a tradição crítica.

Apesar disso, é legítimo que se reconheça todo o legado e importância nas teorizações sobre fenômenos originalmente modernos: instituições, partidos políticos, luta de classes, sindicatos, Estados Nações, e tantas outras representações, que já foram passíveis de significações fixas. Mas, contemporaneamente  se multiplicam significações e sentidos sobre o mundo e as coisas, é uma maquinaria produtiva, que excede a  própria “velocidade da luz”. Destarte, o fato é que vivemos em um momento histórico de grandes transformações, as quais para o espanhol, estudioso curricular, Jurjo Torres Santomé (2013) constituem-se como doze (12) revoluções de nossa época:

  • Revolução nas tecnologias da informação e comunicação;
  • Revoluções nas comunicações;
  • Revoluções científicas;
  • Revolução na estrutura das populações das nações dos Estados;
  • Revolução nas relações sociais;
  • Revoluções econômicas;
  • Revoluções ecológicas;
  • Revoluções políticas;
  • Revoluções estéticas;
  • Revoluções nos valores;
  • Revolução nas relações de trabalho e no tempo de lazer;
  • Revoluções na educação.

Ao mesmo tempo, pelos próprios (neo)contextos de “novo tipo”, sejam em termos de aspectos econômicos, políticos, sociais, educativos e/ou culturais, nossas próprias subjetividades vêm sendo produzidas-fabricadas em consonância a identidades híbridas[i]. Passamos a nos posicionar e a ser posicionados em configurações relativizadas, precárias e contingentes nas tramas discursivas dos fenômenos sociais. Não é mais possível (se é que algum dia foi), meramente estar: à direita, ao centro, ou à esquerda de uma data situação.

 Compreende-se assim, que em uma abordagem pós-estrutural, dados os deslocamentos vivenciados na contemporaneidade, que os sujeitos são efeitos dos discursos e do poder. Desse modo, o sujeito e o poder não possuem identidades fixas, nem são constituídos em uma “coerente estruturação”, mas são relacionados, liquefeitos, são fluídos. Os “entre lugares” de dispersão do sujeito[ii], podem ser “capturados”, mesmo que provisoriamente, nessa conceituação de Rosa Maria Bueno Fischer (2001):

“[…] Não estamos diante da manifestação de um sujeito, mas sim nos defrontamos com um lugar de sua dispersão e de sua descontinuidade, já que o sujeito da linguagem não é um sujeito em si, idealizado, essencial, origem inarredável do sentido: ele é ao mesmo tempo falante e falado, porque através dele outros ditos se dizem” (FISCHER, 2001, p. 207).

Nesse sentido, pensando no(s) discurso(s) pedagógicos que circulam e operam nos contextos da instituição escolar, em consonância a Garcia (2001) os mesmos:

“[…]  são  práticas,  são  tecnologias,  mistos  de  poder saber e de técnicas que têm efeitos produtivos e práticos sobre os sujeitos a que se dirigem e os objetos de que tratam. Seus efeitos vão além de um tipo de  violência  simbólica  que  a  sociologia  crítica  da  linguagem  e  da  cultura costuma  atribuir  aos  signos.  Os  discursos  instituem  campos  de  objetos, concorrem  na  produção  de  formas  de  subjetividade,  estabelecem diferenciações,  presenças,  exclusões,  saberes  e  verdades  acerca  de  como pensar,  ser  e  agir,  quando  os  indivíduos  estão  investidos  de  certos  papéis sociais e formas de autoridade” (GARCIA, 2001, p.31).

A conceituação de poder, que aqui “coloca em jogo relações entre indivíduos  (ou  entre  grupos)”  (FOUCAULT,  1995,  p.240), que nas tramas discursivas da/na escola, se negociam e excluem mutuamente. No entanto, aqui se faz necessário explorar o que seria essa noção de discurso que não mais determina totalmente relações e posições de sujeitos em uma superestrutura e nem desloca o analista para fora da ideologia. Nesse sentido, Fischer (2001)[iii] ao tentar oferecer elementos para uma discussão teórica e metodológica sobre o conceito de discurso em Michel Foucault, faz um instigante convite para a desconstrução do já “treinado” olhar, enquanto analistas do discurso:

“[…] tentar desprender-se de um longo e eficaz aprendizado que ainda nos faz olhar os discursos apenas como um conjunto de signos, como significantes que se referem a determinados conteúdos, carregando tal ou qual significado, quase sempre oculto, dissimulado, distorcido, intencionalmente deturpado, cheio de“reais” intenções, conteúdos e representações, escondidos nos e pelos textos, não imediatamente visíveis. É como se no interior de cada discurso, ou num tempo anterior a ele, se pudesse encontrar, intocada, a verdade, desperta então pelo estudioso”.

