Marta A.O. Morais
publicado em 14/02/2009
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Resumo
O trabalho tem por objetivo identificar por meio das letras de músicas brasileiras a geograficidade, as manifestações populacionais, o descaso do governo para com seu povo, a cultura do povo e a época em que os fatos ocorrem. A música a ser trabalhada é “Tropicália” de Caetano Veloso.
Palavras chave – música, poder, cultura.
Introdução
No inicio da formação da população do Brasil podemos dizer que foi constituída por dois grandes grupos: os brancos e os não brancos. Nesse inicio de colonização do Brasil recebemos a influência cultural dos portugueses e dos africanos.
Nos dias atuais a cultura norte americana é nítida em nosso país. Essa influência pode ser notada na alimentação, na língua, mas principalmente na linguagem musical e no ritmo é que está explicita.
Da música ou do ritmo musical pode-se perceber a geografia dos lugares, as regiões e até mesmo países podem ser identificados por meio da música. Pode-se considerar “lugar” quando o espaço e o tempo assumem sua identidade carregando toda paisagem ali existente. (Yázigi, 2001,p.189).
Com uma breve interpretação da letra de uma música, consegue-se identificar lugares, regiões, épocas e até mesmo os fatos ocorridos, ou seja, as letras das músicas podem dar referências de localização, os lugares podem identificar as pessoas, e por meio da música pode-se perceber a cultura de um povo.
O Movimento Tropicalista
Entre 1967 e 1968, surge o “Tropicalismo”. Foi um movimento de ruptura que balançou o ambiente da música popular e da cultura brasileira. Os tropicalistas (Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal. Costa, entre outros), procuraram universalizar a linguagem da Música Popular Brasileira (MPB), incorporando elementos da cultura jovem mundial, como por exemplo, a guitarra elétrica. As ideias tropicalistas modernizaram a música e a cultura nacional.
Com as novas informações da época, o tropicalismo renovou a letra da MPB, mas continuaram a seguir as tradições dos grandes compositores da Bossa Nova. As canções tropicalistas faziam uma conjunção do Brasil arcaico e suas tradições, do Brasil moderno e sua cultura de massa, de um Brasil futurista com astronautas e discos voadores.
Durante o período militar no Brasil (1964-1985), ocorre o rompimento com a democracia, a repressão à imprensa, a ruptura aos direitos civis da população e uma ditadura militar onde qualquer tipo de manifestação popular era proibida, restava a música para protestar e criticar o governo. Muitos artistas e políticos nesse período foram exilados e muitas músicas foram proibidas, como “Cálice” que é uma canção escrita e interpretada por Chico Buarque e Gilberto Gil em 1973, na qual percebe-se um elaborado jogo de palavras para despistar a censura da ditadura militar. A canção teve sua execução proibida durante anos no Brasil.
No final dos anos 60, o poeta, compositor Caetano Veloso, lança seu primeiro elepê solo, e o grande destaque desse disco é a música “Tropicália”. A música foi dividida em cinco partes de melodias primárias e iguais, cada uma determinando um par de “vivas”. A composição mostra uma visão crítica e sintetizada da política brasileira e contrapõe valores dessa realidade.
“Tropicália” (1967) Caetano Veloso
Quando diz “aponta contra os chapadões”, faz uma referência a Brasília, capital do Brasil, situada na Região Centro-Oeste., “eu organiza o movimento eu oriento o carnaval eu inauguro o monumento” “carnaval”, como sinônimo de festa anárquica. Na segunda estrofe que fala sobre o “monumento” ele se refere ao Palácio do Planalto, sede do governo federal em Brasília.
“Viva a bossa, sa, sa”, está se referindo a elite carioca.Viva a bossa, sa, sa, viva a palhoça, ça, ça, ça, ça. Nessa frase nota-se que há uma associação fonética entre “palhoça” e “palhaço”, simbolizando o povo brasileiro sendo enganado pelo governo.
Nessa frase: “é de papel crepom e prata”, refere-se às cores e a beleza; “não tem porta”, por isso ninguém pode entrar ninguém pode protestar; “a entrada é uma rua estreita e torta”, é difícil chegar até lá, o caminho é sinuoso, cheio de obstáculos.
“E no joelho uma criança sorridente e morta estende a mão / Viva a mata ta ta”. O “joelho” pode ser o Nordeste brasileiro, observando-se o mapa do Brasil, é no Nordeste que percebemos um joelho dobrado, e é nessa Região que as crianças passam fome, é lá que ficam abandonadas a toda sorte, são feias, maltratadas, e estendem a mão, pedindo ajuda, são crianças esquecidas pela sociedade e pelo governo.
