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Avaliação Institucional: O SEAP/RS Como Elemento De Regulação

Avaliação Institucional: O SEAP/RS Como Elemento De Regulação

Itaara Gomes Pires*[1]

José Edimar de Souza**[2]

Sônia Maria Oliveira da Rosa***[3]

Resumo

Itaara Gomes Pires – Mestre e doutoranda em Educação na UNISINOS. Bolsista do Observatório de Educação INEP/CAPES

A investigação tem objetivo de analisar o SEAP – Sistema Estadual de Avaliação participativa junto aos docentes pertencentes ao 39º núcleo do CPERS-Sindicato enfatizando um viés da realidade sob a perspectiva dos docentes da zona sul de Porto Alegre. Adota teoria crítica como referencial teórico e metodologicamente a análise de conteúdo. Destaca como resultados parciais que o SEAP não se configura como um instrumento de regulação menos dirigista e de menor controle, ainda que se nomeie participativo.

Palavras-chave: avaliação institucional,  regulação, educação pública, qualidade em educação.

Resumen

La investigación tuvo como objetivo analizar la SEAP – participativa Sistema de Evaluación de Estado junto a los profesores pertenecientes a 39 núcleos Unión CPER haciendo hincapié en un sesgo de la realidad desde la perspectiva de los docentes en la zona sur de Porto Alegre. Adopta la teoría crítica como un análisis de contenido teórico y metodológico. Sin resultados parciales de la SEAP no califica como un instrumento de regulación de control menos intrusivo y menos, incluso si el nombre participativa.

Palabras-clave: evaluación institucional, la regulación, la educación pública, la educación de calidad.

José Edimar de Souza – Mestre e doutorando em Educação na UNISINOS. Bolsista CAPES/Proex. Integra o Grupo de Pesquisa- Educação no Brasil: memória, instituições e cultura escolar (EBRAMIC).

Introdução

Escola para todos é o discurso mais propalado pelo Estado. O direito de ter acesso à escola, quando absorvido pelo Estado-Nação incorporou o discurso liberal, que na atualidade associa-se a gestão democrática. A educação como um direito agrega a discussão sobre o processo de ampliação do acesso à escola. Nesta esteira, observa-se a frequente discussão que associa um declínio qualitativo no atendimento educacional quando este passa a incorporar uma parcela da sociedade que outrora estava excluída do processo educativo.

 Carlota Boto (2005) identifica esse processo de evolução a partir do desenvolvimento de três gerações: a primeira seria aquela que considera o momento em que todos adquirem a possibilidade de acesso à escola pública; a segunda seria aquela caracterizada pelo salto qualitativo do ponto de vista do direito ao acesso, momento histórico que passa a contemplar, pouco a pouco, o atendimento a padrões de exigência voltados para a busca de maior qualidade do ensino e a última se refere à fase de consagração dos direitos de escola, quando os currículos e orientações políticas passam a representar atendimento que contempla justiça distributiva, ou seja, atendimento aos grupos sociais reconhecidamente com maior dificuldade para participar desse direito subjetivo universal.

A educação como um direito de terceira geração responde à emergência do debate contemporâneo relativo à diversidade dos seres humanos e evidencia a necessidade de se questionar sobre as estratégias de governo construídas com o intuito de, ampliado o acesso à educação, garantir que independente da idade que os sujeitos ingressem na escola, possam usufruir de condições que possibilitem o sucesso na aprendizagem, assegurando uma educação de qualidade.

No Rio Grande do Sul (RS), sob a premissa de buscar o desenvolvimento da educação de “qualidade social”, aqui entendida como contraponto à “qualidade” de viés mercadológico, foi regulamentado pelo governo estadual, gestão 2011-2014, através do Decreto 48.744/2011 o Sistema Estadual de Avaliação Participativa do Estado do Rio Grande do Sul – SEAP/RS. (SEAP, 2013).

Nesse sentido, nosso objetivo com este estudo, mesmo que de modo provisório, é analisar o processo regulatório pelo qual foi implantar o SEAP/RS junto aos docentes da rede pertencentes às escolas que compõe o 39º núcleo do CPERS-Sindicato, enfatizando desse modo, uma nuance da realidade, sob a perspectiva dos docentes da zona sul do município de Porto Alegre. Tendo como referencial teórico a perspectiva histórico crítica, Saviani (2005), pretendemos conhecer e analisar este sistema de avaliação participativo instituído pela Secretaria de Educação do RS levando em consideração o contexto de influência das políticas neoliberais.

