Crônicas Margarete Hülsendeger

Muletas psicológicas

MULETAS PSICOLÓGICAS

Margarete Hülsendeger

 

Margarete Hülsendeger é Física e Mestre em Educação em Ciências e Matemática/PUCRS. É mestra e doutoranda em Teoria Literária na PUC-RS

Quem não precisou de um ombro amigo pelo menos uma vez na vida que atire a primeira pedra. Com certeza, esse não é o meu caso. Ao contrário. Reconheço que só consegui superar muitos momentos complicados porque contei com o apoio e o carinho de pessoas amigas. Sem elas ainda estaria perdida em verdadeiros “buracos negros” criados, na maioria das vezes, por mim mesma.

Portanto, quem diz que se vira bem sozinho ou que não precisa de ninguém está mentindo. Pior. Está se enganando. Como dizia o poeta inglês John Donne, “Ninguém é uma ilha em si mesmo. Cada um é uma porção do continente, uma parte do oceano”. Contudo, é importante não confundir precisar com depender, pois nesse caso também estaremos mentindo e nos enganando.

Existem pessoas que há muito tempo esqueceram a sensação de caminhar com as próprias pernas. Elas não conseguem tomar decisões, dependem dos outros para praticamente tudo e, se formos analisá-los, descobriremos que são indivíduos com uma autoestima baixa e, portanto, emocionalmente fragilizados. Ter algo ou alguém – drogas, álcool e até um marido – que lhes tire o poder de decisão representa um alívio e um conforto.

O dependente emocional sempre se vê como uma pessoa incapaz e indigna de confiança. Sente-se permanentemente constrangido, pronto a abrir mão de quaisquer sonhos ou aspirações próprias. Além disso, é fácil de manipular, pois pauta a sua vida apenas em função do que os outros pensam e querem.

Assim, precisar e depender são dois verbos diferentes não só na conjugação, mas, principalmente, no seu significado. Você pode precisar da pessoa amada, porém, isso não significa que deva depender dela. O amor não deve ser compreendido como uma forma de sujeição. Quem ama, respeita a individualidade e estimula a independência da pessoa amada. Do mesmo modo os amigos. Eles são uma parte importante na vida de qualquer pessoa normal e devemos nos esforçar em conservá-los. No entanto, se eles estão longe ou ocupados demais para nos dar atenção, isso não deve ser motivo para sustos ou angustias infundadas.

Contudo, desvencilhar-se das chamadas “muletas psicológicas” não é tarefa fácil e muito menos rápida. É necessário vencer o medo, recuperar a autoestima e saber-se capaz de superar obstáculos aparentemente intransponíveis. Essas são atitudes que levam tempo para serem cultivadas, principalmente se a pessoa acostumou-se a transferir para os outros as decisões que caberiam a ela tomar. No entanto, querendo ou não, a busca pela autonomia e a autodeterminação são fundamentais para quem deseja sentir-se bem e dono do seu próprio destino. É como diz Hermann Hesse, em seu livro Demian, “Sempre é bom termos consciência que dentro de nós há alguém que sabe tudo.” E é esse alguém que devemos estar sempre prontos a ouvir e seguir.

De minha parte, posso dizer que amo meus amigos e familiares, mas não dependo deles para seguir em frente com a minha vida. Ouço seus conselhos, respeito suas opiniões, mas no final, é sempre minha a última palavra. Afinal, como iremos aprender se não nos arriscarmos? O risco faz parte da vida; no entanto, só o experimentaremos se acreditarmos que somos capazes de acertar mesmo quando insistimos em fazer as escolhas erradas.

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