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O Desenvolvimento Profissional e Pessoal dos Docentes: uma educação contínua

Leonardo Vivaldo

28 de fevereiro de 2007

Em período de transformação, alguns princípios ficam conflitantes e o significado que se atribui aos atos se relativiza, causando dúvidas sobre os valores que devem ser estabelecidos no método educativo. Observa-se, pois, uma certa imprecisão sobre o que é ou não consentido, sobre o que é ou não aceito. Em parte isso incide porque não há um indicador moral universal “um código” que constitua modelos éticos normatizadores da ação humana.
A carência de parâmetros, de códigos morais e éticos na educação evidencia, portanto, a deficiência de diretrizes normativas que aceitem a composição de uma educação moral concreta e sólida o que, em consequência, bloqueia a ação dos educadores, pais e docentes dentro do processo evolutivo do saber.
A investigação sobre a formação continuada dos docentes, recebeu a partir do inicio dos anos 80 um ponta pé extraordinário. Este é, ultimamente, um ponto bastante discutido nos últimos tempos dentro dos trabalhos dissertados nos muitos cursos de pós-graduação em todo país. Entretanto, tal como relata Pacheco e Flores esta temática não conhece, a nível da estrutura disciplinar das Ciências da Educação, “uma autonomia e prática de formação de professores” (Pacheco; Flores, 1999, p. 10). Neste ponto a pesquisa tem abordado, seja a formação alicercial, seja o desenvolvimento ininterrupto dos docentes.
Ultimamente, acentua-se a seriedade da reflexão na formação de docentes. A ênfase da reflexão advém do ramo da educação de adultos, da qual o desenvolvimento de docentes faz parte integrante. Vejamos o que relata Garcia sobre isso:

“A investigação do campo da formação de professores não deve, nem pode dissociar-se do campo de investigação em educação de adultos, assumindo-se como uma forma particular de educação de adultos.” (Garcia, 1999, p. 52).

A abordagem da temática da formação de docentes implica em um conhecimento do campo em que se agrega. Este estudo pretende apresentar alguns indicativos e ideias que possam orientar a otimização dessa dificuldade por estudantes de educação de nível superior de uma forma geral no campo da educação.
É precisamente neste significado que se procurará ao longo deste ensaio abordar os contributos da educação continuada, para a reflexão sobre o desenvolvimento do professor/aluno, ponderando que com um maior conhecimento na área da formação de professores também colaborará para um conhecimento mais aprofundado da educação continuada.
Um olhar da atividade profissional continuada do professor consistindo apenas “numa resolução instrumental de problemas pela aplicação de teorias e de técnicas científicas” (Schön, 1983, p.23) é redutora, pois omite o acontecimento dos sujeitos aumentarem saberes na prática. A este desígnio, parafraseando com Perrenoud (1993) afirma que variadas vezes a ação do docente não se reduz a uma aplicação de uma determinada regra, de um esquema codificado a uma situação concreta:

“Demorar-se um pouco mais com um aluno em dificuldade, responder ou não as suas questões, encorajá-lo com uma palavra, escolher entre ver e não ver, sancionar ou não uma conduta desviante, seguir ou não uma pista sugerida pelo aluno, dar seqüência a uma discussão ou terminá-la, dar a palavra a este ou àquele, aceitar ou não uma proposta, dramatizar ou banalizar um apelo à calma (…) tantas decisões tomadas no momento, sem grande ou nenhuma reflexão.” (Perrenoud, 1993, p. 37)

