Poliana Fabíula Cardozo
publicado originalmente em 23/01/2008 como <www.partes.com.br/turismo/poliana/planejamentoturistico.asp>
O turismo enquanto atividade tem se tornado extremamente competitivo, pelo aumento da demanda e sua heterogeneidade com relação aos produtos, e também pelo aumento da própria oferta de produtos em si. Uma enorme gama de produtos são postos nas prateleiras do mercado a cada nova estação, na ânsia de atrair visitantes, e com as mais variadas segmentações. Contudo, já é sabido que apenas vai colocar-se com êxito neste mercado aquela localidade que souber planejar suas ações, que conhece sua demanda e sua oferta, e que através disto saberá valorizar tanto o produto, como o turista e a qualidade da experiência que um pode trazer ao outro.
Neste sentido, muitas são as tentativas de planejamento vistas pelo mercado. Algumas ditas mais arrojadas valorizam a sustentabilidade, mesmo que apenas com vistas na economia e não no meio ou na sociedade. Contudo, o planejamento turístico sustentável para uma localidade é muito mais do que preservar para obter mais entrada de moeda.
A sustentabilidade do turismo está alicerçada nos interesses não apenas do meio ambiente (cultura e natureza), mas também nos profissionais do mercado turístico, os quais se fazem necessários para atuarem com propriedade sobre este meio; o envolvimento da comunidade local que sempre será a primeira a sentir os impactos do turismo; fatores econômicos, pois a atividade turística deve ser rentável ao maior número possível de grupos de interesse; e na plataforma da política, onde o Estado é o responsável pela elaboração e cumprimento das legislações, pelo uso de parte do patrimônio turístico, especialmente aqueles considerados patrimônio cultural ou natural, e também pelas políticas de turismo que elabora e executa. Assim sendo, entende-se planejamento sustentável do turismo é aquele que envolve e considera: meio ambiente, profissionais, a sociedade local, a economia, e política no sentido de abranger a máquina estatal. Quando um desses aspectos falha, a sustentabilidade falhará também no seu intuito. Dessa forma, apenas poderá ser garantida a sustentabilidade turística da localidade se todos esses eixos trabalham em sincronia.
Ainda sob a reflexão da sustentabilidade das localidades turísticas, inevitavelmente entra-se na discussão dos valores agregados dos bens turísticos (que irão contribuir para a diferenciação do destino, ou até mesmo para garantir a oferta de uma experiência turística única, e marcante para o visitante), onde é inevitavelmente privilegiada a cultura local, com toda sua carga de inventividade e possibilidades de fruição pelo visitante. É dizer: artesanato, música, dança, gastronomia, festividades, patrimônio material e seus múltiplos usos, e tantos outros aspectos. Em se estando de acordo com esta afirmativa, e muitos autores o estão (apenas para citar como exemplo de autores brasileiros que corroboram com esta assertiva: Beni, Gastal, Barretto, e outros), também não se deve desconsiderar o papel da comunidade receptora neste processo de planejar e atuar no turismo. Não se descarta o papel da comunidade receptora, porque além de ser ela quem vai sofrer os impactos da atividade em sua localidade também terá sua cultura exposta para os visitantes observa-la e não raro participar de algumas manifestações.
Isto posto cabe então abordar uma questão delicada para o turismo, que é a participação da comunidade no processo de planejamento turístico. Quando o processo de planejamento envolve o setor público, os técnicos, o mercado, e a comunidade local o mesmo é chamado de planejamento turístico participativo. Sobre este assunto muito se discute, e se consensua que este pode ser a chave para o planejamento de sucesso, especialmente por envolver a comunidade local e receptora. Alguns modelos de planejamento ultrapassados, ou que não valorizam a localidade como um todo, tende a obter resultados tendenciosos, e sendo a comunidade local aquela que mais sofre os impactos da atividade turística, é necessário ouvi-la, mas não apenas, e sim considerar suas colocações, necessidades e intuitos. Essa é a essência do planejamento participativo.
Planejamento participativo é diferente de consulta, sensibilização, conscientização turística. Enquanto os últimos preocupam-se com argumentos convencedores quanto a importância e/ou relevância da atividade turística na localidade e da importância de bem tratar ao visitante, o planejamento participativo deve atender as solicitações das partes envolvidas. Este não é um processo simples, pois demanda uma gama variada de conflitos a serem administrados, e a metodologia do mesmo não é facilmente encontrada na bibliografia disponível, inclusive porque cada localidade terá seu nível de conflito distinto da outra.
