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Compreendendo o desenvolvimento profissional docente: reflexões sobre a (trans)formação de professores… de educação fisica

COMPREENDENDO O DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE: REFLEXÕES SOBRE A (TRANS)FORMAÇÃO DE PROFESSORES…DE EDUCAÇÃO FÍSICA

Publicado originalmente em 5 de set de 2011 como www.partes.com.br/educacao/desenvolvimentoprofissional.asp

Patric Paludett Flores* e Hugo Norberto Krug**

Resumo

Este estudo traz algumas reflexões em relação à formação de professores, a qual faz parte do desenvolvimento profissional docente. Neste trabalho procuramos destacar, articulando com a literatura, alguns pontos que nos levam a refletir sobre a seguinte questão: Como o professor pode vir a compreender a sua formação na tentativa de melhorar, em partes, o seu desenvolvimento profissional? Baseando-se nesse questionamento, que buscamos traçar o pensamento que norteia este ensaio.

Palavras-chave: Educação, Educação Física, Formação de Professores, Desenvolvimento Profissional.

Abstract

This study provides some thoughts in relation to teacher training, which is part of the professional development of teachers. This article aims to highlight, articulating with the literature, some points that lead us to ponder the question: How can the teacher come to understand their formation in an attempt to improve, in part, their professional development? Based on this inquiry, we seek to trace the thought that guides this essay. 

Keywords: Education, Physical Education, Teacher Training, Professional Development.

Introduzindo a temática: o desenvolvimento profissional

        Atualmente, a questão da formação de professores vem obtendo destaque nas produções acadêmicas e nos discursos de profissionais ligados à área, bem como, em discussões políticas, na busca de uma melhoria na qualidade do ensino na escola.

         Durante muitas décadas o professor esteve invisível perante os olhos das políticas nacionais, onde as “outras profissões” com seus problemas e preocupações possuíam todos os olhares. Porém, nos últimos anos essa invisibilidade já não está mais tão presente e, desta forma, podemos acompanhar o regresso dos professores ao centro do palco (NÓVOA, 2007).

         Ao escolhermos ser professor, muitas são as certezas que devemos estar cientes, e uma delas é o fato de que estaremos em formação constante e que nosso desenvolvimento profissional vai se dando diariamente. Mas pensando deste modo, devemos compreender bem alguns conceitos sobre esta temática, os quais estão, cada vez mais, em destaque, principalmente, nas falas e discussões do meio acadêmico.

         Podemos perceber que a formação do docente faz parte de seu desenvolvimento profissional, mas não é somente este fato que poderá garantir um desenvolvimento profissional de qualidade. Assim, concordando com Imbernón (2006), destacamos como desenvolvimento profissional, em especial, do professor, não como apenas um desenvolvimento pedagógico, conhecimento e compreensão de si mesmo, desenvolvimento cognitivo ou teórico, mas todos estes fatores ao mesmo tempo delimitado ou incrementado por uma situação profissional que irá permitir ou impedir o desenvolvimento do professor.

Essa perspectiva é mais global e parte da hipótese de que o desenvolvimento profissional é um conjunto de fatores que possibilitam ou impedem que o professor progrida em sua vida profissional. A melhoria da formação ajudará esse desenvolvimento, mas a melhoria de outros fatores (salário, estruturas, níveis de decisão, níveis de participação, carreira, clima de trabalho, legislação trabalhista etc.) tem papel decisivo nesse desenvolvimento (IMBERNÓN, 2006, p.44).

         Deste modo, ao continuarmos com este texto, faremos uma breve reflexão sobre nossa profissão, bem como, sobre nossa formação e/ou (trans)formação¹ ao longo de nosso percurso, seja ele, pessoal ou profissional. Vale ressaltar, que ao discutirmos este ponto, junto discutiremos sobre o desenvolvimento profissional docente, pois a formação de professores é um fator (não o decisivo) deste processo. Desta maneira, podemos refletir sobre a seguinte questão: Como o professor pode vir a compreender a sua formação na tentativa de melhorar, em partes, o seu desenvolvimento profissional?

Refletindo sobre a formação de professores

         Primeiramente, ao falarmos de formação de professores, precisamos ter conhecimento do conceito desta palavra. Segundo García (1999), a formação pode ser entendida como uma função social de transmissão de saberes, bem como, um processo de desenvolvimento e de estruturação da pessoa que se realiza com um duplo efeito de uma maturação interna e de possibilidades de aprendizagem e de experiências do sujeito.

