Por Conrado Vaz
Revista Partes – Ano V – fevereiro de 2005 – nº 54
Naquela sexta-feira, Pachecão, como era conhecido, engordou a já obesa estatística de desemprego no Brasil. Seu ex-patrão, o novo gerente de logística, que tinha a metade da sua idade e o dobro do seu salário, lhe explicou o inexplicável: Uma consultoria alemã realizara um downsizing para a obtenção da certificação ISO. O trabalho que fora dele por 25 longos e rotineiros anos agora era realizado em uma cidadezinha de nome estranho, que ficava na China.
“Tudo por causa de um alemão fdp”, praguejava, tentando achar um culpado pela sua situação.
A cerveja naquela sexta não estava tão gelada nem o bar tão animado quanto nos sem número de sextas-feiras que brindou ao futuro com seus amigos.
Aliás, o brinde semanal estava ficando cada vez menor, por falta de quórum. As cabeças estavam rolando na empresa já havia meses.
Em uma tarde de domingo, uma ou duas semanas depois de ter se tornado um número, Pachecão decidiu que não iria se deixar abater. Iria realizar seu sonho – montar seu próprio negócio.
Qual negócio?
Hora do jantar. Horário ideal para comunicar sua resolução. Aproveitando o início da novela, oportunamente a hora em que sua esposa não iria prestar muita atenção na conversa, comunicou sua decisão.
Seus dois filhos o aplaudiram. Maria, sua esposa, desligou a televisão.
Percebeu que aquela seria uma longa noite.
Maria foi a primeira. Certamente pensando no fundo de garantia, que estava a cada dia garantindo menos, perguntou qual seria esse negócio?
Pachecão havia sido pego desprevenido. Ele não sabia que negócio queria montar.
Ouvira falar que um amigo de sua irmã estava ganhando muito dinheiro com canecas personalizadas.
“Canecas personalizadas?” indagou o filho mais velho, estudante de economia.
A idéia foi descartada.
“Vamos montar um bar”, falou o mais novo.
Pachecão lembrou das inúmeras vezes que ficara pedindo para o português, dono do boteco a que ia toda sexta-feira, pendurar a conta que nunca era paga. Mais uma idéia descartada.
“Pai, o que você sabe fazer?”. A pergunta mais sábia da noite.
Pachecão fazia parte de uma linha de produção de motores de geladeira. Não sabia como se montava um motor ou qual a função da peça que era de sua responsabilidade. Não sabia como funcionava uma geladeira e muito menos qual era o custo ou o material empregado na peça.
Em resumo, não sabia nada, não sabia fazer nada. Podia montar qualquer negócio. Todos seriam igualmente difíceis.
Maria, que permanecera calada durante todo o tempo, se manifestou, com um brilho nos olhos: “Vamos vender trufas, empadas e salgadinhos para festas”.
Espanto geral.
“A Zuleide, minha amiga do cabeleireiro, montou uma lojinha depois de vender salgadinhos para festas durante um ano. Está super feliz.”
“Eu cuido das finanças”, se pronunciou o futuro economista.
“Eu vendo os salgadinhos”, falou o mais novo.
“Eu entrego os salgadinhos ”, falou Pachecão. Mal sabia ele que, após ser despedido por um gerente de logística, se tornaria um.