Sônia Maria Oliveira da Rosa

A análise de documentos estrutura-se a partir de Bacellar (2011) especialmente quanto à reconstrução do contexto e significado que necessitam ser considerados na produção de um trabalho de História. Além disso, reconhecemos como argumentam Corsetti e Luchesi (2010, p. 473) que os documentos são “plenos de relações de poder, de jogos de sentido e significação, construídos e preservados no tempo […]”.

A institucionalização do SEAP

            A demanda pela educação básica tornou-se uma face da crescente vinculação da educação ao desenvolvimento econômico de determinada região. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) calcula o Índice de Desenvolvimento da Educação (IDEB) a partir da equação que combina o desempenho dos alunos nos exames nacionais Prova Brasil ou Saeb (5º e 9º ano do ensino fundamental e por amostragem 3º ano do ensino médio). Esse índice vincula taxas de aprovação, reprovação e abandono.

Nesse sentido, o Rio Grande do Sul sofre com o baixo IDEB tanto em relação à federação quanto à própria região Sul do país. Nos anos finais do ensino fundamental em 2011, o estado do RS atingiu a média de 3,8 e não se equiparou à meta estabelecida pelo Ministério da Educação e Cultura (BRASÍLIA, 2010) de 4,3; demonstrando certa estagnação em relação aos anos anteriores, como se observa no quadro abaixo:

Quadro 1- índice do IDEB Ensino Fundamental

Ano Índice do IDEB Ens. Fund.
2005 3,5
2007 3,7
2009 3,8

Fonte: Elaborado pelos autores, para este estudo, 2014.

Se os índices não apresentaram melhora qualitativa de aproveitamento para o Ensino Fundamental, em relação ao ensino médio, o RS em sua região sofre o índice mais baixo ainda. Em 2009 atingiu a média de 3,4 ficando muito atrás de Santa Catarina, com aproveitamento de 4,3 e do Paraná, que foi de 3,9.

A análise de documentos referentes ao desempenho do Estado do RS permitiu realizarmos as primeiras constatações. Concordamos que tais índices não dão conta da complexidade do processo de aprendizagem e, por isso, não explicitam as condições de aquisição de conhecimento. Também ao nos debruçarmos sobre os documentos que se referem ao Programa de Governo, gestão 2011-2014, destacamos a ênfase dada na concepção de educação  pautada na qualidade social como direito de cidadania e como diretriz, traz o tópico “Democratização e Qualidade do Ensino com Cidadania”. Este item contempla quatro eixos estratégicos: qualificação e democratização da gestão; valorização profissional; modernização tecnológica e recuperação física da rede estadual de ensino e reestruturação curricular da educação básica e formação continuada.

Nossa análise, com o presente estudo é focarmos a discussão no eixo da qualificação e democratização da gestão, na qual a Secretaria de Educação do RS desenvolveu um sistema próprio de avaliação institucional: o SEAP. Esse sistema pretende explicar com maior nitidez os números apontados pelo IDEB e tem como objetivo principal estabelecer e viabilizar um conjunto de indicadores fundamentais aplicáveis por meio de uma metodologia participativa, que favoreça a produção de esforços coletivos na efetivação de uma escola de qualidade social e ajude na tomada de decisão necessária na área da política educacional do Estado; capaz de superar suas limitações constatadas.

Neste sentido, o governo do estado do RS aposta que a partir do SEAP/RS os índices de aprendizagem e as práticas pedagógicas das instituições públicas escolares possam apresentar melhores resultados. Além disso, como afirma o governador Tarso Genro “[…] vai possibilitar uma profunda revolução na base da educação e na construção da qualidade da educação nas escolas estaduais.” (SEDUC/RS, 2013,p.1).

SEAP/RS: elemento de avaliação e regulação institucional

         A avaliação como todos os elementos que compõem a complexidade escolar é decorrente de um processo histórico, que não cabe à explanação neste trabalho. No entanto, para o momento, destaca-se que a avaliação, de um modo geral, ao contrário do que foi apresentado por diversas gerações como um mecanismo de controle e regulação, atualmente vem adquirindo características de um processo nuclear de gestão que visa a atuação de seus partícipes na promoção da chamada  qualidade social da educação através do autoconhecimento de suas fragilidades para além do reducionismo dos dados estatísticos.

