por Sandra Kezen
– Mãe, me dá um copo dágua?
– Mãe, eu quero um celular.
– Mãe, ela mexeu nas minhas coisas!
– Mãe, faz um bolo de chocolate?
– Mãe, por que você trabalha tanto?
– Mãe, você está horrível com essa cor de cabelo.
– Mãe, por que você tem que estudar mais?
– Mãe, que horas você volta hoje?
– Mãe, tá na minha vez de mexer no computador!
– Mãe, por que você não vem almoçar em casa?
– Mãe, tô com fome!
Elas usam de tudo para tirar minha concentração, para chamar minha atenção: querem ficar com comigo. Ligam para o trabalho algumas vezes por dia: a mais nova para saber se precisa lavar o cabelo ou que roupa vai usar para o curso de inglês; para dizer que precisa comprar um presente para a coleguinha que faz aniversário hoje à noite, e quer que EU vá junto pra comprar, o pai não “serve”, porque não entende de moda para garotas (acho que nem eu, já que eu sou de “outra época”); que tem que levar material de artes amanhã de manhã bem cedo, que já me disse isso na semana passada, como é que eu pude esquecer???; a mais velha para que eu a leve ao cabeleireiro; para dizer que quer o CD de algum(a) cantor(a) novo(a); que quer um computador novo; que quer ir ao show daquela banda nova, etc, etc, etc. Brigam por tudo e por nada, mas quando querem algo em conjunto, viram as melhores amigas. E são amigas carinhosas, também:
– Mãe, não chora. Você pode fazer de novo essa tal prova para o mestrado, não pode?
– Mãe, vamos lanchar?
– Mãe, eu te adoro.
– Mãe, vamos ver esse filme juntas?
Assim são os filhos. Despertam em nós as maiores emoções de nossas vidas. Não conseguimos ficar indiferentes a eles. Vê-los dormindo é como contemplar anjos, e, no entanto, de anjo não têm nada, como, aliás, qualquer um de nós. Muitas de nós dariam a vida por eles, muitas de nós deram os melhores anos de suas vidas a eles. “Valeu a pena? Tudo vale a pena, se a alma não é pequena” , como diz o grande Fernando Pessoa.
Muitas de nós, que vivemos numa época em que é impossível não trabalhar, carregamos uma enorme carga em nossos ombros: é a famosa culpa por não acompanhar mais de perto o dia-a-dia de nossos filhos. Gostaríamos de ficar com eles mais tempo, sabemos que eles precisam de nós. Mas também é preciso que os deixemos para que resolvam suas pequenas coisas. Também é preciso que retomemos a nossa vida. Precisamos olhá-los de longe, às vezes, senão corremos o risco de sufocá-los e nos sufocarmos com esse amor todo. Precisamos ir adiante e precisamos deixá-los ir. É tão difícil nos separarmos deles! No entanto, chega uma hora em que é preciso olhar mais para nós. Dedicamos tanto tempo à criação de nossos filhos que esquecemos de nos dedicar a nós mesmas. Também precisamos de mais tempo para nós, para resolvermos nossas coisas. Ou para não resolvermos nada. A decisão é nossa. Vale a pena nos dedicarmos a nossos filhos, acompanhá-los bem de perto, mas não vale a pena esquecermos das coisas de que gostamos de fazer. Devemos ter consciência disso. Com a correria de nossas vidas, é muito difícil achar um tempinho para nós. Contudo, se nós mesmas não lutarmos por mais esse tempinho, quem o fará? Por isso, às vezes é preciso dizer que vamos cuidar mais de nós: nós também temos que ir ao cabeleireiro, à manicure, ao cinema, ao teatro, aos shows de nossos artistas favoritos, ouvir nossos CDs, ler nossos livros. O importante é não deixar a vida passar sem fazer alguma coisa para nós mesmas. Não podemos esquecer de nós. É muito triste não ter o que fazer quando os filhos crescem e vão-se embora, viver suas vidas. Não devemos nos perguntar: e agora, o que vou fazer? Sabemos o que vamos fazer: há uma vida inteira para viver, milhões de coisas por fazer e por aprender. E cabe a nós pensar nisso. Desde já. Por nós mesmas.