Margarete Hülsendeger
Todos vós, que amais o trabalho desenfreado (…), o vosso labor é maldição e desejo de esquecerdes quem sois.
Friedrich Nietzsche
Já dizia o poeta, “Tão bom morrer de amor! e continuar vivendo…”. Como tema de um poema essa ideia parece perfeita, mas amar com loucura não é uma prática das mais saudáveis. E não importa qual o objeto desse amor. Se não se consegue estabelecer alguns limites corre-se o risco de esquecer ou deixar de lado outras partes, igualmente importantes, da vida. Logo, em termos românticos, esse ideal de dedicar-se 24 horas do dia ao que se ama parece maravilhoso; no entanto, em geral, sentimentos desse tipo, independente do que os poetas possam dizer, acabam se transformando em alguma espécie de obsessão doentia, difícil de controlar.
Se você chegou ao fim do parágrafo anterior pode estar pensando que se trata de mais um texto sobre as emoções extremas que o amor é capaz de despertar. E você não está errado. A diferença é que o amor sobre o qual vou escrever não é o dos poetas, mas daqueles que se dedicam a um trabalho ou, se preferir, a uma atividade profissional.
Em 2014 completa-se 10 anos do surgimento da expressão worklover, em uma tradução livre, “amante do trabalho”. Os worklovers seriam pessoas completamente apaixonadas pela sua profissão ou pelo trabalho que exercem. Os que ficaram surpresos poderão perguntar, “Mas existem pessoas que desenvolvem sentimentos “amorosos” pelo trabalho?”. Muitas e, segundo os especialistas, a cada dia o número aumenta.
O criador dessa palavra foi o professor e psicólogo social paulista Wanderley Codo, que desde os anos 80 pesquisa o envolvimento das pessoas com a sua atividade profissional. Segundo ele, existiriam duas razões determinantes para o aumento do número de worklovers nos próximos anos: as pessoas estão reinventando suas profissões (o elevado número de autônomos é uma evidência desse fenômeno) e a informática está tornando muitas atividades profissionais “mais divertidas”.
Worklover seria, então, um sinônimo para workholic? Não!
Para os psicólogos, o primeiro estaria associado a emoções mais positivas como gratificação pessoal, prazer e felicidade de estar fazendo o que se gosta; o segundo é o grupo dos estressados, ou seja, das pessoas que têm dificuldade de lidar com a pressão, sempre tentando atingir metas absurdas e com isso sendo suscetíveis a desenvolver problemas de saúde como perda de memória e doenças cardiovasculares.
Um lembrete importante: os especialistas não estão 100% seguros de que um grupo pertença ao lado “negro da força”, enquanto o outro faz parte dos “jedis”. Na verdade, mesmo um amor imenso pode levar a excessos que comprometem a saúde. Assim, é preciso se perguntar: “Amo tanto o meu trabalho a ponto de não me preocupar com meus amigos ou familiares?”. Ou ainda: “Estou tão mergulhado nos ‘prazeres’ de minha profissão que esqueço a existência de um mundo além dela?”. Se a resposta for positiva a ambas as perguntas é necessário refletir sobre o assunto. Esse comportamento não é algo a ser estimulado. Afinal, a dedicação excessiva ao trabalho (prazerosa ou não) pode ser um indicativo de uma defesa psíquica. Defesa contra algum tipo de dor, como a passagem do tempo ou até mesmo a perda de quem se ama.
Então, como ficamos? Ser um worklover é bom ou é ruim?
Como acontece com todas as questões que envolvem o comportamento humano, não existem respostas conclusivas ou fechadas. Tudo vai depender de como cada indivíduo gerencia a sua vida e, principalmente, de que forma suas atitudes afetam o seu bem estar e o de quem está a sua volta. Contudo, não há dúvidas quanto ao fato de que amar o que se faz é muito bom, principalmente, porque passamos a maior parte de nosso tempo no trabalho.
Há uma frase de Carl Jung que define bem o meu pensamento: “A felicidade perderia seu significado se ela não fosse equilibrada pela tristeza”. O problema reside justamente aí: encontrar o ponto exato desse equilíbrio. E não se enganem: essa não é uma tarefa simples. Pelo contrário. É um exercício semelhante a andar em uma corda bamba, onde qualquer deslize pode gerar mais dor e ansiedade. Ame, então, o que você faz, mas sem esquecer que além do trabalho existe todo um mundo a ser vivido e valorizado.