Tal tipo de ação, baseado naquilo a que Perrenoud classifica de sucessão de micro-decisões, é muito mais do que uma simples aplicação de determinadas teorias à prática. O conhecimento e a informação são fontes de saberes e é a partir delas que se constrói o saber profissional do docente preocupado com o seu e com o desenvolvimento de seus alunos.
De qualquer maneira, o que está em questão para o docente, é a ideia de que para se ensinar é preciso, antes de tudo, disciplinar o aluno. E qual é essa matéria? Quando se fala em matéria, em geral, se fala em ordenamento, o que, muitas vezes, nos leva à ideia de repressão e coação entre as pessoas. Por isso é que, entrar por esse caminho, pode ser arriscado.
Todavia, é preciso reconhecer que, embora existam muitas maneiras de se ordenar às condutas, esse ordenamento não deve estar associado a práticas de dominação e subordinação. Se a ordem é realmente necessária não precisa ser estabelecida por relações autoritárias. Para a construção da ordem, da disciplina, são necessárias regras que estabeleçam o que é ou não permitido, mas, veja bem, regras que ordenem e não que dominem.
Como relata Sarrazin (2002, p. 3), “O desenvolvimento do juízo moral na criança passa por uma moral heterônoma – que é baseada em relações unilaterais – mas, não se limita a ela. É necessário construir uma moral autônoma, fundada em relações de reciprocidade e respeito mútuo”.

Por que educação continuada?
Uma questão sempre esta presente em nossos dias por que Educação Continuada e não outro termo? A palavra ‘educar’ tem sua origem nas expressões latinas ‘educare’ (cuidar, alimentar, nutrir, criar) e ‘educere’ (externar, conduzir, modificar, transformar). O sentido etimológico parece-nos esclarecer que a Educação é um processo de ir e vir. É um processo complexo de ensinar a aprender, aprender a ensinar, ensinar a ensinar, aprender a aprender, aprender a pensar, ensinar a aprender a pensar.
O termo ‘educação’ compreende vários nuances de significado e recebe às diversas forças ideológicas. Aqui, portanto, focalizaremos a compreensão de que o termo ‘educação’ aponta para a criação, recriação e transformação da realidade social, moral e cultural do indivíduo.
Parafraseando com as palavras de Libâneo (1998) a Educação, em sua concepção histórico-social e em seu sentido amplo, compreende os processos formativos que acontecem num dado meio social, sejam eles informais ou não, institucionais ou não, intencionais ou não.
Em relação à educação contínua de professores, compreendemos que ações intencionais intervêm nas relações individuais e coletivas, com vistas à transformação. A educação, assim, está viva no meio das relações sociais e pode ser impulsionada pelos interesses e práticas de classe, o que a define como prática transformadora ou não. Libâneo (1998) apresenta-nos uma síntese sobre a importância da educação:

“A educação, enquanto atividade intencionalizada, é uma prática social cunhada como influência do meio social sobre o desenvolvimento dos indivíduos na sua relação ativa com o meio natural e social, tendo em vista, precisamente, potencializar essa atividade humana para torná-la mais rica, mais produtiva, mais eficaz diante das tarefas da práxis social postas num dado sistema de relações sociais.” (Libâneo, 1998, p.74).

Além dessa compreensão, procuramos em Brandão (1981) uma ideia complementar que dá uma dimensão do político em Educação. Ele entende que a educação enquanto processo de humanização se dá ao longo da vida. Ela acontece na rua, no trabalho, na família, na igreja, e na escola. Nesta, ela tem funcionado, cada vez mais, para o controle, para a adaptação do ser humano à sociedade. Assim, a escola ainda funciona como aparelho de transmissão da ideologia dominante. Brandão conclui que há dois tipos de educação bem materializados que:

“(…) pode tomar homens e mulheres, crianças e velhos, para torná-los todos sujeitos livres que, por igual, repartem uma mesma vida comunitária; e há outro tipo que pode tomar os mesmos homens, das mesmas idades, para ensinar uns a serem senhores e outros, escravos.” ( Brandão, 1981, p.34)

