Política Política e Cidadania

Nada de novo sob o pré-sal – Petróleo e os sanguessugas de sempre

Julio Paupitz

publicado em 04/11/2009

www.partes.com.br/politica/presal.asp

Julio Paupitz é Eng. Florestal

Resumo: Noticias importantes passam amiúde despercebidas pela grande imprensa. Ainda, que provenientes de países distantes ou realidades tão diferentes das nossas guardam uma relação visível com os destinos de nosso país. A conspiração recente, envolvendo a Guiné Equatorial, um dos mais pobres países do mundo, os ditadores de turno, mercenários, além dos representantes de interesses indizíveis de grandes corporações é um sinal patético de vulnerabilidade nacional. A denúncia casual de desaparecimento de informação de elevado valor estratégico sobre as reservas do pré-sal lança luz sobre o empenho nunca abandonado das antigas potencias coloniais em assegurar boa parte da tão desejada mercadoria.

Abstract: Important news quite often are not so obvious to the mainstream media, especially when these are coming from different realities and distant countries, in spite of keeping a direct connection with our country and its fate. A recent oil affair nears a conspiracy involving one of most impoverished countries of the world helps to understand this situation. In this case, Equatorial Guinea, its dictators and public officers together with mercenaries and the usual international corporations are key actors in hinting pathetic signs of our vulnerability. The leaking of high-valued strategic information about oil reserves of the “pre-sal” geologic layer sheds light about the never ending ex-colonial powers to ensure their share of the coveted commodity

 

Diariamente muitas noticias escapam de nossos registros. E tudo indica que o fenômeno seja mais recorrente com os distantes fatos africanos, independentemente de quão próximos estejam dos nossos narizes.

Faz pouco tempo, a Folha de São Paulo (18/06/2008) nos informou sobre o julgamento de Simon Mann, cidadão britânico, acusado de participar de uma tentativa de golpe de estado para derrubar o presidente Teodoro Obiang em 2004.

Não fossem as referências a respeito de Mark Thatcher, filho da antiga primeira-ministra do Reino Unido, Margareth Thatcher, como um dos financiadores da frustrada tentativa ficaríamos sabendo ainda menos de mais uma de tantas tristes e despudoradas empreitadas imperiais naquele continente. Nessa ocasião, os tribunais da Guiné Equatorial condenaram 11 estrangeiros à penas de prisão e se contava com a extradição de Mark Tatcher para aquele país rico em petróleo para enfrentar as acusações de promoção mercenária e tentativa de derrubada de governo.

A Guiné Equatorial pertence a uma região que foi repetidas vezes alvo da presença mercenária, e tema de denúncias bem documentadas a partir dos anos 60 na seqüência dos processos de independência africanos.

Supostamente soberana e indecentemente pobre, mas sobejando reservas petroleiras, a Guiné Equatorial é juntamente com a Nigéria, Camarões, Gabão e o arquipélago de São Tomé e Príncipe parte dos sinistros bastidores da guerra do petróleo, envolvendo países, corporações internacionais, agências de inteligência, grupos mercenários, sobrinhos e afilhados de presidentes, etc., tudo a mando dos três primeiros.

Uma olhada mais atenta aos antecedentes da Guiné revela a importância deste antigo porto de escravos destinados às plantações do novo mundo. Logo após sua independência, a jovem nação foi imediatamente presa de um dos mais brutais ditadores africanos. Macias, subjugou o país até inicio do anos 80. Os recursos naturais da região do Golfo da Guiné, e em especial o petróleo desde sempre atraíram a fortemente a cobiça das potências ocidentais Em 2001 se calcula que das novas reservas mundiais de petróleo estimadas em 9 bilhões de barris, 7 bilhões estariam localizadas no Golfo da Guiné e principalmente em espaços territoriais pertencentes à Guiné Equatorial e o arquipélago de São Tomé e Príncipe.

Aos olhos de muitos leitores, inclusive os bem informados, o Sr. Mann era peça de uma trama mirabolante, mais próxima das aventuras de Tintin, o menino prodígio belga ou dos piratas caribenhos do passado. Porém uma leitura em conexão com a história da região e dos interesses imperiais se aprende que a história é bem outra. Os fatos, como vêm sendo expostos, trazem uma riqueza de detalhes que deixam estupefatos a qualquer um, diante da crueza e a ousadia dos representantes imperiais e os gigantes corporativos do petróleo.

Com o desastre da operação encabeçada no “terreno” por Mann, a imprensa londrina passou a denominar tratava o golpe como um “segredo aberto”, alegando inclusive, que o mesmo tinha sido discutido com certa anterioridade até em reuniões públicas do setor de energia na Inglaterra.

Os acontecimentos que levam à prisão de M. Tatcher em Johannesburgo e Simon Mann em Harare, Zimbabue em 2004 tiveram inicio alguns meses antes em Malabo, capital da Guiné Equatorial. Os serviços de segurança sul africanos passaram informações da iminência do golpe aos serviços secretos dos Estados Unidos, Inglaterra e da Espanha, antigo poder colonial na Guiné. Coincidentemente ou curiosamente, estes países não repassaram o alerta ao presidente ameaçado, apesar de suas boas relações com os barões petroleiros americanos.

