Grandes atrações PIRANI
Aparecida Luzia de Mello*
Quem tem mais de 50 anos certamente lembrar-se-á deste slogan: “PIRANI, a gigante de São Paulo”, ou “PIRANI, a Gigante do Brás” e do programa de televisão da extinta TV Tupi “Grandes Atrações PIRANI”.
Lembranças quase apagadas a parte, o sonho daquela garota, desde criança era trabalhar nas lojas PIRANI! Ela sequer conhecia a loja, mas assistia ao programa na TV, preto e branco, da casa da vizinha.
Toda vez era a mesma coisa; dormia e sonhava, sonhava que trabalhava lá!
Ela que aos 9 anos já cuidava de crianças, quando fez 10 anos foi trabalhar numa fábrica clandestina de perucas, aos 11 anos entrou numa fábrica de componentes para rádio e aos 13 anos e 8 meses candidatou-se a uma vaga na loja de seus sonhos – PIRANI.
No dia da entrevista soube que só contratavam jovens acima de 14 anos. Ela não teve dúvidas, preencheu a ficha alterando o ano de nascimento e saiu de lá com a lista de documentos a serem apresentados no DP (departamento de pessoal, hoje RH) e a autorização para trabalhar que deveria ser assinada pelos pais.
Os detalhes se perderam, mas uma coisa ficou cristalizada em sua memória. Sua ousadia…
Ao tentar tirar a Carteira Profissional de Menor, teve que se apresentar ao Juiz, acompanhada da mãe, pois ainda não tinha 14 anos, e inocentemente pediu ao Meritíssimo Sr. Dr. Juiz que além da autorização para a emissão do documento mandasse falsificar sua idade. O Juiz, surpreso, quis saber o porquê de tal pedido.
Ela toda sorridente lhe disse:
-: consegui emprego na “PIRANI, a gigante de São Paulo”. Mas só tenho 13 anos e a empresa só contrata quem tem no mínimo 14 anos, mostrando a ele a lista de documentos, as fotos 3×4 e a autorização assinada pelos pais.
O Juiz olha para a mãe, vê a carência da família, olha para a garota, uma menina, uma criança ainda – 1,45 m de altura e 38 kg, tão empolgada pra trabalhar e ajudar a família, e, certamente penalizado, pois não viu maldade naquele ato, assina a autorização da emissão do documento e lhe diz que a idade teria que sair correta, mas que ela não se preocupasse, pois a empresa a contrataria.
Dito e feito! Carteira entregue, contratação feita. Também pudera, ninguém conferiu os documentos, afinal era mês de novembro e só para a seção de brinquedos, onde ela trabalharia tinha 60 vagas para serem preenchidas imediatamente. Claro que, como todo ano acontecia, após o natal ia (quase) todo mundo para o olho da rua. Naquele ano apenas 5 continuariam empregados.
Ela caiu nas graças do gerente geral e foi escolhida. Ficou entre os 5 melhores funcionários e ganhou a vaga permanente.
Foi transferida para o setor de roupas infantis, na divisão de recém-nascidos onde se vendia fraldas, babadores, cobertores, etc.
A garota, com sua simplicidade, pediu ao gerente que autorizasse criar um espaço para demonstração de berços, carinhos e andadores, criando um ambiente propício as futuras mamães. Uma vez que estes objetos eram vendidos somente na seção de móveis, em outro andar.
O gerente gostou da ideia, a menina então pediu mais, pediu bonecos para vesti-los e coloca-los dentro dos berços. Ele querendo ver no que ia dar, autorizou.
Deu tão certo que o faturamento de moveis infantis dobrou. Os lençóis, colchas e roupinhas expostas também. Ele autorizou que ela passasse a vender ali mesmo os moveis infantis e ganhasse comissão sobre tudo que fosse vendido!
Meses depois ela já tinha o maior salário de casa, superando inclusive o salário do pai, que era um humilde lixeiro da prefeitura de São Paulo.
Ela encerrou esta viagem ao passado dizendo:
-: por muitos anos, continuei sonhando com a loja onde trabalhei na Avenida Celso Garcia. Nos sonhos via-me subindo na escada rolante, ora enfeitando o setor, ora ouvindo e cantando músicas de natal ou de carnaval como acontecia nas épocas festivas, via-me atendendo clientes… Depois de muito tempo os sonhos foram rareando, rareando até deixarem de acontecer… Mas a beleza da loja e a alegria que sentia naquela época até hoje estão em minha memória!
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* Mestre em Políticas Sociais com especialização em idoso.
Email: cidamell@uol.com.br