Gilberto da Silva
publicado em 03/02/2009
Renato lia tudo que podia e que porventura caisse em suas mãos. Ouvia tudo, estava ligado, antenado nas notícias. Assim era. Assim foi.
Belo dia de Sol e lá estava Renato ouvindo coisas absurdas nos canais de televisão. Meditava. Desconfiava. Ansiava. Tinha em sua vida visto muitas coisas que não gostaria de ter visto. Nem ouvido…. Pensava que as vezes tudo não passava de um processo ilusionário, fantasioso. Tentava abstrair-se, fingir-se de mudo, morto.
Em certas noites os pernilongos e ruídos dos televisores vizinhos não permitiam chegar a um sono reanimador. O corpo cansado. A insônia. Tinha sonhos com atropelamentos, desastres, assassinatos. Pensava estar perdido em becos escuros e sujos. Suas atitudes já não convenciam ninguém e nem se convencia com as atitudes alheias. Talvez uma análise, um psicodrama. Um médico de cabeça. Terapias alternativas, mas o máximo que conseguia era encher a cara de cerveja no Bar do Mané da esquina.
Pensava nas cartas que havia enviado a Renata. “Ah! talvez ela já as tenha jogado fora!” pensava. Sempre imaginou ser a vítima, o culpado: das catástrofes, dos ciúmes, das mentiras e do fracasso. Nunca acretidou que o culpado fosse ele.
Preparou certa noite um dossiê com todos os acontecimentos ocorridos em sua vida conjugal e pensou que nunca haveria um dia em que pudesse gritar: sou feliz! Uma coisa era certa: ele estava aflito. Pode ser que com o tempo ele passaria a encarar tudo com naturalidade, mas hoje isto era impossível. Não acreditava em mais nenhum gesto que o reparasse.
Ficou sem falar com Renata durante muito tempo. Não continha a raiva de saber que ela estava em outro lugar, em festas e bares até altas horas da madrugada. Ela comprava roupas e mais roupas. Queria estar bela, chamar a atenção. E Renato, com seus ciúmes, não acreditava que ela queria seus beijos e abraços. Pensava; “ela deve sonhar com outros personagens que não eu…”. Renata devia estar arrependida da relação e ele não conseguia acreditar nesta verdade.
Renato, nos seus raros momentos de lucidez, elaborava reformas em sua casa e em seu comportamento. Mas era necessário uma revolução. Mas que Revolução? Se tudo já não fazia mais sentido em sua alma… Eram dias difíceis para Renato que nem conseguia mais trabalhar direito. Estava péssimo.
Naquele dia Renato não foi trabalhar e ficou em casa ouvindo e vendo as notícias espetaculares da Televisão. Viu o adolescente apaixonado invadir a casa de sua ex-namorada e torná-la refém, prisioneira do seu amor e ódio. Zapeava em todos os canais para ver a cobertura enquanto sua cabeça elaborava seu plano. O seu próprio plano de Revolução!
Queria também a sua vingança. A sua sentença. O seu mandamento final.
Munido com estes pensamentos e crente da sua revolução gloriosa, Renato desceu as escadas que davam ao andar térreo, abriu a porta da sua casa e saiu dando direto ao passeio da rua.
Bordão
“A vida é rir, chorar e viver intensamente.”
Oscar Niemeyer em Veja – 11 de abril de 2001 – pag. 66
Resistiré
(M. de la Calva – C. Toro) cantada por La Calva y Toro (duo dinamico )
Cuando pierda todas las partidas
Cuando duerma con la soledad
Cuando se me cierren las salidas
Y la noche no me deje en paz
Cuando sienta miedo del silencio
Cuando cueste mantenerse en pie
Cuando se revelen los recuerdos
Y me pongan contra la pared
Resistiré erguido frente a todo
Me volveré de hierro para endurecer la piel
Y aunque los vientos de la vida soplen fuerte
Soy como el junco que se dobla pero siempre
Sigue en pie
Resistiré
para seguir viviendo
Soportare los golpes
Y jamás me rendiré
Y aunque los sueños
se me rompan en pedazos
Resistiré
Cuando el mundo pierda toda magia
Cuando mi enemigo sea yo
Cuando me apuñale la nostalgia
Y no conozca ni mi voz
Cuando me amenace la locura
Cuando mi moneda salga cruz
Cuando el diablo pase la factura
O sí alguna vez me faltas tú
Resistiré erguido frente a todo
Me volveré de hierro para endurecer la piel
Y aunque los vientos de la vida soplen fuerte
Soy como el junco que se dobla pero siempre
Sigue en pie
Resistiré
para seguir viviendo
Soportare los golpes
Y jamás me rendiré
Y aunque los sueños
se me rompan en pedazos
Resistiré
A música acima está na parte final do filme Átame! (1989) de Pedro Almodóvar. Nessa seqüência Rick (Antonio Banderas) e Lola (Loles Leon) cantam a canção que escutam no rádio do carro em que Lola fora, junto com a irmã, resgatar o personagem de Banderas. Os dois cantam, enquanto Marina (Victoria Abril) se emociona.
Ouça no YouTube: http://www.youtube.com/watch?v=SU_pPTIBFpU
http://www.partes.com.br/colunistas/gilbertosilva/noticias.asp