As estrepolias das grandes empresas ligadas aos antigos interesses coloniais, desde muito tempo foram objetos de reportagens. Nos anos 60, o escritor inglês Frederick Forsyth (Cães de Guerra e o Dossiê Odessa) nos faz lembrar as tragédias da região mediante um apelo dramático em favor do movimento de secessão de uma das regiões da Nigéria. Em Biafra, um de seus livros, Forsyth denuncia a ação das potências coloniais e das grandes petroleiras. O terrível drama de Biafra representou a imagem paradigmática da miséria, crueldade e baixeza humanas.

Como numa visão profética, Forsyth em Cães de Guerra, esmiuça a ação de mercenários a serviço de conglomerados mineiros para a tomada de um país imaginário da África Ocidental, mas que todos reconhecem como a Guiné.

Em um paralelo com o livro de Forsyth, a ação real programada em 2004 é abortada com a apreensão de um avião no aeroporto de Harare, no Zimbabue e de seus 64 passageiros que declaravam-se engenheiros, prospectores e agentes de segurança de empresas internacionais de mineração no Congo.

A sinistra operação contêm os elementos clássicos do teatro das guerras africanas. Por um lado, o presidente deposto no exílio, por outro, um contrabandista de armas, mercenários em espera do golpe final para ficarem ricos além dos interesses indizíveis das antigas potências coloniais representados por “laranjas” e seus instrumentos de ação; “ex-membros” das forças armadas dos países imperiais (mercenários). Esta situação é por demais conhecida, como o são também as promessas de pagamento post-projeto “em espécie”. De acordo com o jornal britânico The Observer, em 2003 Mann assinou um contrato de fachada com um grupo de investidores libaneses aos quais tinha sido garantida uma rica concessão petroleira, assim que Obiang fosse deposto. Ainda

Nesse emaranhado chama atenção o grande número de empresas norteamericanas na região. É notável a presença de corporações como a Amereda Hess e Halliburton, ambas ligadas ao mundo do petróleo, o Texas e naturalmente à quem recentemente deixou a Casa Branca.

Ainda como governador do Texas, George W Bush, obteve um lucro de 15 milhões de dólares com um investimento de 600.000, graças à intervenção de executivos das empresas mencionadas. Halliburton, uma das donas da guerra do Iraque e que foi dirigida pelo vice presidente Dick Cheney, não fica atrás em matéria de transações na região e já foi acusada de pagar uma propina de 180 milhões de Dólares na Nigéria para obtenção de uma concessão para exploração de gás.

As conexões e as dimensões do “imbroglio” africano, trazem à tona uma eventual vulnerabilidade do Brasil, ante a ação de grupos organizados a serviço de interesses corporativos internacionais como no caso da empobrecida Guiné. As evidências de tal possibilidade são muitas e inclusive respaldadas por alguns acontecimentos recentes. Um deles é a súbita presença da quarta frota americana em áreas próximas às águas territoriais brasileiras, e também a ação pouco disfarçada de multinacionais petroleiras em território nacional.

Com o anúncio da descoberta de reservas da chamada camada do pré-sal em janeiro de 2008, chama atenção o supostamente casual roubo de alguns computadores de um contêiner da Petrobrás. É de conhecimento público que a carga do contêiner era vigiada por uma empresa contratada pela Halliburton no estado do Rio de Janeiro. A seqüência dos acontecimentos causa espanto que a Petrobrás tenha confiado guarda de sua carga sigilosa à Halliburton, de tão conhecidos antecedentes. Como no caso da anedota, é como se a fábrica de lingüiça ficasse sob vigilância de um cachorro.

Halliburton é muito conhecida da imprensa nos Estados Unidos, desde mediados dos anos 80, a empresa participa de esquemas de terceirização de funções de logística militar promovidos pelo exército americano.

As atividades da empresa foram exponenciadas durante a administração Bush e com a invasão do Iraque. onde mais do que nunca se confundem as funções da estado invasor com os serviços prestados pelos “contratistas”. A esteira de falcatruas se estende da Colômbia ao Iraque, passando pelo Afeganistão, Paquistão e Guantânamo. Muitos detalhes das operações fraudulentas não somente da Halliburton, mas também de outras organizações como a Dyn Corp estão fartamente documentados pela Auditoria Nacional dos Estados Unidos e no livro The Three Trillion Dollar War do prêmio Nobel em economia Joseph E.Stiglitz e Linda J. Bilmes (Norton, 2008).

Hoje através da perícia policial realizada nos contêineres violados, ficou comprovado o desaparecimento de informação estratégica referentes à bacia de Santos e informações sobre a reserva do Campo de Júpiter. O caso não é o primeiro, já que vários laptops foram subtraídos de residências de pessoal técnico da Petrobrás de acordo com o diretor da Associação de Engenheiros da Petrobrás (AEPET) e ex-engenheiro da área de exploração e produção da estatal, Fernando Siqueira. Segundo Siqueira a ação criminosa detrás do desaparecimento dos computares implica na subtração de dados de 30 anos de pesquisas da empresa brasileira.

Fica difícil entender como a Petrobrás pôde tão facilmente dispor informações de uma riqueza que pertence a 180 milhões de brasileiros.

Julio Paupitz

Eng. Florestal

Curitiba, 17.10.2009

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