E no refrão, “Viva a mata, ta, ta Viva a mulata, ta, ta, ta, ta” pode-se associar esse fato à morte, que vem no segundo refrão, a repetição da sílaba “ta” pode estar relacionada ao som das metralhadoras, símbolo da morte por meio do genocídio.
“No pátio interno há uma piscina com água azul de Amaralina”, é assim mesmo que se forma o Palácio do Planalto: na Praça dos Três Poderes com uma imensa piscina, mas não pode tomar banho na água azul e cristalina.
“E no jardim os urubus passeiam” “urubus” é referência aos políticos que detém o poder nas mãos.
“Viva Maria, ia, ia, viva a Bahia, ia, ia, ia, ia”. Maria e Bahia fazem referencia ao povo sofrido. Essa repetição oral “ia” se alterarmos a posição das vogais percebe-se um grito de dor: ai, ai, ai, ai. Se o compositor tivesse optado por repetir, na escrita, a sílaba “ai”, a censura cortaria esse trecho, por ficar evidente a crítica ao governo através da dor do povo.
“No pulso esquerdo o bang-bang em suas veias corre muito pouco sangue”, o bang bang também é símbolo de poder; em suas veias corre muito pouco sangue, percebe-se uma crítica à falta de sensibilidade do governante, que não se emociona ao ver a situação em que está seu país.
No final dessa estrofe, “ele põe os olhos grandes sobre mim” aqui há uma demonstração nítida de perseguição, uma pessoa denuncia ser o alvo das perseguições, ele se coloca como um perseguido, uma pessoa que deve se calar, que não tem o direito de criticar, pois estão de olho nele.
“Viva Iracema, ma, ma”. Nessa frase pode-se deduzir dois sentidos para o adjetivo “ma”, primeiro de um governante tirano, de sua índole, à sua visão brutal, egocêntrica, de seu poder. Ao mesmo tempo, é possível notar que a sílaba “ma”, pode ser de mãe, que nos protege, nos acode, nos ajuda quando precisamos. Na última estrofe, as metáforas referem-se ao povo, suas alegrias e tristezas.
“Domingo é o fino-da-bossa segunda-feira está na fossa terça-feira vai à roça”. Depois de uma semana de muita luta, chega o domingo, dia de descanso, de alegria, de diversão.Segunda percebe-se a cultura do nosso povo, pois é dia de luta, de trabalho pesado, de labuta para a sobrevivência da família.A frase também pode indicar oposição entre o governo e o trabalhador que luta para seu sustento.
“O monumento é bem moderno não disse nada do modelo do meu terno”. Monumento moderno faz relação com o presidente, com o poder, não disse nada do modelo do meu terno, não liga para a aparência do trabalhador, para seus problemas.
“Que tudo mais vá pro inferno, meu bem Viva a banda, da, da Carmem Miranda, da, da, da, da Viva a banda, da, da Carmem Miranda, da, da, da, da”. O autor encerra a música com três grandes astros da MPB: Roberto Carlos, que tudo mais vá pro inferno; Ronnie Von viva a banda e a grande Carmem Miranda.
Considerações Finais
A música é clara quanto ao rompimento tradicional da política e da cultura. Nos anos sessenta os músicos tropicalistas buscaram novas ideias, novos valores, novos estilos de vida e demonstraram isso por meio da música, das vestes, da aparência física. Os cabelos longos e armados, com roupas exageradas, eram mensagens de crítica ao tradicional, pois inovaram com a música, com sua poesia cantada.
Por meio da música também se identifica regiões, lugares, manifestações e revoltas populares.
Referências
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil . São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
SILVA, Jorge Luiz Barcellos da. Atlas Geográfico do Brasil: leituras da territorialidade e a construção da brasilidade. 2006. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Pontifícia Universidade Católica, São Paulo.
http://www.dicionariompb.com.br/verbete.asp?nome=Gilberto+Gil&tabela.
http://www4.mackenzie.com.br/fileadmin/Pos_Graduacao/Mestrado/
Educacao_Arte_e_Historia_da_Cultura/
Publicacoes/Volume3/O_movimento_tropicalista_e_a_revolucao_estetica.pdf.
http://www.webartigos.com/articles/6206/1/a-tropicalia-e-a-analise-de-seu-dicurso/pagina1.html.
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Marta A.O. Morais é mestranda da PUC-SP. martha_morais@yahoo.com.br