Em relação ao discurso pedagógico, as teias de relações de poder na escola, pressupõe uma relação de  forças:    identidade(s)  e  diferença(s). Operam sob diferentes  origens  sociais,   diferentes “bagagens”  culturais entre  os discentes,  entre  os próprios docentes  e  é claro, entre a relação discente-docente, seja em seus diferentes aspectos de posições de classe social, etnia, gênero, sexualidade, raça e nacionalidade. Na  escola  o  poder-saber,  expressão  utilizada  por  Michel  Foucault,  circula  de forma que “não existe relação de poder sem a constituição de um campo correlato de saber, assim como não existe saber que não pressuponha e constitua relações de poder” (SILVA, 2000, p.91). E ainda:

“[…] não há relação de poder sem resistência, sem escapatória ou fuga, sem inversão  eventual,  toda  a  relação  de  poder  implica,  então,  pelo  menos  de modo  virtual,  uma  estratégia  de  luta,  sem  que  para  tanto  venham  a  se superpor,  a  perder  sua  especificidade  e  finalmente  se  confundir” (FOUCAULT, 1995, p.248).

De tal modo, é com essas e tantas outras problematizações, que se vem pensando os desafios da escola na contemporaneidade, pois muito já se avançou em termos de “oxigenar” as discussões referentes aos deslocamentos das noções de sujeitos e suas posições nas tramas do discurso, mas quanto às negociações referentes ao discurso pedagógico, há um “intenso e contingente” trabalho pela frente.

Considerações, por ora, Finais

Sob a credencial interpretativa de ordem qualitativa e cunho pós-estrutural, pode-se considerar que o argumento articulador, aqui proposto, de que os sujeitos são efeitos dos discursos e do poder; A escola, compreendida como um espaço social de antagonismos, em que crenças e pontos de vistas diversos se negociam e excluem mutuamente é efeito de poder saber em uma complexa trama discursiva.

Sem esgotar as possibilidades interpretativas das questões problematizadas nesse ensaio, cabe agora, ao leitor, (re)pensar a partir de sua posição-sujeito, os aspectos que lhe são produtivos.

Referências

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.

FISCHER, Rosa Maria Bueno. Foucault e a Análise do Discurso em Educação. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/cp/n114/a09n114.pdf (Site acessado em 14 e 15/11/2014).

FOUCAULT, Michel. O sujeito e o poder. In: RABINOW, P. e DREYFUS, H. Michel Foucault: uma trajetória filosófica, para além do estruturalismo e da hermenêutica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, p.231-249, 1995.

GARCIA CANCLINI, Néstor. Culturas Híbridas: Estratégias para Entrar e Sair da Modernidade/ Néstor García Canclini. Tradução Heloísa Pezza Cintrão. Ana Regina Lessa; tradução prefácio à 2. Ed. GênesSs. 4 ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo. 2013. – (Ensaios Latinoamericanos, 1).

GARCIA,  Maria  Manuela  Alves.  O  sujeito  emancipado  das  pedagogias  críticas. Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 26, n.N. 2, p. 31-50, 2001.

SILVA,  Tomaz  Tadeu da.  Teoria  cultural  e  educação:  um  vocabulário  critico.  Belo Horizonte: Autêntica, 2000.

TORRES SANTOMÉ, Jurjo. Currículo escolar e justiça social: o cavalo de Tróia da educação/ Jurjo Torres Santomé; tradução: Alexandre Salvaterra; revisão técnica: Alvaro Hipolito. – Porto Alegre: Penso, 2013.

*Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Pelotas/UFPel. Email: gabkehler@gmail.com

[i] Sobre identidades hibridizadas ver Néstor Garcia Canclini (2000) em Culturas Híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. Disponível em: http://pt.calameo.com/read/002628419d6442f1908e8 (Site acessado em 14/11/2014).

[ii] Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/cp/n114/a09n114.pdf (Site acessado em 14/11/2014).

[iii] Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/cp/n114/a09n114.pdf (Site acessado em 15/11/2014).

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