         É importante também termos consciência que esta formação não se dá somente de forma autônoma. Debesse (1982 apud GARCÍA, 1999), distingue formação em três formas: a autoformação (formação independente, onde o sujeito organiza a sua própria formação), a heteroformação (a partir de “fora”, é organizada a formação do sujeito) e a interformação (formação a partir da troca de conhecimentos e saberes entre os profissionais). Desta forma, podemos perceber as diferentes formas que pode-se dar esta formação.

         Contudo, trazemos a formação de professores em destaque, pois como afirma Rodriguez Diéguez (1980 apud GARCÍA, 1999), este tipo de formação nada mais é do que o ensino profissionalizante para o ensino, onde se desenvolve para contribuir na profissionalização dos sujeitos encarregados de educar as novas gerações.

         Neste sentido, podemos destacar a formação de professores em dois níveis: inicial e continuada. A Formação inicial corresponde ao período durante o qual o futuro professor adquire os conhecimentos científicos e pedagógicos e as competências necessárias para enfrentar adequadamente a carreira docente (CARREIRO DA COSTA, 1991). Porém, não se deve achar que a formação inicial ofereça “produtos acabados”, e sim a encarando como uma fase de um longo e diferenciado processo de desenvolvimento profissional (GARCIA, 1992).

         Ainda neste caminho, o mesmo autor destaca a necessidade de se conceber a formação de professores como um “continuum”, pois para manter a qualidade do ensino é preciso criar uma cadeia coerente de aperfeiçoamento, cujo primeiro nível é a formação inicial. Isto significa que o modelo de ensino e, consequentemente, o modelo de professor assumido pelo sistema educativo e pela sociedade tem de estar presente, impregnando as atividades de formação de professores, a todos os níveis. Este princípio implica, também, a necessidade de existir uma forte interconexão entre o currículo da formação inicial de professores e o currículo da formação permanente de professores.

Conhecendo o professor e sua profissão

         No momento em que optamos na carreira de professor, temos que ter consciência que estamos adentrando em um campo de trabalho cheio de surpresas, e estas interferem fortemente na nossa profissão docente.

Porém, antes de pincelarmos alguns destes condicionantes, precisamos falar um pouco sobre profissão. Pois quando conversamos sobre profissão docente, é interessante compreendermos o que é profissão. Imbernón (2006) adota o conceito de profissão como processo, um processo envolvido com as mudanças, as quais esta profissão supostamente deveria proporcionar, de maneira que o profissional, agora nos referindo à docência, estivesse envolvido na emancipação das pessoas.

         Desta maneira, ao vermos o docente como um profissional, devemos estar cientes que isso implica dominar uma série de capacidades e habilidades especializadas que o fazem ser competente em um tipo de trabalho, e que o ligam a um determinado grupo de trabalho organizado e sujeito a controle (SCHON, 1992 apud IMBERNÓN, 2006).

         Também podemos destacar além dessas habilidades e capacidades específicas da profissão, outros condicionantes que fazem parte de nossa profissão docente.

         Para Abraham (2000) muitas são as dificuldades que os professores encontram no exercício de sua profissão, onde esta pode ser comparada a um labirinto, o qual corresponde a um caminho difícil de se percorrer até chegar na sua saída. A autora comenta que este símbolo da mitologia pode ser uma realidade encontrada pelos educadores.

         Neste mesmo sentido, destacamos o fato que o sistema escolar é um campo bem diferenciado, em que mobiliza totalmente a relação do eu individual e do eu coletivo. Desta forma, isso demonstra a grande influência da escola na formação da identidade do educador e da sua relação com os demais sujeitos que compreendem este campo educacional (ABRAHAM, 2000).

         Seguindo esta linha, trazemos Arroyo (2009), o qual comenta sobre a constituição do professor atual, onde o autor faz uma comparação entre ensino e educação, em que os professores se vêem mais como docentes do que educadores e a escola como ensino e não como educação.

         Para o mesmo autor o professor foi se constituindo nessa história confusa em que educação e instrução andam tão desencontradas. Observamos que nossa identidade se confunde entre educador e entre docente, e que esses desencontros vão formando nosso papel perante a sociedade, bem como, somos vistos e nos vemos. Compreendemos que a maioria dos professores de educação básica foram formados para serem ensinantes, para transmitir os conteúdos, programas, áreas e disciplinas de ensino.

