Nair Lúcia de Britto
publicado em 06/10/2008
www.partes.com.br/cultura/cinema/camelostambemchoram.asp
Byambasuren Davaa e Luigi Falorni, Die Geschiche von weinenden Kamel, Alemanha/Mongólia, 2003) |
“A vida nos grandes centros urbanos é fria, desapegada de seus valores mais simples e básicos, substitui o convívio com a natureza através da construção de uma outra “natureza” de ordem cultural onde habita a impessoalidade e a correria…”, diz Ruy Gardnier no início de seu belo comentário sobre esse filme. Talvez, tenha sido esse o motivo pelo qual os diretores estudantes Bymbasuren e Luigi Falorni buscaram um lugar onde os sentimentos ainda prevalecessem e a convivência com outro conservasse sua pureza natural, aliada ao instinto de sobrevivência. Foi assim que chegaram com suas câmeras no deserto de Gobi, no sul da Mongólia, justamente na época de cria dos camelos, meio de transporte dos nômades e provedores de lã; para documentar a vida de uma família, composta de quatro gerações, que vivia numa pequena aldeia daquele imenso deserto. O resultado desse trabalho foi indicado para o Oscar como melhor filme-documentário. Os camelos são animais ruminantes que têm corcovas no dorso, pescoço longo e calosidades nas juntas dos joelhos. Aqueles que têm apenas uma corcova são os dromedários. Por serem animais muito úteis e facilmente domesticados, eles são muito estimados pelo homem, nas regiões desérticas da Austrália, para onde foram levados. Há registro da domesticação de camelos desde cerca de 1100 anos a.C., na Babilônia. Adaptam-se muito facilmente no deserto porque são capazes de viver de plantas espinhosas e conservar água no corpo. No filme, o componente mais velho da família conta uma lenda sobre os camelos aos seus netos. A lenda diz que no começo de sua existência os camelos tinham chifres, que emprestaram aos veados. Mas os veados não os devolveram e sumiram misteriosamente, levando os chifres dos camelos. Por isso que até os dias de hoje, os camelos costumam contemplar o horizonte com um olhar perdido e melancólico, à espera do que ainda julgam lhes pertencer… Apesar do seu jeito desengonçado, os camelos sabem conquistar o coração da gente com uma a ternura que só ele sabe transmitir; além de prover o sustento da família. Embora imaginemos que sem o conforto proporcionado pela tecnologia e pela modernidade, a vida deve ser muito dura, o que o documentário mostra é maravilhoso! A começar pela paisagem exótica, o contato do homem com a natureza e com os animais… O carinho, a paciência e o amor enriquecendo essa convivência. Os idosos são valorizados pelo seu conhecimento e são ouvidos com atenção pelos mais jovens e também participam das atividades, pois a alegria de viver os tornam saudáveis. As crianças são criadas com carinho e atenção, mas sem excesso de mimos ou de brinquedos que as tornem ociosas e inaptas. Elas têm seu momento de folguedos, mas também têm suas obrigações e, junto com os adultos, aprendem cedo as leis de sobrevivência. Uma fêmea de camelo dá cria e o último filhote que nasce é um lindo camelinho branco. Foi um parto bastante difícil, mas que contou com toda assessoria da família. A mãe, como que ressentida pelo sofrimento passado, rejeita o filhote de camelo, negando-se a amamentá-lo. A família já sabe como solucionar o caso. Dois meninos vão à cidade à procura de um tocador de violino para que ele, com sua música, amoleça o coração da mãe ressentida para que ela faça as pazes com seu filhote. O músico chega e começa o ritual com toda a família em volta. Todos em silêncio ouvindo o som de um instrumento rústico, feito à mão. Enquanto as notas musicas ecoam no ar, a mãe dos meninos vai aproximando o filhote de camelo, branco, de sua mãe. O animal nem percebe a ação estratégica de que está sendo alvo… O pensamento do animal está na canção, seus ouvidos atentos às notas musicais… até que de seus olhos correm lágrimas. O filhote abocanha a teta da mãe e saboreia o leite… que o alimenta e lhe garante a vida! O filhote vence, afinal, toda a resistência da mãe. É um momento de grande comoção!
Elenco: |