(Autor: Antonio Brás Constante)
Apagão é um assunto que geralmente nos deixa no escuro, sem saber o que está acontecendo, mas logo acaba sendo apagado de nossas lembranças. As explicações sobre os motivos ficam obscurecidas por inúmeras hipóteses mal fundamentadas, e sentimos uma falta de energia geral das autoridades para tratar ou mesmo apurar o assunto (eu mesmo precisei de um empurrãozinho da jovem leitora Letícia Castro de SP, para discorrer sobre este tema. Pensei até em escrever à noite, com as luzes apagadas, para entrar no clima e me inspirar).
No jogo de empura-empura atrás de culpados, muitos costumam pagar pra ver, mesmo que isso custe caro para quem recebe a conta. Ruim mesmo é quando percebemos que somos nós que pagamos, e mesmo assim não conseguimos ver coisa alguma.
O que chama atenção é quando comparamos situações, por exemplo, como no caso da enfermeira que intoxicou onze recém-nascidos aqui em Canoas. Algo monstruoso, direto, insano. O culpado aparentemente está ali. Seu ato atroz facilmente percebido como um ato atroz. No caso de um apagão geral, a quantidade de vítimas é incrivelmente maior, mas parece chocar menos. Os diversos fatos se perdem em um vagalhão de acontecimentos de maior e menor importância. Mas esteja certo de que algumas pessoas presumivelmente morreram (direta ou indiretamente) em decorrência da falta de energia. Outras se acidentaram, outras se tornaram alvos fáceis para meliantes, etc.
O pior é que as causas do apagão são frutos de um efeito dominó de descaso, sobre as necessidades energéticas de toda uma nação (cada vez maior e mais consumista). Apagões de energia, assim como epidemias, e alguns outros tipos de crise, não respeitam governos militares, neoliberais ou populares, justamente porque os governos não respeitam sua periculosidade, não as tratando como prioridades.
Muito bandido que mata hoje, provavelmente já matava em outros governos, assim como não é de agora que muitos políticos enchem os bolsos de seus paletós de grife, feitos sob medida para embolsar dinheiro público. Por que com a crise energética seria diferente? O que falta é energia para se criar medidas que possam resolver estes problemas. A propósito, sabe como acabar com o burburinho sobre o apagão? É fácil, basta começar um novo BBB que no máximo em dois paredões ninguém mais vai lembrar de nada.
As pessoas fecham os olhos para não ver o apagão. Elas fecham as portas para não ver a violência e fecham a cara para não parecerem vulneráveis e serem enganadas. A principal energia que anda faltando no mundo não é elétrica e sim humanitária. Cada vez mais vejo gente apagando valores éticos de suas vidas, ou vivendo na escuridão de seus medos.
Somente espero que desta vez a solução não seja a mesma de 2001 e 2002, no então governo de FHC, quando resolveram combater o problema de falta de energia com racionamentos, e conclamando a população para economizar energia, o que aconteceu depois? Aumentaram as taxas de luz, já que, possivelmente, a referida economia prejudicou o faturamento das companhias de energia elétrica.
Enfim, com tantas alternativas energéticas que temos a disposição hoje em dia, somente espero que governo e oposição usem sua imensa força não apenas para achar culpados ou desculpas, mas para resolver de forma iluminada e eficiente esta situação. Se o pior cego é aquele que não quer ver, o pior paralítico (ou político?), fatalmente, é aquele que não quer agir, prevenir, resolver.
PERGUNTA: O que é, o que é, que ninguém consegue ver quando acontece? APAGÃO NOTURNO.
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