         Não podemos deixar de comentar a grande desvalorização social dos professores que também interferem na nossa profissão, onde esta crise, em que o professorado enfrenta, sem dúvida, reflete nas salas de aula. Deste modo, também é relevante ressaltar que nos últimos anos vem se agravando ainda mais, o mal-estar docente.

         Esteve (1991) coloca que nos últimos anos, muitas são as mudanças que a sociedade vem passando, e com a escola não é diferente, pois o professor tem que redefinir o seu papel perante esta situação e, isso, muitas vezes, leva o professor a um desencanto, um mal-estar docente, onde o autor emprega essa expressão para descrever os efeitos permanentes, de caráter negativo, que afetam a personalidade do professor como resultado das condições psicológicas e sociais em que exerce a docência, devido à mudança social acelerada.

         Para o mesmo autor, as principais consequências do mal-estar docente são os sentimentos de desajuste e insatisfação perante os problemas reais da prática de ensino, assim ocasionando pedidos de transferência, como forma de fugir desses conflitos; esquemas de inibição, evitando a implicação pessoal com o trabalho executado; desejo de abandonar a docência (realizado ou não); absentismo laboral, como mecanismo de cortar a tensão acumulada; estresse; ansiedade; autodepreciação; autoculpabilização perante a incapacidade da docência; reações neuróticas; depressões, dentre outras manifestações.

         Observando os pontos levantados anteriormente é que buscamos demonstrar, atualmente, como os professores estão se constituindo enquanto profissionais, bem como, a série de fatores que intervêm na profissão docente. Na tentativa de trazer estes fatos que partimos para a sequência de nossa conversa.

O professor reflexivo: buscando possíveis (trans)formações

            Nesta parte do texto, retomamos a questão da importância da formação dos professores qualificada, na tentativa de achar uma maneira de melhorar a formação profissional docente, e deixar este profissional preparado para enfrentar o seu campo de trabalho, o qual sabemos que é bastante subjetivo e complexo.

         É de nosso conhecimento, que a formação inicial deve, ou ao menos deveria dar um bom suporte para a nossa profissão, que indiferente da disciplina, é ser professor. Mas o que podemos relatar dessa formação é que aprendemos apenas os conteúdos que serão ensinados e como ensiná-los, mas, muitas vezes, esquecemos de compreender aspectos básicos de nossa profissão: alunos, colegas, pais, nossa prática, etc. Esquecemos de estabelecer uma relação do todo, da comunidade que estamos envolvidos, que iremos trabalhar. Esses fatores são indispensáveis para nossa profissão e nos ajudam a compreendermos esta profissão complexa e que ultimamente está sofrendo, assim como toda a sociedade, grandes mudanças (IMBERNÓN, 2009).

         Conforme Esteve (1991), ao escrever sobre a formação de professores, o autor coloca que é importante que os cursos preparem os docentes para enfrentarem essas mudanças, onde é preciso fazer um planejamento preventivo que retifique erros e incorpore novos modelos no período de formação inicial e, também, articular estruturas de apoio aos professores de modo que possam ajudá-los, onde a formação permanente deve construir-se a partir de uma rede de comunicação, de modo que haja uma reflexão sobre os sucessos e as dificuldades dos professores.

         Contudo, não podemos deixar de considerar o que coloca Nóvoa (2007), o qual diz que a maneira que encontramos as formações continuadas não está sendo o suficiente, pois apenas realizá-las sem ao menos saber o porquê de fazê-las, não é a maneira mais correta de se resolver os problemas docentes. Desta forma, o autor acredita que os momentos significativos para que ocorra essa formação, são os espaços de trabalho coletivo através de diálogos e partilha das práticas dos próprios professores, buscando trabalhar com as necessidades pessoais e profissionais dos mesmos.

          Desta forma, a formação de professores reflexivos, que buscam investigar, compreender e relacionar suas práticas com o meio em que está envolvido, com certeza dá suporte a profissionais que conseguem entender e lidar com essas transformações que nossa sociedade vem sofrendo e, assim, enfrentam melhor essas situações que são comuns em sala de aula, pois há uma diversidade de alunos, uma comunidade escolar diferente e, colegas professores com pensamentos diferentes. E isso, muitas vezes, se não compreendidas, podem levar nossa profissão ao caos.

         Quando falamos em professores reflexivos, não são apenas aqueles professores isolados, são professores que pensam em conjunto, no coletivo, que entendem que ao compartilharem seus sucessos e fracassos, é uma maneira de estarem buscando alternativas para melhor entender o ensino e, assim, tentar melhorá-lo. Pois o professor que pensa em sua prática, sabe melhor interpretá-la e, principalmente, sabe o porquê de realizá-la.

