Necessidades Sanitárias: Doenças Que Modificam E Transformam O Espaço Urbano De Pelotas (1822-1930)
VIEIRA, Rosana da Silva*
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo discutir a modificação do espaço pelotense através da verificação das necessidades sanitárias do distrito sede. Abordar as questões que modificaram o espaço urbano pelotense tornam-se necessários e úteis enfatizado os fatos mais relevantes que contribuíram para o desenvolvimento da cidade de Pelotas.
Palavras-Chave: Pelotas, Doenças, Espaço Urbano, Necessidades Sanitárias
ABSTRACT
This paper aims to discuss the modification of Pelotas space by checking the health needs of the district headquarters. Addressing the issues that changed the urban Pelotas become necessary and useful emphasized the most significant events that contributed to the development of the city of Pelotas.
INTRODUÇÃO
As mudanças no espaço urbano bem como as evoluções estruturais de Pelotas que ocorreram entre 1822 e 1930 nos ciclos econômicos do charque e da indústria tiveram diversos agentes modificadores, sendo os problemas sanitários um dos mais significativos. Decorrente do crescimento urbano e populacional, a insalubridade e a falta de estrutura sanitária trouxeram para o distrito sede pelotense moléstias que deixaram grande parte da população enferma. Abordaremos neste artigo questões ligadas a saúde, salubridade e higiene como agentes modificadores do espaço e paisagem urbana de Pelotas.
METODOLOGIA (MATERIAL E MÉTODOS)
Como metodologia desta pesquisa será realizada uma revisão bibliográfica e pesquisa na internet buscando materiais relativos aos problemas sanitários e higiênicos que contribuíram de forma significativa na formação e transformação do espaço e paisagem urbana da cidade de Pelotas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Ao analisarmos o processo de produção do espaço e paisagem da cidade de Pelotas durante o período em que o charque sucumbia e a economia diversificada ascendia, houve modificações que, por diversos motivos e necessidades foram surgindo ao longo do processo histórico-geográfico o qual construiu a identidade física, social e econômica da cidade pelotense.
[…] A esse conjunto de técnicas e costumes, construindo o passado socialmente, Vidal denominou ‘gênero vida’, o qual exprima uma relação entre a população e os recursos, uma situação de equilíbrio, destruída historicamente pelas sociedades. A diversidade dos meios explicaria a diversidade os gêneros de vida. (SANTOS, 1991 p. 63)
Suertegaray diz que “o espaço geográfico se forma (no sentido de formação, origem) e se organiza (no sentido de funcionalidade), projetando-se como determinação ou como possibilidade.” (SUERTEGARAY, 2000, p.19). A autora ainda menciona o espaço geográfico como “a coexistência das formas herdadas (de uma outra funcionalidade)” (SUERTEGARAY, 2000, p.19), reconstruindo sequencialmente o presente. Do ponto de vista geográfico, o tempo é o guia que esclarece como o espaço se forma e transforma desde sua origem. Partindo da instalação da estância de José Pinto Martins , Pelotas inicia o processo de desenvolvimento que viabiliza o surgimento do seu espaço urbano nas imediações da atual Catedral São Francisco de Paula, reorganizando seu espaço e paisagem através do surgimento das novas necessidades dos maiores agentes modificadores, ou seja, seus habitantes. Santos, afirma que “o espaço é resultado da ação do homem sobre o próprio espaço, intermediados pelos objetos, naturais e artificiais” (SANTOS, 1991, p.71).
Famílias de charqueadores não alcançavam satisfação de suas necessidades sociais morando nas charqueadas mal cheirosas e insalubres, por esse motivo mudaram-se para o centro da zona urbana iniciando uma nova fase na urbanização pelotense.
Durante este período a saúde de quem morava nas charqueadas ficava a revelia das condições insalubres de vida que a matança e salga de carne promoviam dentro das estâncias, uma vez que, a proliferação de doenças era facilitada pela falta de estrutura salutar. Neste período, os mais vulneráveis eram aqueles que estavam em contato com a falta de salubridade, ou seja, os cativos que, trabalhavam de forma exaustiva na confecção do charque. Simão publicou na obra de Flores (1994) dados do Bispado de Pelotas entre 1822 e 1850 onde, 40,6% dos óbitos ocorriam entre 0 á 10 anos de idade, 16% entre 11 e 20 anos de idade, 21,9% entre adultos de 21 á 40 anos de idade e 10% não consta a idade.
Através dos dados percebemos óbitos ocorreram entre os escravos no período em que suas vidas tinham maior valor de mercado. Simão ainda afirma que a saúde dos cativos urbanos era melhor do que a dos cativos rurais, pois, apesar de explorados, os escravos urbanos tinham condições de procurar formas de sobrevivência menos “pesadas” do que a dos cativos rurais.
O atendimento médico na Santa Casa de Misericórdia de Pelotas era concedido apenas aos negros que eram considerados mais valiosos pelos charqueadores que pagavam pelo tratamento. Mulheres e crianças não recebiam atendimento médico por não terem valor comercial. Saladeiros e suas famílias, também eram atingidos por moléstias, porém, devido ás condições de vida infinitamente melhores a dos escravos, senhores e suas famílias ficavam menos vulneráveis e tinham condições de tratamentos superiores, podendo buscar a cura até mesmo fora do país.
Por volta de 1890, o charque entrou em declínio e a cidade de Pelotas inicia um momento de transição econômica, social e cultural o qual deu novos traços para o espaço e paisagem pelotense. Neste período histórico-geográfico, muitas doenças surgiram em Pelotas.