A implantação do planejamento participativo é difícil, Molina (2001) ensina que particularmente na América Latina esta modalidade de planejamento é uma necessidade latente, mas na mesma força se apresenta como dificuldade, haja vista o nível de descentralização do poder necessária para esta tomada de decisões, e ainda o receio ou uma possível intimidação da comunidade local deve ser considerada.
O planejamento participativo, segundo Molina (2001) terá ao final as seguintes características:
– terá objetivos e metas que atendam a todos os envolvidos;
– o plano é produto da sociedade;
– contribuirá para dirimir conflitos existentes;
– valorização maior do meio abrangente como um todo.
Esta modalidade de planejamento, segundo o mesmo autor ainda contribui para que a comunidade como um todo passe a se auto-conhecer e aprender cada vez mais, por compreender não apenas sua própria realidade mas a de outros sujeitos envolvidos.
Barretto (2005) insiste que o planejamento participativo deve ser firme e claro em sua metodologia, e outra vez mais se toca na questão da metodologia do mesmo sem comenta-la a profundidade. Nestes termos, tenta-se aqui, de forma teórica delinear uma possível metodologia preliminar ao planejamento participativo do turismo municipal.
O planejamento turístico municipal ou mesmo regional, deve estar de acordo com a Política Estadual ou Nacional de Turismo, e ter seus objetivos relacionados. O levantamento da oferta turística (inventário) é uma etapa que não deve ser ignorada, de vez que esta será a matéria prima da atividade turística na localidade estudada. Da mesma forma, conhecer a oferta turística (potencial e real) permitirá zonear a localidade em regiões turísticas ou não turísticas. Este zoneamento preliminar será fundamental para o chamamento da comunidade local para a discussão.
O estudo da demanda também figura como relevante, uma vez que seu perfil, anseios e opiniões são reflexos das possíveis experiências turísticas vividas ou desejadas.
O órgão público e seus profissionais técnicos são os responsáveis por elencar os participantes do processo – Trade (entidades representativas constantes na localidade); academia; e a comunidade local (ONGs relacionadas ao setor; e lideranças de bairros zoneados como turísticos.) – e também são os responsáveis pela execução e condução do trabalho.
Os membros envolvidos no planejamento são chamados para conhecerem a oferta turística real e potencial da localidade, bem como a demanda, em termos quanti e qualitativos. É possível ainda que os técnicos apresentem as segmentações de mercado as quais a localidade atende e seus concorrentes. A partir daí, debate-se com relação aos objetivos do plano a ser traçado. Sob os objetivos, é possível que os técnicos já partam com sugestões, que os membros podem acatar ou refutar.
Todos os membros são ouvidos com relação as suas percepções sobre a atividade turística e os objetivos que cada um deles tem para com a mesma. Este pode ser um ponto de saída para a determinação dos objetivos do plano, ou dos programas.
Os mesmos membros também são ouvidos quanto à formatação de possíveis produtos turísticos, é dizer: que atrações incluir e como fruí-las, e também o que deve ser excluído do rol de atrações.
É necessário fazer uma projeção das relações de ganhos e perdas para cada setor envolvido para cada uma das ações planejadas.
Findo o plano, e durante sua execução, com intervalos periódicos que variarão de acordo com os prazos estabelecidos, requer-se que os membros sejam constantemente acionados para avaliar o desempenho e a partir da avaliação propor possíveis alterações.
Como se pode perceber trabalhar com metodologia de planejamento participativo não é tarefa simples, até mesmo porque envolve uma variada gama de interesses e interessados. Envolver distintos sujeitos ao processo requer boa vontade política e descentralização do poder. Contudo, esta é a ferramenta para garantir um planejamento coerente com a realidade estudada e que possa auferir objetivos minimizando impactos negativos e maximizando os positivos, distribuindo os ônus e os bônus para todos os envolvidos.
Referências:
BARRETTO, M. Planejamento responsável do turismo. Campinas: Papirus, 2005.
MOLINA, S. Planejamento integral do turismo. Bauru: Edusc, 2001.