Os tipos revolucionários
Por Gilberto da Silva
O Revolucionário Permanente. Ele nunca está contente. Sempre há uma revolução para fazer, para ser completada. Aqueles que impedem estas ações revolucionárias são sempre denominados de reacionários, ou contras. Eles cantam o amanhã, mesmo após acordar com um sério desencanto. Não é preciso apenas mudar o mundo, é preciso mudar o Universo. É preciso muito e sempre e mais. É preciso interpretá-lo, reinventá-lo. Este tipo de revolucionário sempre denomina-se um emancipador nato. Para estes a revolução é sempre um processo de mudanças profundas, necessárias e absolutamente importantes.
O consenso só é possível se seus pontos de vistas forem absolutamente aceitos. O futuro para estes sempre será melhor, mais acolhedor, mais humano. É sempre preciso explorar novos caminhos (entendendo como novo, o velho conceito que provavelmente ele carrega). Mudança sempre!
A repressão e suas características
Dentro do contexto de uma revolução um componente que requer um estudo mais apurado é a utilização da repressão. A repressão tem vários sentidos e pode ser analisado sob diversos pontos de vistas. Não existe apenas a repressão física, mas também a psicológica e a ideológica. Os movimentos repressivos são dirigidos por duas maneiras: a reação e a progressão. Esses dois mecanismos lembram muito o famoso Sístoles e Diástoles do general Golbery, teórico geopolítico do Governo Militar.
Uma reação pode ser repressiva se servir de antídoto radical aos processos evolutivos da função social; ela pode ser exercida para reagir às tendências humanas de tentar o REAL (entendido aqui como o IDEAL para o Outro). A repressão exercida pela reação é uma defesa dos valores morais, sociais ou culturais. É a preservação do EU, um movimento de conservação e defesa precedida de um ataque.
Já movimento de progressão é a repressão aos valores arcaicos, ao modelo antigo, às velhas ordens emanadas por um poder que teoricamente está em ruínas, ou em processo de deterioração. Progressivo é, para quem o exerce, a reestruturação na procura de uma ordem moderna, evolutiva. Neste caso, a repressão possui um claro sentido aniquilador do retorno de uma antiga ordem.
A repressão possui quatro tipos de “caráter”: o revolucionário, o progressivo, o conservador e o reacionário.
O Revolucionário é para quem o exerce, a quebra de velhas ordens num determinado momento social: o da revolução. Sua função é a de reprimir os ataques contra-revolucionários. Não devemos esquecer que todo caráter repressivo pode ser em nível de poder estatal ou poder individual, nas relações homem-mulher; pai-filho-mundo; religião-homem-mundo.
O caráter revolucionário da repressão é – para quem o exerce – o processo de mudança de uma estrutura, a virada de uma pirâmide, por isso, seja necessário reprimir os que ainda tentam subverter a nova ordem. A repressão é, nesse sentido, vista pelos revolucionários como uma necessidade, um mal que vem para o bem, uma medida certa para a total implantação dos seus novos valores.
Para os revolucionários é aniquilando os velhos valores que se pode tornar-se seguro da situação, “… pois esta tem sempre, como divisa de rebelião, a liberdade e os seus antigos costumes, os quais nem o transcurso do tempo nem os benefícios recebidos farão esquecer.” [i]
Os sandinistas utilizaram-se deste expediente de aumento de repressão na tentativa de aniquilar as forças contra-revolucionárias somozistas e dos índios miskitos.
Sob o ângulo da repressão homem-mundo, essa repressão revolucionária teria sentido se, por exemplo, as mulheres abolissem as velhas ordens morais aderindo à uma ordem, a uma nova ordem moral, sexual e rechaçar todos os velhos conceitos da tradição familiar submissa, do patriarcado.
A repressão revolucionária dá-se num determinado momento histórico, num período ainda desestabilizado onde novas ordens ainda não foram aceitas, acomodadas, onde ainda o perigo da iminente reação sobrevoa.
O Progressivo se dá no período em que há uma norma, uma ordem, em franco desenvolvimento, num momento em que ainda é preciso modernizar-se, progredir, ir à procura de uma nova situação. O caráter progressivo da repressão é baseado na persuasão e na aniquilação, sendo que na persuasão há a clara intenção da ideologia modernizadora, onde ela é exercida com o sentido de aniquilar as velhas hierarquias, os velhos sistemas e aperfeiçoar novas formas de manutenção da estrutura.
O caráter progressivo da repressão geralmente se dá num período pós-revolucionário onde é necessário aperfeiçoar novas formas de dominação, criar métodos mais eficazes de controle nesse sentido toda “reação” em contrário é anti-revolucionário, conservador ou reacionário.
Ao contrário do caráter revolucionário que ainda é portador de um conteúdo utópico, o progressista já atingiu “para si” a realidade: ele apenas realiza seu projeto. O repressor progressista ainda não chegou à “plenitude”, ainda busca a totalidade da sua eficácia e espera atingir a sua “finitude” (que pode ser inatingível). É o caso do jovem saindo de uma fase de contestação para outra de ações conscientizadoras, sem euforismos. Um jovem partindo da simples agitação para a transformação progressiva da sua personalidade, não aceitando nem a revolução total de seus conceitos como a volta aos padrões que a família lhe engendrou.
A atitude repressiva é, nesse caso, sempre aplicada no sentido de favorecer o andamento de uma prova nova ordem criada. É exercida como atitude “construtura”.
O caráter Conservador utiliza a repressão como manutenção da situação vigente, reprimindo toda manifestação ao contrário e toda tentativa de mudança. Usa os instrumentos repressivos como arma de defesa dos valores por eles implantados. Utilizado-a como um bem para si e para os que seguem os mesmos valores.
O conservador sente-se sempre um íntegro, tradicionalista., moralista e evita de forma total qualquer tentativa de mudança. Partem de um pressuposto que vivendo numa estabilidade (a sociedade ou a sua individualidade) os que são estáveis (ou) os dominados a aceitar geralmente legítimo domínio vigente.
A relação pais-filhos é sempre visto sob o ponto de vista conservador. O patriarcado age de acordo com os princípios da repressão conservadora na manutenção da ordem familiar. A igreja tradicional e ortodoxa agiu muitas vezes de acordo com os princípios do caráter repressivo conservador
O caráter reacionário é o que utiliza da repressão através de uma resposta a uma ação qualquer que tem interesse em provocar a ameaça a sua ordem. É tido como opositor a qualquer inovação nos valores. É tido como contrário a liberdade e age de acordo com os princípios arcaicos e ultrapassados. No seu modo de ver é preciso agir sempre contra qualquer ação evolutiva, revolucionária e ou modernizadora.
O reacionário não é um conservador, o caráter repressivo dessa maneira é dado em qualquer situação.
[i] O Príncipe. Maquiavel. São Paulo: Circulo do Livro. s/d. página 56.