A tuberculose, em especial foi uma das preocupações mais constante entre a população e seus governantes. Diversos fatores sócio-econômicos entre eles, a falta de moradias com o mínimo de condições de higiene e saneamento bem como a necessidade de atendimento médico adequado formam alguns dos agravantes da proliferação de doenças na cidade. A população com maior poder econômico também foi atingida pelas moléstias e teve que modificar muitos de seus hábitos em nome da erradicação de certas enfermidades.
No século XX, a população urbana era formada na maioria por pessoas pobres que moravam e se aglomeravam em cortiços e arrabaldes da zona urbana, sendo postos à margem da sociedade ficando mais vulneráveis ás moléstias. Descendentes de cativos, ex-escravos ou antigos trabalhadores das charqueadas, tinham poder aquisitivo extremamente baixo, sendo os mesmos considerados miseráveis e ou vagabundos pela nova sociedade pelotense. Intencionando estruturar-se como uma cidade moderna, Pelotas ainda possuía muito forte em seu espaço e paisagem os traços do ciclo saladeiril.
Teorias e melhorias na estrutura urbana foram elaboradas e postas em prática ao longo do tempo sempre intencionando extinguir ou amenizar os problemas sanitários e modernizar a cidade. No distrito sede não havia plano saúde estruturado e o saneamento era precário, então, a partir do início do século XX (até 1930) as questões de saúde e higiene foram trabalhadas de forma mais eficaz. Enfermos com doenças contagiosas foram tratados em locais específicos e isolados para evitar o contágio das moléstias (tuberculose, peste bubônica entre outras), cortiços e vilas operárias eram vistas como locais infectados por haver pouca ou nenhuma condição sanitária e de higiene. Foram criados planos de moradias na tentativa de amenizar ou erradicar as doenças.
Novas casas foram construídas e distribuídas pelo poder público e por empresários para os moradores de cortiços e vilas insalubres modificando mais uma vez os traços do espaço e paisagem urbana pelotense. As novas moradias eram fortemente fiscalizadas pela Polícia Administrativa e pela Polícia Sanitária da cidade.
Esgotos foram implantados pela primeira vez na zona urbana em 1887. Em 1900 abria-se caminho para a ampliação da canalização dos esgotos pelotenses sendo ampliada com o passar do tempo ao passo que as necessidades de melhorias sanitárias foram surgindo. Houve muitas melhorias na estrutura urbana de Pelotas, porém, ainda havia muito a se fazer no que se refere á higiene e controle de doenças. A estrutura urbana estava sendo modernizada e modificada pelos novos hábitos sociais e culturais que também se adaptaram a nova realidade do distrito sede.
O poder público continuou incentivando a criação de novas vilas operárias em locais ainda não ocupados nas regiões periféricas da cidade criando assim a estrutura base da maioria dos bairros atuais. Serviços de asseio e a eletrificação foram implantados para melhorar a vida da população, porém, todos os feitos não foram suficientes, sendo algo constante na história da cidade, passando por diversas administrações, modificações perdurando até os dias atuais transformando e atualizando o perímetro urbano pelotense.
CONCLUSÕES
Seja no período saladeiril ou na nova estruturação industrial, a insalubridade, as diferenças sociais, econômicas bem como a falta de planejamento urbano eficaz, foram para Pelotas, fatores que atuaram diretamente no processo evolutivo da cidade.
Doenças contagiosas atingiram todas as classes sociais mobilizando o poder público e comunidade na tentativa de erradicar o problema. Partindo dos elementos sanitários que formaram transformaram Pelotas durante o período de transição econômica entre o charque e a indústria, através da análise focada na saúde e salubridade urbana, podemos afirmar que o perímetro urbano foi radicalmente criado e remodelado para atender a precisão momentânea da população que habitava Pelotas neste período.
Toda e qualquer intervenção humana no espaço e paisagem tem a finalidade de atender as necessidades da população da cidade. Por esse motivo, concluímos que, problemas sanitários e de saúde pública acompanham o desenvolvimento da zona urbana desde sua gênese até os dias atuais sendo diferenciadas pelas necessidades de cada época. Através do presente artigo, pretende-se incentivar novas pesquisas acerca do tema com a finalidade de buscar novas informações que nos permitam ter um melhor entendimento das transformações e modificações do espaço urbano pelotense.
REFERENCIAS
GILL, Lorena Almeida. O mal do século: tuberculose, tuberculosos e política de saúde em Pelotas/RS. Pelotas: UDUCAT, 2007.
GUTIERREZ, Ester J. B.. Negros, Charqueadas e Olarias: um estudo sobre o espaço pelotense. Pelotas: Editora Universitária/UFPel; Livraria Mundial, 1993.
MAGALHÃES, Mário Osório. Opulência e Cultura na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul: um estudo sobre a história de Pelotas (1860-1890). Pelotas: EDUFPel: Co-edição Livraria Mundial, 1993.
SANTOS, Milton. Paisagem e Espaço. In: Metamorfose do espaço habitado. São Paulo: Editora Hucitec, 1991
_____________. O espaço geográfico um híbrido. In: A natureza do espaço: técnica e tempo. Razão e emoção. São Paulo: Editora Hucitec, 1997
SIMÃO, Ana Regina Falkembach. A saúde do escravo em Pelotas (1822-50). In: FLORES, Moacyr (org.). Negros e índios: história e literatura. Porto Alegre: EDIPUCS, 1994.
SUERTEGARAY, Dirce Maria Antunes (Org.). Espaço Geográfico uno e múltiplo. In: Ambiente e lugar urbano: a Grande Porto Alegre. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2000.
COMO CITAR O TRABALHO: VIEIRA, Rosana da Silva. Necessidades Sanitárias: Doenças que Modificam e Transformam o Espaço Urbano de Pelotas (1822-1930). Pelotas: Revista Virtual Partes. [on-line]. 2010.