         Compreender a sua realidade é um importante elemento para que possamos melhorar nossa educação. E ao fazermos isso, principalmente no coletivo, podemos buscar novas alternativas para o sucesso do ensino, sabendo que é necessário sermos flexíveis e dinâmicos no processo de formação e desenvolvimento profissional.

Considerações finais: uma possível interpretação

        Desta maneira, concordando com Nóvoa (2007), acreditamos que o trabalho de formação deve estar próximo da realidade escolar, bem como, dos problemas sentidos pelos professores, pois muito se diz o que devemos fazer, mas na prática não chegamos nem perto. Precisamos romper com essa situação e ir mais além destes discursos muito lindos nas falas. É necessário de imediato que possamos começar essa mudança e encarar os problemas docentes com suporte concreto.

        É pensando deste modo que podemos entender a importância de sermos professores que refletem sobre suas práticas, que compreendem o seu papel perante a educação e, principalmente, conhecem o ambiente em que estão inseridos.

        Assim, podemos, em partes, buscar melhoras no nosso desenvolvimento profissional. Onde, quem sabe, conseguir atingir todos os fatores que correspondem a este processo, qualificando, cada vez mais, este desenvolvimento do professor e assim, talvez, melhorar nosso sistema educativo, bem como, tudo que o envolve.

Referências

ABRAHAM, A. El universo profesional del enseñante: um laberinto bien organizado. In: ABRAHAM, A. (Org.). El enseñante es también una persona. Conflictos y tensiones em el trabajo docente. Barcelona: Gedisa, 2000. p.23-32. [Original editado em Paris, 1984].

ARROYO, M.G. A humana docência. In: ARROYO, M.G. Ofício de Mestre. Imagens e auto-imagens. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 2009. p.50-67.

CARREIRO DA COSTA, F.A.A. Caracterização da intervenção pedagógica de dois grupos de professores com níveis de sucesso distintos no ensino de uma técnica desportiva. In: BENTO, J.; MARQUES, A. (Orgs.). As ciências do desporto e prática desportiva. Porto: Universidade do Porto, 1991. p.329-348.

ESTEVE, J.M. Mudanças sociais e função docente. In: NÓVOA, A. (Org.). Profissão professor. Porto: Porto Editora, 1991. p.93-124.

GARCÍA, C.M. A formação de professores: novas perspectivas baseadas na investigação sobre o pensamento do professor. In: NÓVOA, A. (Coord.). Os professores e sua formação. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1992. p.51-76.

__________. Estrutura conceitual da formação do professorado. In: GARCIA, C.M. Formação de professores. Para uma Mudança educativa. Porto: Porto Editora, 1999. p.15-68.

IMBERNÓN, F. Formação docente e profissional. Formar-se para a mudança e a incerteza. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2006. p.119.

__________. Una nueva formación permanente del profesorado para un nuevo desarrollo profesional y colectivo. Revista Brasileira de Formação de Professores, v.1, n.1, p.31-42, maio, 2009.

NÓVOA, A. S. O regresso dos professores. Conferência: Desenvolvimento profissional de professores para a qualidade e para a equidade da aprendizagem ao longo da Vida. Lisboa, Parque das Nações – Pavilhão Atlântico – Sala Nónio, 27 e 28 de Setembro de 2007. Disponível em: http://escoladosargacal.files.wordpress.com/2009/05/regressodosprofessoresantonionovoa.pdf

 

Nota

¹ Utilizamos este termo para relacionar às mudanças que podem ocorrer com o professor ao longo de sua formação permanente.

* Licenciado em Educação Física CEFD/UFSM; Especializando em Educação Física Escolar PPGCMH/CEFD/UFSM; Mestrando em Educação PPGE/CE/UFSM. E-mail: patricflores_12@hotmail.com

** Doutor em Educação e Doutor em Ciência do Movimento Humano. Professor Associado do Departamento de Metodologia do Ensino e do Programa de Pós-Graduação em Educação MEN/PPGE/CE/UFSM. E-mail: hnkrug@bol.com.br

 

Como citar este ensaio:

FLORES, P.P.; KRUG, H.N. Compreendendo o desenvolvimento profissional docente: reflexões sobre a (trans)formação de professores…de educação física. P@rtes. Xxxxxxx.

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