O Puxa-Saco feliz
por Johnny Notariano
publicado em 29/11/2007
Depois de muitos anos de carreira eu cheguei a algumas conclusões que me surpreenderam com relação à colegas de trabalho. Não entendam meus colegas de trabalho e sim todos os que trabalham em grupo em qualquer instituição, seja pública ou privada. Trabalhei no setor privado, mas foi no setor público que ratifiquei minhas conclusões.
A que mais me chamou a atenção e serve de alerta para os que estão iniciando na senda do puxasaquismo, é que algum dia o puxa-saco cairá e, quem irá derrubá-lo não será o chefe e sim os melhores colegas de trabalho. Aqueles que não se cansam de dizer, \estamos do seu lado para o que der e vier; você é bacana e muito legal\.
Conhecido como bajulador, galanteador e sabe-tudo. O perfil cultural é sofrível, para não dizer ridículo, tem muita dificuldade para as tarefas que necessitam de habilidades mínimas e básicas, mas apresenta-se a todos como PhD em todas as áreas de conhecimento. É o próprio \cricri\, aquele que atormenta o outro bichinho conhecido por \chato\. Tem perfil de jornalista e trabalha na locução das \Rádios Pião\, aquelas instaladas nos corredores, banheiros e durante as comemorações dos funcionários. Está sempre de plantão no meio das fofocas, não perde nenhuma notícia e nenhum detalhe. Participa sem ser chamado de conversas sobre decisões, ouve escondido, como quem não quer nada e imediatamente corre a procura da resposta em primeira mão para o chefe. Jamais subestime ou menospreze a capacidade de um puxa-saco infernizar a vida de um colega de trabalho.
Entre o puxa-saco e os superiores, existe uma falsa relação de amizade, aparentemente amigável, duradoura e chega até a causar inveja nos seus colegas, que inocentemente confidenciam tudo a ele com medo de perder essa tão importante amizade.
Depois de muitos anos descobri que o puxa-saco tem características da serpente expulsa do paraíso nos tempos de Adão e Eva, a considerar pela condenação de rastejar eternamente aos pés do chefe e a procurar perscrutando a própria identidade perdida.
O puxa-saco é como um tumor maligno, causa sofrimento e morte prematura nas pessoas e é difícil de se exterminar. A cada dia aparecem mais e mais, como uma praga maldita e pelo que tudo indica e leva a crer, sobreviverá ao apocalipse e ao Almagedon. Consegue-se acabar com colônias de ratos; cupins; baratas e outras pragas nocivas à saúde, mas de nada adianta a despuxasaconização, inútil tentar, eles sobrevivem a tudo. É como ameba, não adianta polivalente. Acaba-se com um, tem dez esperando para tomar o lugar do outro. No setor privado é diferente, o puxa-saco tem vida curta, mesmo que seja filho do patrão, porque ninguém tem rabo preso, agora no setor público ele faz a festa. É conhecido também como \parasita infernalis\.
Engana-se ao pensar que o puxa-saco galgará posições de comando ou chefia. A cabeça dele é muito pequena para responsabilidades maiores, tomada em quase sua totalidade por tudo, menos pela dedicação ao trabalho; ao aprendizado e ao aperfeiçoamento da própria função, vive com dúvidas e disfarçadamente, às escondidas, pergunta tudo depois assume a autoria e ainda fala que não precisa de ninguém. Faz-nos crer que já nasceu sabendo. E tem quem acredite. O puxa-saco só chegará a ser um chefe o dia que a Instituição dele desaparecer e não tiver mais ninguém lá dentro, ou todos enlouquecerem ao mesmo tempo, pelo inferno causado por ele. O lema deles é: \Puxa-saco unido, jamais será vencido\. Dizem que já sugeriram sindicalização.
Observadores do comportamento humano e relações no trabalho descobriram nesses anos passados que o sofrimento causado pela humilhação e injustiça cometido a funcionários e trabalhadores honestos, competentes e inteligentes, tem como causa o conhecido Assédio Moral. Meu primo, docente e interessado no tema, Dr. Wadirretro Kahfagest foi a fundo e descobriu que em cada dez casos de Assédio Moral, tem trinta puxa-sacos envolvidos como causadores do constrangimento. São verdadeiras bactérias patogênicas, víboras; serpentes peçonhentas, leucócitos em ferimento doloroso em processo de infecção.
Teóricos e estudiosos do tema nos alertam para que sejamos prudentes com esse tipo asqueroso que vive arquitetando armadilhas para pegar ingênuos colegas no trabalho. O puxa-saco não tem caráter; vive de sala em sala; se mete em tudo; sempre perdido na selva do trabalho, capaz de descontrolar a própria bússola; não vive a vida dele, gerencia a dos outros e quando se dedica a algum projeto, com certeza, será para aprimorar os métodos de bajulação.
Uma dica importante para descobrir o foco da infecção e se providenciar a assepsia. Não é fácil se livrar deles, mas vale a pena tentar. Também não é difícil identificar um puxa-saco no ambiente de trabalho, mas como sempre surge do nada mais um e as primeiras vítimas em potencial são os novatos na instituição, um alerta. Detalhes que seguramente devem ser considerados. Procure saber antes a localização do ninho das najas. Quando chegar ao seu trabalho e alguém que você não conhece lhe cumprimentar com gentilezas; beijinhos; elogiar sua roupa, de repente pedir desculpas por te-lo confundido com alguém e lhe deixar falando sozinho, é esse o perigoso, o puxa-saco feliz, está sempre de plantão. Procure saber os apelidos dos colegas, aquele, que jovem ou não, for identificado como \Raposa Velha\, caia fora.