         Diante do questionamento sobre os recursos financeiros destinados à educação e dos parcos resultados obtidos nas avaliações em larga escala, a população do estado do RS suscita dúvidas relativas à eficácia da gestão de governo e, de certa forma, exige uma aferição cada vez mais minuciosa do ensino oferecido.

Assim, frente à difusão da política de “accountability” que, de um modo amplo, corresponde à “prestação de contas” dos atores envolvidos no sistema educacional diante do desempenho atingido e demonstrado através da comparação entre as instituições, o que se observa é uma crescente imputação de responsabilidade única aos docentes pelos parcos índices apontados nas avaliações de larga escala. Pois, não negando a necessidade das avaliações, convém ressaltarmos que a “accountability” tende a não levar em consideração os desníveis socioeconômicos e a própria construção cognitiva prévia dos alunos. Além disso, destacamos que a vida cotidiana das escolas é um espaço complexo, onde as condições materiais e subjetivas refletem em outras lógicas e práticas, por vezes distintas, dos planejamentos de gabinete.

O SEAP/RS (2013) entendido como um instrumento de avaliação participativa também pode revelar intenções e racionalidades que se expressam numa falsa negação de controle, mesmo ao se propor democrática e participativa. Em relação à utilização desse sistema de avaliação, do ponto de vista da gestão administrativa, Graça Simões complementa, “[…] têm funções simbólicas de legitimação da autoridade e axiológicas ou de transmissão de valores, logo implicam opções políticas”, (SIMÕES, 2007, p.41); e pode ser entendida como uma ação reguladora do Estado.

Para depurarmos o entendimento sobre regulação recorremos a Barroso (2005), que entende a regulação como “modernização” da administração pública pautada pelas intervenções do Estado e que de certo modo é mais flexível na definição dos processos e rígida na avaliação da eficiência e eficácia dos resultados.

Neste sentido, constatamos que o termo regulação se expressa agregado à concepção de promover medidas políticas administrativas na educação mais centradas no sucesso dos resultados. Uma justificativa de cunho político também usado a respeito de políticas de privatização que, em última análise, visam “libertar a sociedade civil” do controle rígido do Estado, promovendo maior eficácia na obtenção dos resultados desejados.

Diante da única experiência de aplicação do SEAP, desde a sua instituição no estado do RS, o que ficou exposto[4]¹ foi um processo de “ficção”. Artesanalmente construída em cada escola de acordo com as suas possibilidades de tempo, configuração da comunidade na qual a escola está inserida e recursos humanos disponíveis para responder à exigência de preenchimento do SEAP feita pela Secretaria de Educação/RS. Portanto, a ideia de um sistema de avaliação participativo está longe de concretizar-se na prática. Talvez haja a necessidade de desenvolver outros dispositivos, como a melhor remuneração aos docentes, para dar sentido real à ampla avaliação da instituição escolar, a fim de garantir uma qualidade social na educação.

Considerações finais

Ao retomar, entendemos que o processo de constituição de medidas de descentralização e de crescente aumento da autonomia escolar ocorrido, particularmente na última década, contribuiu com o surgimento de novos modos de regulação. O Estado tende a perseguir a qualidade da educação, e particularmente no estado do RS, com a gestão de governo (2011-2014) visualiza-se o interesse na chamada qualidade social sem, contudo, desprender-se de um controlo sobre os resultados. Concluímos provisoriamente que o SEAP/RS mesmo assentado em uma perspectiva democrática e autônoma pode render-se aos fins de um mero instrumento de controle de resultados.

Concordamos que as políticas educacionais, também as que objetivam avaliar os sistemas de ensino, apresentam tanto controle e autonomia quanto estabilidade e risco. Contudo, o grau de benefício concreto a todos os envolvidos vai depender da capacidade de intensificação e potenciação da relação entre os recursos econômicos e uma nova lógica mais aproximada ao campo da justiça social.

Referências

BACELLAR, Carlos. Fontes documentais. Uso e mau uso dos arquivos. In: PINSKY, Carla Bassanezi. (Org.). Fontes históricas. 3ª. ed. São Paulo: Contexto, 2011.

BARROSO, João. O Estado, a Educação e a Regulação das Políticas Públicas. In: Revista Educação e Sociedade, Campinas, v. 26, n.92, p.725-751, Especial. Out/2005.

BOTO, Carlota. A educação escolar como direito humano de três gerações: identidades e universalismos. Educ. e Soc, São Paulo. v. 26 nº 92, 2005, p. 777 – 798.

