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Olhar, imaginar, desenhar, escrever: Um ensaio investigativo e metodológico que passeia pelo campo simbólico da Educação Artística Parte II

Olhar, imaginar, desenhar, escrever:
Um ensaio investigativo e metodológico que passeia pelo campo simbólico da Educação Artística – Parte II
Por José Henrique Manhães Neves
publicado em 31/01/2007 como www.partes.com.br/educacao/olharimaginar2.asp

  1. Agentes Atuantes no Processo

A prática que se deu ao longo do ano de 2005 ecoou como um Projeto “FAZENDO ARTE” aos ambientes da Secretaria Estadual de Educação. Não somente os Agentes envolvidos, mas o componente da Sociedade, Cultura, Filosofia, Entretenimento, Prática Pedagógica, Gestão e os Recursos Humanos foram norteadores para que se estabelecesse a relação dos poderes simbólicos a que se pretendeu.

A esse respeito, percebeu-se que aliar o poder simbólico ao poder formal das práticas docentes e o que se pretendeu atingir, a primeira vista, pareceu-me uma investida quase que impossível, pois os sujeitos da ação em qualquer âmbito de suas práticas ou negociações têm que enfrentar o poder simbólico de tais relações. E nesta cadeia hierárquica Bourdieu aborda com muita propriedade essas relações de força que detêm poderes diferentes, pois cada agente ocupa um lugar diferente em suas atuações e o poder simbólico, nesse sentido, vem carregado de força. Para Bourdieu, o poder exercido no Sistema de Ensino é o poder simbólico, “poder invisível que só pode se exercer com a cumplicidade daqueles que não querem saber que a ele submetem ou mesmo que o exercem (Bourdieu, 1977, p.31)”.

Busca-se também neste momento de reflexão e poderes elencados na base de componentes, a contribuição de Rogers (1972) quando expõe a ideia de que “os desafios fazem com que a pessoa se desenvolva e cresça”.

A partir das contribuições de Bourdieu e Rogers percebe-se que a prática como tal e suas relações produz ao homem a visão de mundo e da realidade em que se está envolvido, porque o

“ círculo da docência não deve fechar-se, como uma cidadela sitiada, sob o bombardeio da cultura de mídia, exterior à escola, ignorada e desenhada pelo mundo intelectual (MORIN, 2001, p.80)

As produções dos alunos foram à convite da Secretaria de Educação, expostas no ambiente desta mesma Secretaria, se fez itinerante por vários bairros e espaços culturais da região bem como na disponibilização do site da Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro todas as produções efetivadas.

Faz-se premente, então, um repensar da educação, não apenas nos pressupostos filosóficos, o que naturalmente é essencial, mas também naquilo que constitui o fazer pedagógico, o dia-a-dia na sala de aula.

Dando prosseguimento a pesquisa, resolvemos extrair depoimentos que só fazem enriquecer e indicar caminhos em relação ao papel dos atores sociais no Aparelho Ideológica do Estado. Seguem alguns depoimentos que estão em registro no próprio colégio e de posse também deste pesquisador. As fotos bem como os depoimentos foram autorizadas pelos pais dos alunos envolvidos assim como as produções artísticas que mostram claramente o envolvimento das representações sociais.

Foi perguntada, a Leidiane Gomes dos Santos, aluna da sexta série e envolvida no processo uma pergunta por um outro professor que não fosse este pesquisador.

O que você achou das aulas de Educação Artística do Professor Henrique Manhães?

“ Eu achei  muito boa e interessante  e me acrescentou vários aprendizados não só aprendendo a pintar mas também a observar como qualquer pessoa pode ser um artista, é só usar a criatividade e se deixar viajar na pintura e acrescentar amor, carinho e tudo o que está sentindo no momento”

 

