Neiva Pavesi
Ao apagar das luzes de 2005, um ano pontuado de frases vazias, palavras suspeitas, mentiras, leviandades, bate-bocas e presepadas, falou-se em Homer Simpson. Muito ti-ti-ti, muito blá-blá-blá, muitos egos abalados, outros nem tanto. Neste janeiro de 2006, de chuva e sol, de calor, luz e cor, expresso meu ponto de vista sobre o telespectador brasileiro ser ou não ser clone da triste figura.
Afinal de contas, por que tanta polêmica e tanto disse-não disse? O mérito da reportagem foi trazer à baila o “óbvio ululante” que não queríamos nem gostaríamos de encarar. Em sã consciência, quem não sabia disso? Quem pode achar o noticiário televisivo um informativo isento capaz de inclusão política e social, capaz de bem informar para formar cidadãos críticos? Deixamos que a nossa inteligência e capacidade de raciocínio fossem subestimadas. Deixamos que, praticamente ao nascer, nos colocassem antolhos. Com o campo de visão limitado, só vemos e aprendemos o que nos permitem. O objetivo da sociedade utilitarista é, justamente, que sejamos todos medíocres, com visão reduzida sobre uma vida mais ampla. Como não conseguimos tirar os antolhos, somos o que fizemos de nós: não temos autoconhecimento, nem autorrespeito, nem autoestima. Deixamos de questionar qual a nossa relevância para a nossa própria sobrevivência como seres humanos. Somos um povo acomodado; nossa inércia é crônica e anacrônica.
Sabemos que somos manipulados, só não temos a coragem de admitir isso. Qual a surpresa? Continuamos com um pé na senzala e fazemos tudo o que nosso dono mandar. Inclusive transformar notícias de pé-quebrado em verdades absolutas.A grande novidade foi a citação desabonadora, a comparação com aquele abilolado da série americana. Por falar nisso, veio-me à lembrança os think tanks americanos citados por Rose Marie Muraro em seu livro Memórias de Uma Mulher Impossível. Coincidência?!
A comparação foi um soco no estômago para milhares de brasileiros com um pinguinho de amor próprio: viram-se nus diante de Sua Alteza o editor-chefe, o senhor das notícias, o poderoso comunicador. Um tapa na cara; uma bofetada que doeu mais porque sabíamos disso e fizemos de conta que não era conosco. Somos o país do faz-de-conta. Culturalmente de terceiro mundo nos enganamos dizendo que somos uma sociedade emergente.
Merecemos a comparação, só não esperávamos que fosse tão escrachada assim. E que viesse de quem veio, afinal , somos nós que mantemos os altos índices de audiência da emissora e garantimos o ótimo salário do comunicador, porque permanecemos hipnotizados frente à tevê e, no dia seguinte, repetimos como papagaios o que ouvimos, ou pensamos ouvir. Nem nos damos conta de que, na verdade, somos os senhores absolutos do realduto que abastece a emissora: é através dos índices medidos pelo IBOPE que a enxurrada de reais chega aos bolsos dela e do comunicador. Na sociedade do espetáculo em que vivemos, quando a imagem se sobrepõe ao pensamento, parece-me inevitável a alienação que campeia por esses brasis. Daí não conhecermos o nosso poder.
Comparar-nos com Homer foi a maior babaquice que o editor-chefe cometeu. Estar do outro lado da telinha não o isenta dos mesmos “atributos”. Somos todos brasileiros, cara pálida. Como você não é um deus, apesar de se achar o próprio, desça da pose e acrescente Simpson ao seu sobrenome.