Para identificar com certeza o foco das parasitas infernalis, solte um boato que foi convidado a ser chefe ou vai jantar na casa de qualquer superior imediato. Aquele que levar um cafezinho para você e perguntar se quer com açúcar ou adoçante e depois mexer com a colherinha, é esse o canalha.
Outra dica, você que é jovem então alguém no primeiro dia de trabalho lhe pergunta, – quanto tempo falta para a sua aposentadoria; tem casa própria ou paga aluguel? – Tem carro? Qual é a marca; é casado? Se ele perguntar quanto você ganha, aí então não tem antivírus que resista. Você está diante de um puxa-saco em potencial, o invejoso, esse tipo é de arrasar. Faça uma novena ou procure um exorcista, porque ele vai colar.
Também não é preciso sair desconfiando de todos e descarregar a mágoa no cunhado, é tolice, aquele coitado que chega à sua casa com a família nas horas de almoço; de dormir; na hora de sair para um passeio ou no momento daquele esperado filme; no sábado no exato momento que o entregador de pizza buzina; na hora de tirar do forno os biscoitos contados da vovó. Ele é adulador por natureza, ainda mais quando o cartão de crédito estourou e o especial já foi para o espaço. Realmente ele mantém uma boa relação de amizade e parentesco, ame seu cunhado. Não descarregue nele as mágoas causadas pelo rotaviruspuxa-sacus de seu trabalho.
Você que é um puxa-saco assumido, não se desespere, a vida é boa; tudo pode mudar e voltar a ser aquele \colegão\, quem sabe até um grande amigo. Deixe de ser pegajoso; não ponha o \bico\ onde não é chamado; não roube autoria de ninguém, tenha suas próprias idéias e agradeça quando lhe passam informações no trabalho. Cuidado com panelas, principalmente as de pressão, longe delas; pelego só é útil em cavalo ou em burro; não acredite em pistolões; elogie a beleza de sua mulher; sua família que agüenta seu papo todos os dias; vale até mentir para a sogra ao dizer que ela é maravilhosa, ela acredita, creia; mas não transfira esse elogio para o seu chefe; tenha opinião própria, mande embora o Grande Puxa-Saco que existe em você e verá que tudo vai mudar na sua vida. A felicidade existe, não estrague a dos outros.
Puxar o saco de patrão deve ser uma doença perfeitamente tratável e com recuperação imediata. Siga alguns conselhos: – Comece estimulando seu hemisfério esquerdo do cérebro. Esqueça um pouco a calculadora e faça cálculos de cabeça; deixe os colegas das outras seções em paz, dedique-se em arrumar suas gavetas que devem estar uma verdadeira zona; não tenha mais dúvidas em informática, dedique-se em aprender alguma linguagem nova ou faça um curso de Word e Excel, que tenho certeza, você não sabe nada. Quer aparecer para seu chefe? – Pare de falar palavras soltas em Inglês querendo demonstrar que sabe e faça um curso de conversação. Experimente trabalhar com as mãos, você vai relaxar e esquecer que tem que rir daquelas piadas ridículas do seu superior. Se tiver coragem, atualize seu extrato bancário. Se depois de tudo sentir alguma recaída, e perceber que não tem jeito mesmo, não se descontrole, leve uma caixinha de bombons para seu chefe, mas indague antes se ele não é diabético.
Para que você se sinta realmente bem e definitivamente deixe o puxasaquismo do lado, exercite também seu hemisfério direito do cérebro. Reserve um lugar tranquilo, esforce-se para esquecer as últimas fofocas, pratique meditação e yoga. Se tiver tendências artísticas, pratique dança; faça ballet; pinte um quadro ou faça até um cursinho de matelacê, macramé, mas faça mesmo. Uma boa dica, pintura em tecido. Ouça uma boa música melodiosa; planeje um programa cultural diferente; volte a ser criança e exercite o bom humor; seja espontâneo e brincalhão, mas sem exageros do contrário vem a recaída, que é pior. Se o chefe espirrar, não diga \saúde\, se for tentado a se manifestar, então recomende um antialérgico ou um médico, ou fique quieto, será melhor.
Nem tudo está perdido, não se desanime em algum lugar você também tem um verdadeiro amigo, todos temos. De acordo com Plutarco, moralista Grego, viveu entre os anos 50 a 120, na cidade de Queronéia na Beócia, devemos considerar algumas afirmações. O verdadeiro amigo usa de parresia, merece crédito ao criticar e sem medo de punição. É aquele que nos fala a verdade mesmo que nos incomode; critica nossas ações, faz-nos reconhecer os erros e aponta nossos defeitos com naturalidade. Há quem questione a parresia considerando que alguns indivíduos sem poder, usam-na para alcançar o cume, na relação de baixo para cima. De qualquer forma o verdadeiro amigo é um Parrésico e pronto. Atente como é verdadeiro, só um amigo sincero tem a capacidade de nos livrar de falsas ilusões e nos mostra o reflexo de nós mesmos no espelho de nossa alma. Nos momentos cruciais de sua vida será ele, com toda a certeza que ficará a seu lado. No trabalho é a mesma coisa, nunca culpe ou acuse precipitadamente o seu chefe sem antes conhecer os canalhas puxadores de tapetes no qual você faz parte e quer sair. Não é mesmo?
Se tiver mesmo que puxar o saco, esqueça o chefe, que seja de seus colegas de trabalho, eles são os que aturam a sua chatice no cotidiano, convive com você como se fosse sua segunda família. É no trabalho que você passa a maior parte do tempo, seu domicílio. Seja pelo menos um puxa-saco agradecido e feliz.
Agora meu infeliz amigo puxa-saco, se depois de tudo isso ainda sentir vontade de puxar um tapete, então eu recomendo que entre para alguma Igreja e comece a rezar, porque seus dias no trabalho estão contados.
JLNotariano