De forma a perceber a uma releitura da aluna, entende-se que a partir de seu depoimento que “qualquer pessoa pode ser um artista” Isto me remete a questão da escola, principalmente aquela que atravessa por dificuldades por ser periférica e com um público que desconhece espaços culturais por negligência, também, do poder público. O ator social remeteu-se aos seus sentimentos e “a tudo que está sentindo no momento”. Este grifo nos leva a pensar no caminho da criatividade e das fronteiras educacionais que passa e perpassa pelo existencialismo, sem ao menos, por vezes nos darmos conta.  O “ a tudo que está sentindo no momento” é o princípio de uma teoria educacional progressista que pode desenvolver nas aulas de Educação Artística, a Filosofia e, assim como  Paulo Freire perfeitamente proferia que o professor aprende com o aluno. Só me dei conta da questão do existencialismo, da filosofia após ter lido o depoimento da aluna. O “que está sentindo no momento” remete ao aluno a enfrentar a verdade de que algo de bom ou ruim acerca da realidade de todos nós e remete ao próprio educando o significado da existência humana.

Mais adiante, após leitura, deparei-me com observações que puxavam, neste momento, o sufoco na garganta. Não podia me permitir a distanciar-me do que me é próximo. Tal pergunta a seguir contextualiza o parágrafo anterior. A pergunta foi a seguinte:

 

Você gostou de observar o desenho do colega? E fale também sobre seu desenho, o que você quis transmitir?

“ Gostei, fiquei observando as coisas boas e ruins. Sinceramente, antes eu desenhava muito, mais ultimamente (há uns três ou dois anos) eu não sei mais o que desenhar e acabo que não desenho e quando eu fiz o quadro que foi pedido pelo professor, fiz o que me veio na cabeça”

Fugir a regras e valores foi o que foi permitido a aluna. “ Fiz o que me veio a cabeça”.  A análise lógica desta fala me remete a preferência que cada um tem em seu âmago, embora ela soubesse identificar teoricamente em qual das escolas estudadas em classe o desenho se encaixaria. É bom que se lembrem de qualquer escolha, seja ela fácil ou difícil, mas que se saiba o que se está fazendo.

Por ser uma turma bastante heterogênea e com mais de 55 alunos não poderíamos introduzir todos os depoimentos, embora o diálogo tenha sido apreciado. Ainda cabe ressaltar e dialogar com o que se segue.

Esta é a contribuição do aluno  Rogério Luiz da Silva (sexta série).

 

O que você achou das aulas de Educação Artística?

“Eu achei muito interessante porque aprendi muita coisa legal, aprendi a dor valor ao que eu sei fazer agora. Agora eu sei fazer vários quadros e sei identificar se é uma composição expressionista, impressionista, etc.”

Perguntando ao mesmo aluno:  O que você sentiu quando viu sua obra exposta na Secretaria de Educação?

“Eu me senti um garanhão. Pude tirar onda com meus quadros e também pude tirar onda para a minha família, pra mim e pros meus amigos que acreditam no meu trabalho”

Sentir destes atores sociais à alegria de possuir-se, de sentir-se, de acreditar em si como homem social e político vão além do que se possa pensar somente no imediatismo de uma relação social em que foi realizada uma experiência vivencial de ação e comprovação imediata da ação tanto na escola e estendendo-se para outros espaços sociais em suas representações.

O pesquisador consciencioso que coloca os frutos dos seus conhecimentos à serviço do coletivo percebe a qualidade do próprio e que pode ser entendida como construção para si e para a sociedade.

As dimensões destes atores não limitaram-se apenas ao espaço escolar, mas a um conjunto mais amplo, situando-os em relação a rua, a casa e ao trabalho e colocando referências que os legitimem.

“Somos de uma geração para qual a obra criadora, esse primeiro escalão da obra de arte, foi reduzida a clandestinidade. Estude! Copie! Repita!… Não tínhamos lápis nem papel. A arte para nós, era o Cristo na cruz da igreja ou os figurinos da moda nos catálogos da Samaritaine. Mas a vida caminha… Num século em que a imagem é rainha, em que papel, guaches e aquarelas guarnecem as prateleiras dos bazares, ajudem seus alunos a ultrapassarem o estágio da bandeira azul, branca e vermelha; abra-lhes as portas encantadas de um mundo que nos foi proibido e que eles vêem com os seus olhos inocentes de poeta, de artistas, de construtores, a caminho do seu destino de homens” (FREINET, 2000, p. 32 – 33)

 

Acho que a escola dá e se faz atuante de tentativas de acertos no resgate da Disciplina de Educação Artística  apropriando-se do que não é o oficial para que educando desbravem além das fronteiras as cores da nossa bandeira.

