“O BICHO-PAPÃO VAI TE PEGAR!”
Margarete Hülsendeger
Todos os homens têm medo. Quem não tem medo não é normal; isso nada tem a ver com a coragem.
Jean-Paul Sartre
Essa frase foi definida por especialistas, em matéria publicada no jornal[1], como sendo o erro mais comum cometido por pais, quando o tema é a educação dos filhos. De minha parte, só posso dizer que concordo plenamente! Não há pior erro do que infundir temores sem sentido nas crianças. Aliás, o assunto da matéria era exatamente esse, os medos infantis.
No mesmo texto, um psicólogo e psicanalista – Dr. Júlio Cesar Waltz –, ao ser questionado sobre o assunto respondeu: “Como os pais devem agir? Isso é que não sei. Tenho muito medo dessa pergunta, porque é uma pergunta para ninguém ter de pensar”. Gostei da resposta e por dois motivos: primeiro, o terapeuta admitiu também sentir medo e, segundo, reconheceu a relação desse medo com o fato de não existirem respostas prontas para esse tipo de pergunta.
Mesmo não sendo uma especialista no assunto, compreendo que os medos da infância são de uma natureza especial, diferente dos adultos, e, portanto, precisam ser tratados com todo o cuidado. Porém, também acredito que o sentir medo é parte importante das emoções que constituem o ser humano. Eu tenho vários e diferentes medos, desde os mais sérios – como perder alguém que amo –, até os mais ridículos – “morrer” de medo de baratas. E não adianta racionalizações do tipo “todos um dia têm de morrer” ou “baratas são apenas insetos”. Não adianta! O medo permanece e, em alguns momentos, até mesmo me paralisa.
Alguns poderão argumentar que os medos dos adultos são “mais reais” do que os das crianças. Será?
Para um menino ou menina de quatro anos o bicho-papão é tão real quanto a barata é para mim. Medo é medo. Ele não pode ser explicado pela lógica e, muito menos, diminuído, não importa qual a idade que se tenha.
É claro que conforme crescemos e amadurecemos vamos aprendendo a “lidar” com eles. Um psicanalista diria que, na verdade, não lidamos, mas trocamos. Os monstros infantis são substituídos pelo medo da doença, da violência, do abandono e da morte. O bicho-papão transforma-se no terror de perder um ente querido em um acidente de trânsito. Todos esses medos nos mantêm, muitas vezes, insones, exatamente como acontecia quando éramos crianças.
No entanto, o mesmo Dr. Júlio Cesar reconheceu não ter nenhuma solução milagrosa para aliviar as angustias dos pais. Segundo ele, quem deseja respostas prontas não quer pensar. Pura verdade! Infelizmente, a educação dos filhos não é uma “tarefa” que venha com manual de instruções. Aliás, não há receitas prontas para quase nada na vida. Só experimentando é que saberemos se vai dar certo ou não.
É óbvio que existem exemplos a seguir. Pessoas que antes de nós cometeram os mesmo erros – e acertos – e, portanto, já têm uma ideia do que irá acontecer. O problema é que não podemos pautar a nossa vida pela experiência dos outros. E a responsabilidade de criar um filho é uma dessas experiências. A mãe, a tia, a avó ou a amiga até podem opinar, mas na hora H quem vai decidir somos nós e somente mais tarde é que saberemos se o que fizemos estava certo ou não.
De qualquer maneira, reitero minha ideia inicial: incutir medo nas crianças não é o melhor caminho para educar. A vida já tem terrores suficientes esperando por nossos filhos para que coloquemos outros mais em suas cabeças. Meu filho, como todas as crianças, também teve a sua cota de bichos-papões, é normal. Nós, seus pais, sempre nos esforçamos em lidar com eles da melhor maneira possível: deixando uma luz acessa em seu quarto ou acudindo em seu auxílio quando um pesadelo o assustava. Contudo, sei que no futuro isso será cada vez mais difícil, pois ele, assim como eu, precisará enfrentar seus próprios medos, mesmo que seja o de uma simples (e nojenta) barata.
[1] Jornal Zero Hora – Caderno “Meu filho” – 05 de março de 2012.
HÜLSENDEGER, Margarete Jesusa Varela Centeno . O BICHO-PAPÃO VAI PEGAR!. REVISTA VIRTUAL PARTES, SÃO PAULO, , v. 10, p. 3 – 4, 18 out. 2012.