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O ensino De História a Serviço da Transformação da Realidade

José Edimar de Souza*

publicado em 01/06/2009 como www.partes.com.br/educacao/oensinodehistoria.asp

 

 

A constituição da pesquisa 


José Edimar de Souza é graduado em História, Especialista em Gestão da Educação, Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional. Acadêmico do curso de Geografia REGESD/UCS. Assessor Pedagógico da SMED/NH- Secretaria Municipal de Educação e Desporto de Novo Hamburgo.

Esta pesquisa é resultado de um estudo de caso qualitativo realizado numa escola pública estadual de Campo Bom onde foram utilizados como instrumentos de coleta de dados, principalmente, entrevistas e observações. O objeto de pesquisa foi à compreensão de como o ensinar e o aprender História nas séries finais do Ensino Fundamental possibilitam a construção de um posicionamento, uma reflexão crítica capaz de produzir conhecimento e aplicá-lo na vida em sociedade. A proposta foi investigar o ensinar e o aprender na prática de História e as mediações exercidas por estas para que os sujeitos se constituam como sujeitos autônomos, capazes de se perceberem como cidadãos.

Para TRIVIÑOS (1987) o materialismo histórico ressalta a força das ideias, capaz de introduzir mudanças nas bases econômicas que as originou. Por isso, destaca a ação dos agrupamentos humanos. Essa ação pode produzir transformações importantes nos fundamentos materiais dos grupos sociais. O Ser social compreende relações materiais dos homens com a natureza e entre si que existem em forma objetiva, independente da consciência.

Partindo do pressuposto que as aulas de História deveriam contribuir para o desenvolvimento de uma consciência cidadã, este aspecto vem sofrendo alterações, principalmente para que os alunos consigam ler sua realidade.  A população da pesquisa foi constituída por um professor de História dos anos finais do Ensino Fundamental e duas turmas: 7ª e 8ª séries, num total de 11 sujeitos. Os sujeitos participantes da investigação foram escolhidos de duas maneiras.  Os alunos contemplados compreendem uma faixa etária de 15 a 31 anos, trabalham durante o dia e estudam a noite; quase todos com um histórico familiar de separação dos pais; são oriundos de classes sociais distintas; um encontro étnico-racial e de gênero que identificam comportamentos fortes em relação a opções sexuais e de hábitos sócio-comportamentais.

Interface: teoria e prática de ensino de História

 

A práxis (ética e política) da poésis refletida nas ações de práxis do professor de História no Ensino Fundamental é observada no sentido de compreender a práxis analisando-a na relação ensino e aprendizagem. Marilena  Chauí (2001) complementa

Se examinarmos as ações humanas, veremos que (…) há uma distinção entre dois tipos de atividades: a atividade técnica (ou o que os gregos chamam de poésis) e a atividade ética e política (ou o que os gregos chamam de práxis) […]. A práxis, porém, é a atividade própria dos homens livres, dotados de razão e de vontade para deliberar e escolher uma ação. Na práxis, o agente, a ação e a finalidade são idênticas e dependem apenas da força interior ou mental daquele que age. (Chauí, 2001, p. 11)

Freire (1996) acredita na educação consciente, de que aprender é tomar consciência de um determinado saber que se encontra em movimento. “Mas, o termo conscientização entendido como diálogo de consciências (…) sempre através da mediação da realidade concreta e na intenção expressa de compreensão crítica e transformação dessa realidade.” (GURGEL, 2003, p.87). Nesse sentido, a prática de história é entendida como meio e luta constante na educação para preparar os homens contra os obstáculos à sua humanização.

 Os jovens que compreendem este estudo são apontados pelo professor como: “agressivos, irresponsáveis, dispersos e desinteressados” (conforme entrevista). Sujeitos indisciplinados que insistem em afrontar professores. Há outros alunos que vagueiam pelo tempo, aparentemente perdidos “não respondem as intervenções do professor” no espaço e acabam se agregando a grupos liderados por aproveitadores que transformam o corpo em desenvolvimento, num corpo “parasita” que necessita da figura do Outro perverso para se projetar. Estes jovens iludidos pela “facilidade das recompensas” com que alcançam seus desejos, se perdem na ideologia dominante e exclusiva. A grande maioria dos adolescentes se envolve em menor ou maior grau com a delinquência, confusão e revolta. Como cita um aluno durante a chamada feita pelo professor. “Fulano não veio, ta namorando a Brytnei”.

Para o professor investigado ensinar é “descoberta pelo instinto, evolução humana. Os elementos da natureza em desenvolvimento” aproximando sua prática metodológica a perspectiva inatista. Quanto à dificuldade de ensinar História percebe que o grande problema com a disciplina seja uma questão de interpretação, bem saber ler, escrever e interpretar. Os alunos, de modo geral entendem que aprendem pela explicação do professor, que para isso é preciso ficar em silêncio, estar atento, que devem perguntar, mas como afirma (AD8-1)**“Ele ri quando os alunos falam, (quando percebe que não o respeita) ele manda para rua, grita”. Ou como afirma (ASD8-1)***“Não adianta ele explicar de novo, ele explica mais difícil”, “eu já expliquei” se referindo a uma nova pergunta feita pelos alunos e  reitera “Ele dá trabalho e é só cópia do livro. Ele fica sentado e não explica, a gente que tem que procurar, são muitas páginas” e como conclui um aluno “Entender não entendi, mas se não tem cachorro caço com gato”.