Pretende-se também que o próximo Governo do Estado do Rio de Janeiro (o atual desta gestão de 2007) respeite o profissional de Educação Artística e que intencionalizadamente e definitivamente acabem com práticas migratórias de professores de Língua Portuguesa para preencherem espaços de uma disciplina que exige, sobretudo, uma construção de significados educacionais, pois a Disciplina de Educação Artística embasa-se, sobretudo, também, numa Pedagogia de entendimento, de personalidade e de intervenções como qualquer outra disciplina do Currículo Oficial.

 

 

 

 

 

 

  1. Considerações Finais

Produzir até aqui este artigo foi um desafio e um resgate de memória.  Tudo isso porque entende-se que o conhecimento não é mera repetição, mas o resultado de aplicação de métodos e técnicas que são experienciadas na academia e nos programas de pós-graduação,e, antes destas premissas, o ousar e saber ousar.

Todas as funções que me são convocadas a desempenhar contribuições, desde que possa ser oferecido o ensino/aprendizado, uso e me aproprio dos instrumentos para que tal ação se efetive. Boas medidas dependem de bons instrumentos, isto é, de recursos que satisfaçam as exigências básicas de validade, pois em qualquer campo encontraremos “as minas” que não podemos pisar. O campo simbólico de Bourdieu, a complexidade à luz de Morin,  a sedução de esperança e de atuação política de Paulo Freire e as observações atentas de Tomaz Tadeu da Silva me remeteram a caminhos de sabor mas, sem nunca deixar de perceber  que os dissabores existem e que estão aqui, ali, acolá, por vezes, do seu lado.

É sabido que as relações de força e poder no Aparelho Ideológico do Estado são tão aparentes tanto quanto a sodomia do Banco Mundial que reflete nos espaços sociais e principalmente em suas representações. Mas investir numa pedagogia desafiadora, sem ser ingênua, foi para este pesquisador trabalhar com a pedagogia interativa e dialógica, como um processo constante de investigação que se fez solidariamente com os agentes da ação. A troca de experiências pede/despede/contrapede/ espaços e tempos de formação e informação mútua, nos quais o professor é chamado a desempenhar o papel de formador e formando.

Esta formação de professor-pesquisador advém também de exercícios reflexivos que procura superar ações contraditórias e espontaneístas, formando-se então o pensamento lógico-reflexivo que se pode subverter sem se perder os sentidos da ação humanizadora responsável pela tessitura do mundo.

 

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BARBOSA, Ana Mãe. Teoria e Prática da Educação Artística. São Paulo, Cultrix, 1975.

BORO, Anamelia Bueno. O olhar em construção. São Paulo, Cortez editora, 2001.

BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo, Perspectiva. 1997.

_________.  O Poder Simbólico. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1997.

DEMO, Pedro. Saber Pensar. São Paulo, Cortez Editora.2001.

EGREJAS, Marisa. O currículo de Educação Artística em escolas Municipais do primeiro grau do Rio de Janeiro. Dissertação de Mestrado: Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1996.

 

FREINET, Célestin. Pedagogia do Bom Senso. São Paulo, Martins Fontes. 2000.

 

LAJOLO, Marisa. Do mundo da Leitura para a Leitura do Mundo. São Paulo, Editora Ática, 2005.

LOPES, Regina Pereira. Pedagogia e emancipação humana. Campinas, Olho d’água, 2005.

MORIN, Edgar. A cabeça bem feita: Repensar a reforma e reformar o pensamento. Rio de Janeiro,  Bertrand Brasil, 2001.

ROGERS, C. Liberdade para aprender. Belo Horizonte, Interlivros Editora, 1972.

SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de Identidade: Uma introdução às teorias do Currículo. Belo Horizonte, Autêntica, 2003.

TAVARES, José. Resiliência em Educação. São Paulo, Cortez editora, 2004.

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