BRASÍLIA. Ministério da Educação. Documento Referência. Conferência Nacional de Educação – O PNE na articulação do sistema nacional de educação: participação popular, cooperação federativa e regime de colaboração. Brasília: MEC, 2010.

CORSETTI, Berenice.; LUCHESE, Terciane Ângela. Educação e instrução na Província do Rio Grande do Sul. In: GONDRA, José Gonçalves.; SCHNEIDER, Omar. (Org.). Estado e instrução nas províncias e na corte imperial. Vitória: EDUFES, 2010, p. 453-485.

DECRETO Nº 48.744, de 28 de dezembro de 2011. Institui o Sistema Estadual de Avaliação Participativa do Estado do Rio Grande do Sul – SEAP/RS. Aces. 07 de ago. 2013. <http://www.al.rs.gov.br/filerepository/repLegis/arquivos/DEC%2048.744.pdf>.

SAVIANI, Dermeval. Pedagogia histórico-crítica. 9. ed. Campinas: Autores Associados, 2005.

SEAP/RS. Sistema Estadual de Avaliação Institucional Participativo – RS, 2011. Aces. 06 de ago. 2013. <http://www.educacao.rs.gov.br/dados/seap.pdf>

SEDUC/RS. Página de Notícias: Governo do Estado lança Sistema Estadual de Avaliação Participativa. Aces. 06 ago. 2013. <http://www.educacao.rs.gov.br/pse/html/noticias_det.jsp?PAG=3&ID=9952>.

SIMÕES, Graça Maria Jegundo. A Auto-avaliação das escolas e a regulação da ação pública em educação. Sísifo. Revista de Ciências da Educação, n.04, Lisboa- PT, 2007, p. 39-48.

Itaara Gomes Pires: Vice-diretora no Colégio Estadual Cônego Paulo de Nadal, de Porto Alegre. Possui artigos científicos publicados em eventos da área educacional, como: PIRES, Itaara Gomes. Educação e Reestruturação Produtiva: equação complexa. In: IV Seminário Nacional de Pesquisa em Educação, 2012, Santa Cruz/RS. III Seminário Nacional de Pesquisa em Educação – Políticas e formação de professores, 2012. v. 1. p. 1-10. Contato: itaarapires@gmail.com

José Edimar de Souza: Especialista em Educação na Fundação Escola Técnica Liberato Salzano Vieira da Cunha, de Novo Hamburgo. Possui artigos publicados em eventos científico da área da educação e em revistas, como: SOUZA, J. E. Civilizar O Rural?: Memórias De Práticas Em Torno Da Aula Pública Municipal No Morro Dos Bois Novo Hamburgo/RS (1933-1952). Revista HISTEDBR On-line, v. 13, p. 18-30, 2013. Contato: profedimar@gmail.com

Sônia Maria Oliveira da Rosa: Gerente do “Programa de Qualificação e Valorização da Educação Municipal”, na Secretaria Municipal de Educação de Canoas. Possui artigos científicos publicados em eventos da área educacional e capítulos de livro como: ROSA, S. M. O.  Formação continuada dos professores da EJA: ressignificando a prática. In: SCHEIBEL, Maria Fani.; LEHENBAUER, Silvana. (Orgs.). Saberes e Singularidades na educação de jovens e adultos. 1ª ed. Porto Alegre: Mediação, 2008, p. 163-168. Contato: soninhamusical@terra.com.br

Como citar este artigo: Documento Eletrônico (ISO)

PIRES, Itaara Gomes.; SOUZA, José Edimar de.; ROSA, Sônia Maria Oliveira da.  Avaliação Institucional: O SEAP/RS Como Elemento De Regulação. Rev. P@rtes. [online]. Nº de páginas: …., Vol:… Janeiro de 2014. Disponível….

[1] *Mestre e doutoranda em Educação na UNISINOS. Bolsista do Observatório de Educação INEP/CAPES.

[2] **Mestre e doutorando em Educação na UNISINOS. Bolsista CAPES/Proex. Integra o Grupo de Pesquisa-  Educação no Brasil: memória, instituições e cultura escolar (EBRAMIC).

[3] ***Mestre e doutoranda em Educação na UNISINOS. Bolsista do Observatório de Educação INEP/CAPES.

[4]1 Esta constatação tem uma amplitude restrita às escolas que compõem o 39º núcleo (zona sul Porto Alegre) do CPERS-Sindicato. Ficou evidente apenas através de conversas informais de diferentes diretores e representantes de escolas presentes nas reuniões do sindicato.

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