Por fim, invocamos aqui a concepção que consegue incorporar as anteriores e que não deve ser desprezada quando falamos de formação de professores. O mentor Paulo Freire deixou-nos um grande e poderoso legado: a educação é ato político, é ato de libertação (Freire, 1980). Freire procura deixar claro que, diante das contradições e desigualdades que estão instaladas nesta sociedade, a educação pode desempenhar um papel político de construir uma nova sociedade: uma sociedade mais fraterna, mais solidária, menos desigual, mais justa. Freire entendia que, através da educação, seria possível ampliar a participação da classe oprimida, tornando-a capaz de transformação social. Essa concepção preconiza uma articulação entre teoria e prática, constituindo, assim, uma práxis desafiadora e transformadora. Essa práxis caracteriza-se pela relação dialógica, perspectivas de criticidade e vivência. Dessa forma, caminha-se de uma consciência ingênua para uma consciência crítica.
O termo ‘continuada’, outro item da expressão assumida aqui, possui o sentido de processo ininterrupto, inacabado, algo que permanece, sucessivo (Bueno, 1996). Assim, a denominação Educação Continuada deve ser compreendida como possibilidade de se alterarem situações atuais epistemológicas e pedagógicas dos professores de modo processual, seguindo sempre adiante, sem finalização.
Vejamos o que discursa Araújo:

“A Educação Continuada deve ser entendida como processo constituído por práticas cotidianas de reflexão sobre o trabalho que o professor desenvolve, além de compreender, também, que essa denominação oferece-nos uma possibilidade mais abrangente para obtermos visão mais integrada da educação.” (ARAUJO, 2000, p. 34).

Considerações finais
Busquei ao longo deste ensaio agregar a reflexão sobre a formação de docentes com a sua educação continuada, constituindo esta última um referencial importante para a análise do desenvolvimento pessoal e profissional do docente, de uma forma geral. Este desenvolvimento não pode ser idealizado de forma alguma de uma forma individualista e isolada. Muito pelo contrário é necessário fomentar a cooperação e o diálogo crítico entre os docentes, colaborando para a divisão de diferentes perspectivas sobre a prática docente.
Além de todas essas informações anteriormente citadas, essa cultura de colaboração é crucial para o aparecimento de projetos de inovação nas escolas. Muitos desses projetos inovadores “nasceram” a partir de uma ponderação conjunta sobre os problemas concretos que existiam em uma comunidade escolar determinada. O desenvolvimento pessoal e profissional pressupõe o desenvolvimento de uma cultura colaborativa que parte da própria escola.

Referencias Bibliográficas

ARAÚJO, I. A. de. Educação continuada na escola: traços, trilhas e rumos da coordenação pedagógica. Brasília: Ed. UnB, 2000.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues (org.) Pesquisa participante. São Paulo: Brasiliense, 1983.
____. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, 1981.
BUENO, Belmira O; CATANI, Denice B; SOUSA, Cynthia P. (orgs.) A vida e o ofício dos professores – formação contínua, autobiografia e pesquisa em Colaboração. São Paulo: Escrituras Editora, 1998.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1998.
____.Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.
GARCIA, C. M. Formação de professores – Para uma mudança educativa. Porto: Porto Editora, 1999.
HOLANDA, Aurélio Buarque de. Dicionário da Língua Portuguesa. RJ: Ed Nova Fronteira S.A, 1977.
LIBÂNEO, José Carlos. Pedagogia e pedagogos, para quê? São Paulo: Cortez, 1998.
PACHECO, J; Flores, M. Formação e avaliação de professores. Porto: Porto Editora 1999.
PERRENOUD, P. Práticas pedagógicas, profissão docente e formação: perspectivas sociológicas. Lisboa: Publicações D. Quixote, 1993.
SARRAZIN. Adriana H. Educação e Psicologia: Cúmplices ou Parceiras? Disponível em: <http://www.futuro.uniube.br/textos/menu/menu.html.> Acesso em 26 de Janeiro de 2006.
VIVALDO, Leonardo. Educação e as Novas Linguagens Tecnológicas Digitais: Uma aprendizagem constante. Disponível em: <http://www.partes.com.br/educacao.asp.> Acessado em 23 de Fevereiro de 2006.

Leonardo Vivaldo da Silva é mestrando em Ciências da Educação pela Northern Professional University-NPU, em parceria com o CESCON-Centro de Estudos Contemporâneos. Especialista em lingüística aplicada à língua e à literatura pela Faculdade de Selvíria – FAS. Graduado em Letras pelo CESB/ICSH e Professor de Inclusão Digital na Faculdade CESB.

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