Margarete Hülsendeger
publicado em 03/01/2010
Meia verdade é sempre uma mentira inteira
Está comprovado, mentir pode provocar sérios danos à saúde. Algo para o qual nossos pais já nos alertavam quando éramos crianças, tornou-se matéria de estudo cientifico. O mentiroso compulsivo pode provocar sua própria doença.
Porque, então, insistimos em continuar mentindo? Porque falar a verdade, muitas vezes, nos custa tanto?
A explicação da ciência é a seguinte: as mentiras estão associadas à vergonha de admitir fraquezas ou a uma busca por atenção. Em outras palavras, o mentiroso prefere criar histórias sobre si mesmo a ter de encarar a dura realidade de suas limitações. Assim, prefere dizer que festas são chatas a correr o risco de ser excluído. Ou, ainda, inventa que está doente para impedir que outros possam aproveitar esse momento de descontração.
Doentio? Sim. Atualmente o mentiroso compulsivo está sendo considerado um doente mental, passível de tratamento. Inclusive, segundo a psicanalista Nina Furtado, mentiras, mesmo inofensivas, podem ter efeitos colaterais graves em um consultório, pois induzem erros de diagnóstico.
No entanto, será que existe alguém que nunca tenha mentido alguma vez em sua vida? Duvido. Segundo essa mesma psicanalista, uma pessoa, em média, pode mentir até 200 vezes por dia. Não é incrível?! Faça, só como exercício, uma lista das mentiras que você já aplicou em um único dia da sua vida. Será que elas se aproximarão desse número?
De qualquer maneira, se a mentira faz parte de nossas vidas desde sempre, o importante é tentarmos entender em que medida estamos fazendo uso dela. Uma coisa é mentir porque se está com vergonha, outra bem diferente é mentir por compulsão. A primeira pode ser superada encarando-se de frente aquilo que nos envergonha; a segunda é um caso médico que exige tratamento.
Do mesmo modo, é preciso diferenciar aquele que tem mania de mentir porque quer se autoafirmar e daquele que mente para proteger alguém. Esse segundo tipo de mentira, minha avó costumava chamar de “mentira piedosa”. Segundo ela, o objetivo não era fazer o mal, mas evitá-lo. No entanto, aqui também é preciso ter muito cuidado, pois a linha que divide os dois tipos – a mentira boa da ruim – é muito tênue.
Como explicar, por exemplo, para uma criança essas diferenças sem que ela se sinta confusa ou enganada?
Lembro, quando era pequena, dos adultos ficando furiosos quando flagravam qualquer criança em uma mentira. As atitudes iam desde a simples ameaça até ao castigo físico. Contudo, recordo também da mágoa quando descobria que aquilo que em mim era castigado, num adulto era escondido. Como ensinar que mentir é feio, passível de punição, quando a criança observa esse tipo de atitude nos adultos que ela deve respeitar?
Lidar com essa linha fina entre o que é bom e ruim é uma das tarefas mais difíceis no processo de educar. Ela será a diferença entre formar um adulto que irá mentir pelo prazer de mentir e aquele que só fará uso desse recurso em situações realmente necessárias.
Portanto, se você fez o exercício sugerido de listar quantas mentiras você contou hoje e já chegou a marca das 200, acredito que seria bom parar para refletir. Pergunte-se: “porque estou mentindo? Minto para mim mesmo, por que tenho medo de reconhecer minhas próprias limitações? Minto para obter algum tipo de vantagem? Minto para me autoafirmar, acreditando que assim os outros vão me ver de forma diferente? Ou, minto para proteger alguém?” Se você conseguir responder a essas perguntas com absoluta honestidade – sem mentir – com certeza estará dando um passo importante em sua vida. Estará descobrindo em qual categoria de mentiroso você se insere. A partir daí, você decide se quer ou não continuar mentindo. Afinal, como disse no inicio desse texto, está comprovado: mentir faz mal a saúde.