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Formação em Ciências: uma questão Cinquentenária

Celso Luis Levada, celsolevada@yahoo.com.br

Miriam de Magalhães O. Levada, miriamlevada@uniararas.br

Ana Laura R.Zeni Beretta, analaura@uniararas.br

Resumo

“Surely You’re Joking, Mr. Feynman!”: Adventures of a Curious Character é um livro com uma coleção de lembranças do físico Richard Feynman, ganhador do Prêmio Nobel. O livro, lançado em 1985, abrange uma variedade de situações na vida de Feynman, incluindo  sua crítica ao sistema de ensino de ciências no Brasil, em 1952. A constatação do professor FEYNMAN parece tão atual, embora já se passaram mais de cinquenta anos, conforme se verifica do desabafo do presidente da ABINEE, em relação a formação de engenheiros. Destaca-se nesse cenário o forte apego aos livros didáticos como referência para os professores e ausência de aulas práticas. Sugere-se a revisão dos conteúdos a ensinar, nas escolhas de assuntos que sejam relevantes às coisas do cotidiano e mais uso de laboratórios.

Abstract

“Surely You’re Joking, Mr. Feynman!”: Adventures of a Curious Character is a book with a collection of memories of the physicist Richard Feynman, Nobel laureate. The book, released in 1985, covers a variety of situations in life Feynman, including his criticism of the system of science education in Brazil, in 1952. The observation of the teacher FEYNMAN seems so current, although it’s been more than fifty years, as evidenced in the speech of the President of ABINEE, for training engineers. Stands out in this scenario the strong attachment to textbooks as a reference for teachers and lack of practical experiments. It is suggested to review the content to teach, the choices of subjects that are relevant to everyday things and more use of laboratories.

Introdução

Uma das conclusões do seminário Tecnologia e Inovação: Desafios na Formação de Profissionais de Engenharia para o Século XXI, promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em 25 de agosto de 2010, em São Paulo foi a seguinte: A formação de engenheiro não atende a indústria brasileira. BARBATO (2010) menciona que “além de formar menos da metade dos engenheiros de que precisa a cada ano, o Brasil tem ainda de enfrentar a disparidade entre a qualificação obtida nas universidades e as necessidades das empresas que procuram um profissional. O meio de resolver o problema é o trabalho conjunto de universidades, empresas e governos. O Brasil forma hoje cerca de 30 mil engenheiros por ano, que correspondem a 4,2% do total de formandos nas universidades anualmente. É muito pouco perto da demanda atual do mercado, de pouco mais de 60 mil profissionais anualmente, concordaram os empresários. Indústria brasileira precisa de 60 mil engenheiros por ano”.

A ORIGEM ESTÁ NO ENSINO MÉDIO

Uma das principais deficiências da educação no Brasil tem início no ensino médio e fundamental. De acordo com TAKAHASHI (2010), cerca de 40 mil universitários conseguiram o diploma em uma das quatro licenciaturas no ano passado. Apesar disso, o contingente é bem inferior aos 100 mil docentes sem formação específica que atuam nessas quatro disciplinas do ensino médio. Em física, por exemplo, se formaram 2.000 alunos no ensino superior em 2009, mas 33 mil docentes estão improvisados no antigo colegial. Constata-se que um grande número de docentes acumula disciplinas para suprir a falta dos profissionais específicos, fato que é reconhecido pelo poder público, sobretudo na área de ciências exatas. É necessário, acima de tudo que os professores utilizem técnicas capazes de tornar as aulas mais atrativas e eficazes. Em muitos países, incluindo o Brasil, os sistemas educacionais estão passando por uma revisão, no sentido de preparar melhor os jovens para o trabalho. A formação do profissional de educação para o terceiro milênio impõe-se, hoje, como um grande desafio aos avanços educacionais. É consenso o reconhecimento da importância da qualificação profissional, em especial, em tempos de globalização e informatização da economia (AQUINO 2010).

MUDANÇAS NA METODOLOGIA?

Para COUTO (2010), o ensino de ciências em todo o mundo vem passando por transformações. Um dos aspectos discutidos é o motivo de um menor interesse por parte dos alunos pelas carreiras científicas em uma sociedade cada vez mais dependente dos produtos dessa ciência. No Brasil, do 6º ao 9º do ensino fundamental, uma disciplina que deveria desenvolver conceitos de uma área integradora como a Ciência Natural encontra-se fortemente ancorada em apenas umas delas: as ciências biológicas. Aspectos como falhas na formação de professores e na produção de materiais didáticos reforçam o quadro dos problemas encontrados no ensino, pois, segundo do Educacenso 2008 são quase 30 milhões de alunos na educação básica que apresentam as piores notas em ciências nos sucessivos testes internacionais como o Pisa (www.pisa.oecd.org). No último relatório PISA o Brasil ficou na 52º colocação em ciências. Resultado da combinação de pais ausentes na escola, baixos salários de professores que tem que trabalhar três turnos e desinteresse dos alunos. HAMBURGER (2007) escreve: “O ensino de Ciências, assim com a educação em geral, precisa ser aperfeiçoado no Brasil. A gestão das redes escolares é deficiente. A formação de professores é inadequada e insuficiente. Os currículos e a metodologia em sala de aula precisam ser atualizados. As ciências podem e devem ser ensinadas, baseadas em investigação, desde as primeiras séries escolares. A divulgação científica em museus e centros de ciência e nos meios de comunicação pode ser um recurso importante para o ensino”. Um país que quer exportar tecnologia tem urgentemente que inverter estes fatos. A revolução de transformar a sala de aula em laboratório, do aprender fazendo, resolvendo situações problemáticas, e principalmente, da autonomia para os estudantes que passam a ser sujeitos de sua própria aprendizagem, por aqui ainda não chegou. Existe, então,  um enorme desafio: a formação adequada de profissionais capacitados a trabalhar em ciências da natureza, durante os quatro últimos anos do ensino fundamental, que devem trabalhar aspectos biológicos, químicos, físicos e ciências da Terra. O problema decorrente do baixo interesse das universidades em investir na formação de professores é amplamente registrado por pesquisas na área de educação (Hamburger, 2007).

