Daniele Barizon
publicado em 01/12/2008 como www.partes.com.br/reflexao/pesos.asp
Veritá Effettuale, ou verdade efetiva, é um conceito utilizado por Maquiavel, em O príncipe, para justificar as ações de dominação de um chefe sobre sua nação. Segundo o autor, devemos examinar a realidade como ela é, e não como gostaríamos que fosse, razão pela qual, explica, seria lícito um líder valer-se de quaisquer métodos, inclusive escusos, para manter a ordem e garantir sua soberania. Em resumo, ter “sabedoria para agir conforme as circunstâncias”. Apesar de vastamente criticada, a máxima ainda anda em voga na maioria dos governos. E das mídias, claro.
A pressão exercida por parte da imprensa (atente para a palavra parte), em alguns casos – como, por exemplo, o Satiagraha – quase nos faz crer que determinados profissionais estejam de fato sequiosos de justiça. Não se iluda, leitor. Trata-se, no mais das vezes, de tapas de luvas (em certos embates outros objetos menos delicados) entre girondinos e jacobinos do chamado quarto poder – o que, se não é sempre saudável, ao menos serve para esclarecer, quando cuidamos de peneirar as informações. Questão de pesos e medidas. É melhor julgar o excesso que a falta, não?
Um aparte, pelo visto, é o da PRP 92/07, lei complementar que se ocupa da criação da Fundação Estatal do Direito Privado para áreas estratégicas como saúde, assistência social e meio ambiente, entre outros. Amor e ódio sim, mas apenas entre os principais interessados. Se pesquisarmos sobre o assunto, encontraremos vários vestígios do duelo entre funcionalismo público e publicações governamentais, contra e a favor, respectivamente, de sua aprovação. Os veículos ditos imparciais, entretanto, optaram por transcrever os fatos sem muitos detalhes, ou, mais especificamente, como habitual, sem apresentar de modo satisfatório suas implicações, o que não deixa de ser uma tomada de posição. Foram matérias, via de regra, como essa do Globo (vide link:) que expuseram o tema de forma genérica e disfarçadamente – ou não tanto assim – partidária. Mantendo ao largo a emblemática discussão Estado x Capitalismo (enfraquecimento do aparato estatal, “privatização” de setores-chave, etc.), se a publicação era equitativa, peca por não apresentar algumas das principais contradições entre os argumentos: se por um lado findam-se as regalias do funcionalismo público, que passaria a ter seu desempenho constantemente avaliado e cumpriria metas como qualquer classe de trabalhadores regidos pela CLT, por outro essa flexibilização na contratação acarretaria a criação de ambiente propício às indicações e trocas de cargos entre aliados políticos, em negociações de apoio. Ainda que fosse “desburocratizado” o atendimento nos hospitais universitários, vagas gratuitas diminuiriam em função da necessidade de leitos particulares. Temática de tal monta, aliás, deveria ser incitada a tornar-se discussão popular, quiçá definida através de plebiscito, onde pudesse prevalecer a opinião da maioria (uma forma de a sociedade exercitar o direito de decidir sobre o que lhe diz respeito), sob a batuta de analistas atuantes, mesmo que DECLARADAMENTE a seu favor, ou contra. E o povo que fizesse seu dever de casa e tratasse de pesquisar para escolher a opção conveniente.
Trabalhoso e injusto? Talvez. Mais simples, no entanto, que esperar que comunicadores auto-intitulados neutros atuem genuinamente como auxiliares na articulação de ideias que objetivam pura e simplesmente a elucidação da população. Afinal, em se tratando de certos meios, “todos vêem aquilo que pareces, (mas infelizmente) pouco sentem o que és”.