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Seguindo no trem azul

Estava deitado no sofá, enfrentando a onda de calor repentino, dormitando e ouvindo uma seleção de sucessos do Roupa Nova, banda que surgiu em 1980, e mantém até hoje sua formação original, composta por Paulinho, Serginho Herval, Nando, Kiko e Cleberson Horsth.

            Eles entoavam “Seguindo no trem azul”:

“Confessar

Sem medo de mentir

 Que em você

Encontrei inspiração

Para escrever…”

            Olhos entreabertos viram um vulto na poltrona a minha frente, sem camisa, bigode e cabelos grandes, já grisalhos e uma latinha de Bhama na mão.

            – Ô, cara! Acende meu cigarro.

            Era sem dúvida nenhuma, o espírito do meu amigo, Du Venerando, atraído pelo festival de músicas do conjunto que  mais vezes promovera em Lavras, num vídeo perfeito, em que pareciam sair da tevê LED para o ambiente da sala.

            E começou a falar de arranquinho, como era seu hábito, contando-se as aventuras que enfrentara para trazer grandes shows no recém-inaugurado Ginásio Poliesportivo do LTC.

            – Eu trouxe o RPM – ele disse e que era a maior banda do rock brasileiro.

            Pensei em lhe dizer que na atualidade o que estava fazendo sucesso era o talsertanejo universitário, com muitas duplas que faziam sucesso e levavam três vezes mais pessoas aos shows atuais do que os antigos sucessos de antigamente.

            – Você se lembra como transformava a FM Rio Grande, em “Rádio Roupa Nova” ou “Rádio RPM” na semana que antecipava o evento? – me perguntou.

            Um carro de campanha política passou com o som altíssimo o que fez que sorrisse e sua imagem se desvanecesse, ficando apenas sua última imagem e sua voz:

– Vou bater uma bolinha – e com a raquete de tênis sumiu definitivamente.

De tanto conversar com ele sabia que detestava a política partidária, num tempo que lhe cabia carregar um equipamento de som mastodôntico para todos os lugares onde haveria comício e não adiantava tentar discutir nada com o pai.

– Traíram o “velho” – ele dizia justificando para mim a derrota do pai, Leonardo Venerando, considerado sempre como candidato invencível.

Du Venerando  cumpriu também, por alguns anos, a missão de erguer um palanquinho de madeira, na Padaria Rocha, seu “point” preferido, contratar os músicos do Demá e um veículo qualquer que servisse de transporte para os foliões que chegavam de fora para desfilarem na Banda do Funil.

Finalmente, o que era uma brincadeira familiar cresceu tanto que acabou tendo a necessidade de se institucionalizar, o que foi o seu fim.

Daqueles tempos ficaram apenas as lembranças trazidas por uma criatura vinda do mundo dos sonhos e que solfejava:

“Confessar

Sem medo de mentir

Que em você

Encontrei inspiração

Para escrever…”

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