(…) Educar significa, então, capacitar, potencializar, para que o educando seja capaz de buscar a resposta do que pergunta, significa formar para a autonomia. A escola, no ideal de Sócrates, deveria instituir-se toda ela em torno da autonomia. Seu método: o diálogo. O discípulo é quem deve descobrir a verdade.  (GADOTTI, 1992, p. 9-10)

Autonomia, conforme Piaget (1932/1992) é a condição do indivíduo se dar conta de que é capaz de constituir normas a partir da cooperação. Ele, a partir do princípio da simpatia, é capaz de perceber a reciprocidade espontânea, o que é típico da relação de amizade, e a reciprocidade normativa de cunho social. Já para Moacir GADOTTI (1992) e Paulo FREIRE (1996) educar se relaciona com o dialogar e perguntar constante. Pressupostos para maturidade de pensamento e alcance da consciência individual.

Conforme observações “não há um vínculo entre professor e alunos”, “o professor  não apresenta domínio e segurança para os alunos perguntarem”, o que dificulta o ensino e a aprendizagem de História, bem como da constituição da autoria. Muitos alunos não lembram o que aprenderam. A disciplina que deveria colaborar para que as desigualdades sociais, culturais, históricas fossem amenizadas e capazes de produzir uma realidade mais humana e justa, acaba sendo desprezada pelos alunos, sendo entendida ainda como uma mera repetição, como uma cópia de livros, e pior como uma história que valoriza o belicismo e personalismo de sujeitos.

Considerações finais

 

         Identifico que as aulas de história não colaboram para a libertação dos sujeitos e autonomia de pensamento. O que se percebe ainda é uma prática de ensino de história tradicional positivista, distando de uma produção democrática e cidadã, de um desenvolvimento e salto social, justo e humanitário. A crítica à aula tradicional acaba sendo substituídas pela concorrência do mercado capitalista, as discussões que deveriam versar por uma autoria, por uma organização do pensamento frente à realidade se perdem no cotidiano e o que foi observado é a intensificação das diferenças sociais, humanas, de sexo (preconceitos pelo colega negro, gay…), competitividade e uma “teatralização” da aprendizagem. A falta de mobilidade na condição de ensino e aprendizagem conserva um pacto oculto de que cada um deva bem cumprir seu papel na sociedade tal qual como ela se apresenta, não há um encorajamento para enxergar além daquilo que a ideologia dominante apresenta para estes jovens.

As questões são elaboradas na hora e estas não se relacionam com o conteúdo em estudo, o que dificulta uma participação efetiva. Os alunos fazem atividades diferenciadas e não há uma conexão do grupo, do coletivo com o que é desenvolvido. “É pela atividade produtiva, teórica e prática, que os homens transformam a natureza, criam a ciência, desenvolvem seu pensamento e transforma a si próprios.” (REDIN, 1995, p. 5). O indivíduo na sua realidade é o conjunto das relações sociais que estabelece, e estas são expressões gerais da atividade prática e teórica de determinado modo de produção, de organização do trabalho, como atividade primordial.

Perguntar, dialogar é indispensável para construir aprendizagens e confrontar saberes e conhecimentos da realidade. É necessário que a escola ensine a pensar para que a autonomia e a cidadania se materializem; para que a realidade se transforme; para que uma prática pedagógica mais sincera se constitua. Isto significa romper com as amarras do colonialismo, a tradição empirista e possibilita a elaboração de uma instituição que represente a própria cultura da realidade.

As possibilidades de autoria de pensamento dos alunos que conservam esta característica são pouco aproveitadas pelo professor, principalmente da escola pública estadual, como é o caso deste estudo.  Estas são atravessadas pelo convívio tecnológico. Os alunos manifestam sintoma quanto à falta de autonomia, de participação e das oportunidades para se atreverem, transgridem, fazem um jogo de forças de poder com o professor, que perversamente utiliza sua autoridade para preconizar os alunos, enquanto poderia ser utilizado no debate de ideias e diálogo cidadão. É necessário que haja um líder que enxergue. É preciso fazer mais. É preciso que muito mais de um de nós sustente o desejo de enxergar.

Referências Bibliográficas

CHAUI, Marilena. O que é Ideologia. São Paulo: Brasiliense, 2001;

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996;

GADOTTI, Moacir. Escola Cidadã. São Paulo:Editora Cortez e Autores Associados,1992 ;

PIAGET, J. Le Jugement Moral chez l’Enfant. Paris: PUF, 1932/1992;

TRIVIÑOS, Augusto Nibaldo Silva. Introdução à pesquisa em ciências sociais:  a pesquisa qualitativa em educação. 3 ed. São Paulo: Atlas, 1987.

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* Professor, Graduado em História, Especialista em Gestão da Educação e  graduando em Geografia – REGESD/UCS. Assessor Político-Pedagógico da Secretaria Municipal de Educação de Novo Hamburgo- RS.

**AD- Código identificador de aluno da pesquisa. 8/7 indica a série, D/dificuldade  e o número da indicação.

***ASD- Código identificador de aluno da pesquisa. S/sem dificuldade. 8/7 indica a série e o número da indicação.

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