Prof. Dr. Angelo Zanaga Trapé
Coordenador da Área de Saúde Ambiental
Coordenador do Programa de Monitoramento de Populações Expostas a Agrotóxicos
Departamento de Saúde Coletiva
Faculdade de Ciências Médicas-Unicamp
Membro do CCAS – Conselho Científico para Agricultura Sustentável
Em Dezembro de 2011 a ANVISA, divulgou os resultados do PARA, Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos Na divulgação feita em rede nacional pela mídia a ANVISA informou que foram realizadas análises em 2488 amostras de diversos produtos da hortifruticultura para variados ingredientes ativos(i.as.)que compõem os agrotóxicos.
Do total das amostras analisadas segundo a ANVISA, 28% ou seja, 694 apresentaram-se insatisfatórias sendo o pimentão o principal alimento com maior índice de amostras insatisfatórias, perto de 91%.
Para entendermos o significado do parâmetro “insatisfatório” da agência e podermos interpretar os resultados de maneira científica é preciso que a base da avaliação seja a metodologia científica em Toxicologia( disciplina da Ciência que estuda os efeitos dos agentes químicos em geral nos seres vivos).
A metodologia em Toxicologia tem como princípio básico para qualquer substância química( medicamentos, produtos industriais, metais pesados, agrotóxicos), a relação DOSE=RESPOSTA, ou seja para haver uma resposta nos organismos vivos seja ela benéfica ou não é necessário haver a absorção de uma dose capaz de determinar alguma alteração do organismo boa ou ruim.
A Toxicologia moderna ainda mantém o ensinamento de Paracelsus, médico belga que iniciou os conhecimentos científicos nessa disciplina há mais de 500anos: “ A dose faz o remédio, a dose faz o veneno”. Portanto não é qualquer dose ou resíduo de uma substância química, no caso os agrotóxicos, que pode ser capaz de determinar alterações prejudiciais nos seres humanos seja de curto , médio ou longo prazo. A Clínica e a Epidemiologia em Toxicologia nos ensinam isto.
No caso dos alimentos, as agências internacionais que regulam níveis de resíduos de substâncias químicas em alimentos ingeridos “In natura” ou processados estabelecem há muitas décadas valores , níveis aceitáveis dessas substâncias( conservantes, corantes, realçadores de sabor, agrotóxicos) sem causar danos à saúde humana pelo consumo cotidiano desses alimentos durante a vida .
Para os alimentos analisados pelo PARA, o parâmetro que deve ser respeitado pela agência reguladora ANVISA para que uma amostra seja “satisfatória” ou “ insatisfatória” deve ser o limite máximo de resíduos de ingredientes ativos( i. as.) em um determinado alimento, os chamados LMRs, abaixo dos quais não há preocupação em termos de saúde pública.
Voltando aos resultados do PARA de 2010, temos que 28% das amostras ou seja 694 foram consideradas “insatisfatórias” pela agência, porém quando analisamos cientificamente os dados vemos que deste total, somente 42 ou 1,7% das 2488 amostras tinham algum resíduo acima do parâmetro aceito internacionalmente, o limite máximo de resíduo, LMR. A maior parte 605 amostras ou 24,3% eram detecções de i.as. não registrados para aquela cultura mas com registro para outras culturas no país.
Avaliando os alimentos realçados pela agência e pela mídia, como os mais “contaminados” temos o seguinte:
1º) Pimentão- segundo ANVISA, 91% de 146 amostras “insatisfatórias”, porém 84,9% com detecção de i.as. não registrados para a cultura, mas abaixo dos LMRs quando comparadas com os valores estabelecidos para culturas semelhantes. Amostras com detecção acima do LMR-0,00% segundo o relatório da ANVISA
2º) Morango- segundo ANVISA, 64,3% de 112 amostras “insatisfatórias”, porém 51,8% com detecção de i.As. não registrados para a cultura, mas abaixo dos LMRs quando comparadas com os valores estabelecidos para culturas semelhantes. Amostras com detecção acima do LMR- 3 ou 2,7% segundo o relatório da ANVISA.
3º) Pepino- segundo a ANVISA, 57,4% de 136 amostras “insatisfatórias”, porém 55,9% com detecção de i.as. não registrados para a cultura, mas abaixo dos LMRs quando comparadas com os valores estabelecidos para culturas semelhantes. Amostras com detecção acima dos LMRs- 2 ou 1,5%
4º) Alface- segundo a ANVISA, 54,2% de 131 amostras “insatisfatórias, porém 51,9% com detecção de i.as. não registrados para a cultura, mas baixo dos LMRs quando comparadas com os valores estabelecidos para culturas semelhantes. Amostras com detecção acima dos LMRs- 0,00%
5º) Cenoura- segundo a ANVISA, 49,6% de 141 amostras “insatisfatórias”, porém 48,9% com detecção de i.as. não registrados para a cultura, mas abaixo dos LMRs quando comparadas com os valores estabelecidos para culturas semelhantes. Amostras com detecção acima dos LMRs- 0,00%
Este problema é fitossanitário, de extensão de uso de um agrotóxico de uma cultura para outra(s) e não de saúde pública pois o parâmetro que deveria ser respeitado pelo órgão regulador, o LMR não foi ultrapassado. Mesmo nos casos de culturas onde ocorreu detecção de resíduos acima dos LMRs pelo relatório, os valores são muito baixos e tem como unidades de valor miligramas do i.a., por Kilo do alimento. Do ponto de vista de saúde à luz do método em Toxicologia, principalmente DOSE=RESPOSTA, os valores são muito baixos não indicando riscos para a população consumidora desses alimentos em curto, médio ou longo prazo.
Como conclusão, fazendo uma leitura dos resultados do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos-PARA da ANVISA, com base na metodologia científica que deve sustentar qualquer estudo , relatório, norma ou portaria, principalmente de uma agência reguladora nacional, podemos dizer que os alimentos analisados em 2010 mostraram uma adequada segurança química, indicando à população brasileira tranquilidade para o consumo desses alimentos.