UM ENSINO DE CIÊNCIAS CRÍTICO.

Conforme MENEZES (2007): “Tomar o ensino de ciências como a promoção de seu aprendizado é compreender que isso começa por interessar quem aprende pelas ciências, e desenvolver instrumentos teóricos e práticos para investigar e compreender a natureza e as técnicas. Desde processos de consolidado interesse tecnológico, como as diferentes formas de condução elétrica, até a discussão da energética das estrelas, há uma infinidade de temas que fazem ambas as funções, que é estimular a curiosidade e a imaginação e dar visão de mundo e recursos par a vida. Ciência é isso tudo”. Entretanto, durante muito tempo ensino de Ciências, especialmente no que concerne às Ciências exatas, está vinculado à memorização e decoreba, de modo que, há maior ênfase aos recursos do cálculo e resolução de problemas, com algumas analogias conceituais. Uma proposta ideal seria integrar os alunos ao laboratório, pois, a experimentação é de demasiada importância para o desenvolvimento das ciências, especialmente quando acompanhadas de  um discurso crítico.

 CONSIDERAÇÕES FINAIS: UMA CONSTATAÇÃO DE CINQUENTA ANOS

FEYNMAN (2006), premio Nobel em Física, conta em um de seus livros que, quando esteve no Brasil na década de 1950 visitando os melhores institutos brasileiros, ficou estupefato: o bom aluno brasileiro sabia tudo na teoria, mas era incapaz de utilizar seus conhecimentos nas situações mais cotidianas.

Num dado trecho do livro FEYNMAN escreve: “Em relação à educação no Brasil, tive uma experiência muito interessante. Eu estava dando aulas para um grupo de estudantes que se tornariam professores. Esses estudantes já tinham feito muitos cursos, e esse deveria ser o curso mais avançado em eletricidade e magnetismo, equações de Maxwell, e assim por diante. Depois de muita investigação, finalmente descobri que os estudantes tinham decorado tudo, mas não sabiam o significado dos cálculos. Depois participei de uma palestra na faculdade de engenharia. Os estudantes estavam todos sentados lá fazendo anotações e, quando o professor repetia a frase, checavam para ter certeza de que haviam anotado certo. Então eles anotavam a próxima frase, e a outra, e a outra. Depois da palestra, falei com um estudante: “Vocês fizeram uma porção de anotações , o que vão fazer com elas?” – Ah, nós as estudamos, ele diz. Nós teremos uma prova. Então fui a um exame de admissão para a faculdade de engenharia. Era uma prova oral e eu tinha permissão para ouvi-la. Um dos estudantes foi absolutamente fantástico: ele respondeu tudo certinho!  Então, ele calculou. Ele era muito bom. Uma das questões tratava de discussões sobre substância diamagnética. Depois da prova, fui até esse brilhante jovem e expliquei que eu era dos Estados Unidos e que eu queria fazer algumas perguntas a ele que não afetariam, de forma alguma, os resultados da prova. A primeira pergunta que fiz foi: “Você pode me dar algum exemplo de uma substância diamagnética?” Ele disse não. Era uma pena! Eles, pessoas inteligentes, faziam todo o trabalho, mas adotaram essa estranha forma de pensar, essa forma esquisita de autopropagar a “educação”, que é inútil, definitivamente inútil”. A constatação do professor FEYNMAN parece tão atual, embora já se passaram mais de cinquenta anos.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AQUINO, K.M.B.S., EGRESSOS DOS CURSOS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES, disponível em www.fja.edu.br/praxis/documentos/artigo_03.pdf, acesso em 5/9/2010.

BARBATO, H. boletim da  ABINEE Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica, sobre o  Workshop: desafios na formação de profissionais de Engenharia, realizado no dia 25 de agosto de 2010 e disponível em http://www.abinee.org.br/noticias/com13.htm, acessado em 05/10/2010

COUTO, F.P. Revista Interlocução, v.2, n.2, p.15-19, Nov./Dez.2009 /Jan. 2010

FEYNMAN, R. P., O senhor está brincando Sr. Feynman : As Estranhas Aventuras De Um Físico Excêntrico, Editora: CAMPUS,  1ª Edição – 2006        352 pág.

HAMBURGER , E. W.,  Apontamentos sobre o ensino de Ciências nas séries escolares iniciais,  Revista de  Estudos  Avançados,  vol.21 no.60 São Paulo, 2007, artigo acessado em 20/08/2010, disponível no site  scielo.br/scielo.php?pid=S0103-40142007000200007&script=sci_arttext&tlng

MENEZES, L.C. Interessar, Motivar, Criar-três estratégias para o ensino de ciências, revista Ciência em Tela, n.1, jan.2008

TAKAHASHI, F. disponível em www1.folha.uol.com.br/…/794305-aumenta-numero-de-professores

FEYNMAN, RICHARD  e o Ensino da Física no Brasil, artigo acessado em 7/9/2010, disponível em physicsact.wordpress.com/…/richard-feynman-e-o-ensino-da-fisica-no-brasil/

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